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30 de março de 2022

Opinião – “Morbius” de Daniel Espinosa

Sinopse

O bioquímico Michael Morbius tenta curar-se de uma rara doença sanguínea com ADN de morcegos mas acaba por se tornar uma espécie de vampiro vivo. As aventuras de um anti-herói da Marvel.

Opinião por Artur Neves

“Morbius” é mais um filme de Super Heróis do reportório de Marvel Comics com o personagem Morbius, transformado num vampiro vivo decorrente de uma grave deficiência sanguínea. Depois e ter despachado os anteriores super heróis a Marvel tentou desenvolver a personagem do Homem Aranha e seus derivados tal como “Venon” e agora este Morbius também baseado numa personalidade que coabita o Dr. Morbius, como iminente médico investigador que se deixou arrastar nas suas investigações para uma caraterística típica dos morcegos que desperta nele a personalidade malévola sedenta de sangue.

Como sempre nas histórias de super heróis o enredo é muito simples e neste caso começa pelo princípio com Morbius (Jaredo Leto) ainda jovem a cargo de uma instituição, onde conhece um outro garoto, Milo, da sua idade que vai se transformar posteriormente no maior rival de Morbius, devido a ter uma situação de saúde semelhante. O Dr. Michael Morbius tenta avisá-lo e promover a sua salvação mas ele, Milo (Matt Smith) só vê a vantagem que o segredo de Morbius lhe pode trazer e procura por todos os meios alcança-la, intervindo e atacando em todos os locais onde sente a mais leve possibilidade. Para contrastar com Morbius é um ser cínico, traiçoeiro com capacidade de intervenção relevante.

Com esta metodologia em que Morbius possui o lado do bem e Milo, corporiza os mais falsos objetivos, todo o filme é um conjunto de perseguições fantásticas com recorrência a efeitos especiais utilizando as caraterísticas dos morcegos como sejam o ouvido apurado e o olho que consegue ver mais longe do que aquilo que está à frente dele transformando o ar num fluido em movimento onde Morbius se desloca a alta velocidade em acrobacias difíceis de associar a um mortal comum.

Todavia a promessa de bons momentos de emoção e aventura, mesmo na versão IMAX, não contêm a motivação e a surpresa da sua ação que nos faça deixar de pensar que o investimento da SONY na Marvel fica abaixo dos resultados esperados que ambas as empresas nos habituaram, pois sendo uma estreia de um novo personagem as amostras disponíveis no You Tube não transmitem algo de novo que desejamos ver. Todavia isso depende do público que se dispuser a ser surpreendido, aliás como sempre…

O realizador Daniel Spinosa nascido na Suécia apresenta-se com “Life” de 2017, uma história com um enredo muito próximo de “Alien o 8º Passageiro” ou “Detenção de Risco” de 2012 que continua até agora uma boa referência que nos leva a pensar que ele está comprometido com a qualidade que não aparece neste filme, muito embora seja pior a falta de motivação do argumento do que o perfecionismo técnico mostrado em todas as cenas

Tem estreia prevista em sala dia 31 de Março

Classificação: 4 numa escala de 10

 

16 de fevereiro de 2022

Opinião – “Uncharted” de Ruben Fleischer


 Sinopse

O perspicaz Nathan Drake (Tom Holland) é recrutado pelo experiente caçador de tesouros Victor “Sully” Sullivan (Mark Wahlberg) para recuperar a fortuna arrecadada por Fernão de Magalhães e perdida há 500 anos pela Casa de Moncada. O que começa como um golpe, rapidamente se torna numa corrida pelo mundo para encontrar este tesouro antes do implacável Santiago Moncada (Antonio Banderas), que acredita que ele e a sua família são os seus legítimos herdeiros. Se Nate e Sully conseguirem decifrar as pistas e resolver um dos mais antigos mistérios do mundo, irão alcançar o tesouro de 5 mil milhões e talvez até o irmão desaparecido de Nate... isto se aprenderem a trabalhar em equipa.

Opinião por Artur Neves

A história que suporta o filme é um argumento de videojogo, no qual os personagens têm todos os movimentos previstos e o espectador não pode intervir além de olhar, olhar e continuar a olhar para uma ação que se desenvolve em frente dos seus olhos, revelando os segredos que ocultam o desfecho final que facilmente se antecipa sem muita surpresa. Por outro lado não tem novidade. As armadilhas e os alçapões pensados e criados não foram objeto de um rasgo visionário de um argumentista em ascensão mas antes a repetição com algumas variantes de situações já vistas, recicladas, reinterpretadas que conduzem sempre à mesma solução e ao mesmo final estafado do bem que vence o mal, glória aos heróis e castigo aos vilões.

Quando se começa a ver recordamos algo semelhante de outras épocas, como “Os Salteadores da Arca Perdida” e as suas sequelas, porque na essência a história remete-nos para essa mirífica idade em que um professor de História de uma faculdade, despia o fato da cátedra envergava a pele do explorador científico e partia para outras paragens em busca do Santo Graal da cultura que haveria de certificar a sua tese debatida em plenário. Claro que era uma história, mas a sua devoção ao resultado era mais séria e tanto as motivações como as atitudes estavam impregnadas duma dignidade que neste “Uncharted” não paira por qualquer das cenas. Claro que no outro era tudo falso, a fingir, mas neste a justificação são somente a ganancia e a ideia de poder que se esboroa no tempo.

Este “Uncharted” possui uma história muito acessível, logo ao nível dos videogames e uma dinâmica bem humorada que todavia não são suficientes para transformarem em homem o personagem criança crescida Nathan Drake (Tom Holland), bar tender de profissão em Nova Yorque que abandona as sua atividades quando desafiado por Victor Sullivan (Mark Wahlberg) para procurar o ouro perdido na viagem de Fernão de Magalhães no século XVI, que constitui igualmente o projeto de Santiago Moncada (Antonio Banderas) só que com mais meios e dinheiro contrata mercenários para lhe fazerem o trabalho que serão os principais vilões contra quem Nathan e Sulli têm de se confrontar em toda a demanda pelos locais menos comuns, que as pistas indiciam. Porém, ainda existe mais um personagem Chloe Frazer (Sofia Ali), que de acordo com as circunstâncias, joga para ambos os lados em todas as situações construídas por Ruben Fleischer e sua equipa, que apesar da multiplicidade de confrontos cruzados não confere ao filme um “sabor” que o caraterize. O que é pena, porque em algumas sequências mais arrojadas sente-se que foram construídas com imaginação, todavia a brevidade da sua duração e a sua imediata superação tornam-nas vulgares e supérfluas.

