Mostrando postagens com marcador meio ambiente. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador meio ambiente. Mostrar todas as postagens

Nascimento de grupo de capivaras mostra que natureza resiste na Lagoa da Tijuca

Capivaras que nasceram na Lagoa da Tijuca, na Baixada de Jacarepaguá 


O nascimento de um grupo de pequenas capivaras surpreendeu pesquisadores que cuidam da área do manguezal no entorno da Lagoa da Tijuca, na Baixada de Jacarepaguá, zona oeste do Rio de Janeiro. Nascidas há cerca de um mês, elas fazem parte de ninhada de cinco filhotes, dos quais três sobreviveram.

“Devido ao crescimento urbano desordenado, os animais ficam com cada vez menos espaço. E a última linha de defesa tem sido as faixas marginais das lagoas”, explica o biólogo Mario Moscatelli.

A faixa marginal de proteção é de geralmente 30 metros ao redor das lagoas e conta com formações de manguezais, brejos e restingas, que servem de abrigo para essa fauna residual.

“É uma área onde fazemos a manutenção do manguezal, recuperada anos atrás. E ela tem sido usada como área de abrigo por capivaras, preás, cutias, tatus, lontras e outros animais que buscam proteção nesse tipo de ecossistema”, destaca Moscatelli.

De acordo com o biólogo, o crescimento urbano desordenado faz com que esses animais possuam cada vez menos espaço para se reproduzir. Mesmo protegidos por lei, esses últimos refúgios estão ameaçados.

“Se a gente quiser ter, em um futuro breve, fauna no sistema de lagoas da Baixada de Jacarepaguá, é fundamental a recuperação da lagoa e das faixas marginais de proteção”, afirma Moscatelli.

Registro de um dos filhotes com poucos dias de vida

Essas faixas marginais de proteção também funcionam como importantes corredores de contato entre diferentes lagoas, onde os animais podem transitar de uma para outra nos espaços ainda existentes nas faixas de proteção.

As pequenas capivaras estão sob os cuidados da mãe, e a família é monitorada pelos pesquisadores. A localização exata não é divulgada, para evitar que os animais sejam molestados por curiosos.

Capivara deu à luz cinco filhotes na Lagoa da Tijuca; três deles sobreviveram 


Área de manguezal recuperada no final do século passado 
e que funciona como abrigo para as espécies 



Fonte: G1 

Fotos: Mario Moscatelli

Milhões de animais mortos: o furacão Florence e a criação intensiva


A passagem do furacão Florence, na costa leste dos Estados Unidos, causou a morte de 41 pessoas, mas o triste balanço continua a subir. Entre as vítimas do desastre natural, também estão os animais, especialmente aqueles forçados a viver em fazendas de criação intensiva.

Três milhões e quatrocentos mil galinhas e perus e 5.500 porcos teriam morrido como resultado da inundação causada pelo furacão Florence. A informação vem do Departamento de Agricultura da Carolina do Norte.

“Foi uma tempestade sem precedentes, com inundações que excederam todas as expectativas. Sabemos que também na agricultura haverá perdas significativas porque as inundações afetaram seis municípios do nosso estado”, disse o comissário de Agricultura, Steve Troxler, em um comunicado.

Como dizíamos, também os animais são vítimas diretas dessa calamidade e, se muitos cães e gatos foram salvos, um destino melhor não foi dado aos porcos, galinhas e perus que viviam confinados.

As fotos aéreas mostram as fazendas completamente submersas pela água, e o balanço dos animais mortos é muito alto, ainda que seja impossível fazer uma estimativa precisa.



De fato, há aqueles que morreram devido à tempestade de vento, à água ou ao colapso de edifícios. E ainda há muitos outros porcos que estão morrendo de fome.

Durante a tempestade, os criadores tentaram remover os animais, tarefa impossível de ser cumprida com êxito devido ao elevado número de bichos - assim, paradoxalmente, o furacão Florence trouxe à tona a inutilidade da criação intensiva de animais.

Sabemos que a maioria dos porcos, galinhas e perus era destinada ao abate, mas os ativistas dos direitos animais veem o número de mortos como reflexo de um sistema que não pensa minimamente no bem-estar animal.

“Os animais são tratados como mercadoria, e não como seres vivos que têm o direito de viver. São colocados em uma gaiola e é impossível para eles escaparem quando desastres atacam a cidade”, diz Susie Coston, diretora do abrigo Farm Sanctuary.

Não só isso: o impacto do furacão Florence nos confinamentos também apresenta riscos para a saúde humana, pois os excrementos dos animais acabam nas lagoas e representam um perigo para as pessoas com sistema imunológico baixo, bem como para todos os ecossistemas aquáticos e marinhos*.

Fonte: Green Me  

Fotos: Reprodução


*NOTA DA NATUREZA EM FORMA:

Na verdade, a criação de animais para abate já é um grande poluidor aquático com ou sem furacão. O Florence apenas acelerou a situação. Leia: O colapso ambiental tem forma de bife 

Importância do Brasil na biodiversidade mundial é maior do que se pensava, dizem cientistas

Recifes de coral cobrem apenas 0,1% dos oceanos, mas são responsáveis 
pela sobrevivência de mais de 200 milhões de espécies (Foto: Getty Images)


Quase um quarto de todos os peixes de água doce do mundo - mais precisamente, 23% - está nos rios brasileiros, assim como 16% das aves do planeta, 12% dos mamíferos e 15% de todas as espécies de animais e plantas.

Esses números estão sendo compilados pela primeira vez por cientistas brasileiros após a publicação do estudo O Futuro dos Ecossistemas Tropicais Hiperdiversos, divulgado no final de julho na revista Nature.

"Já imaginávamos que o Brasil tinha essa quantidade de espécies, mas os números exatos estavam espalhados em bases de dados muito diferentes pelo mundo. É uma combinação de dados única", diz a bióloga Joice Ferreira, da Embrapa Amazônia Oriental, que participou do estudo e lidera os esforços para compilar os dados brasileiros.

"A condição do Brasil é muito única, mas, nas discussões políticas, o papel que o País tem na biodiversidade mundial é pouco considerável. Precisamos de um conjunto de políticas muito mais fortes e atuantes para lidar com essa biodiversidade."

O estudo, realizado por um grupo de 17 cientistas, incluindo quatro brasileiros, é a maior revisão de dados sobre a biodiversidade nos trópicos, segundo o biólogo marinho, zoólogo e botânico britânico Jos Barlow, da Universidade de Lancaster, no Reino Unido, que liderou a pesquisa.

"Sempre soubemos que a região era importante. Mas encontramos números surpreendentes. Mostramos, por exemplo, que 91% de todos os pássaros do mundo passam ao menos parte de suas vidas nos trópicos. Isso é incrível", expõe Barlow.

