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sábado, 3 de novembro de 2012

Elasticidade

Não é escassa a discussão, um pouco por todo o lado, em torno de sistemas tácticos. Para muitos, o sistema táctico é apenas um pormenor, e o desempenho de uma equipa depende muito mais das dinâmicas a que ela obedece; para outros, pelo contrário, o sistema táctico é absolutamente determinante. Confesso que ambas as hipóteses me parecem redutoras. Como é evidente, o 433 de José Mota é muito diferente do 433 de Guardiola, embora o desenho táctico seja igual. Daí não se segue, todavia, que a essência do Barcelona de Guardiola não esteja intimamente ligada ao desenho do 433. Aquilo que estou a querer insinuar é que, sem esse desenho, nada daquilo seria assim, ou seja, que embora o desenho táctico não seja suficiente para que uma equipa tenha qualidade, é-lhe necessário.

Um 433 rígido não é bom só porque é um 433. Se há coisa que caracterizou o 433 de Guardiola foi a sua absoluta elasticidade. Os extremos não eram extremos. Raramente eram eles quem dava profundidade e raramente tinham movimentos verticais. Muitas vezes, eram até médios por vocação quem jogava na posição de extremo, precisamente por causa dos movimentos interiores. O avançado também não era avançado, e, se quisermos, os médios não eram médios. Do meio-campo para a frente, havendo referências para cobertura e apoios, havia uma elasticidade tal que a equipa não obedecia a padrões de comportamento convencionais. Por elasticidade não se deve entender, no entanto, liberdade. Os jogadores, não estando presos a posições rígidas, não tinham também liberdade para tudo e mais alguma coisa. Aquilo que tinham era liberdade para esticar o desenho, para lhe conferir elasticidade e imprevisibilidade. Se há coisa que Tito Vilanova flagrantemente decidiu não continuar foi essa elasticidade. Daí a sua recusa, por exemplo, em adoptar o 343 de Guardiola (um sistema ainda mais elástico que usou, até agora, apenas uma vez, se não estou em erro, durante 15 minutos, e que não retomou, apesar do sucesso que teve), e em jogar com médios na posição de extremos. O seu 433 é muitíssimo mais rígido do que era o de Guardiola, e ainda que os jogadores mantenham hábitos de apoios e coberturas semelhantes, a equipa funciona ligeiramente pior precisamente porque não parece existir vontade de forçar a sua elasticidade. Com Vilanova, Messi manteve a sua liberdade. Mas isso talvez apenas porque é Messi. Os extremos são mais extremos do que nunca (tanto ou mais do que na primeira época de Guardiola), e foi-lhes retirada a iniciativa de virem para dentro. A equipa é mais previsível por ser menos elástica, por fomentar menos as combinações interiores e por deixar menos a cargo dos laterais a profundidade de que precisa.

Um dos principais méritos de Guardiola foi precisamente ter conseguido, de ano para ano, aumentar o nível de elasticidade da equipa (culminando com aquele extraordinário 343), sem que se rompesse o seu tecido táctico. Nesse aspecto, superou amplamente dois dos seus mestres, Louis Van Gaal (sobretudo pelo seu 343 losango no Ajax) e Marcelo Bielsa, cujas equipas são, sem dúvida, das mais tacticamente elásticas da História do jogo. Outros há, mais conservadores, que preferem não arriscar tanta elasticidade, temendo rupturas em tal tecido. É o caso de Vilanova, que tem a sorte, porém, de ter herdado uma equipa com processos formidáveis. Um terceiro grupo de treinadores existe para quem a elasticidade parece ser importante, mas que não sabem de que modo a podem fomentar sem que arrisquem descompensações. São os casos, a meu ver, de Jorge Jesus e de Wenger. Se Wenger tem o problema de, pretendendo uma elasticidade acima de tudo horizontal, muito parecida com a do Barcelona, com as movimentações a serem essencialmente do exterior para o interior, e de dentro para fora, não perceber como é que tal ideia se deve suportar em termos de coberturas, apoios e compensações, Jesus tem o defeito de gostar de uma elasticidade de tipo diferente, mais vertical, de permutas entre jogadores de sectores diferentes, com movimentos essencialmente de trás para a frente, o que provoca uma vertigem difícil de controlar e buracos tácticos difíceis de preencher. Bielsa, por sua vez, é um misto dos dois, virtuoso como ambos, mas com os defeitos, não tão acentuados, é certo, e muitas vezes potenciados por alguma falta de qualidade individual dos seus jogadores, de ambos.