No seu conjunto a história explora uma tradição de aventuras perversas, com uma equipa de heróis que desconfiam todos uns dos outros para conferir à aventura um cariz de imprevisibilidade em todas as pistas encontradas por Nathan, o mais bonzinho de todos, Sulli, o mais sarcástico, e Chloe que conhece e não confia em Sulli e que por isso duvida de Nathan. Não há química entre eles e do lado dos vilões só Jo Braddock (Tati Gabrielle) contratada pelo implacável Moncada se fixa no nosso olhar pelo irrealismo de algumas ações. Bem sabemos que os filmes de aventuras há muito tempo abandonaram as leis da física mas uma série de paletes carregadas a saírem amarradas de um DC10, em pleno voo, como mostra o poster do filme, parece imediatamente impossível, porém constitui um exemplo da prodigiosa imaginação dos efeitos especiais e faz-nos pensar nas possibilidades que sobram para os personagens. É uma aventura total e o que mais interessa é a pura fruição das sequências arrojadas, se não é este o seu objetivo caro leitor, então este filme não é para si.

Tem estreia prevista em sala dia 17 de fevereiro

Classificação: 5 numa escala de 10

2 de dezembro de 2021

Opinião – “Resident Evil – Raccoon City” de Johannes Roberts


 

Sinopse

Voltando às origens da popular história “Resident Evil”, o fã e cineasta Johannes Roberts dá vida aos jogos para toda uma nova geração de fãs. Em “Resident Evil: Raccoon City”, que já foi a casa em expansão da gigante farmacêutica Umbrella Corporation, Raccoon City é agora uma cidade agonizante do médio oeste. O êxodo da empresa deixou a cidade num deserto... com um grande mal fermentando debaixo da superfície. Quando esse mal é desencadeado, um grupo de sobreviventes devem trabalhar juntos para descobrir a verdade por trás da Umbrella e sobreviver durante a noite.

Opinião por Artur Neves

A saga “Resident Evil” começou em 2002 como sendo a luta de Alice (Milla Jovovich), uma ex-especialista em segurança recrutada pelo governo para lutar contra a farmacêutica Umbrella Corporation que desenvolvia armas biológicas que provocavam um apocalipse zumbi. Com este formato e passando por sucessivas sequelas a saga durou entre 2002 e 2016, sendo o último dos seis filmes produzidos nomeado como; “O Capítulo Final”, mas como é sabido, em cinema o final nem sempre é o fim, e cá temos o reinício em 2021 com este “Raccoon City”, que adapta as histórias dos dois primeiros jogos de computador desenvolvidos pela Capcom Co. Ltd que comprou os direitos da história original, para a apresentar em forma de jogo de vídeo. Inicialmente para a plataforma Nintendo Game Cube em 2002 e o segundo jogo em 2019 para a Play Station e XBox, com relevantes melhoramentos da qualidade da imagem e da fluidez da ação apresentada no jogo. Esta adaptação aos jogos de computador começou logo em 2017, após a apresentação de “O Capítulo Final” e agora é o cinema que se serve do argumento do jogo para nos servir este filme… mais palavras para quê?...

Um aspeto que não pode ser esquecido porém, é que todo este material arrecadou mais de mil e duzentos milhões de dólares durante este tempo, tendo sido classificado como o vencedor dos filmes de terror e de zombies em termos de lucros e o record de mais adaptações para filme de um jogo de computador. É obra… todavia como cinema é mais um exemplar recordado pelo seu lucro e não pela sua qualidade, não esquecendo que tem os seus fãs e o seu público dedicado que com certeza vai cumprir o ritual de assistência e deliciar-se com os efeitos especiais e os monstros criados ao longo da história, pois os personagens serão incrivelmente familiares e bem conhecidos dos jogadores de “Resident Evil” e toda a ambiência da história, bem como o seu argumento linear, de fuga e perseguição, com uma narrativa de ação constante e prolongada não dececionará o seu público fiel, embora não provoque a adrenalina que os jogadores frequentes procuram numa sessão de jogo.

Johannes Roberts não é um novato nestas coisas e procura caraterizar a atmosfera do argumento com uma cidade praticamente deserta, chovendo copiosamente na noite em que Claire Redfield (Kaya Scodelario) resolve voltar á cidade onde já viveu na infância em busca do seu irmão Chris Redfield (Robbie Amell) que ficou na casa de acolhimento quando ela fugiu. Ela volta de boleia num camião cisterna, cujo motorista atinge mortalmente uma garota que aparece subitamente na estrada. O motorista quer abandonar o local mas Claire discute com ele forçando-o a parar para dar assistência à sinistrada que se encontra deitada no chão. Enquanto eles discutem a rapariga levanta-se e foge para a floresta iniciando o sentimento de que algo está muito errado em Raccoon City, depois do abandono da cidade pela corrupta Umbrella Corporation que deixou a cidade a morrer com as suas experiências impróprias. O cão do motorista lambe o sangue que encontra no chão e em poucos minutos fica um zombie furioso que morde o dono transmitindo-lhe o mesmo efeito e provocando nos espectadores fiéis a situação de conforto ao recordarem os cães zombie como sendo as “coisas” mais aterrorizantes utilizadas nos jogos. Estou a ouvi-los pensar nas suas cadeiras: “…aí estão os cães!…”

A familiaridade que os personagens inspiram nos jogadores e nos fãs dos filmes hão de contrastar com um Chief Irons (Donal Logue) chefe da esquadra de Raccoon, que masca desesperadamente um pastilha e se apresenta como um chefe de paródia de polícias descontraídos e sem farda, desinteressados da reunião, ou uma Claire muito mais parada do que nos lembramos de Alice (Milla Jovovich) para quem era tudo ação e competição. Tudo se passa entre os heróis contra os zombies para um final previsível desde muito cedo sendo possível adivinhar o caminho do argumento e com quem será travada a sequência final daquela fuga em perseguição dos zombies. Todavia, não acaba aqui, pois após os créditos principais do filme ainda temos um epílogo que nos informa que o filão ainda não secou e teremos continuação no futuro.

Tem estreia prevista em sala para 09 de dezembro.

Classificação: 4 numa escala de 10

9 de outubro de 2021

Opinião – “Venom: Tempo de Carnificina” de Andy Serkis

Sinopse

Tom Hardy regressa ao grande ecrã no papel do protetor letal Venom, um dos maiores e mais complexos personagens do universo MARVEL. Realizado por Andy Serkis, este filme tem também a interpretação de Michelle Williams, Naomie Harris e Woody Harrelson, no papel do vilão Cletus Kasady/Carnificina.

Opinião por Artur Neves

Venom é mais um personagem da Marvel Comics que foi explorado inicialmente na banda desenhada, em 1933 e na série de animação do Homem-Aranha em 1994, tendo merecido destaque com a coleção “The Venom Saga” em 1996. Nunca teve uma grande espetacularidade nem foi particularmente popular, até que em 2018 a Marvel decidiu transpô-lo para o grande ecrã, provavelmente já influenciada pelos ventos de reforma dos heróis tradicionais que vieram a “falecer”, todos de uma assentada em “Avengers: Endgame” de 2019.