"Também fiquei impressionado com o fato de o Brasil ser responsável por um quarto dos peixes de água doce. Geralmente, esses ecossistemas são ignorados."

Os ecossistemas tropicais – florestas, savanas, rios e lagos e recifes de coral – 
concentram mais de três quartos das espécies do planeta (Foto: Adam Ronan)


Perda acelerada de espécies tropicais

No estudo, a equipe internacional de cientistas alerta para o fato de que a falta de ações de conservação e monitoramento dos ecossistemas tropicais pode causar, em breve, uma perda sem precedentes de espécies - muitas das quais sequer são conhecidas.

Os ecossistemas tropicais - florestas, savanas, lagos e rios e recifes de coral - cobrem 40% do planeta, mas abrigam mais de três quartos (78%) de todas as espécies.

Além disso, desses ecossistemas dependem as vidas de centenas de milhares de espécies. Os recifes de coral, por exemplo, são responsáveis pela subsistência e proteção de mais de 200 milhões, apesar de só cobrirem 0,1% dos oceanos.

Em todos esses locais, dizem os pesquisadores, a flora e a fauna sofrem a "ameaça dupla" das atividades humanas, como o desmatamento e a pesca predatória em excesso, e de ondas cada vez mais frequentes de calor, causadas pela mudança climática.

"A maior parte dos cientistas foca apenas um bioma. Mas nós mostramos que todos os ecossistemas tropicais estão sofrendo dos mesmos problemas", diz Barlow.

Espécies nos trópicos podem ser perdidas em breve por causa da atividade humana e do aquecimento global, mas são menos "lembradas" do que as de regiões polares, segundo pesquisadores 
(Foto: Alexander Lees)


"Quando falamos em mudança climática, falamos muito de seu impacto nas regiões polares, mas isso está devastando os trópicos. E o mundo parece ter dado um passo atrás no que se refere ao compromisso com ações relacionadas ao meio ambiente."

Para Joice Ferreira, da Embrapa, também é preciso considerar que a maior parte dos países tropicais são regiões mais pobres, com menor capacidade de pesquisa.

"Nossa região alimenta todas as outras do mundo com recursos naturais, mas a maior parte das pesquisas sobre os trópicos é liderada por países desenvolvidos", afirma.

"Isso nos coloca numa situação de vulnerabilidade, porque temos uma capacidade menor de resposta às mudanças climáticas. Estamos colocando em risco um número muito grande de espécies."

Dificuldade para catalogar dados no Brasil

Segundo Barlow, um dos principais problemas das regiões tropicais é a falta de investimento na coleta e catalogação de espécies. Ou seja, sequer sabemos tudo o que está em perigo com o aumento das temperaturas globais.

Atualmente, cerca de 20 mil novas espécies são descobertas no mundo a cada ano. Mas, nesse ritmo, os pesquisadores estimam que seriam necessários pelo menos 300 anos para catalogar toda a biodiversidade do planeta.

O Brasil tem 16% das aves de todo o planeta; 91% das aves do mundo 
passam ao menos parte da vida nos trópicos (Foto: Getty Images)


"Descrever novas espécies tem que ser um trabalho colaborativo global, com pesquisadores tendo acesso a recursos e espécimes em muitos museus e coleções. Mas tudo isso é dificultado pela burocracia excessiva - algo que o Brasil conhece muito bem", diz o britânico.

Joice diz que ainda falta no Brasil um programa "abrangente e integrado de avaliação da biodiversidade". A maior parte das pesquisas, ela afirma, são feitas em locais de fácil acesso - como a beira dos rios e as margens de estradas - e na região sudeste, onde se concentra a maior parte dos pesquisadores.

"Tentamos aos trancos e barrancos cumprir as metas internacionais, mas é tudo muito grosseiro e genérico. Num país muito menor como o Reino Unido, se conhece a fauna e a flora de cada quilômetro do país", compara.

"Precisamos fazer programas de monitoramento amplo em todos os biomas brasileiros e programas de conservação nos outros biomas, além da Amazônia. Mas o que vemos é justamente o contrário disso, um corte massivo de financiamento para ciência e tecnologia, especialmente nos recursos humanos."

Em 2014, o governo brasileiro criou o Sistema de Informação sobre a Biodiversidade Brasileira (SiBBr), uma espécie de atlas das espécies do País, ligado ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC). A iniciativa, no entanto, avança a passos lentos na tarefa de catalogar apenas o que já se sabe sobre a fauna e a flora nativas.

"Nunca chegamos numa amostragem de toda a biodiversidade espacial. O território brasileiro é grande demais, nunca tivemos investimento com regularidade suficiente e os programas de pesquisa nunca se preocuparam em traçar uma estratégia que abrangesse o território todo", diz a bióloga Andrea Nunes, coordenadora de Biomas do MCTIC e diretora-geral do SiBBr.

Sistema de catalogação da biodiversidade brasileira tem cerca de 15 milhões de registros, mas falta financiamento e cultura de compartilhamento de dados, segundo bióloga 
(Foto: Leonardo Merçon / Getty Images)


O principal obstáculo encontrado pelo sistema é justamente a dificuldade de convencer os pesquisadores a registrarem, uma por uma, todas as espécies que já pesquisaram.

"O Brasil não tem cultura de compartilhamento de dados. Esse problema começa pela própria academia, que usa dados de biodiversidade para a publicação de teses de mestrado, doutorado, e quase joga esses dados fora. Muitos pesquisadores acham que faz parte de seu trabalho compartilhar esses dados primários", afirma a diretora.

"Além disso, o MCTIC apoiava as instituições de pesquisa pagando bolsistas para estruturar os dados e alimentar o sistema. Há cerca de um ano e meio, não podemos mais oferecer essa ajuda."

Andrea estima que, atualmente, o SiBBr tenha cerca de 15 milhões de espécies em sua base de dados. Mas, só nas seis principais coleções do Brasil - instituições como Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e Museu de Zoologia de São Paulo -, pode haver até 40 milhões de registros.

"Imagine que essas coleções ainda não foram completamente catalogadas em nosso sistema, e que o Brasil tem mais de 300 coleções do tipo. Ninguém sabe o número total de registros de espécies que temos. Até porque pode haver muita coisa duplicada", diz.

Fonte: BBC Brasil 

Turismo para conservar a natureza

O Parque Nacional da Serra da Bocaina, situado na divisa entre os estados do 
Rio de Janeiro e São Paulo, é rico em fauna e flora da mata atlântica (Foto: Divulgação)


Por Márcia Hirota e Erika Guimarães*

A visitação aos parques nacionais é uma estratégia extremamente importante para engajar a sociedade e promover sua reconexão com a natureza. Especialmente na mata atlântica, que abriga uma parcela significativa da população brasileira urbana, essas áreas são muitas vezes os últimos refúgios onde as pessoas podem desfrutar de práticas esportivas, recreativas e de lazer.