Ora, dificilmente Guardiola conseguiria a agilidade táctica que conseguiu se não a tivesse fundado num sistema táctico como o 433 (ou mais tarde como o 343). Em 442 clássico, por exemplo, jamais conseguiria o jogo entre linhas que conseguiu, jamais conseguiria a quantidade de apoios centrais que conseguiu, jamais conseguiria ter sempre os jogadores juntos uns dos outros e juntos do local onde a bola está. O 433 permite, por definição, maior elasticidade do que um 442 clássico, embora haja equipas mais elásticas em 442 clássico do que em 433. O problema não está, pois, apenas nas dinâmicas da equipa, mas também, e muito significativamente, no sistema táctico que se adopta. Se o sistema de Wenger fosse o 433 (e não o 4231), se calhar não teria metade dos problemas que tem. Se Mourinho preferisse jogar com Modric ao lado de Kaká ou Ozil, e não ao lado de Xabi Alonso, se calhar o seu Real daria o salto qualitativo de que precisava. Em sentido contrário, parece-me ser, por exemplo, a grande mais-valia de Vítor Pereira. A elasticidade táctica de uma equipa depende muito das ideias do treinador, daquilo que é pedido aos jogadores, das características dos jogadores, e das dinâmicas treinadas. Mas, no limite, sistemas tácticos diferentes permitem níveis de elasticidade diferentes. Na minha opinião, o 433 (com um só médio-defensivo) e o 442 losango são das tácticas cujo potencial de elasticidade é maior, embora nenhuma delas supere o 343 losango. A equipa que não jogue em nenhum destes sistemas poderá ter processos de jogo interessantes (como a de Jorge Jesus ou de Arséne Wenger), poderá estar optimamente mecanizada (como o Real Madrid de Mourinho), poderá até ser extraordinariamente competitiva (como o Atlético de Madrid de Simeone), mas dificilmente atingirá a excelência. A consequência mais relevante dessa caraceterística a que estou a chamar "elasticidade" é a imprevisibilidade da equipa. Como é óbvio, elasticidade a mais pode provocar, para além de imprevisibilidade, caos e desorganização, pelo que o truque é perceber de que modo, em que condições, e em que medidas, deve ser desejada. Alguns sabem-no. E nenhum desses joga em 4231 ou em 442 clássico.

quinta-feira, 19 de abril de 2012

O Bilbao de Bielsa

Para o Entre Dez, o trabalho de Marcelo Bielsa em Bilbao não é necessariamente motivo de surpresa. Quem se habituou a seguir este blogue, sabe que não é de agora a admiração pelo treinador argentino. Com ou sem resultados, as equipas de Marcelo Bielsa sempre impressionaram. E essa impressão, não os resultados obtidos, é que deve ser o critério decisivo para se aferir a qualidade de um treinador. No início da época, estive para escrever sobre o campeonato espanhol em geral, sobre a crescente qualidade de algumas equipas de segunda linha, e sobre os treinadores responsáveis por essa qualidade. Acabei por não o fazer, e houve coisas que ficaram por dizer sobre treinadores como Unai Emery, ou Mauricio Pochettino. Não são os únicos, mas são os que talvez mais me agradam, de todas aquelas equipas que lutam por um lugar europeu. À excepção de Marcelo Bielsa, claro, que é de outro campeonato.

Na antevisão do jogo de hoje, Ricardo Sá Pinto colocou-o ao nível de Guardiola e de Mourinho. É difícil fazê-lo unicamente porque não tem o palmarés, a nível de títulos, dos outros. Mas as suas equipas raramente desiludem. E, tendo em conta que oferecem sempre um futebol de qualidade, eu diria que o trabalho dele merecia outra atenção. Disse dele, recentemente, Guardiola que se tratava do melhor treinador do mundo. Exagerava, talvez, mas homenageava um dos seus principais mentores. Para mim, que tenho uma ideia de futebol muito específica, e acho que os grandes treinadores da História do jogo são, não aqueles que conquistaram mais coisas, mas sim aqueles que fizeram evoluir a concepção do jogo e deixaram maior legado em termos teóricos, Marcelo Bielsa tem necessariamente de ser colocado ao lado dos principais treinadores, de César Luis Menotti, de Rinus Michels, de Johan Cruyff, de Arrigo Sacchi, e, sim, de José Mourinho e Pep Guardiola. É esta a estima que tenho por Bielsa, estima essa que o futebol do Athletic de Bilbao, esta época, não tem de maneira nenhuma decepcionado.

Como todas as ideias revolucionárias, as ideias de Bielsa requerem tempo para serem implementadas. Os jogadores bascos terão demorado a interiorizar tudo o que deles passou a ser exigido, com Bielsa, mas, agora que a época se aproxima do fim, este Bilbao - e este é o melhor elogio que se lhe pode fazer - é a equipa que vi jogar que mais se aproxima do Barcelona de Guardiola. Em Old Trafford, frente a um todo-poderoso Manchester United, sem estratégias de gente pequena, assumiu o jogo, pegou na bola, e fez com que os ingleses andassem a correr atrás dela. O golo de Óscar de Marcos é um excelente exemplo daquilo que, ofensivamente, esta equipa sabe fazer, mas houve, durante o jogo, vários momentos ainda mais brilhantes. Ferguson ficou deslumbrado e reconheceu, no final da eliminatória, que era um regalo poder ver o Athletic de Bilbao a jogar futebol. De uma equipa que se encolhia, como todas as equipas de nível médio-baixo, perante adversários todos poderosos, o Bilbao de Bielsa transformou-se numa equipa que controla qualquer adversário. Isso só é possível de uma maneira: querendo sempre a bola. É esse o principal traço fisionómico desta equipa: ter bola. Falta-lhe, é certo, muito para fazer com a bola o que os jogadores catalães fazem, mas tem, pelo menos, a consciência de que, para o jogo que pretende, um jogo em que é o adversário que tem de se adaptar a si e não o contrário, ter a bola é o mais importante princípio de jogo.



