Publicado originalmente no site JLPOLÍTICA, em 18 de outubro de 2022
Por Eduardo Almeida *
Sergipe não tem tradição de fazer herdeiros políticos. Na recente história política do Estado, não há registro desse tipo de herança entre os políticos que chegaram ao topo do poder, nele permaneceram por um tempo razoável e passaram a ter grande influência no tabuleiro eleitoral sergipano.
Da redemocratização para cá, nenhum líder político de projeção estadual se deu ao trabalho de preparar um herdeiro para substituí-lo quando a aposentadoria política lhe batesse à porta.
O máximo no que esses líderes se empenharam foi fazer candidato com força eleitoral suficiente para sucedê-los no poder quando as regras do jogo não lhes permitissem mais a reeleição.
Fazer sucessor não é fazer herdeiro político. João Alves Filho chegou ao Governo de Sergipe em 1982 surfando em um mar de votos, apoiado pela família Franco, na época o que Sergipe tinha de mais poderoso do ponto de vista político e econômico.
João Alves soube transformar a oportunidade em capital político capaz de encorajá-lo a, em um primeiro lance, romper com os Franco e, depois, eleger Antônio Carlos Valadares governador, derrotando José Carlos Teixeira, candidato da família Franco.
João voltou ao governo em 1990 e em 2002, sempre como candidato dele mesmo. O último mandato foi o de prefeito de Aracaju, de 2013 a 2016, conquistado com o prestígio político que construíra com maestria. Politicamente, saiu da vida como entrou: sem ter sido e sem deixar herdeiro político. Com a saúde debilitada pelo Alzheimer, morreu em 2020, aos 79 anos.
Antônio Carlos Valadares deixou o governo em 1991 para, em seguida, ser senador por três mandatos e 24 anos sem interrupção. Nesse ínterim, tentou, sem êxito, ser prefeito de Aracaju e voltar ao governo.
Recorreu a uma solução doméstica para tentar emplacar uma herança política. Quis fazer de Valadares Filho prefeito de Aracaju e governador de Sergipe, mas as urnas rejeitaram-lhe o plano. Está com 79 anos, em gozo de iminentes aposentadorias políticas que não lhe negam os feitos, mas não deixar herdeiro não deixa.
Albano Franco chegou ao governo em 1994, reconciliado com João Alves e por ele apoiado. Foi reconduzido ao cargo em 1998, desta vez rompido com João e apoiado por Jackson Barreto. Não conseguiu fazer de Francisco Rollemberg o seu sucessor no governo e, em 2002, teve que passar a faixa para João, que estava de volta para o seu terceiro e último mandato de governador pela eleição de 2022.
Com o prestígio de dois mandatos de senador - 1983-1994 -, dois de governador e um de presidente da poderosa Confederação Nacional da Indústria por 14 anos - 1980-1994 -, Albano exerceu um mandato de deputado federal entre 2007 e 2011, antes de se dedicar às atividades empresariais em detrimento da política. Tem 81 anos, está com a saúde abalada pelo Parkinson e não tem ninguém que possa ser chamado de seu herdeiro político.
Jackson Barreto dominou por muito tempo a política em Aracaju, tornando-se um verdadeiro campeão de votos na capital. Foi tudo o que quis e o quanto quis. Vereador por dois mandatos de Aracaju, prefeito aracajuano por dois mandatos - 1986-1988 - e - 1993-1994 -, foi responsável direto pelas eleições de Welington Paixão e de João Gama para prefeitos e elegeu-se deputado federal por quatro mandatos.
Era vice de Marcelo Déda e, com a morte do governador em 2013 por causa de um câncer, assumiu definitivamente o governo, sendo reeleito em 2014, com a força do próprio prestígio. Tinha como vice Belivaldo Chagas, que rompera com Valadares, seu padrinho político, para se tornar o candidato vitorioso ao governo em 2018, com a benção de Jackson, de quem hoje é desafeto.
Dessa geração de líderes, Jackson, aos 78 anos, é o único em plena atividade político-partidária. Durante esse tempo todo, nunca se ocupou na formação de um herdeiro político e, a essa altura, não há sinal de que esteja interessado no assunto.
Quanto a Marcelo Déda, a morte precoce, aos 53 anos, interrompeu-lhe a carreira política em ascensão. Deputado estadual, deputado federal duas vezes, prefeito de Aracaju duas vezes - 2001-2006 -, governador do Estado duas vezes - 2007-2013 - era um colecionador de mandatos.
Carismático, articulado e bom orador, não teve tempo de conduzir o processo eleitoral para a sua própria sucessão no governo, do qual estava licenciado para tratamento da doença, e muito menos preparar um herdeiro político, se essa fosse a vontade dele.
Vaidade, apego ao poder, crença na infalibilidade e complexo de traição, uma teoria em que o criador é engolido pela criatura e prática não rara na política, são fatores que podem servir de base para o estudo sobre herança política ou a falta dela na recente história sergipana.
[*] É jornalista profissional e editor da TV Alese.
Texto e imagem reproduzidos do site: jlpolitica.com.br