Assim, em “Venom” de 2018 temos o aparecimento do jornalista falhado Eddie Brok (Tom Hardy) que se regenera após a coabitação com uma entidade alienígena, um simbionte do espaço exterior que gosta da terra e passa a habitar o corpo de Eddie constituindo uma parceria contra o crime e a maldade na cidade de Nova Iorque. No final deste filme, foi logo indiciada uma sequela através do breve aparecimento do serial killer; Cletus Kasady (Woody Harrelson) que vem a tornar-se figura grada no presente filme depois de escapar à prisão, após ter dado guarida a Carnage, (Carnificina) um extra terrestre da família de Venom mas muito mais violento e caótico em todas as suas atitudes.

A história passa-se uma ano depois dos acontecimentos narrados no primeiro filme e começa com o jovem Cletus assistindo impotente à transferência da sua amada Frances Barrison (Naomie Harris) do Lar St. Estes para Crianças Indesejadas, para o Instituto Ravencroft para ser sujeita a experiencias médicas de investigação do seu poder de grito com altas frequências sónicas que ela usa como defesa e agressão. Enquanto isto, Brok tenta adaptar-se à vida de hospedeiro de Venom, que possui opções divergentes da sua, como modo vida. Ele tenta recuperar a sua profissão de jornalista através da entrevista a Cletus que está preso no corredor da morte esperando a data da sua execução, mas escapa através de ter incorporado o simbionte Carnage, que em princípio é mais poderoso do que Venom. Como Cletus é um assassino a sangue frio, o exuberante “Carnificina” é mais cruel, reforçado ainda por habitar um serial killer psicopata, sem limites ou barreiras de contensão aos desmandos que deliberadamente pode provocar.

Com esta perspetiva pode imaginar-se que este filme seja dedicado a um público jovem, órfão dos super-heróis tradicionais, cuja primeira versão, granjeou mundialmente mais de 800 milhões de dólares em volume de bilheteira, o que trás esperanças acrescida para esta sequela que só no primeiro fim-de-semana de estreia nos USA arrecadou mais de 90 milhões, e que seguramente não vai ficar por aqui, considerando a cena apresentada a seguir aos créditos finais. É assim um filme para ver, em tamanho quanto maior, melhor, pelo que se recomenda a assistência à versão IMAX, com som Dolby Atmos que possibilitam maior imersividade na ação e nas complicadas lutas entre titãs.

Depois da privação das salas de cinema por causa da pandemia, este mês de Outubro está recheado de filmes que podem assinalar uma amostra do que será o futuro do cinema em sala, com James Bond em 30 de Setembro, este Venom em 14 de Outubro e o esperado “Dune” para 21, podem dar uma noção muito concreta da disponibilidade do público em se deslocar a uma sala de cinema para ver um filme. Até agora, com “James Bond: Sem Tempo para Morrer” a resposta parece já ser afirmativa.

Tem estreia prevista em sala para dia 14 de Outubro

Classificação: 4 numa escala de 10

 

26 de janeiro de 2020

Opinião – “Mulherzinhas” de Greta Gerwig


Sinopse

A realizadora e argumentista Greta Gerwig (Lady Bird) apresenta uma versão de “Mulherzinhas” que se baseia não só no romance clássico de Louisa May Alcott, como também nas notas deixadas pela autora. Esta história, vai desdobrando-se no alter ego da autora, Jo March, à medida que esta leva a sua vida real para a sua obra ficcional. Na opinião de Gerwig, a adorada história das irmãs March - quatro jovens determinadas a viver a vida à sua maneira - é intemporal e oportuna. Retratando Jo, Meg, Amy e Beth March, este filme é protagonizado por Saoirse Ronan, Emma Watson, Florence Pugh, Eliza Scanlen, com Timothée Chalamet no papel do seuvizinho Laurie, Laura Dern como Marmee e Meryl Streep como tia March.

Opinião por Artur Neves

Este é o oitavo filme sobre o romance clássico de Louisa May Alcott numa realização salpicada de reflexos #Metoo, considerando a modernidade com que o argumento é abordado transformando as meninas que atingiram a maioridade em 1860 apenas dedicadas ao lar e à vida doméstica da época, em raparigas modernas, conscientes de si e das suas vontades e do seu desejo de independência e autonomia em relação aos costumes e tradição com que foram educadas.
Alcott escreveu o romance por encomenda do seu editor e impregnou-o da sua autobiografia de tal modo que Jo é um personagem baseado em si mesma e com a mesma ânsia de se tornar escritora e através disso afirmar-se na sociedade do seu tempo.
Greta Gerwig, atriz e realizadora americana que já nos deu “Lady Bird” em 2017 e o excelente desempenho de Frances em “Frances Há” em 2012 pega nesse facto logo no início do filme, mostrando-nos Jo March (Saoirse Ronan, fabulosa como sempre) entrando nos escritórios de uma editora em Nova Yorque para apresentar o seu primeiro trabalho que é imediatamente corrigido com desdém pelo responsável, embora veja nela o potencial de escritora que se vem a revelar posteriormente.
A partir daqui o filme recua e avança no tempo mostrando-nos a Jo do passado e a sua vida em casa, com as irmãs e o pai ausente na guerra da secessão e a mãe Marmee March (Laura Dern) que desenvolve um personagem cheio de força e de carácter, embora doce e silencioso nas ocasiões de sofrimento e drama, como o esteio que mantém a família unida.
Este modo inovador de apresentar a história é sem dúvida o resultado de um rasgo de inteligência de Greta Gerwig que com indicações subtis nos posiciona antes e depois, entrelaçando os factos identitários de cada tempo e de cada local. Tem como contra, o facto de exigir mais atenção do espectador para não se confundir no tempo com os factos apresentados. A nota que sublinha o classicismo da época coube à tia March (Meryl Streep) que sem qualquer disfarce para a sua idade real é a única que recomenda às sobrinhas que se casem com um homem rico para assegurarem a sua subsistência financeira, exemplificando com a sua vida celibatária, só possível devido ao dinheiro que já possui.
Por outro lado a modernidade de abordagem de um romance do século XIX revelada neste filme, faz-nos sentir que os personagens têm carne e sangue em alvoroço nas suas veias, assemelham-se a pessoas reais, nossos colegas, nossos vizinhos, pessoas que conhecemos e dos quais conhecemos a história, muito diferente das meninas bem comportadas de antanho tradicionalmente apresentadas. Para mim é a melhor das oito adaptações existentes e muito embora a representação da sociedade de uma época clássica se mantenha, está despida do servilismo e obediência submissa que a caracterizava.

Classificação: 7 numa escala de 10

23 de janeiro de 2020

Opinião – “Jojo Rabbit” de Taika Waititi


Sinopse

O escritor e realizador Taika Waititi (“Thor: Ragnarok”, “Hunt for the Wilderpeople”), traz-nos o seu habitual humor e dedicação no novo filme “Jojo Rabbit”, uma sátira sobre a Segunda Guerra Mundial, que conta a história dum solitário rapaz alemão (Roman Griffin Davis) cujo mundo foi virado avesso quando este descobre que a sua mãe (Scarlett Johansson) esconde no sótão uma jovem judia (Thomasin McKenzie). Apoiado apenas pelo seu amigo imaginário, Adolf Hitler (Taika Waititi), Jojo é obrigado a confrontar-se com o seu nacionalismo cego.