Montado em 433, o Bilbao de Bielsa joga sempre em função da bola, e obriga os adversários a jogar sempre em função deles. Ofensivamente, é uma equipa poderosíssima precisamente porque é das melhores do mundo a trocar a bola, a arranjar espaços de penetração centrais. O trabalho de desmarcação, a preocupação com os apoios interiores, a dinâmica sem bola do ataque, tudo isso oferece ao portador da bola mais soluções do que normalmente se tem. Aos seus pupilos ensinou Marcelo Bielsa a importância do papel da decisão. Aprenderam a tabelar, a devolver o passe, a jogar curto, a sair de zonas de pressão em posse, deixando presos ao relvado três ou quatro adversários. Por vezes, quando se intranquilizam, esquecem tudo isto. Mas, se, porventura, estiverem concentrados, conscientes do que têm de fazer, é muito difícil superar-lhes o jogo.

Entre várias revoluções, fez Marcelo Bielsa de Javi Martinez um central. Quando tantos adaptam defesas a médios-defensivos, adaptar um médio-defensivo (ainda por cima um dos principais esteios da equipa e um dos maiores valores do futebol espanhol na sua posição de origem) a central diz mais de um treinador do que qualquer linha de currículo. Como fez Guardiola com Mascherano, ao perceber que não tinha qualidade para jogar no meio-campo catalão, Bielsa transformou um médio-defensivo de combate num defesa central competente. E, para a posição de médio-defensivo, escolheu um jogador muito diferente de Javi Martinez, Ander Iturraspe, um jogador inteligente, bom de bola, capaz de se posicionar, mas franzino e pouco dado ao choque. Para além de Javi Martinez e de Iturraspe, destaco, no que diz respeito ao sector recuado, o lateral-direito Iraola. Depois, do meio para a frente, não há um único jogador que não me pareça francamente dotado. Ander Herrera chegou esta época a Bilbao, mas a sua competência a meio-campo é inegável. É o cérebro desta equipa, e espera-se muito da sua evolução. Ao seu lado joga normalmente Óscar de Marcos. Embora os seus movimentos sejam muito diferentes dos de Ander Herrera, a sua posição de base é no meio-campo. Partindo daí, invade normalmente espaços verticais, aproveitando os abaixamentos e os movimentos interiores quer do ponta-de-lança, quer dos extremos. Raramente é ele quem aparece entre linhas, e é a ele que, normalmente, é mais difícil atribuir um lugar no esquema de Bielsa. Depois, o trio da frente, com Susaeta e Muniain nas alas. Não podiam ser jogadores mais diferentes, mas igualmente competentes. Susaeta é, para mim, a principal revelação desta equipa. Não sendo um prodígio em termos de técnica, é porém inteligentíssimo. É um exemplo extraordinariamente feliz de como um extremo não precisa de ter argumentos individuais notáveis para ser um grande extremo.



Quanto a Iker Muniain, é simplesmente a maior esperança do futebol basco. Com apenas 19 anos, é ele quem assume, muitas vezes, as rédeas do jogo basco. Quando apareceu, com 17 anos, era um jogador vertical, um jogador de drible, sempre preparado para enfrentar o seu opositor directo na linha. Hoje em dia, sobretudo pelo que Bielsa fez dele, é um jogador muito diferente. Partindo da linha, raramente aposta no um para um. Vem para dentro, procura espaços interiores, e só força o drible como recurso. Muito por causa dessa evolução intelectual, Marcelo Bielsa costuma também apostar nele no meio, nas costas do avançado, no lugar de De Marcos, quando as coisas exigem alteração. Quando assim é, costuma entrar para a ala esquerda outro jogador que me parece bastante habilidoso: Ibai Gomez. Finalmente, na frente, Fernando Llorente. De Llorente, o melhor que posso dizer é que gosto dele ainda ele não era conhecido. Numa selecção espanhola de sub-20 que, em 2005, não chegou mais longe porque Lionel Messi, sozinho, não permitiu, em onde pontificava Cesc Fabregas, havia dois jogadores muito subvalorizados que me impressionaram desde logo: um deles, que nem sequer era titular nessa selecção, era David Silva; o outro, o avançado Fernando Llorente. Desde então, Llorente tem confirmado tudo o que esperava dele. É o protótipo daquilo que deve ser um avançado grande, alguém que sabe jogar de costas para a baliza, que se sabe movimentar, que percebe as movimentações dos colegas, etc.. Quando se fala em Llorente, fala-se normalmente na sua temível capacidade no jogo aéreo, ou nos seus dotes de finalizador. Para ser sincero, esses são os seus atributos menos importantes.

