"Por Mundos Divergentes", antologia com histórias de Ana C. Nunes, Nuno Almeida, Pedro G.P. Martins, Ricardo Dias e Sara Farinha (Editorial Divergência)
Esta antologia reúne uma série de contos distópicos (futuros em que a humanidade não está no seu melhor, o oposto de utopia, embora um dos contos seja, em essência, utópico), passados no nosso Portugal.
A premissa chamou-me logo a atenção (e refiro-me a antes de eu própria submeter um conto à antologia, claro).
Ora, como sempre, vou dar a minha opinião conto a conto, em baixo, mas no geral foi uma leitura muito interessante. Diferentes visões do que poderá ser o futuro do país e da humanidade. Uns mais tecnológicos, outros mais rurais, mas todos com boas histórias.
A nível de design, devo dizer que gosto bastante da capa, em contraste com a contra-capa que desgosto por ser praticamente ilegível. O interior do livro está muito comprimido e poderia estar mais bem organizado, de forma a ser mais apelativo. Quanto às ilustrações interiores, mencionarei cada um dos trabalhos juntamente com os contos (de forma individual), visto que cada história foi interpretada por um ilustrador diferente.
No geral recomendo pois as histórias são bastante boas e acho que quem tem curiosidade sobre o tema, e as raízes portuguesas que este contém, irá ser agradavelmente surpreendido.
"Patriarca", de Ricardo Dias (ilustrações de Rui Miguel Gomes)
Neste conto as pessoas estão oprimidas por um sistema que vigia cada um dos seus passos, das suas conversas, e das suas intenções. Um pouco ao estilo do 1984 (George Orwell). O protagonista cai no erro de dizer algo que é tido como anti-sistema e a isso seguem-se várias situações que culminam num excelente final.
Ora, no início a prosa não me cativou por ser muito explicativa. Isto melhorou a partir da última parte e o final, efectivamente, é muito bom. Apesar de eu achar que o protagonista não tinha muita personalidade, aceitando tudo com demasiada facilidade e questionando pouco o que lhe aconteceu ao longo da história.
No respeitante à ilustrações, achei-as pouco apelativas e muito duras, ou seja, o traço era pouco confiante. Apesar de achar que o ilustrador se esforçou bastante por mostrar o ambiente, a técnica foi insuficiente.
"Em Asas Vermelhas", de Nuno Almeida (ilustrações de Ana Santo)
Cidades muralhadas, dividindo duas estirpes da sociedade, sendo que só a mais baixa, a que vive na miséria, sabe da existência da outra. Ou não morassem eles, e sobrevivessem eles, do lixo dos restantes.
Premissa bem interessante e bem executada, embora eu ache que mereceia um texto mais extenso para alcançar o seu verdadeiro potencial.
Temos dois protagonistas, um de cada lado da sociedade: Heidi e Dani. Mas foi a primeira que, a meu ver, distorceu um pouco a prosa. Ou melhor, a mudança radical da personalidade de Heidi. Isto porque no início Dani é aventureiro e Heidi é mal-educada e pretenciosa. No fim Dani continua corajoso (embora eu ache que matou com demasiada facilidade) mas a Heidi perde o seu pretenciosismo assim que cai no outro extremo da sociedade. Assim do nada!).
Enfim, tirando isso gostei bastante da prosa e adorei especialmente a primeira parte do conto. No entano achei que a resolução do conflito foi facilitada, apesar de ter gostado muito dos parágrafos finais.
No que toca às ilustrações, gostei bastante. O traço é simples mas limpo. Acho que teria funcionado melhor com um pouco mais de negro, para entrar no espírito do conto, mas são bons trabalhos.
"Dispensáveis", de Ana C. Nunes (ilustrações de Manuel Alves)
Sobre este não vou comentar, por ser a autora, mas deixo uma nota de apreço pelo fantástico trabalho do ilustrador: Manuel Alves. Se não conhecem o trabalho dele, convido-vos a visitar o seu site
AQUI.
"Arrábida8", de Pedro G.P. Martins (ilustrações de Leonor Ferrão)
Talvez este seja o melhor conto que li, até hoje, do Pedro G.P. Martins. Em
Arrábida8, o autor mistura a ciência com um futuro muito envolvente. O protagonista é um cientista que estuda a causa da diminuição da população de uma espécie no Tejo e isso irá conduzí-lo, e à sua colega de trabalho, numa descoberta que muitos tentam manterem segredo.
Gostei imenso da prosa, da sequência da acção e das personagens. Gostava muito de ver mais histórias passadas neste futuro distópico.
Quanto às ilustrações da Leonor Ferrão, são visualmente apelativos mas teria gostado ainda mais se fossem mais detalhadas e mostrassem mais o ambiente da história.
"Somos Felizes", de Sara Farinha (ilustrações de Magde Matias)
Sara Farinha traz-nos um futuro em que tudo na sociedade é desenhado para levar os habitantes à felicidade, mas o protagonista irá descobrir que certas coisas na vida nunca poderão ser esquecidas e que a felicidade não é algo que se possa forçar.
O conceito desta história está muito bom mas o início do texto confundiu-me bastante. Já na segunda parte gostei mais da prosa e consegui ligar-me às personagens que, em poucas páginas, ficaram bem vincadas.
O final não surpreendeu mas isso não fez com que o conto fosse menos interessante. No todo, gostei.
Por outro lado as ilustrações estavam bastante más. Vê-se que a ilustradora se esforçou por mostrar bem as cenas (e isso conseguiu fazer), mas o desenho é muito amador e o acabamento é fraco.
Sinopse:
Num futuro por vezes
próximo, por vezes distante, Portugal sucumbe dos mais variados estados
ditatoriais. Aquele que pensa é um inimigo do Estado. Um inimigo da
pátria que tem de ter cuidado… e os que não têm cura, devem ser
sacrificados pelo bem maior.
Por mundos divergentes conta com
cinco contos distópicos escritos por Ana C. Nunes, Nuno Almeida, Pedro
G. Martins, Ricardo Dias e Sara Farinha.