Opinião por Artur Neves

Não sei se será boa ideia misturar holocausto com comédia, sobretudo porque se trata de comédia fantástica em que o próprio Adolf Hitler é o amigo imaginário de Jojo Betzler “Rabbit” (Roman Griffin Davis) um garoto alemão de 10 anos com um amor fanático pela causa Hitleriana e que tem o próprio Hitler como seu mentor espiritual e hóspede dos seus pensamentos e dos seus desejos.
Este filme estreou em 2019 no Festival de Cinema de Toronto e recebeu o galardão “People's Choice Award” por ter sido escolhido pelo público, tendo descartado; “História de Casamento” e “Parasita”, pelo que causou alguma estranheza considerando que este galardão já premiou algumas obras que posteriormente se vieram a revelar merecedoras do Oscar.
O humor utilizado emprega muitas piadas repentistas e diretas que nem causam muito riso porque se fundamentam ou na inépcia de Jojo, que se fere gravemente num treino de campo da juventude Hitleriana, quando auto inflamado pela doutrina nazi, sofre o rebentamento de uma granada que ele próprio tinha atirado, ou na grotesca assistente Fraulein Rahm (Rebel Wilson) do Capitão K (Sam Rockwell) que só pelo seu aspeto e atitude, pretende evocar o riso quando serve o Capitão K, um militar expulso do exército principal por andar sempre bêbado, a quem deram a missão de formar os novos recrutas. Não há elevação nos diálogos, nem subtileza nas conversas, nem qualquer segundo sentido nas alusões. Rosie (Scarlett Johansson) que faz de mãe de Jojo, constrói um personagem esteriotipado pouco convincente.
“Jojo Rabbit” baseia-se num romance de uma autora belga / neozelandesa, Caging Skies e não é uma história cómica, nem inclui Hitler como modelo ideológico de Jojo, sendo esta uma ideia peregrina (acho eu) do realizador Taika Waititi, descendente de maori, judeu e irlandês e que se descreve como “judeu polinésico”, que assumiu esse papel construindo um “Hitler”, em versão maníaca, meio idiota e infantil, muito distante do arquétipo que a juventude Hitleriana deveria inculcar nas mentes em formação dos seus membros e impossível de ter sido concebido pela mente de um miúdo de 10 anos, fanático pela doutrina e pelo personagem. Esta é portanto uma gritante discrepância que contrasta com o contexto sombrio do personagem real, tornando o resultado algo excêntrico.
Jojo é um rapaz preocupado com a guerra, com o seu resultado, com o futuro, com os nazis que matam pessoas nas ruas da sua cidade e que mataram a sua mãe e que neste sentido pode ser encarado como o despertar da inocência de uma criança. Os torcionários, a polícia política, são representados como palhaços estúpidos, mas não nos esqueçamos que eles não foram inofensivos, foram eles que executaram o Holocausto, que está subjacente na judia Elsa (Thomasin McKenzie) de 16 anos, que Rosie abrigou no sótão de sua casa e que por isso morreu quando foi denunciada.
Pode também considerar-se que “Jojo Rabbit” é um filme ousado por abordar de forma ligeira a questão mais dramática do século XX, mas a sua ausência de condenação explícita, numa narrativa de banalização do Holocausto, não previne nem erradica a sua indesejada repetição e neste aspeto não é feliz no seu argumento.

Classificação: 5,5 numa escala de 10

16 de janeiro de 2020

Opinião – “Bad Boys para Sempre” de Adil El Arbi e Bilall Fallah


Sinopse

Os Bad Boys, Mike Lowrey (Will Smith) e Marcus Burnett (Martin Lawrence) estão de volta para uma última viagem juntos no muito antecipado “Bad Boys para Sempre”

Opinião por Artur Neves

Este é o terceiro filme de uma mini série (mini se ficar por aqui, bem entendido) começada em 1995 com “Bad Boys” em que a dupla Will Smith e Martin Lawrence assenta arraiais e prossegue com “Bad Boys II” em 2003 repetindo a dose de aventura, pancadaria e muitos tiros, no combate aos malfeitores instalados no mundo da droga, ambos realizados por Michael Bay e produzidos por Jerry Bruckheimer que também produz os CSI’s, Las Vegas, Miami e outros filmes para televisão que eu caracterizo como “séries de filmes a metro”.
Desta vez retoma-se o tema mas com mais distânciamento, a idade já é outra, estão ambos mais próximos da reforma e embora a ação seja muita e o argumento apresente muitas notas de comédia e de verdades sobre a vida, sente-se o cansaço dos personagens. É como uma revisitação a um lugar onde ambos foram felizes, na esperança que esses momentos então vividos reapareçam, não obstante a predisposição já ser diferente.
Nesta história Mike Lowrey e Marcus Burnett estão ensaiando uma corrida em direção ao hospital onde está prestes a nascer o neto de Marcus, que agora se tornou homem de família ao lado da sua esposa Therese (Theresa Randle) e da filha Megan Burnett (Bianca Bethune), quando aparece uma mota em alta velocidade, cujo condutor dispara dois tiros em pleno peito de Mike que o conduzem ao hospital entre a vida e a morte.
Consternado, Marcus encomenda o amigo a todos os santos e ao próprio Deus, pedindo pela vida de Mike, que recupera seis meses depois e nos aparece com a mesma garra e os mesmos interesses de sempre, desejoso de fazer justiça e de reocupar o seu posto de polícia no ativo. Só que Marcus não está para aí virado e tenta convencer Mike a deixar esse trabalho para os atuais especialistas, Rita (Paola Nuñez) responsável por uma elite de investigadores com outros meios e outras técnicas diferentes das que eles estavam habituados.
O sempre irritadiço Captain Howard (Joe Pantoliano), não concorda com a ideia de ter Mike de volta à ação e só depois de um grande esforço deste, concorda em aceitá-lo mas como “consultor” e subordinado a Rita, coisa que nós logo compreendemos que não vais ser assim porque manifestamente não está na natureza de Mike. Entre os dois ainda surge uma chispa de olhares cúmplices mas cedo se percebe que é uma pista falsa para aquela história.
A busca pelo responsável do atentado a Mike começa e ficamos a saber que se chama Armando (Jacob Scipio) é filho de uma bruxa mexicana, Isabel Aretas (Kate del Castillo) que está obcecada em matar Mike por razões que constituem o twist principal da história com uma surpresa, que mantém a ação em bom nível, sempre com uma vertente de comédia que ameniza o ambiente.
Esta sequela é realizada por dois realizadores, nomeados como "Adil & Bilall", uma dupla de realizadores Belgas da nova geração que espalham adrenalina e cenas de família numa história com origem na “fábrica” de Bruckheimer que com certeza não a tinha pensado assim, mas convenções à parte, acaba por ser a sequela mais conseguida da mini série e considerando que o epítome “para Sempre” permite intuir um fim, ou uma constância de continuidade, ficaremos expectantes sobre qual das duas hipóteses se verificará no futuro.