É difícil falar da qualidade desta equipa sem uma maior contextualização de imagens, pois as suas principais virtudes estão na dinâmica, sobretudo com bola, que consegue imprimir. Ainda assim, penso, é importante perceber que é uma equipa capaz de arranjar espaços onde eles não existem, uma equipa que assume sempre o jogo, e uma equipa não entrega o destino à inspiração individual nem ao acaso. O seu principal ponto fraco é a nível defensivo. Desde que conheço Bielsa que sei que não gosta de treinar defensivamente. É um partidário da criatividade, e preferiu sempre perder tempo com a parte criativa do jogo, entregando o trabalho defensivo ao esforço individual dos seus jogadores. Há quem ache que o Bilbao de Bielsa defende ao homem, com referências individuais claras. Baseiam-se estes iluminados em vídeos que encontraram que o confirmam. Acontece que esses vídeos dizem respeito a um jogo específico, um jogo de características únicas e que não se voltou a repetir. Foi o jogo em San Mamés, com o Barça. Nesse jogo, sim, a estratégia defensiva basca pareceu passar por perseguir individualmente os jogadores catalães. Não sendo perfeita a forma como o Athletic de Bilbao defende, não é, contudo, assim tão primitiva. O que se passa é que Bielsa, ao contrário do que parece ser agora consensual, opta por não colocar em fora-de-jogo os adversários. Assim, o Bilbao não defende numa linha de quatro, com os jogadores alinhados uns pelos outros, e vai-se afundando no campo à medida que a bola se aproxima da baliza. Acontece também que o Bilbao, ao contrário de muitas outras equipas, não utiliza uma zona defensiva expectante. Esteja a bola onde estiver, quando está no meio-campo defensivo, o comportamento do Bilbao é sempre feito numa zona pressionante. O que isto significa é que não há nunca momentos de expectativa, momentos de organização zonal; há sempre reacção. Assim, é natural que vejam os iluminados jogadores sistematicamente atrás de jogadores adversários, emparelhados. O Bilbao defende sempre em reacção, sempre em zona pressionante, e isso parece-lhes, a eles, sempre desorganização. Os únicos problemas, a meu ver, nisto tudo, são o facto de abdicarem de uma linha defensiva que lhes permitisse jogar com o fora-de-jogo, e a forma como a equipa activa essa zona pressionante, muito mais preocupada em estar em cima de cada adversário do que em cortar linhas de passe. Ainda assim, diria que podia ser bem pior. O facto de defender sempre em zona pressionante acaba por compensar os defeitos posicionais, e os espaços que inevitavelmente concedem.

De resto, a campanha basca fala por si. As meias-finais da Liga Europa, sobretudo se tivermos em conta que eliminaram equipas como o Manchester United, o Shalke 04, ou mesmo o PSG, são qualquer coisa de inédito, mas é preciso não esquecer que vão disputar a final da Taça do Rey com o Barcelona, e que, no campeonato, estão na luta por um lugar de acesso à Liga dos Campeões do ano que vem. Trata-se de um ano brilhante para o clube, algo que dificilmente aconteceria se Bielsa não estivesse ao comando desta equipa. Há quem ache que a força da equipa está, acima de tudo, na mentalidade competitiva. Essas pessoas estão, obviamente, enganadas. A mentalidade sempre foi a grande arma do clube basco, mas, sem mais nada, nunca passou de um clube de terceira dimensão, que umas vezes lutava pela Europa e outras para não descer. A mentalidade sempre lhes permitiu ser uma equipa difícil de ultrapassar. Mas foi a competência de Bielsa que lhes deu o empurrão decisivo. Com Bielsa, deixaram de ser essa equipa que tudo o que podia fazer era cerrar os dentes, disputar cada lance como se fosse o mais importante da vida, e esperar que o suor chegasse para vencer, e passaram a ser a equipa que troca a bola, que controla o jogo, que obriga o adversário a correr. Com Bielsa, adquiriram faculdades que nunca tinham tido, faculdades que, associando-se à mentalidade que sempre tiveram, permitem sonhar com títulos e deslumbram meio mundo.



Pelo comportamento recente das duas equipas, espera-se no jogo de hoje uma equipa a atacar e a outra, com um bloco baixo e numa atitude expectante, a defender muito perto da sua baliza. Ontem, num jogo de características semelhantes às que espero hoje, a equipa que mais fez por ganhar acabou por perder. O futebol tem destas coisas, e muitas vezes a História escreve-se por quem menos faz para a escrever. Acontece. O que não pode ficar por dizer é que, tal como ontem, a única razão para que a equipa que defendeu (e que não defendeu sequer muito bem) ter superado a equipa que atacou (e que atacou bem) foi o factor "sorte". Hoje até pode acontecer o mesmo, porque todos, mesmo aqueles que esperam que as vitórias caiam do céu, se arriscam a vencer desde que estejam em campo. Mas os que merecem o Olimpo não são os que ganham; são os que fazem o que é certo para ganhar. Como o Barcelona de Guardiola ontem fez, acredito que o Bilbao de Bielsa hoje o fará.

quinta-feira, 17 de junho de 2010

A Primeira Surpresa e a Melhor Equipa

Na estreia daquela que era unanimemente considerada como uma das principais favoritas à vitória final na competição, a primeira surpresa. Os suíços, recorrendo a uma estratégia que, para gáudio dos pragmáticos, parece ser moda neste mundial, conseguiram levar de vencida os campeões europeus. Significa isto que está encontrada a fórmula mágica para vencer os espanhóis e todos aqueles que se impõem pela posse de bola? Há quem ache que sim. O Miguel, um dos nossos leitores, disse o seguinte há uns dias:

"A atitude para ganhar a Espanha é simples: organização na defesa e não deixar-se embalar pelo joguinho deles. E ver muitas vezes o Barcelona-Inter..."

