País Possível
País Possível é um livro de Ruy Belo de 1973 com uma indubitável unidade
temática: «a do mal-estar de um homem que, ao longo da vida, tem pagado
caro o preço por ter nascido em Portugal», tal como afirma o autor na sua
nota introdutória. Neste livro, que a Assírio & Alvim publica a 28 de janeiro
Com um prefácio de Nuno Júdice, Ruy Belo aborda Portugal como um país
real, não mítico ou mitificado, ou então como um país ainda irreal, mas que
depois de tornado real, tende a tornar-se impossível. Nas suas próprias
palavras: «Portugal, país que só existe em pensamento».
DAS COISAS QUE COMPETEM AOS POETAS
Nas terras onde os sinos andam pelas ruas
há horas surdas sós e sem cuidados
há mar condicionado ao possível verão
e vendem- se
manhãs e mães por três ideias
Nas terras onde a música é o fogo de artifício
a camioneta curva a carga sob os plátanos
e à sombra dos lacrimejantes carros
o gato dorme a trepadeira sobe
o soba grita nunca ninguém sabe
a erva cresce e as crianças morrem
O mar aceita chão a mão do sol
Que plural deplorável o da magna agência mogno
E nas tílias há riscos dos vestidos de retintas raparigas
e o dente resistente número quarenta cheira a pepsodent
O Outro Ulisses Regressa a Casa
«Viajar é tão-só aprender / a mais devagar saber morrer.» pode ler-se neste
novo livro de poesia de Luís Filipe Castro Mendes, que a Assírio & Alvim
publica a 4 de fevereiro. Muito mais do que uma evocação de sentimentos,
pessoas ou lugares, trata-se aqui da própria vida, daquilo que é viagem e
caminho, do que nos transforma e define, do ato criador, da escrita, da
poesia. Como nos diz o autor, ao longo deste livro o «leitor encontrará
muitas alusões, referências e citações encapotadas, às quais não deve ligar
demasiado.»
Outro Ulisses Regressa a Casa será apresentado na 17.a edição do
Correntes d’Escritas, na Póvoa de Varzim, e em Lisboa, na Casa Fernando
Pessoa, a 1 de março.
AO LUAR
(Manet, Luar no porto de Boulogne)
Movemo-nos entre as noites e as dunas que nos cercam,
espectros de outro tempo e de outra vida;
mas aquelas mulheres juntaram-se a um canto, silenciosas,
pois esperam de nós alguma coisa
que não sabemos o que é:
uma palavra, um grito, um deslizar manso
sobre as águas, ou o mero esplendor do nosso fim
iluminado pelo mais solene dos luares?
As nuvens, sim, as indiferentes nuvens
anunciam um cruel fulgor,
que nós a tempo não saberemos ver