Classificação: 6 numa escala de 10

9 de dezembro de 2019

Opinião – “Jumanji: O Nível Seguinte” de Jake Kasdan


Sinopse

Em “Jumanji: O Nível Seguinte”, o gang está de volta, mas o jogo mudou. Quando regressam a Jumanji para resgatar um deles, descobrem que nada é como estavam à espera. Os jogadores terão de enfrentar lugares desconhecidos e inexplorados, desde os áridos desertos às montanhas nevadas, para escapar do jogo mais perigoso do mundo.

Opinião por Artur Neves

“Jumanji” é uma história iniciada em 1995 que relata a descoberta de um jogo de tabuleiro encantado, por uns miúdos que acidentalmente o encontram e iniciam o jogo. Esse facto liberta um homem, Alan Parrish (Robin Williams, já falecido) aprisionado no interior do tabuleiro que liberta com ele todos os perigos de que ele se escondia há décadas, por não ter conseguido terminar o jogo.
Tudo poderia ter ficado por aqui e ficaria muito bem. Na altura não era um filme natalício, foi estreado em Portugal em Março de 1996 e mostrava uma boa dose de efeitos especiais que encantaram miúdos e graúdos e principalmente, revelou para o género de comédia um ator em ascensão chamado Robin Williams que pela sua qualidade nos deu excelentes desempenhos em personagens trágico-cómicos com grande conteúdo emocional e ainda hoje apreciáveis.
O problema começa quando a Sony em 2017, “desenterra” o assunto, alterando o conceito inicial, transformando um jogo de tabuleiro num vídeo jogo de consola e os miúdos em matulões, que por motivos nunca completamente explicados se envolvem em aventuras loucas, justificando a utilização de sofisticados meios técnicos computorizados numa história de perseguições sobre perseguidos, que fogem e são apanhados, para depois serem novamente libertados para manter o enredo, em peripécias cada vez mais mirabolantes com o intuito de fascinação circunstancial gratuita, mas sem qualquer objetivo específico que não seja acabar o jogo provisoriamente, para o continuar no ano seguinte, ou dois anos depois como é o presente caso.
Aqui chegados, cá temos mais uma sequela em 2019, agora em calendário natalício para aproveitar as férias escolares, que é mais do mesmo, com os mesmos matulões, efeitos ainda mais sofisticados e com um enredo ainda mais forçado que o anterior, tendo com única razão fazer o grupo voltar ao jogo que tinha sido destruído no filme anterior. But, the show must go on e os pedaços em que ficou o videojogo têm de ser recuperados para que a turma se volte a perder e encontrar em novas aventuras.
Considerando que este género de filmes é só para ver e esquecer de seguida, os argumentos são sempre muito simples. Neste caso temos uma troca de identidades, melhor, uma rotação de identidades que me dispenso de enumerar, pois transformam-se todos em avatares de todos sem razão objetiva e tornam-se incapazes de enfrentar os desafios em que o jogo os envolve para apanharem uma pedra roubada por um rei bárbaro.
Para cumprir esta história, seguem-se perseguições com todas dificuldades que se possam imaginar, provas de dificuldade crescente, diálogos de graça duvidosa e quase no final, uma referência a “Jumanji” 1995 que tem sabor a agradecimento e homenagem mas que não salva a sandice geral que pulula por todo o filme.
Os miúdos estão de férias, é preciso ocupá-los pelo menos temporariamente e nesse campo este filme cumpre o propósito, em todos os outros aspetos é duma pobreza franciscana que nem os efeitos especiais de bom nível compensam… Receio que para o ano tenhamos mais!...

Classificação: 3 numa escala de 10

20 de novembro de 2019

Opinião – “Enquanto a Guerra durar” de Alejandro Amenábar


Sinopse

Salamanca, verão de 1936, Espanha vive uma situação desconcertante e o ilustre escritor Miguel de Unamuno decide apoiar publicamente a revolta militar acreditando que poderá trazer ordem ao caos existente. Como consequência desse apoio, é imediatamente demitido do seu cargo de reitor da Universidade de Salamanca pelo governo de esquerda. Entretanto o general Francisco franco une as suas tropas à rebelião e inicia com sucesso uma campanha vinda do Sul, tentando secretamente tomar o comando da guerra. Este confronto torna-se bastante sangrento e alguns amigos e colegas do escritor são detidos e aprisionados, obrigando Unamuno a questionar o apoio que tinha dado anteriormente à rebelião e até aos seus próprios princípios. Quando Franco transfere o seu quartel general para Salamanca e é nomeado Caudilho, Unamuno visita-o no palácio determinado a implorar clemência.

Opinião por Artur Neves

Alejandro Amenábar apresenta-nos aqui um relato dramático sobre o início do regime Franquista, em pleno início da guerra civil e como esse personagem congelou os destinos do povo espanhol durante quase 40 anos submetendo-o a uma ditadura de direita com a bênção divina. Franco e sua família eram fortemente crentes em Deus e o filme documenta essa dependência.
A história desenvolve-se em torno do filósofo e escritor Espanhol Miguel de Unamuno, conhecido pela sua obra; “O Sentimento Trágico da Vida” que lhe valeu a condenação da igreja e pela sua postura social, tal como descrito na sinopse e que compõe o argumento deste filme.
Miguel de Unamuno (Karra Elejalde) é assim considerado um autor estimado e filosofo, incluindo a fação nacionalista que o considerava patriota e nessa conjuntura, ele também se mostrava solidário com a junta militar que em processo colegial tinha o controlo do poder em convulsão e que evitava criticá-lo por conhecer o seu raciocínio de livre pensador independente de qualquer dogma.
Os seus amigos mais chegados são; Salvator (Carlos Serrano-Clark) um jovem professor que foi seu aluno e Atilano (Luis Zahera), pastor protestante, em que nas suas longas conversas, ambos, sobrevalorizando a influência política de Unamuno, frequentemente lhe recomendavam intervenções e pedidos que Unamuno sabia não estarem ao seu alcance, não só decorrente dos achaques da sua saúde, como principalmente, pela indiferença a que o poder remete o prestígio da intelectualidade, quando estão em jogo as ideologias fascistas e os partidos totalitários que enquadram pessoas incultas nas suas fileiras e divulgam uma doutrina que os afasta do raciocínio lógico.
Dos elementos constituintes da junta militar dirigente começa a formar-se a ideia da existência de um líder único em contraste com a tomada de decisão colegial, particularmente impulsionada por um general, mutilado e herói de guerra, temperamentalmente arrogante e possivelmente psicótico; Millan-Astray (Eduard Fernández) camarada de armas de Franco na frente africana, que “empurra” Franco para a presidência do grupo, apesar deste se apresentar como um militar fraco, sem qualquer espírito de liderança, passivo e até tímido, com medo (declarado pelo próprio) de “fazer o movimento errado”. Millan-Astray possivelmente teve em conta o seu poder de influência sobre Franco na condução das decisões de guerra.
É pois a este general Franco, já empossado pelos seus pares, que Unamuno se dirige em audiência pedindo clemência para os seus amigos entretanto presos, recebendo como esperado, um “não” rotundo, e que é posteriormente solicitado para a presidência do ato de abertura do ano letivo de 1936 no salão nobre da universidade, onde depois das exaltações da praxe política, Unamuno revela a sua oposição ao regime evidenciando muito particularmente as contradições do regime que ele abomina.
Alejandro Amenábar que nos ofereceu; “Mar Adentro” em 2004 com o drama da vida de Ramon Sampedro como ilustração da justeza da eutanásia, ou; “Os Outros” em 2001, numa história que inverte a posição entre os mortos e os vivos que habitam uma casa assombrada, traz-nos aqui um documento histórico que embora do ponto de vista técnico flua com segurança, apresenta alguma falha de ignição emocional que não nos empolga nem surpreende em nenhum momento. Todo o filme está bem construído, utilizando meios técnicos de primeira qualidade que tornam a representação credível e bem representativa de um passado não muito distante que serve para nos lembrar que todos os conflitos emergentes na Espanha atual não são um assunto novo.