Não faltam estudos que evidenciam os efeitos positivos para a saúde física e emocional de se estar na natureza. O Japão é um dos países que mais têm investido no desenvolvimento de pesquisas nessa área. Cientistas da Universidade de Chiba (Tóquio) demonstraram, por exemplo, que um passeio em um ambiente natural pode relaxar e melhorar alguns aspectos da saúde, como a redução da concentração de cortisol no sangue — o chamado hormônio do estresse — e da pressão arterial; o fortalecimento do sistema imunológico; o aumento da capacidade de concentração e a melhora em quadros de depressão. Lá, os chamados “banhos de floresta” têm sido considerados uma prática de saúde pública.

Medidas semelhantes ganham cada vez mais importância em países como Austrália e Estados Unidos, reforçando a grande contribuição da visitação nas áreas protegidas para a saúde e bem-estar.

Se bem implantados, o turismo e a visitação podem ser grandes aliados para promover a conservação das áreas protegidas e o engajamento da sociedade. E podem ainda ter um impacto relevante no desenvolvimento econômico dos municípios que ficam no entorno dessas áreas.

Os números confirmam que o impacto econômico da visitação aos parques e outras áreas naturais protegidas é muito grande — mas existe um potencial ainda maior. Um estudo realizado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) mostrou que a visitação em 2015 teve um impacto econômico de R$ 1 bilhão e gerou mais de 43 mil empregos, sendo que cada real investido na gestão dessas unidades produziu outros sete reais em benefícios econômicos diretos para o País.

Para isso, é preciso adotar medidas com o objetivo de garantir a abertura à visitação e a estruturação de todos os parques nacionais brasileiros, em especial naqueles que estão mais próximos dos centros urbanos. Isso deve ser feito de maneira organizada, lançando mão de uma agenda e parcerias com empresas ligadas ao setor do turismo e com as comunidades do entorno das unidades de conservação, por meio das concessões de serviços, permissões e outros instrumentos.

Essa agenda contribui não só para que as unidades de proteção cumpram os objetivos para os quais foram criadas, mas também funcionem como um polo indutor para alavancar o turismo e movimentar as economias locais nas regiões onde estão inseridas.

Receber bem e ampliar a oferta de atrativos é condição fundamental para garantir uma melhor experiência dos visitantes e contribuir para um desafio ainda maior: engajar pessoas para se tornarem aliadas da causa ambiental.

*Márcia Hirota é diretora executiva da Fundação SOS Mata Atlântica e Erika Guimarães é gerente de Áreas Protegidas da Fundação SOS Mata Atlântica

Fonte: O Globo 

Chilenos criam sacos plásticos solúveis em água que não poluem

Os engenheiros Roberto Astete e Cristian Olivares mostram duas sacolas, 
uma de plástico e outra de material biodegradável inventada por eles 
(Foto: Claudio Reyes / AFP)


Com uma mudança sutil na fórmula do plástico, que permite substituir o petróleo pela pedra calcária, um grupo de empreendedores chilenos conseguiu fabricar sacos plásticos e de tecido reutilizáveis solúveis em água e que não contaminam.

Roberto Astete e Cristian Olivares, os dois artífices desse produto, começaram a fazer experimentos para fabricar um detergente biodegradável, mas acabaram encontrando a fórmula química à base de PVA (álcool polivinílico, solúvel em água) e que substitui os derivados do petróleo, responsáveis pela alta durabilidade dos plásticos, que são ingeridos por animais marinhos e responsáveis pela deterioração do meio ambiente.

“Nosso produto deriva de uma pedra calcária que não causa danos ao meio ambiente”, assegura Astete, diretor-geral da empresa Solubag, que espera comercializar seus produtos a partir de outubro no Chile, um dos primeiros países da América Latina a proibir o uso de sacos plásticos convencionais em estabelecimentos comerciais.

“É como fazer pão”, acrescenta. “Para fazer pão, é preciso farinha e outros ingredientes. Nossa farinha é de álcool de polivinil e outros componentes, aprovados pela FDA (agência norte-americana reguladora de alimentos, medicamentos, cosméticos, aparelhos médicos, produtos biológicos e derivados sanguíneos), que nos permitiu ter uma matéria-prima para fazer diferentes produtos.”

Diante de jornalistas, os dois demonstraram a solubilidade imediata de suas sacolas plásticas em água fria ou de bolsas de tecido reutilizáveis em água quente.

“O que fica na água é carbono”, assegurou Astete. Segundo ele, exames médicos realizados demonstraram que “não há nenhum efeito no corpo humano”. Para demonstrar que a água turva resultante da dissolução é “inócua” e potável, eles beberam alguns copos.

Reciclagem doméstica

“A grande diferença entre o plástico tradicional e o nosso é que aquele vai estar entre 150 e 500 anos no meio ambiente, e o nosso demora apenas cinco minutos. A gente decide quando o destrói”, afirmou Astete, antes de acrescentar que “hoje em dia, a máquina recicladora pode ser a panela de casa ou a máquina de lavar”.

A fórmula encontrada permite “fazer qualquer material plástico”, razão pela qual eles já estão trabalhando na produção de materiais como talheres, pratos e embalagens.

Os tecidos solúveis na mesma água quente que serve, por exemplo, para preparar um chá ou um café, podem ser usados para produzir sacolas de compras reutilizáveis e produtos hospitalares como os protetores de macas, batas e gorros do pessoal médico e de pacientes que costumam ter um único uso, conforme explicou Olivares.

E quando chove, como as compras chegam em casa? Os fabricantes podem programar a temperatura à qual tanto os sacos plásticos quanto os de lixo se dissolvem no contato com a água.

Outra vantagem das sacos é que são antiasfixia, uma causa importante de mortalidade infantil, pois se dissolve em contato com a língua ou as lágrimas.

Com a produção maciça, que pode ser feita nas mesmas empresas que fabricam os plásticos convencionais – basta apenas alterar a fórmula -, o preço de seus produtos pode ser similar ao dos atuais, eles garantem.

Em um mundo onde, em 2014, foram fabricadas 311 milhões de toneladas de plástico e, se nada mudar, em 2050, serão produzidas 1,124 bilhão de toneladas, Astete e Olivares esperam dar ao cliente o “empoderamento de ajudar a descontaminar o meio ambiente”.

A iniciativa ganhou o prêmio SingularityU Chile Summit 2018 como empreendimento catalizador de mudança, o que rendeu aos inventores um estágio no Vale do Silício a partir de setembro.

Fonte: Exame 

Indústria do calçado investe no sapato vegano, sem matéria-prima animal


A indústria brasileira de calçados identificou o crescimento de um grupo muito particular de consumidores e decidiu criar uma linha de produtos só para eles: uma linha vegana.

