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12 de setembro de 2011

MATO EM NOME DA LEI (LAWMAN) WESTERN COM BURT LANCASTER FAZENDO ‘JUSTIÇA’


Aos quase 60 anos, em 1971/1972, Burt Lancaster surpreendeu o mundo do cinema atuando em três westerns intitulados “Mato em Nome da Lei” (Lawman), “O Retorno de Valdez” (Valdez is Coming) e “A Vingança de Ulzana” (Ulzana’s Raid). Eram tempos em que a presença das forças norte-americanas no Vietnã era fortemente condenada mas encontrava também alguns poucos que tentavam justificá-la. “Mato em Nome da Lei” é uma alegoria àquela guerra ainda que o western de Michael Winner se abstenha de qualquer tipo de julgamento. Justamente por fazer referência indireta à presença de Tio Sam no Vietnã, esse western foi praticamente ignorado quando de seu lançamento, somado ainda à dose elevada de violência e ao uso de características técnicas próprias dos westerns-spaghetti. Hoje, visto à distância daquele momento político e após os tantos filmes em que justiceiros tentam sozinhos implantar a lei e a ordem, “Mato em Nome da Lei” deixa uma impressão bastante melhor que quando de seu lançamento, tempos que alguém já chamou de “os intoxicantes anos 70”.

Lee J. Cobb e Albert Salmi, vítimas de Jared Maddox
UM HOMEM CONTRA UMA CIDADE - O filme conta a história do Marshall Jared Maddox (Burt Lancaster), inflexível homem da lei que sai de Bannock, cidade onde é a autoridade, em direção Sabbath, cidade dominada pelo fazendeiro Vincent Bronson (Lee J. Cobb). Maddox não tem nenhuma jurisdição em Sabbath, o que não o impede de tentar prender sete homens responsáveis por um assassinato ocorrido lá em Bannock. Bronson e seus homens foram os responsáveis por essa morte quando passaram por Bannock e inconsequentemente dispararam tiros a esmo. O Marshall Maddox quer prender os responsáveis pacificamente contando para isso com a ajuda da autoridade local, o Marshall Cotton Ryan (Robert Ryan). No entanto Cotton é também subordinado a Bronson, assim como praticamente todos na cidade, desde o prefeito, passando pelos comerciantes até chegar aos modestos rancheiros. Sabendo-se ameaçados os homens de Bronson tentam enfrentar Maddox e vão sendo mortos à medida que os enfrentamentos ocorrem, entre eles o filho de Bronson o que o leva cometer suicídio. Apenas um jovem chamado Crowe Wheelright (Richard Jordan) sobrevive, aparentemente porque aceita a intransigente maneira de ser de Maddox.

Sheree North entre
R. Ryan e R. Duvall
WESTERN SEM HOMENS MAUS - Jared Maddox é um homem solitário, triste e taciturno que não admite que um crime fique impune e se necessário executa ele próprio a justiça, sua forma de impor a lei e a ordem. Maddox não é propriamente um justiceiro ou um regulador pois está investido da autoridade nos limites de sua cidade. Fora de sua jurisdição usa o distintivo e a fama de homem frio e sem escrúpulos para se impor. Maddox tem seu próprio código de ética e age movido pela filosofia própria em que uma morte sempre se justifica quando ela ocorre no cumprimento da lei. Diferentemente dos fazendeiros poderosos de outros westerns, Bronson é dotado de equilíbrio e senso de responsabilidade. É um barão de gado que dá liberdade a cada um de seus homens para que decidam quanto ao enfrentamento com Maddox. O mesmo Bronson tem uma ambígua relação com Harvey Stenbaugh, seu braço direito e tenta uma saída menos drástica para o impasse da rendição de seus homens mesmo sabendo que Maddox é impiedoso e inflexível. A chegada de Maddox a Sabbath levou pânico não só aos homens que procurava mas a todos que lá viviam. Ocorre um movimento dos cidadãos que tenciona enfrentar Maddox fazendo uso da desigualdade numérica, mas o Marshall de Bannock os desarma com poucas palavras, com seu olhar e os convence com seu ideal de justiça. A rigor não há homens maus em Sabbath.

ANTECIPANDO OS HERÓIS MODERNOS - Maddox é um personagem incomum nos westerns, mais próximo dos tipos que o cinema criou nos anos 70 como ‘Dirty’ Harry Callahan (Clint Eastwood) e Paul Kersey, o justiceiro interpretado por Charles Bronson em filmes dirigidos pelo mesmo Michael Winner. As mulheres são acidentes na vida desses personagens, assim como para Jared Maddox, representadas em “Mato em Nome da Lei” por Laura Shelby (Sheree North), companheira de uma noite de amor. Laura alimenta a ilusão de acompanhar Maddox mas termina vendo-o assassinar seu marido em fuga no meio da rua principal de Sabbath, com um tiro pelas costas. Essa morte, mais que qualquer outra define Jared Maddox, aquele que não possui nenhum sentimento de piedade e confirma o que lhe disse a própria Laura que ele, Maddox, era um ‘widowmaker’ (fazedor de viúvas). A próxima seria exatamente ela.