Classificação: 7 numa escala de 10
PS: Não existem documentos históricos do discurso de Unamuno na universidade, mas segundo os relatos da época a controvérsia das suas declarações que levaram à sua terceira destituição de Reitor da Universidade de Salamanca estão descritas na página da Wikipedia referente a Miguel de Unamuno, cujo link deixo aqui.


8 de novembro de 2019

Opinião – “Le Mans '66: O Duelo” de James Mangold


Sinopse

“Le mans 66”: O Duelo”, protagonizado pelos oscarizados Matt Damon e Christian Bale, é baseado na história real do visionário car designer Carroll Shelby (Matt Damon) e do destemido piloto britânico Ken Miles (Christian Bale). Juntos lutaram contra os regulamentos, as leis da física e os seus próprios demónios com o objetivo de construir um carro de corrida revolucionário para a Ford Motor Company e vencer os carros de Enzo Ferrari nas 24 horas de Le Mans em França 1966.

Opinião por Artur Neves

Numa observação ligeira pode pensar-se que se trata de um filme de carros de corrida, ou até de máquinas de competição em velocidade, mas “Le Mans 66” é muito mais do que isso, é uma história de castas, de orgulho, de tenacidade e perseverança, de carne e sangue suportados por máquinas de metal e fogo que chegam aos 320 km/h e sem levitar, transportam o seu ocupante para o lugar do seu espírito e para a paz que este pretende atingir na loucura do seu veloz deslocamento controlado.
Estamos na década de 60 e Henry Ford II, (Tracy Letts). que recebeu o negócio do pai, confronta-se com uma empresa paralisada. Os carros não agradam, vendem-se dificilmente, sofrem desenvolvimentos menores que não agradam ao público, mas que aparentemente servem a corporação, os seus pergaminhos, a sua tradição apoiada por uma bateria de funcionários corporativos que apesar de endeusarem o seu patrão não lhe trazem valor acrescentado, nem cash-flow ao departamento comercial. Henry Ford II, sente-se preso na sombra do império e subjugado pelo peso da herança.
Para se libertar dos medos que o assaltam enverada pelo salto qualitativo do seu produto através da conceção de uma máquina que possa vencer a Ferrari de Enzo Ferrari (Remo Girone), na prova rainha de resistência da época; as 24 do circuito de Le Mans em França, através da contratação do melhor profissional no ramo, Carroll Shelby (Matt Damon), um piloto da Aston Martin que venceu Le Mans 1959 e que teve de abandonar as provas por motivos de saúde.
É aqui que a batalha começa e que será decidida na pista de Le Mans por Carroll Shelby que se fará acompanhar pelo seu piloto de eleição Ken Miles (Christian Bale), imposto após dura luta ao patrão da Ford que o recusa por não ter o tipo e a formatação corporativa dos trabalhadores Ford.
James Mangold, realizador americano, nascido em 1963, que já nos ofereceu “Vida Interrompida” em 1999, e "Heavy" (1995), o seu filme mais dramático não passado em Portugal, constrói uma história baseada num caso real que nos mostra a aspereza emocional do confronto entre pessoas que embora situados em mundos diferentes precisam umas das outras e sabem como conduzir os seus objetivos para concretizar as obras que darão felicidade a ambos, embora se mantenham separados pela distância entre os seus mundos.
Independentemente da personalidade real de Carroll Shelby e Ken Miles, o argumento desenvolve personagens bem conseguidos pelos seus intérpretes. Mat Damon constrói um britânico decidido, com ideias e vontade própria embora algo melancólico e Christian Bale apresenta-se como nunca o vira-mos, um americano rural, desbragado, calculista, determinado nas suas opções e com uma família constituída pela mulher; Mollie (Caitriona Balfe) que embora com um pequeno papel mostra sentido e determinação em todos os seus atos, tanto no afeto por Ken, como na hora de impôr a sua vontade quando sente fraqueza do lado de Ken, ou nos cuidados ao filho Peter (Noah Jupe), mostrando que a felicidade familiar é uma componente de construção diária e os três formam uma equipa equilibrada e coesa.
De toda esta história ressalta o valor da determinação em alcançar um objetivo e constitui uma homenagem justa a uma máquina, o modelo Ford GT40 que foi construído para destronar a Ferrari que tinha sido vencedora do circuito das 24 horas de Le Mans entre 1960 e 1965 consecutivamente, tendo conseguido esse trofeu em 1966 com três carros Ford nos 1º, 2º e 3º lugares, constituindo a nova referência da marca que a potenciou no mercado. Muito interessante, bem construído e interpretado, merece ser visto e recomendo.

Classificação: 8 numa escala de 10

26 de outubro de 2019

Opinião – “Exterminador Implacável: Destino Sombrio” de Tim Miller


Sinopse

A história de “Exterminador Implacável: Destino Sombrio” começa 20 anos depois de Sarah Connor impedir o Dia do Julgamento, mudar o futuro e reescrever o destino da raça humana. Dani Ramos (Natalia Reyes) vive uma vida simples na Cidade do México com o irmão (Diego Boneta) e o seu pai quando um novo exterminador altamente avançado e mortal - um Rev-9 (Gabriel Luna) - viaja no tempo com o objetivo de caçá-la e matá-la. A sobrevivência de Dani depende da sua união com duas guerreiras: Grace (Mackenzie Davis), uma aperfeiçoada super-soldado do futuro, e Sarah Connor (Linda Hamilton), que soma muitos anos de batalha. À medida que Rev-9 destrói cruelmente tudo e todos que se cruzam no seu caminho, Dani, Grace e Sarah acabam por encontrar um T-800 (Arnold Schwarzenegger) do passado de Sarah, que pode ser a sua última esperança.