Sapatos iguais aos outros, com uma diferença de DNA: foram feitos sem matéria-prima animal, dando preferência para materiais reciclados. O calçado vegano não tem nada de couro. Por cima, imitação sintética ou tecido natural de algodão. Por baixo, sola de borracha crua ou de placas prensadas nos modelos mais finos. A palmilha, de espuma e cortiça. Mesmo nos detalhes, nada de couro.

Para atender à demanda vegana, uma fábrica em Franca, no interior paulista, decidiu ir contra a vocação da cidade, famosa pelos produtos de couro. Investindo na moda sustentável, o negócio cresce quase 100% ao ano.

Quando começou, há cinco anos, a indústria produzia 100 pares de sapato. Agora são 1.500. Em 2017, o número de funcionários dobrou. A maior parte da produção é exportada para 11 países da Europa, Austrália e Estados Unidos. Mas o mercado que mais cresce é o brasileiro.

“No exterior, o mercado já é maduro, existe há alguns anos mais do que no Brasil. Aqui, apesar de a gente ter milhões de consumidores que se consideram veganos ou vegetarianos, o consumo de produtos secundários, como calçado, ainda é muito crescente”, afirma o dono da empresa, Gabriel Silva.

Outra fábrica que só vende para o mercado interno foi buscar materiais alternativos: além de tecido vegetal, borracha de câmera de ar e lona de caminhoneiro, trabalha com uma malha nova, mistura de plásticos e panos reciclados. 

“Temos aqui, por exemplo, uma lona com alto teor de pet. Ela tem 30% de pet e o restante, os outros 70%, são de rejeitos de indústria têxtil”, diz Rosana Pedroso Barbosa, sócia da empresa. O resultado são calçados, cintos e bolsas muito procurados.

“Quem compra esse produto não é apenas o vegano, mas todas as pessoas que tenham a preocupação com a origem do produto, de onde veio a matéria-prima, se é uma matéria-prima sustentável, se aquilo agride ou não o meio ambiente”, explica Rosemir Folhas, também sócio da empresa.

Gabriela Tumbiolo é vegetariana e diz que já teve dificuldade para adequar a moda ao estilo de vida. Não tem mais: “Sinceramente, eu não vejo diferença na qualidade nem na durabilidade dos produtos. Vejo diferença na procedência dos materiais. Hoje em dia, a gente encontra produtos maravilhosos no mercado que não precisam ter origem animal”.

Veja aqui a matéria.

Fonte e foto: Jornal Nacional 

Controle populacional de javalis


Por Sérgio Greif*

Em 5 de dezembro de 2017, fui convidado a tomar parte da sessão da CPI de Maus-Tratos contra os Animais, que tratou da caça ao javali em SP. Infelizmente, o rito da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, onde deputados e autoridades têm o direito de fazer uso do tempo que quiserem, não me permitiu realizar a apresentação (disponível aqui).

No presente texto, pretendo abordar a situação dos javalis no Brasil, incluindo sua introdução, expansão, consequências e controle da espécie.

História dos javalis no Brasil

Javalis (Sus scrofa) são animais de ampla distribuição geográfica, nativos da Europa, Ásia e norte da África e posteriormente introduzidos nas Américas e Oceania. Mediante um intenso trabalho de domesticação e seleção artificial, iniciado 10 mil anos atrás nas regiões da Turquia e da China, essa espécie deu origem ao porco doméstico (Sus scrofa domesticus), com distribuição geográfica ainda maior do que a versão selvagem da espécie.

No Brasil, a espécie chegou pelas mãos de Martim Afonso de Sousa em 1532, e como outros animais trazidos da Europa, tais como bovinos, equinos, marrecos e gansos, eram criados de forma extensiva e com frequência alçavam-se, retornando ao estado asselvajado e vindo a constituir populações de animais ferais.

Há descrição de populações de porcos asselvajados presentes no Brasil desde o século 16. No século 18, porcos domésticos escaparam no Pantanal, vindo a constituir a hoje conhecida população de “porcos-monteiros”[1,2].

A partir de 1989, começaram a surgir registros da presença de javalis selvagens no Rio Grande do Sul. Esses espécimes chegavam ao Brasil provavelmente devido à permeabilidade da fronteira com o Uruguai, país onde a espécie havia sido introduzida por volta de 1925 por pessoas que desejavam recriar as antigas caçadas da Europa e não consideravam que sua população poderia crescer sem controle.

Na década de 1990, com a onda das “carnes exóticas” no Brasil, o javali foi introduzido oficialmente por suinocultores, que importavam matrizes trazidas da Europa e do Canadá. Essas matrizes serviram para formar o plantel brasileiro e serem cruzadas com porcos domésticos, criando um híbrido denominado javaporco, com características mistas.

A carne de javali e javaporco não atingiu o grande mercado devido à sua desvantagem competitiva em relação à carne de porcos domésticos. Por exemplo, javalis ganham peso mais lentamente do que porcos domésticos. Para engordar um porco de 100 a 150 kg, são necessários apenas seis meses, enquanto para engordar um javali de 70 a 100 kg, são necessários cerca de dois anos. Além disso, o aproveitamento da carcaça do porco é de 70%, enquanto a do javali é de 50%.

Resultou que a carne do javali só poderia ser comercializada a um custo bastante superior à carne suína, preço este que o consumidor não aceitava pagar. Dessa forma, os suinocultores soltaram os javalis no campo.

O javali como animal invasor

Javalis (e porcos, de maneira geral) são animais que apresentam alta versatilidade adaptativa, são bastante resistentes, pouco específicos em relação à alimentação e apresentam alta fecundidade.

Em relação à sua fecundidade, são animais que atingem a maturidade sexual antes do primeiro ano de vida, em geral entre o oitavo e 10º mês. Uma fêmea pode vir a ter 14 filhotes por ano, com taxa de sobrevivência até a idade adulta de 70%. Disso resulta que cada fêmea virá a ter entre nove e 10 filhotes ao ano. Sua longevidade é de cerca de 12 anos, mantendo sua capacidade reprodutiva até essa idade.

A Equipe Javali no Pampa calcula que uma população de 10 fêmeas e um macho em seis anos terá se transformado em 3,5 mil javalis. Levantamento realizado por Pedrosa e outros mostra a distribuição de javalis e porcos ferais no Brasil[3].

A espécie é considerada invasora, acima de tudo, pelo entendimento que se tem de que sua dispersão não é controlada pela ação de inimigos naturais ou competidores à altura. Entende-se, portanto, que a espécie cresce sem controle, o que supostamente justificaria sua caça, cumprindo ao ser humano, portanto, o papel do predador inexistente.

Em determinada construção retórica, o ser humano caçador de javalis estaria não apenas exercendo um papel em um nicho ecológico desocupado, como também protegendo o meio ambiente, uma vez que os “javalis destroem nascentes e cursos d´água, competem por habitat e recursos naturais, predam a fauna nativa e criações domésticas”. É o caçador ecologista.