Será que o Miguel tinha razão e que os suíços, ao fazer precisamente isto, encontraram um modo infalível de vencê-los? Só um tolo poderia achar que sim. Ou alguém que não tenha visto o jogo. A Espanha dominou do princípio ao fim, criou 8 ou 9 ocasiões de golo e sofreu um muito esquisito, não num contra-ataque, como parece que querem crer, mas no seguimento de um pontapé de baliza e após vários ressaltos muito felizes. O que se pode dizer é que a razão para a Espanha não ter vencido os suíços, mais do que ter sido a estratégia dos helvéticos e a fórmula mágica do Miguel, foi o simples acaso. Só por manifesta infelicidade é que os espanhóis não ganharam o jogo inaugural e o resto é conversa. A fórmula mágica é apenas mágica para quem acredita em magia. A Espanha fez o seu jogo e encontrou uma boa resistência do outro lado. Dominou, circulou a bola e penetrou várias vezes na defensiva adversária. Se não marcou, foi porque não conseguiu concluir as muitas jogadas que criou. Mais nada. Bastava que qualquer um desses lances tivesse dado golo e os suíços tinham imediatamente de mudar de estratégia. Já a selecção helvética jogou para o empate e acabou por ganhar. É por isso que o futebol é tão fascinante, porque permite a equipas mais fracas encontrarem estratégias que podem conduzir a bons resultados, ainda que para isso dependam muito da sorte. Ao contrário, porém, de muita gente, sobretudo dos comentadores televisivos que, após o primeiro jogo, já fazem da Suíça vencedora do grupo e concedem ao Chile ou à Espanha o segundo lugar, acho que os suíços estão muito longe de terem carimbado o apuramento. Em primeiro lugar, porque terão bastantes dificuldades para vencer as Honduras, até porque os hondurenhos deverão jogar de um modo parecido com aquele em que os suíços jogaram e a Suíça tem carências ofensivas muito relevantes, e depois porque o Chile é, a par da Espanha e da Alemanha, a equipa mais interessante a nível ofensivo, não fosse treinado por Marcelo Bielsa.

É precisamente aqui que quero chegar, ao Chile. Embora os cépticos do futebol ofensivo se centrem no resultado da Espanha para justificar o seu cepticismo, houve no mesmo grupo um jogo que serviu de contraprova dessa justificação. As Honduras jogaram como a Suíça e o Chile venceu. Os chilenos, como os espanhóis, são ofensivamente muito bons. Diria, até, que são a melhor equipa da prova, em termos colectivos, neste particular. São das poucas equipas deste campeonato que opta por um só médio-defensivo e das poucas que tem movimentos verdadeiramente colectivos na base da sua estratégia ofensiva. A facilidade com que a equipa conseguiu fazer passes verticais, introduzindo a bola entre as linhas hondurenhas, tem a ver com a capacidade colectiva da equipa e com a criação constante de linhas de passe nesse sentido. Ao contrário de selecções mais cotadas, como a França ou o Brasil, só para citar dois exemplos de equipas que não conseguiram superar um bloco defensivo baixo e solidário e que revelaram uma tremenda inépcia no momento ofensivo, os chilenos souberam sempre como penetrar no bloco hondurenho. É evidente que existe qualidade individual nisto tudo, com Matías Fernandez à cabeça, bem secundado por Valdivia, Isla e Carmona, sobretudo, mas há essencialmente mão de Marcelo Bielsa na forma como o colectivo se comporta. Não admira, portanto, a extraordinária fase de qualificação dos chilenos. É de Bielsa a responsabilidade por os laterais procurarem o meio como solução de passe; é de Bielsa a responsabilidade pela formação constante de apoios próximos ao portador da bola; é de Bielsa a responsabilidade pela movimentação educada sem bola dos médios, que permite à equipa contornar as zonas de pressão dos adversários; é de Bielsa a responsabilidade pela forma como a equipa cria zonas de pressão alta eficazes. Isto é uma lição. Uma lição aos cépticos e uma lição a treinadores como Dunga, Domenech, Queiroz e Capello. Uma lição que consistiu em demonstrar que não é só o momento defensivo que pode ser fruto de trabalho de um treinador. Deu também uma lição a Carlos Carvalhal, no que toca a demonstrar que só os tolos não aproveitam os mais talentosos.