Opinião por Artur Neves

A série Exterminador Implacável publicada até agora é constituída por 5 filmes, pelo que o atual em análise deveria ser o sexto, mas esqueça isso porque as produtoras de cinema têm a sua própria contagem e eliminaram da serie os filmes 3, 4 e 5 e retomaram a ação no final do segundo filme da serie que continua agora com este; “Exterminador Implacável: Destino Sombrio”, cuja sinopse anterior resume a história que se verá no filme.
Segundo as “más línguas” do meio, o que se passou foi que os dois primeiros filmes de 1984 e 1991, escritos e realizados por James Cameron tiveram um êxito de bilheteira consideravelmente superior aos filmes subsequentes dos outros realizadores responsáveis pelas sequelas 3, 4 e 5 e a produtora quando estabeleceu contrato para reativar a série novamente com James Cameron, este apresentou como condição recomeçar a partir do ultimo filme de sua autoria, o que me parece no mínimo, legítimo.
A diferença porém fica-se por aqui, pois ele foi “desenterrar” Sarah Connor (Linda Hamilton), e um T-800 (Arnold Schwarzenegger) que estavam na reforma, para uma história que se resume a uma perseguição das novas máquinas Rev-9 (Gabriel Luna), oriundas da organização Legion (em substituição da defunta Skynet) ao novo símbolo da resistência dos humanos contra as máquinas; Dani Ramos (Natalia Reyes) por montes, vales, ar e mar até a exterminar para deixar intacto o poder das máquinas.
A perseguição é realmente implacável e complexa, entrando aqui o poder dos efeitos especiais do cinema com cenas de tirar a respiração. Rev-9 é na realidade uma máquina indestrutível que se auto recupera depois de destruída, ou pelo menos, depois de muito mal tratada, na forma de um líquido negro que reconstitui todos os órgãos desfeito em cada combate. Além disso ele tem a capacidade de se desdobrar, nele próprio e num exosqueleto metálico negro que sai dele quando o corpo principal fraqueja. É um inimigo do tipo, que de nada serve lutar com ele, sendo melhor simplesmente fugir dele.
A mensagem subliminar é muito curiosa considerando que o salvador da humanidade é uma mulher mexicana, que entra ilegalmente nos USA através da fronteira México – Texas ajudada por três americanos. Isto representa uma clara mensagem de esperança para o estado atual das coisas neste país e numa época pós-Trump que não se sabe se será brevemente possível. Histórias destas nunca aparecem por acaso e uma situação assim, produzida por uma Major dos USA, pela mão de um realizador tão considerado só pode ter uma segunda leitura.
Quanto ao resto é o que já tenho dito em produções deste género. Um filme com tanta “impossibilidade” de ocorrência na vida real como este, só pode ser destinado a impressionar pelos seus meios técnicos. Como tal, se for visto em IMAX 3D, mais imersiva será essa experiência e maior será o grau de diversão obtido. Assim sendo o melhor é esquecer-se de outras preferências e fruir o que a “tela gigante” lhe pode oferecer. Por mim fico rendido.

Classificação: 6 numa escala de 10

13 de setembro de 2019

Opinião – “Ad Astra” de James Grey


Sinopse

Este filme conta a história do astronauta Roy McBride (Brad Pitt) enquanto viaja para as extremidades do sistema solar com o objetivo de encontrar o seu pai desaparecido e desvendar um mistério que ameaça a sobrevivência do nosso planeta. Nesta expedição, Roy irá descobrir segredos que desafiam a natureza da existência humana e o nosso lugar no universo.

Opinião por Artur Neves

Ad Astra, a expressão que dá nome ao filme, tem origem na Eneida, uma epopeia latina escrita por Virgílio no século I a.C. podendo tomar diferentes sentidos no contexto em que for proferida. No aspeto aeronáutico, particularmente no que concerne à conquista espacial pode significar; “por ásperos caminhos até aos astros” (ad astra per aspera), ou mais genericamente “atingir a glória por caminhos difíceis” ou “alcançar o triunfo por feitos notáveis” e qualquer delas está adequada à história contada neste filme.
Na sequência de fortes e perturbadoras tempestades elétricas na terra, provocadas por uma entidade longínqua e desconhecida que se prevê seja provocada por Clifford McBride (Tommy Lee Jones), responsável por uma anterior expedição e pai de Roy MacBride, este é enviado numa expedição para o encontrar, despertando nele sentimentos contraditórios por uma pessoa que ele ama, mas do qual se sente abandonado desde a infância e do remorso que ele sente, de por motivo idêntico provocar isso na sua mulher, remetendo-a um lugar tão marginalizado na sua vida, decorrente da indiferença a que ele a sujeita.
Esta é pois a história de uma saga familiar de um homem amargurado, embora calmo, equilibrado, coerente, cuja memória paterna é tão débil que ele confunde a invenção da sua imaginação com a realidade histórica oficial de um homem que é lembrado e homenageado como o herói para lá do seu tempo, que teve a coragem de viajar no espaço para limites nunca antes atingidos, ad astra, e que ao ser escolhido para esta missão acende-lhe o desejo de finalmente esclarecer as conflituantes emoções que o atravessam e definir o monólogo íntimo que Roy nos dá a conhecer através consistentes narrações em off.
No fim, Roy reconhece “que somos tudo o que temos” e introduz uma linha poética considerando que as pessoas que têm outras pessoas são ricas, são únicas e estão somente aqui na terra. No espaço a realidade é bem diversa.
Para lá deste dilema, Roy é um profissional perfeito e competente em todas as tarefas a que se dedica, sejam elas previstas ou ocorram de surpresa, nos mais fantásticos cenários que o filme pode produzir sobre a galáxia e o cosmos. Esta é outra vertente importante deste filme e inclui a parte lúdica da demonstração da ciência e da tecnologia espacial muito próxima do que são já hoje ou serão num futuro muito próximo. As viagens particulares à lua são encenadas como a SpaceX, fundada em 2002 por Elon Musk, nos anda a vender á uns tempos, mas “Ad Astra” funciona, fundamentalmente porque é lindo de se olhar para a profundidade imensa do espaço fotografado por Hoyte Van Hoytema.
Foram usadas imagens reais das missões Apollo 11 a17 como inspiração, posteriormente recriadas e toda a aparência visual do filme cumpre o nosso imaginário da imensidão espacial e da majestade da coisa real que o cinema nos pode oferecer, especialmente se for vista na versão IMAX que nos absorve e convence em todos os momentos. Todos os pormenores técnicos são respeitados com rigor, conferindo ao filme consistência e realismo.
Sendo eu um adepto do cinema em casa em ecrã generoso, de definição 4K ou 8K, completado por um som multicanal digno, (7+1 ou 10+2 canais + Atmos) rendo-me em absoluto à magnificência do IMAX e recomendo o visionamento deste filme neste formato, como sendo a forma mais imersiva de desfrutar esta obra, em competição no Festival de Veneza 2019.

Classificação: 8 numa escala de 10

28 de junho de 2019

Opinião – “Homem-Aranha: Longe de Casa” de Jon Watts


Sinopse

Após os eventos de “Vingadores: Endgame”, o Homem-Aranha vê-se obrigado a dar um passo em frente e encarar novas ameaças num mundo que mudou para sempre.