Discutamos, pois, de que forma a caça ao javali fora implementada no Brasil e o quanto das acusações que lhe são atribuídas podem ser verdadeiras.

A implementação da caça ao javali no Brasil

A Instrução Normativa nº 8/2010 do Ibama explicitamente PROÍBE a caça de javalis e outras espécies sem estudos que comprovem sua eficácia e necessidade. Trata-se, portanto, de legislação pautada em princípios éticos e científicos, pois, na ausência de consenso científico irrefutável, o ônus da prova se encontra do lado de quem pretende caçar.


Essa mesma Instrução Normativa criou um grupo de trabalho para apresentar e definir propostas para melhorar a eficiência do controle do javali na natureza. Sem, no entanto, que os trabalhos houvessem sido desenvolvidos, o Ibama lançou, em 2013, nova Instrução Normativa (IN nº 03/2013), onde decretava a nocividade do javali e dispunha sobre seu manejo e controle.

Para entendermos do que se trata esse “manejo e controle” ditados pela IN Ibama nº 03/2013, entendamos que seu artigo 2º § 1º declara que "considera-se controle do javali a perseguição, o abate, a captura e marcação de espécimes seguidas de soltura para rastreamento, a captura seguida de eliminação e a eliminação direta de espécimes" e que o § 2º esclarece que "o controle do javali será realizado por meios físicos".

Assim, a dita legislação não apenas autoriza a caça de javalis, como também limita as possibilidades de atuação a esta única. Pelo rigor da Instrução, não se poderia realizar um controle não letal e humanitário de javalis.

Entendamos, pois, de que forma passamos de uma Instrução Normativa fundamentada na ética e na ciência (IN nº 8/10) para uma pautada em valores tão distintos destes. De acordo com dados de 2014, a suinocultura no Brasil é um negócio de US$ 1,5 bilhão. Ocorre que a Organização Mundial da Saúde Animal (OIE) não permite a venda de carne de porcos para outros países sem as devidas certificações de sanidade. Com vistas a manter a fluidez desse mercado, por exemplo, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) criou, em 2012, o Programa Nacional de Sanidade Suídea (PNSS).

Até 2013, a OIE ainda aceitava que os países se autodeclarassem “livres de peste suína clássica”. Até aquele ano, bastava essa autodeclaração de sanidade para que um país pudesse comercializar carne suína para outros países. Até aquele ano, também, o Mapa ainda reconhecia a maior parte do Brasil como livre da doença (IN Mapa 52/2013), porém, em 2015, a certificação já passaria a ser realizada pela OIE, e caso essa sanidade não pudesse ser verificada, a exportação de carne de porco do Brasil estaria comprometida.

Obviamente que tal sanidade é fácil de ser verificada nas criações comerciais, mas de que forma controlar a sanidade de javalis e porcos asselvajados? Em 2012, a Embrapa estruturou um programa de vigilância epidemiológica e manejo populacional de suídeos asselvajados na área livre de peste suína clássica, cuja finalização está planejada para setembro de 2018.

Essa consideração com o controle de javalis surge, portanto, não como uma preocupação com o fato de que eles destroem nascentes e cursos d´água, competem por habitat e recursos naturais, predam a fauna nativa e criações domésticas, mas sim como uma demanda dos suinocultores preocupados em exportar carne suína.

O mesmo grupo que deu causa ao problema, importando javalis para criá-los como animais de corte, agora externaliza esse problema para a sociedade, e, pressionando o órgão do meio ambiente, força para que se promulgue instrução normativa que, sem comprovação de eficácia, permita que se faça o que antes proibia. Foi a suinocultura que trouxe o javali para o Brasil, e é ela que agora fomenta sua caça.

O Ibama se viu forçado a emitir autorizações de caça ao javali em 2013. Em 2014, para o estado de São Paulo, essa atribuição de cadastrar interessados na caça aos javalis e javaporcos asselvajados passa à Secretaria do Meio Ambiente, seguindo o acordo de cooperação técnica para gestão compartilhada da fauna silvestre no estado. Em 8 de novembro de 2017, é implementado no Brasil o Plano Nacional de Prevenção, Controle e Monitoramento do Javali (Sus scrofa).

A caça do javali propriamente dita

Uma breve busca na internet revela cenas de caçadores orgulhosos expondo seus troféus recém-abatidos ainda no campo ou javalis pendurados em suportes ou caminhonetes, com armas de fogo e cães de caça à sua volta.


Embora essa exibição de virilidade possa fornecer bom material para estudos antropológicos e psicológicos, delongarei tais observações para outro momento. Creio que, em pleno século 21, ao menos uma parcela mais instruída da população ocidental conseguirá ver na caça uma mera necessidade de reafirmação.

Discutamos, pois, o ato da caça ao javali em si: de acordo com o engenheiro agrônomo Rafael Salerno, da rede Aqui Tem Javali, cerca de 80% do controle de javalis no Brasil é feito com uso de cães. De acordo com o caçador Mario Knichalla Neto, mais de 90% dos controles são finalizados com facas ou zagaias, que são um tipo de lança[4].

Pelo uso de armas brancas, cães e pelas fotos, vemos, portanto, que a caça ao javali não serve para o mero controle da espécie, pois os caçadores fazem disso recreação e esporte. No controle de pragas de lavoura, como insetos e roedores, se utilizam métodos letais de amplo espectro, que não visem o indivíduo, mas toda a população.

Mas, no caso dos javalis, não apenas o controle é feito um a um, como há também relatos de que alguns são deixados, especialmente os pequenos demais para se transformarem em troféus, para que cresçam e possam ser caçados mais tarde, em uma versão macabra do raciocínio de sustentabilidade.

Há também relatos de capturas desses indivíduos pequenos demais para se tornarem troféus para sua comercialização a pessoas que tenham interesse em introduzir os javalis em suas regiões, para depois caçá-los. Isso explica em parte sua grande dispersão pelo Brasil.

Com relação ao uso de cães, diversas raças são utilizadas de acordo com suas características, sendo estas classificadas nesse caso como cães farejadores, de contenção e de agarre[5]. Assim, cães como galgos, beagles, perdigueiros, sabujos e bloodhounds seriam usados como farejadores e para perseguir os javalis. Pit bulls, dogo argentinos e cães mais fortes seriam usados como cães de contenção, com a função de deter o javali e impedir sua fuga até que os caçadores cheguem.

Há, por fim, os cães de agarre, mais pesados e fortes, como o buldogue, mas também os pit bulls e outras raças, que têm a função de segurar o javali pelas orelhas e com a cabeça para baixo, para que ele possa ser morto pelos caçadores com suas facas e lanças.

A preferência pela “finalização” com arma branca torna a caçada algo pessoal, realizado com espírito de ódio, pois se o objetivo fosse meramente a eliminação dos animais, seria usada arma de fogo. No entanto, não há por que defender que a eliminação dos javalis deva ser feita dessa ou daquela forma, pois o abate em si não tem razão de ser. A utilização de cães e armas brancas apenas evidencia o caráter sádico da caçada.