O Chile pode não ir longe, até porque além de estar incluído no grupo mais difícil da prova, está no grupo que se cruza com o segundo grupo mais difícil da prova, mas este mérito já ninguém lhe tira. Marcelo Bielsa - lembremo-nos - é o mesmo que defende que, ao contrário do que se passa no momento defensivo, o momento ofensivo tem infinitas possibilidades:

"Jamás los técnicos obsesivos se preocuparon por jugar ofensivamente. Yo soy un obsesivo del ataque. Yo miro videos para atacar, no para defender. ¿Saben cuál es mi trabajo defensivo? "Corremos todos." El trabajo de recuperación tiene 5 o 6 pautas y chau, se llega al límite. El fútbol ofensivo es infinito, interminable. Por eso es más fácil defender que crear. Correr es una decisión de la voluntad, crear necesita del indispensable requisito del talento."

Não é por acaso, portanto, que o Chile joga como joga. O seu futebol é fruto do trabalho de um treinador que percebe que o momento ofensivo não pode ficar a cargo da inspiração dos jogadores mais talentosos, mas que deve ser, tal como o momento defensivo, resultado de um trabalho metódico do treinador. O Chile denota uma inteligência táctica, em termos ofensivos, extraordinariamente invulgar. E o que é irónico é que, numa competição em que as principais equipas europeias parecem incrivelmente ineptas do ponto de vista ofensivo, seja uma equipa sul-americana a ensinar como é que se faz. Mais irónico, só se pensarmos que, tirando a Espanha, a única equipa europeia que parece ter ideias é a selecção germânica. Num mundial em que, finalmente, parece haver mais equipas interessadas em defender do que equipas que joguem ao ataque, é de salutar que ainda existam selecções com outra filosofia. A bem do futebol, o Chile, a Espanha e a Alemanha são por isso as equipas em quem mais se deveriam centrar as atenções, sob pena de haver nova regressão na modalidade. Vamos ver que sorte lhes reserva este mundial.

P.S. Um dos comentadores do encontro do Brasil referiu, muito indignado, que um qualquer responsável norte-coreano teria sugerido que Portugal jogava como a Alemanha, e desmentiu-o categoricamente, como se isso fosse um ultraje para os portugueses. A verdade é que, como já tive oportunidade de referir, Portugal tem vindo a tornar-se, aos poucos, numa selecção germânica, uma selecção que dá preferência ao músculo e ao rigor táctico, uma selecção cautelosa, fria, mas na qual não abundam ideias. O mais irónico é que, pelo menos neste mundial, os próprios germânicos são menos germânicos que os portugueses. Por isso, se há algo a condenar na afirmação do norte-coreano, não é o facto de ser ultrajante comparar Portugal à Alemanha, mas o ultraje de comparar a Alemanha a Portugal.

sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

Bitaites de Treinadores

Para começar o ano de 2009, damos a palavra a quem sabe, ou seja, aos treinadores. Ou a quem exerce a profissão de treinador, o que vai dar ao mesmo... Mas antes de lhes passar a bola, uma ou duas coisas sobre Mourinho que podem ajudar a desmistificar algumas coisas, nas palavras do amigo e biógrafo, Luís Lourenço, assim como também nas de Rui Faria e Deco.

"Mourinho sempre disse que os seus jogadores têm que ser inteligentes e que têm que usar essa mesma inteligência." (Luis Lourenço, in Liderança: as Lições de Mourinho, pp.78)

"[...] os jogadores têm de pensar e ser inteligentes para observar e entender o que se passa e evolui à sua volta. Daí José Mourinho dizer que só quer jogadores inteligentes nas suas equipas; eles têm de perceber e para isso têm de pensar." (Rui Faria, in Liderança: as Lições de Mourinho, pp.95)

"[Mourinho é um] treinador com uma inteligência superior, muito ambicioso, que exige que os jogadores também o sejam". (Deco, in Liderança: as Lições de Mourinho, pp.200)

Agora eu: Mourinho privilegia, acima de tudo, a inteligência.


Passemos aos treinadores, então:

1. Jesualdo Ferreira:

Aquando da recente vitória do Porto sobre o Arsenal, no Dragão, tendo a equipa londrina jogado com os reservas, visto já estar apurada, Jesualdo Ferreira afirmou que a vitória do Porto sobre o Arsenal não poderia ser minimizada pelo facto de o Arsenal ter jogado sem os habituais titulares e que a sua equipa era tão nova quanto a apresentada por Arséne Wenger. Francamente, desconhecia a faceta de comediante de Jesualdo...

2. Fabio Capello (La Repubblica, 24 de Julho de 2008):

Ha visto gli ultimi Europei, dal vivo e in tv. Hanno decretato la morte del 4-4-2: non lo fa più nessuno. Lei ci ha vinto molto, alla Juventus e al Real Madrid. E' un modello tattico da consegnare alla storia?
"Nel calcio non si consegna niente alla storia. Ci sono i revival, le rivisitazioni, le piccole modifiche sul modello B. Agli Europei, in realtà, si è giocato il famoso 9-1. Non prendeteci in giro, il calcio moderno è questo: nove che difendono e una punta centrale. Tutti rientrano nella loro metà campo, anche i quattro centrocampisti offensivi. Il calcio di questi tempi è il 9-1".