Opinião por Artur Neves

Depois do cataclismo que se abateu sobre a terra em “Vingadores – Endgame”,em que os principais heróis foram mortos sem ressuscitação possível (palavra da Marvel) esta, só tem que recuperar a sua aura, reciclando um herói que “nasceu” na década de 60 e granjeou até hoje largos milhões de dólares nos vários suportes em que foi apresentada ao público, vista, revista, amada e desejada por uma camada jovem que se presta a sonhar com justiça igualitária e poderes absolutos sobre o mal, esquecendo-se que cada um encara o “mal” (ou o “bem”) á sua maneira e de acordo com as suas experiencias.
Desta vez e para dar a entender um recomeço em grande, a Marvel filmou nas principais capitais europeias sob uma pressuposta viagem de fim de ano escolar para Peter Parker (o nome público do anónimo Homem-Aranha interpretado por Tom Holland, que já tirou assinatura para os super-heróis) e seus colegas de turma, onde por “coincidência”, vão ocorrer os ataques destrutivos dos vilões que ele irá combater. Um dos problemas a resolver para já será manter o anonimato na escola e salvar o mundo da destruição que o ameaça.
Mas ele não está sozinho, além do seu chefe de missão Nick Fury (Samuel L. Jackson) aparece agora um tal Mysterio (Jake Gyllenhaal) a ocupar o lugar de mentor, deixado vago pelo Iron Man (Robert Downey Jr.) e o pelo resto dos vingadores que foi cada um à sua vida individualmente. No lado sentimental temos Michelle Jones (Zendaya) a apaixonada secreta para quem Peter Parker não encontra jeito de se revelar, apesar de pensar nisso e projetar encontros no cimo da torre Eiffel, mas os acontecimentos não o permitem. Ambos são jovens e românticos e exibem a tradicional falta de jeito na adolescência que potencia algumas cenas “gagas” muito comuns em filmes de amor tradicionais.
Para movimentar a história, vários twists surgem na aventura e Mysterio não é bem somente o herói com a cabeça metida num aquário e uma capa vermelha que salva as situações, mas antes um personagem multidimensional que não é bem o que parece. Peter Parker acha que seria a ele que lhe deveria caber a luta contra os quatro elementos que ensombram o mundo, mas a realidade não é essa e o aluno do ensino médio tem de dar o corpinho ao manifesto na pele do Homem-Aranha, muito embora ele queira somente gozar as férias no estrangeiro como os outros colegas.
A certa altura Mysterio diz que; “As pessoas precisam acreditar e cabe-nos a nós dizer-lhes em quê” que para mim resume o fundamento da revitalização dos heróis da Marvel neste filme. Com uma história mais composta que embora se sirva de homens voadores, raios de energia a sair pelos punhos, drones maliciosos e toda a panóplia da tecnologia moderna, não se esgota aqui e consegue com outros personagens herdados da história inicial, tal como; a tia May (Marisa Tomei) que personifica um objeto de desejo em várias cenas, ou Ned (Jacob Batalon) como o amigo do peito e confidente de Peter, com quem ele partilha os seus desejos mais secretos, conferir ao filme uma vertente mais humana e reconhecida que outros filmes do mesmo género perderam completamente.
Parece que o objetivo é continuar por este caminho, pois Peter é ainda um jovem com muito para dar ao personagem. No caso de o leitor optar por assistir a este filme, informo que a Marvel inseriu cenas depois dos créditos finais. Elas não são despicientes, pois indiciam algumas pistas para os próximos capítulos.

Classificação: 7 numa escala de 10

14 de junho de 2019

Opinião – “A Vigilante” de Sarah Daggar-nickson


Sinopse

A Vigilante – Sadie, (Olivia Wilde) uma mulher vítima de violência doméstica, dedica a sua vida ao auxílio de outras mulheres vítimas do mesmo tipo de abuso.
Enquanto procura localizar o seu marido para o matar e então ser verdadeiramente livre.
A Vigilante é um thriller inspirado pela força e bravura de vítimas reais de violência doméstica e pelos inacreditáveis obstáculos à segurança que as mesmas enfrentam.

Opinião por Artur Neves

Denunciar a violência doméstica e utilizar o cinema para divulgar o seu combate e reiterar o direito que ambos os cônjuges possuem em usufruir de uma vida em comum, harmoniosa e profícua. Incitar a mulher, como sendo a vítima mais frequente, a denunciar as sevícias de que é alvo no interior da sua casa é uma boa utilização do cinema em defesa de um problema social que se vem divulgando com uma frequência indesejável.
Considerar como exemplo de solução a existência de uma vingadora, “A Vigilante” na figura de uma mulher durona, combativa, embora também abusada, o que a transforma em juíza em causa própria, como a repositora dos direitos violados, através de justiça executada pelas próprias mãos, é outra coisa muito diferente e significa passar-se para o extremo oposto do problema. Constitui uma abordagem justicialista tão nefasta, equivalente a ação legal da justiça a que temos assistido diariamente no nosso país.
A figura do vigilante justiceiro (no cinema existem também “vigilantes” de outro cariz) tem origem no cinema americano na década de 40 e teve o seu ponto alto na década de 70 com o ator Charles Bronson (num personagem que se lhe colou à pele) no filme; “O Justiceiro da Noite” de 1974, que fez escola noutros filmes da mesma década.
Nesta história Sadie é uma feminista que se dedica à defesa de mulheres em risco de vida, destruindo os homens que as maltratam e de caminho também faz uma perninha como defensora de crianças e de todos os que justificadamente recorram aos seus serviços. Todavia ela só salva, não trata, os miúdos que ficam abandonados por ela castigar os pais que os maltratam têm de posteriormente dirigir-se aos serviços da segurança social porque a companhia dela é perigosa, considerando que ainda tem de matar o marido que a maltratou e que num acesso de fúria, para lhe causar mais sofrimento, ainda matou o filho de ambos.
O parágrafo anterior resume o argumento desta história e será o que vamos assistir durante os 90 minutos do filme até finalmente confrontar o ex-marido (Morgan Spector) um mercenário com aspeto genuinamente selvagem que a deixou quase morta, matou o filho e desapareceu, impedindo-a de acionar o seguro de vida. No primeiro encontro o ex-marido ainda consegue manietá-la, mas no segundo, com um braço partido, ela trata-lhe da saúde de vez.
Com menos conversa e de outro modo mais credível, já Jennifer Lopez tinha lá chegado primeiro, em 2002 no filme “Basta” de Michel Apted, prestando um melhor serviço à causa, representando de forma mais angustiante para a mãe e para o filho, o drama da violência doméstica e o terror da vítima face ao seu algoz.
“A Vigilante” vale assim pelo tema que aborda, mas apresenta inúmeras fragilidades de forma e contem diversos clichês inerentes ao género. Não é que isso seja um mal em si mesmo, mas amortece o impacto dos maus tratos domésticos numa altura em que o tema se reveste duma atualidade gritante. No seu género, Olivia Wilde ainda nos pode oferecer mais do que isto.

Classificação: 5 numa escala de 10