O uso de cães, porém, incorre na morte e ferimento de muitos desses animais, pois são eles que verdadeiramente se arriscam junto aos javalis. Ao caçador humano cabe, tão somente, sangrar o animal quando este já se encontra imobilizado pelos cães. Embora a aventura se preste, no futuro, para o autoenaltecimento, foram os cães que verdadeiramente se expuseram a algum risco. Esses corajosos homens não enfrentariam um javali adulto apenas na unha.


Desconstruindo preconceitos

Nenhuma palavra senão 'preconceito' descreve o ato de atribuir ao javali todos os males que lhe são atribuídos.

Desde que colonizamos todo o planeta, alteramos os ecossistemas nativos, suprimimos a vegetação natural, a substituímos pelas culturas comerciais, transformamos florestas em monoculturas, transformamos biomas em pastos, aumentamos significativamente o número de nossos rebanhos que pisotearam a terra de forma a compactá-la e não permitir mais a rebrota da vegetação, criando desertos. Substituímos toda a biodiversidade de flora e fauna pelas poucas espécies de plantas e animais que domesticamos.

No entanto, é fácil encontrar referências aos javalis como uma espécie invasora que “destrói nascentes e cursos d´água, compete por habitat e recursos naturais, preda a fauna nativa e as criações domésticas”. Quando foi que essa preocupação ecológica surgiu nos próprios pecuaristas e suinocultores que são os verdadeiros responsáveis por todos esses males?

A pecuária, sim, é responsável em grande escala pela destruição de ecossistemas, perda de biodiversidade, erosão do solo, processo de desertificação, escassez de água, contaminação do solo e da água com compostos de nitrogênio e da atmosfera com gases causadores do efeito estufa.

Os javalis, é claro, participam desse processo de degradação ambiental, mas quantos javalis há no Brasil e quantos pecuaristas há no Brasil? E qual a extensão dos rebanhos desses pecuaristas? Qual a extensão de terra utilizada por suas criações ou pelas culturas que alimentam seus rebanhos? Foi somente após a introdução dos javalis no Brasil que começamos a ter problemas com a destruição de nascentes e cursos d´água, com o prejuízo à fauna nativa?

Qualquer população animal em alta densidade dará indícios de um ambiente desequilibrado, mas isso não quer dizer que o restabelecimento do equilíbrio desse ambiente necessariamente deva se dar pela eliminação dessa espécie. Como qualquer outro animal, se em alta densidade, os javalis poderão realmente alterar a dinâmica dos recursos hídricos, soterrar nascentes, competir com espécies nativas, atacar plantações etc., mas o mesmo podemos dizer de seres humanos, bovinos, equinos, ovinos, caprinos, suínos…

É também fato que o ambiente pode se beneficiar da presença de javalis, se sua população puder ser mantida em níveis aceitáveis. Em baixa densidade, uma população de porcos asselvajados pode desempenhar em uma floresta o mesmo papel que seria desempenhado por antas, como dispersores de sementes, por exemplo. Em muitos locais onde as antas estão extintas, as florestas estão morrendo por falta de dispersores. Além disso, javalis em pequena densidade podem ajudar na ciclagem de nutrientes, revolvendo e fertilizando o solo. Como observa Felipe Pedrosa[6], “se tivermos o porco sob controle, em uma quantidade pequena, talvez o benefício possa ser maior que o malefício para o ambiente”.

Em um estudo da UFRJ[7] realizado no SESC Pantanal, que procurava observar a competição entre o porco-monteiro (ou seja, o porco introduzido) e os catetos e queixadas (taiassuídeos silvestres), verificou-se que, além de as interações entre essas espécies não serem significativas, a competição parece simplesmente não existir.

O referido estudo afirma: “Embora as três espécies coexistam, o número de taiassuídeos vem aumentando. De 2001 para 2002, a expansão na utilização da área pelos queixadas foi de 11,5% para 37,9%, e pelos caititus, de 39,6% para 53,1%. O uso da região por porcos-monteiros permaneceu estável (variou de 63,8% para 62,6%)”.

Pode-se pensar que, de alguma forma, a presença de porcos selvagens na área até ajudou a população de catetos e queixadas, talvez diminuindo a pressão da predação pelas onças sobre os taiassuídeos. Pode ser também que a população de catetos e queixadas tenha sido beneficiada com a retirada do gado daquela região, embora a RPPN tenha sido criada em 1997. 

Fosse apenas um estudo isolado, mas outros estudos mostram, igualmente, não haver evidências de competição entre suínos asselvajados e taiassuídeos[8, 9, 10, 11].

Pode-se pensar, mesmo, que caçadores ilegais tenham preferência pelos javalis em vez de espécies silvestres. Não devido a uma consciência ecológica, mas por uma preferência ao sabor da carne do javali, ou por este ser um alvo mais vistoso do que uma capivara, uma paca, uma cotia, um tatu ou mesmo um veado. A espécie serviria, assim, como um escudo para a fauna local, frente à caça ilegal.

Com efeito, em reportagem do Estadão[12] veiculada em 24 de dezembro de 2016, lemos depoimentos de vários caçadores nesse sentido. O senhor Luiz Fernando Gomes, por exemplo, declara: “Caça sempre foi tradição na minha família. Desde o meu bisavô, meu tataravô. Era capivara, veado, mas tudo escondido. Graças a Deus, veio o porco. Caçar regularizado é a melhor coisa”. O senhor Anderson Moreno declara: “Antes, era tudo escondido. Muitos de nós caçavam [sic] capivara, outros animais. Mas na hora que apareceu o porco, a gente se animou. Andando por aí, a gente vê veado, mas nem chega perto. Um porco rende 100 quilos. Vai matar bicho bonitinho de 10 kg?”. O “porco”, ao qual ambos se referem, é o javali.

Não se pode negar que javalis podem, teoricamente, contrair doenças como peste suína clássica, febre aftosa, doença de Aujeszky, leptospirose e brucelose, mas jamais se pôde demonstrar que esses animais possuíssem essas doenças na prática. De toda forma, mesmo que houvesse javalis infectados, a possibilidade de eles transmitirem a doença para animais domésticos é baixíssima, pois a maior parte dessas doenças requer o contato físico ou consumo de seus produtos. É mais provável um javali adoecer se alimentando dos restos de um animal doente descartado de forma não apropriada do que uma criação doméstica adoecer por contágio causado por javalis. 

Javali selvagem e cão convivendo harmoniosamente


Outro preconceito que necessita ser desconstruído é aquele que coloca o javali como um animal gratuitamente agressivo. É óbvio que javalis são animais robustos e que possuem presas, e experiências passadas com seres humanos os enxotando ou mesmo caçando os tornaram animais ariscos ou, sim, agressivos com seres humanos, mas isso não é inerente à sua espécie.

