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Ponto prévio: desta vez, não irei classificar o desempenho individual dos jogadores de Portugal. Segui o jogo numa marisqueira, à conversa entre amigos, no meio de caracóis, saladinhas de polvo e outras iguarias, bem acompanhadas por cerveja fresquinha. Depois, a própria emotividade da partida desaconselha apreciações quantitativas e prefiro centrar a minha atenção em questões colectivas ou de âmbito mais alargado. Posto isto, olhemos para o onze titular de Portugal:
Como jogou Portugal?
Tal como tinha
escrito, na antevisão da eliminatória, não se registaram surpresas nas opções de Scolari. No papel, João Moutinho (depois Raul Meireles) juntava-se a Petit, deixando a responsabilidade de construção para Deco. No entanto, a maior chamada de atenção vai para a colocação de Simão na direita, em detrimento de Cristiano Ronaldo. Tal como previa, a selecção nacional mostrou algum receio face às investidas de Philipp Lahm e à preponderância ofensiva do flanco esquerdo alemão. Olhemos, agora, para a "Mannschaft":
Como jogou a Alemanha?
Também a Alemanha demonstrou o devido respeito pela selecção portuguesa. Face à indisponibilidade de Torsten Frings, Joaquim Low teve a sagacidade táctica de preencher o meio-campo defensivo com as entradas de Simon Rolfes (Bayer Leverkusen) e Thomas Hitzlsperger (Estugarda), libertando Michael Ballack para terrenos mais ofensivos. Deste modo, quer em 4x1x4x1, quer no esquema 4x2x3x1, a selecção germânica jogou com os sectores mais unidos, impedindo que Portugal aproveitasse espaço entre-linhas. Inteligentemente, descontando o frenesim dos últimos minutos, a Alemanha soube dominar as transições e colocar muitas dificuldades ao futebol mais técnico dos nossos jogadores.
Quais os motivos da derrota?Em grande medida, uma das razões já foi apresentada: a Alemanha ocupou melhor os espaços, montou um meio-campo solidário atento à perda de bola e soube retirar vantagem de uma maior agressividade nos duelos individuais. A selecção germânica estudou os pontos fracos do adversário e conseguiu explorar dificuldades evidenciadas por Portugal na organização defensiva.
Contudo, não há como fugir do factor mais decisivo: os lances de bola parada. Nestas situações específicas, a opção tem recaído sobre uma marcação individualizada, quando o ideal seria defender à zona ou, porventura, de forma mista. Relembro que o golo sofrido com a Rep. Checa nasceu da marcação de um pontapé de canto e a derrota na final do Euro’2004, frente à Grécia, resulta de lance semelhante. Para agravar, o guarda-redes Ricardo pouco (ou nada) tem evoluído, quando se exige maior destreza nas saídas a cruzamentos. Lamentavelmente, não aprendemos com os erros do passado.
Scolari: seleccionador, treinador ou psicólogo?Como não poderia deixar de ser, o "sargentão" tem de ser responsabilizado pelas escolhas técnicas, opções tácticas e consequente afastamento da selecção portuguesa. O desempenho global ficou aquém das expectativas, até pelo que tínhamos conseguido em edições anteriores. Pessoalmente, a eliminação não me decepciona porque não tinha grande ilusão em relação à vitória final. Ao contrário do folclore proporcionado pela comunicação social, sempre mantive alguma prudência sobre a real valia desta equipa.
Sobre Scolari, digo o seguinte: é meio treinador. Muito capacitado na construção de um espírito colectivo, baseado em valores de união e solidariedade. Aliás, para o bem e para o mal, as suas opções técnicas acabam por reflectir este predicado. Na função de seleccionador, o futuro treinador do Chelsea nem sempre escolhe os que estão em melhor forma (física, técnica), mas aqueles que lhe oferecem maior confiança e predisposição para "viver" em grupo. A juntar a isto, sabe retirar o melhor partido da parte psicológica, gerindo muito bem a vertente mental e motivacional dos seus atletas.
Porém, tal como afirmei, Scolari é meio treinador. No seu discurso, abdica dos aspectos estratégicos e não privilegia o lado táctico do jogo. Como tem sido constatado, ao longo destes anos, raramente trabalha um plano B alternativo e demonstra fraca maleabilidade estratégica para lidar com a adversidade. No meu entender, a razão subjuga-se à emoção. Em demasia. É certo que uma equipa pode ser um estado de ânimo. Mas, ainda acredito que o futebol é um jogo e, como tal, deve ser estudado ao detalhe. É isso que faz a diferença.
Fonte: Imagens retiradas da
"Marca" online.