Han??? No Europeu, jogou-se em 9-1??? Capello no seu melhor. A explicação é que, no futebol moderno, 9 defendem e 1 ataca. Dá-me ideia que isso de moderno não tem nada... Se há algo de moderno no futebol é o facto de todos defenderem e de todos atacarem. Já dizia Cruijff que o seu primeiro defesa era o Romário e que, se ele não defendesse na zona certa, toda a equipa teria de defender mais atrás. E o Cruijff já não é de ontem. O senhor Capello continua a revelar que está há mais de uma década parado no tempo. Para ele, há jogadores para defender e jogadores para atacar. E, ainda por cima, 90% deles servem para defender. Com esta frase, Capello revelou praticamente toda a sua filosofia: é um treinador conservador, com ideias estagnadas e nada equilibradas, incapaz de compreender a evolução que o futebol foi tendo ao longo dos últimos anos. Além da escassez de ideias novas, Capello privilegia a defesa. Para ele, é mais importante defender do que atacar. Para atacar, espera-se pela sorte, ou então pela inspiração individual dos avançados. Boa...

3. Marcelo Bielsa:

"Jamás los técnicos obsesivos se preocuparon por jugar ofensivamente. Yo soy un obsesivo del ataque. Yo miro videos para atacar, no para defender. ¿Saben cuál es mi trabajo defensivo? "Corremos todos." El trabajo de recuperación tiene 5 o 6 pautas y chau, se llega al límite. El fútbol ofensivo es infinito, interminable. Por eso es más fácil defender que crear. Correr es una decisión de la voluntad, crear necesita del indispensable requisito del talento."

O perfeito oposto da mentalidade de Capello é este comentário do ex-seleccionador argentino e actual seleccionador chileno, Marcelo Bielsa. Para Bielsa, aprender a defender é muito mais fácil que aprender a atacar, pois as possibilidades ofensivas são infinitas. Concordo totalmente com isto. Aquilo com que não concordo é com a aparente leviandade com que Bielsa trata a defesa. Defender não é só correr. Aliás, se Bielsa se preocupa com a forma como ataca, deveria preocupar-se com a forma de defender, que é sempre o princípio de qualquer ataque. O erro de Bielsa é separar tão drasticamente as duas coisas. Defender de forma correcta, isto é, com os elementos bem posicionados em campo, é a base essencial para a equipa poder passar da defesa para o ataque em pouco tempo. A ideia de Bielsa é compreensível: para defender, basta haver vontade, pelo que o trabalho a fazer é apenas motivacional, enquanto que para atacar é preciso cultivar a criatividade, o talento, a inspiração, etc. Mas o problema é que defender não é só uma coisa da vontade. Não basta apenas querer. É preciso cultura posicional, educação táctica, etc. É verdade que, para aprender a defender, não são necessários tantos esforços: basta corrigir posicionamentos defeituosos, limar vícios antigos, obrigar os jogadores a preocuparem-se com coberturas, etc. Para atacar, é preciso tudo isto e ainda apelar ao instinto criativo, à capacidade da equipa se tornar imprevisível. Isso é muito mais difícil. Tanto Capello como Bielsa parecem cair no erro de achar que defender e atacar são duas coisas distintas e intocáveis. Mas de entre os dois, privilegio claramente a mentalidade do argentino, pois compreende que o ataque é muito mais difícil de trabalhar do que a defesa.

4. Fabio Capello:

Mourinho sarà un allenatore rivoluzionario per il calcio italiano?
"Ai nostri allenatori Mourinho non ha da insegnare niente. In Italia il calcio tatticamente è una cosa molto, molto seria. Sotto l'aspetto calcistico siamo i più avanzati e ormai tutti conoscono tutto. Mourinho adesso ha in mano una macchina straordinaria e non credo farà rivoluzioni, gli sarà sufficiente portare quell'un per cento di novità".