Javalis podem ser mansos e há diversos casos que ilustram tal fato. Javalis domesticados obviamente não repelem o jugo humano, e embora sejam mais difíceis de serem manejados do que porcos domésticos, não atacam seus criadores, a menos que provocados.

Praia da Arrábida, Setúbal, Portugal


Mas não apenas os domesticados - há casos de convívio harmônico entre seres humanos e javalis selvagens. Na Floresta de Dean, Gloucestershire, Inglaterra, alguns visitantes acostumaram os javalis selvagens a se aproximarem[13]; imagens semelhantes podem ser observadas em Vierhouten, na Holanda[14]. Na Praia da Arrábida, em Setúbal, Portugal, javalis selvagens foram flagrados aproveitando o mar próximo aos banhistas sem que um incomodasse o outro[15].

É óbvio que javalis podem ser perigosos se se sentirem ameaçados, mas de forma alguma o preconceito se sustenta, pois em grande parte as agressões iniciais partem de seres humanos. No mais, os eventuais ataques a plantações e criações domésticas se justificam pela fome, pois qual animal se arriscaria a enfrentar a ira humana se tivesse opções? Quando suprimimos a vegetação nativa, restringindo as áreas preservadas a alguns poucos metros, é claro que os animais que não perecerem buscarão seu alimento junto aos seres humanos.

Embora tudo isso tenha sido dito, é inegável que javalis não são animais silvestres nativos do Brasil, e o fato de não possuírem predadores e serem altamente prolíferos nos faz concluir que essas populações necessitam de um controle efetivo, embora jamais devamos perder de foco, além da ciência e da técnica, a ética. 

Javali domesticado e cão na Itália: agressividade zero


Análise técnica da efetividade dos métodos de controle de javalis

A eliminação de indivíduos costuma ser o método padrão adotado no mundo inteiro para o controle de javalis. Não obstante a caça de javalis ser autorizada na maior parte do mundo, a população desses animais apenas aumenta. Isso provavelmente porque o abate de indivíduos não impede a reposição da população. Pelo contrário, a retirada de indivíduos (e os caçadores visarão os dominantes, pois se tornam troféus mais vistosos) estimula que os não dominantes se reproduzam, preenchendo com seus filhotes rapidamente o nicho vago.

Ademais, a caça cria essa situação irônica de sustentabilidade descrita anteriormente, pois os caçadores amadores não visam à eliminação da população, mas sim que sejam abatidos apenas alguns indivíduos, para que haja caça para o futuro, inclusive chegando a introduzir javalis onde antes não ocorriam, para que possam ser caçados também nessas regiões.

A caça amadora tem, portanto, uma eficiência de controle muito baixa.

Há, também, a caça mais profissional, realizada muitas vezes até por helicóptero. Essa caça consegue, da mesma forma, abater alguns indivíduos, mas o bando como um todo escapa e aprende a evitar helicópteros. Trata-se, ainda, de um método muito caro e que só pode ser realizado à luz do dia e onde não haja cobertura vegetal.

A caça profissional, utilizando helicópteros, embora certamente mais efetiva que a caça amadora, tem eficiência baixa

A captura dos javalis em armadilhas ou bretes, por outro lado, possibilita o aprisionamento do bando inteiro, e os animais podem ser capturados sem ferimentos. Essa forma de captura seria a mais efetiva, mas seguindo o rigor da Instrução Normativa Ibama 03/2013, os animais uma vez capturados deveriam ser abatidos, pois a Instrução proíbe o transporte dos animais vivos para outros locais.

O controle de javalis por envenenamento realmente poderia matar muitos animais, mas provavelmente muitas populações de espécies não alvo seriam atingidas e até erradicadas antes que se conseguisse erradicar o javali.

A contracepção química seria um método muito promissor de erradicação da população de javali, se os contraceptivos fossem específicos para a espécie, mas o fato é que não são, podendo da mesma forma que os venenos atinjam espécies não alvo.

Pelo ponto de vista puramente técnico, fica claro que a caça amadora, a caça por helicópteros e o envenenamento de javalis são métodos de controle não efetivos ou cujas consequências podem mais prejudicar do que auxiliar. A contracepção química, embora promissora, demanda mais estudos.

Resta, então, a captura de javalis em armadilhas ou bretes como a técnica mais efetiva.

Essa captura se inicia com o acompanhamento da população, para dimensionar o tamanho do bando. Os animais passam então a ser alimentados em determinada área, recebendo com regularidade algum alimento que os atraia, como papas de mandioca ou milho. Esse processo se chama ceva.

Com o tempo, vão se adicionando à área de ceva partes do brete, que vai sendo construído aresta por aresta, até que sobra o lado por onde os animais costumeiramente acessam a área, que deverá ser o portão do brete. Assim, em determinada ocasião em que o bando inteiro se encontre no interior do brete, o portão deverá ser fechado.

Há também armadilhas mais fáceis de serem instaladas, como a boar buster, que é um cercado pré-construído e que deverá permanecer suspenso sobre a área de ceva. Uma vez que o bando esteja completo na área de ceva, este deverá ser rapidamente baixado, capturando vivos e sem ferimentos todos os indivíduos.

Importante que se reforce a necessidade de que o bando seja capturado todo de uma única vez, pois qualquer taxa de captura inferior a 100% dos indivíduos significa prolongar o problema, dada a alta taxa de reposição da população.

Justamente pelo mesmo motivo de que os nichos vagos são rapidamente ocupados, é importante que o trabalho de controle de javalis não seja feito de modo pontual (por exemplo, apenas em uma propriedade, município ou estado), pois mesmo que toda a população seja removida de determinada área, outra população poderá migrar de uma área contígua para ocupar aquele local.

O manejo pontual, realizado por pessoas físicas amadoras, apenas se constitui em caça recreativa, e jamais poderá dar solução técnica efetiva ao problema. No entanto, é justamente isso que a IN Ibama nº 03/2013 decreta em seus artigos 3º e 7º, onde autoriza que não apenas pessoas jurídicas, mas também pessoas físicas realizem o controle de javalis.

De maneira idealizada, esse trabalho deveria ser realizado por profissionais, e não por caçadores recreativos, financiados por aqueles que deram causa ao problema (por exemplo, a Associação Brasileira dos Criadores de Suínos), e acompanhado tecnicamente pelos órgãos de meio ambiente (Ibama, SMA etc.), universidades e centros de pesquisa.

Questões éticas relacionadas

Discutidos já os aspectos técnicos, que apontam para a captura do bando completo por meio de armadilhas e bretes, resta o questionamento ético das obrigações impostas pela IN Ibama nº 03/2013.

De acordo com o artigo 6º da referida Instrução, “os javalis capturados durante as ações de controle deverão ser abatidos no local da captura, sendo proibido o transporte de animais vivos”. Isso significaria a obrigação legal de atirar nos animais já dentro do cercado, não havendo outras possibilidades.

Há, porém, uma ressalva contida no § 2º, que afirma que, em “casos excepcionais, o transporte de animais vivos será permitido mediante autorização da autoridade competente”. Tal ressalva, no entanto, provavelmente não serviria para justificar o transporte desses animais para um santuário, uma vez que a mesma legislação decreta, em seu artigo 8º: “A instalação, registro e funcionamento de toda e qualquer modalidade de novos criadouros de javalis no Brasil estão suspensos por tempo indeterminado”.

Embora um santuário de animais não seja propriamente um criadouro, “toda e qualquer modalidade” exclui possivelmente também a manutenção de animais sem sua recria. Tudo uma questão de interpretação, de qualquer forma.

A impossibilidade de transportar os animais para santuários, castrá-los e mantê-los pelo tempo de suas vidas é legal, mas não técnica. Há vários vídeos no YouTube[16] que mostram a facilidade com que javalis podem ser castrados, o mesmo procedimento realizado com porcos domésticos.

Obviamente que, por razões humanistas, esses procedimentos deveriam ser realizados mediante o uso de anestesias ou sedações, mas o que se deve ressaltar é que a castração é não apenas possível, mas comumente já vem sendo realizada.

Igualmente, a manutenção de um santuário de javalis contendo algumas dezenas ou mesmo centenas de javalis não é algo mais caro do que a manutenção de uma fazenda contendo algumas dezenas ou centenas de porcos criados semiextensivamente, com a ressalva de que não sendo esses javalis animais de corte, poderão ser alimentados sem a preocupação com ganho de peso, o que tornará sua criação mais barata do que seria uma criação comercial ou mesmo realizada por meio de sobras de centros de distribuição, mercados e restaurantes.

Brandemburgo, Alemanha


Conclusões

Embora muitas das acusações que são feitas aos javalis não sejam de todo erradas, há que se entender que muitas outras espécies são causadoras desses mesmos problemas, mormente os seres humanos e as espécies domésticas.

Também há que se compreender que as medidas de controle populacional até hoje empregadas no mundo inteiro não foram efetivas no controle da espécie, sendo que não há por que persistir nesse mesmo erro.

A caça ao javali não apenas é inefetiva para seu controle, como também alimenta os instintos sádicos daqueles que se comprazem com essas ações ou se deleitam em assistir aos vídeos do YouTube onde caçadores torturam animais com a desculpa de estarem ajudando o meio ambiente.

A caça de javalis deve ser imediatamente suspensa no Brasil inteiro. A Instrução Normativa Ibama nº 3 de 2013 deve ser revogada e voltar a vigorar a Instrução Normativa nº 8/2010 ou texto semelhante.

A solução para o problema, se realmente se determinar que a presença de javalis no Brasil é um problema, deverá passar pela captura sistemática de todos os espécimes, visando sua efetiva erradicação. Tal captura deverá ser realizada por meio de armadilhas como boar buster e bretes. Caso métodos contraceptivos espécie-específicos venham a ser desenvolvidos, também poderão ser utilizados.

Por motivos éticos, esses animais não devem ser eliminados após capturados, mas mantidos por entidades que receberiam recursos daqueles que deram causa ao problema - no caso, aqueles que importaram a espécie para nosso continente. De toda forma, a longevidade estimada para javalis é de 12 anos, e, se realizado de forma racional, seria esse o tempo máximo que tal intervenção demandaria.

Referências

1. ZADIK, B. J. The Iberian pig in Spain and the Americas at the time of Columbus. [S.l.]: Ph.D. Thesis. Berkele: University of California, 2005.

2. DONKIN, R. A. The peccary: with observations on the introduction of pigs to the New World. American Philosophical Society, v. 75, n. 5, p. 1–152, 1985.

3. Pedrosa, F.; Salerno, R. ;Borges Padilha, F. V.; Galetti, M. (2015). Current distribution of invasive feral pigs in Brazil: Economic impacts and ecological uncertainty. Perspectives in Ecology and Conservation 44. . 10.1016/j.ncon.2015.04.005.



6. PEDROSA, Felipe. Revertendo a defaunação ou agravando a degradação ecológica? Ecologia da invasão dos suídeos asselvajados Sus scrofa em paisagens defaunadas. Doutorado em andamento em Ecologia e Biodiversidade: Unesp Rio Claro, com previsão de término em 31 de janeiro de 2019.

7. SICURO, F.L. “Inferências acerca da Coexistência de Taiassuídeos e Suídeos Ferais (Mammalia, Artiodactyla), no Pantanal da Nhecolândia (MS): um Modelo Ecomorfológico” Mestrado em Zoologia, UFRJ, 1996.

8. DESBIEZ, A. L. J. Wildlife conservation in the Pantanal: habitat alteration, invasive species and bushmeat hunting. Ph.D Thesis. Canterbury: University of Kent Canterbury, 2007.

9. HOFMANN, G. S. Taiassuídeos simpátricos no norte do Pantanal brasileiro : implicações da estacionalidade climática, do uso da terra e da presença de uma espécie invasora nas interações competitivas entre caititus (Pecari tajacu) e queixadas (Tayassu pecari). [S.l: s.n.], 2013.

10. OLIVEIRA-SANTOS, L. G. R.; DORAZIO, R. M.; TOMAS, W. M.; MOURÃO, G. M.; FERNANDEZ, F. A. S. No evidence of interference competition among the invasive feral pig and two native peccary species in a Neotropical wetland. Journal of Tropical Ecology, v. 27, n. 5, p. 557–561, 2011.

11. SALVADOR, C. H. Ecologia e manejo de javali (Sus scrofa L.) na América do Sul. Ph.D. Thesis. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2012.







*Sérgio Greif é biólogo formado pela Unicamp, mestre em alimentos e nutrição com tese em nutrição vegetariana pela mesma universidade, professor do Instituto de Pós-Graduação e Graduação (Ipog), especialista em gerenciamento ambiental pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da Universidade de São Paulo (USP), ativista pelos direitos animais, vegano desde 1998, consultor em diversas ações civis públicas e audiências públicas em defesa dos direitos animais. Coautor do livro A Verdadeira Face da Experimentação Animal: A sua Saúde em Perigo e autor de Alternativas ao Uso de Animais Vivos na Educação: Pela Ciência Responsável, além de diversos artigos e ensaios referentes a nutrição vegetariana, modo de vida vegano, direitos ambientais, bioética, experimentação animal, métodos substitutivos ao uso de animais na pesquisa e na educação e impactos da pecuária no meio ambiente, entre outros temas, sobre os quais também realiza palestras. Membro fundador da Sociedade Vegana.

Fonte: Olhar Animal 

Fotos: Reprodução