Uma vez mais, Capello demonstra a paralisia temporal que possui. Desta vez, alia à mesma uma pitada de arrogância. Até há uns anos, isto de a Itália ser o país mais evoluído tacticamente era um mito. Confundia-se evolução táctica com jogar à defesa. E confundia-se aglomeração de jogadores atrás da linha da bola com organização defensiva. Nos últimos 5 anos, principalmente, isto foi corrigido. A Itália já não é o país do "catenaccio" e no campeonato italiano até se marcam tantos ou mais golos do que em Inglaterra, por exemplo. O campeonato, este ano, é provavelmente o mais atraente, com partidas fenomenais entre equipas de segunda linha, coisa sem igual noutros campeonatos europeus, e a grande maioria das equipas é bastante evoluída tacticamente. Aliás, é o campeonato no qual se vislumbra uma maior variedade táctica, desde o 442 clássico da Juventus ao 442 losango do Inter de Mourinho, do 4231 da Roma de Spalletti ao 433 da Fiorentina de Prandelli, do 352 ao 343, etc. Concordo, por isso, que em Itália abunde o saber táctico. Mas a frase de Capello é um frase feita. E uma frase que recorda um saber táctico de uma altura em que não havia assim tanto saber táctico. Quando Capello se refere ao saber táctico dos italianos, está a referir-se a um tempo em que isso era um mito, está a referir-se ao seu tempo e a si. E o saber táctico de Capello é como o de Ranieri: está um pouco obsoleto, no meio de tanta variedade e tanta novidade. Além disto, Capello ainda diz que Mourinho trará, no máximo, um por cento de novidade. Dizer isto é não conhecer a realidade, bem como não conhecer Mourinho. Só ao nível da metodologia de treino, Mourinho rompeu com todo o cânone. Basta lembrar que, ao chegar a Itália com este método de trabalho, suscitou imediatamente a curiosidade alheia. Carlo Ancelloti, um dos que não acha que não tem nada a aprender com Mourinho, disse imediatamente que gostaria de ir assistir a um treino do Inter, tal era o interesse que lhe despertava uma nova maneira de trabalhar. Capello, uma vez mais, revela toda a sua pouca modéstia e toda a sua parca sabedoria.

5. Mourinho:

Prefere Stankovic em posições mais centrais ou encostado à esquerda?
"Muitos pensam que o jogador mais posicional à frente da linha defensiva deve ser um jogador muito defensivo. Eu não penso assim. Penso que esse jogador deve ser um jogador com boa capacidade para jogar a bola, com qualidade, com visão, com tranquilidade, para ser quase como o homem que inicia a construção de jogo nessa zona. E o Stankovic é um jogador com experiência que pode jogar aí. Se tivermos Cambiasso para jogar na sua posição normal, obviamente que Stankovic será uma opção para jogar um pouco mais à frente, mas penso que ele pode jogar nessa posição, sim."
Um jogador como Pirlo?
"Não conheço a ideia de Carlo Ancelloti com Pirlo. Não, agrada-me um jogador de futebol, não me agrada um jogador que destrói o jogo do adversário. Gosto, nesta posição, de um jogador que joga e o Cambiasso joga e Stankovic joga e temos alguns outros que podem jogar nesta posição."

Para muitos, isto já não é novidade. Para outros, talvez não seja assim. Ficam, contudo, as palavras de Mourinho (traduzidas por mim) acerca do assunto. Para ele, um médio-defensivo não deve ser um jogador de características defensivas; deve ser alguém que saiba jogar à bola e não alguém para destruir jogo. Em 2008, essa realidade não é propriamente nova, mas, até ao aparecimento de Mourinho, tirando os holandeses, poucos ou nenhuns treinadores tinham ousado pensar desta forma. É uma das muitas revoluções que Mourinho ajudou a realizar. Num futebol a sério, verdadeiramente colectivo, como poucos o preconizam, jogadores como o típico médio-defensivo "carraça" não fazem sentido.

6. Mourinho (Conferência de Imprensa a seguir ao jogo da Supertaça contra a Roma):

[Sobre a questão de Ibrahimovic não marcar muitos golos.]
"Poderá melhorar, mas penso que, numa equipa, para jogar um futebol de controlo e um futebol com posse de bola, é sempre mais importante um super-jogador do ponto de vista técnico que um jogador que marca golos. Se uma equipa está dependente de um jogador que marca 20 ou 30 golos numa época e se o jogador se encontra num momento difícil, as coisas não serão fáceis."

Para Mourinho, o seu ponta-de-lança não tem de ser um exímio finalizador. Isto, se repararmos nas suas equipas e nos números das mesmas, não é nada de novo. Tirando Drogba, no último ano do Chelsea, e McCarthy, no último ano do Porto e após um final de época em que a equipa tudo fez para que o avançado sul-africano aumentasse o seu pecúlio, as equipas de Mourinho, sendo em conjunto o melhor ataque da prova, não têm normalmente o melhor marcador da mesma. Isto porque, nas suas equipas, marcar golo é uma coisa colectiva, da competência da equipa e não do seu avançado. Para Mourinho, para jogar ao ataque, para jogar em posse, é sempre mais importante um jogador que o possibilite do que um jogador capaz de marcar muitos golos. Assim, numa equipa que queira exercer o domínio de jogo, um jogador que valha apenas pela extraordinária capacidade finalizadora que possui não é um jogador útil. Veja-se o erro (assumido por Mourinho no final da época) que foi a contratação de Mateja Kezman. Para Mourinho, incorporar numa equipa sua um jogador que depende da sua capacidade individual de finalizador é desvirtuar o princípio absolutamente colectivo da sua maneira de pensar. Se quer uma equipa que troque a bola e consiga dominar o jogo, todos os seus elementos têm de ser benéficos para isso. Um jogador que não o seja, ainda que depois seja capaz de finalizar melhor do que outros, é sempre um corpo estranho no interior de um colectivo afinado por atributos colectivos. Sim, estou a insinuar que a Mourinho jamais lhe interessaria um jogador como Liedson...