Cena violenta do suicídio de Bronson (Lee J. Cobb)
REUNIÃO DE TALENTOS MADUROS - “Mato em Nome da Lei” tem um elenco excepcional pois somente atores do porte de Lee J. Cobb e Robert Ryan seriam capazes de transformar protótipos como os personagens do barão de gado (Cobb) ou do xerife submisso (Ryan) em seres complexos. O mesmo pode ser dito das ótimas interpretações de Robert Duvall e Albert Salmi. O filme tem a presença da bonita Sheree North que tão poucas oportunidade teve no cinema, uma delas em “O Último Pistoleiro” (The Shootist), de Don Siegel, além de um magnífico elenco de apoio. A lamentar o desperdício de Joseph Wiseman num papel de menor importância e que não foi melhor desenvolvido. Burt Lancaster domina o filme todo criando mais um personagem brutal na sua incontável galeria de tipos fortes vividos no cinema. Lancaster dá a Jared Maddox o olhar triste de um homem sem emoção e sem alegria. Homem que vive para matar. Fortemente influenciado pela estética dos westerns Made-in-Italy, especialmente com o uso por vezes desnecessário de zooms, “Mato em Nome da Lei” tem direção de fotografia de Robert Paynter. Esse cinegrafista se imortalizou por ter sido o responsável pela direção de fotografia no mais famoso clip da história da música que foi “Thriller”, com Michael Jackson. A música é do sempre competente Jerry Fielding, parceiro de Sam Peckinpah em inúmeros filmes, entre eles “Meu Ódio Será Sua Herança”. A magnífica trilogia de faroestes estrelados por Burt Lancaster é completada por “Mato em Nome da Lei”, talvez o menor dos três westerns, mas nunca um western menor.
Burt Lancaster como o pragmático Homem da Lei

9 de setembro de 2011

BURT LANCASTER E SEU DESEJO DE MATAR MICHAEL WINNER


Burt Lancaster era um dos atores que mais apavoravam os diretores. Era necessário ter muita personalidade para dirigir atores como Burt Lancaster, John Wayne, Kirk Douglas e Marlon Brando, entre outros que levavam os diretores ao desespero com suas interferências no trabalho do diretor. Os mais experientes como Ford, Hanks, Hathaway e Huston, ou os mais jovens porém com personalidade forte como Richard Brooks, John Frankenheimer e Sam Peckinpah conseguiam dormir mais tranquilos depois de um dia de trabalho com os astros de Hollywood (ou com algumas estrelas também). Para alguns diretores só faltava chorar no próprio set de filmagem enquanto outros chegavam a ver a morte passar por perto, como aconteceu com Michael Winner em “Mato em Nome da Lei” (Lawman).

O então jovem diretor inglês Michael Winner (estava com 35 anos em 1971), havia ganhado notoriedade com “O Golpe do Século” (The Jokers), estrelado por Oliver Reed. Com o sucesso desse filme Winner conseguiu dinheiro para produzir “Mato em Nome da Lei” e queria Burt Lancaster no papel principal interpretando Jared Maddox. Winner procurou Lancaster que acedeu em ler o roteiro junto com o diretor. Burt Lancaster fez diversas anotações no roteiro original e ao final da leitura disse a Michael Winner que todas as anotações eram para que Jared Maddox ficasse apropriado para... Gregory Peck. Lancaster disse que Jared Maddox deveria ser interpretado por Gregory Peck, talvez lembrando-se de “Estigma da Crueldade” (The Bravados). Porém Winner insistiu e disse que só faria o filme com Lancaster. Vale lembrar que o filme anterior de Burt Lancaster havia sido “O Retorno de Valdez” (Valdez is Coming) e ele já havia assinado contrato para atuar em “A Vingança de Ulzana” (Ulzana’s Raid), sob a direção de seu amigo Robert Aldrich. Seriam três westerns em sequência, o que talvez não fosse muito bom para a carreira de Lancaster, que vinha declinando acentuadamente. Burt Lancaster acabou aceitando a proposta de trabalho e foram todos para Sonora, no México, pois Winner avisara que não filmava em estúdios.

Numa das primeiras cenas a serem filmadas, Jared Maddox (Burt Lancaster) tem que atirar com o revólver no cavalo de Vernon Adams (Robert Duvall), conforme indicava o roteiro. Fizeram duas tomadas e na terceira Lancaster empunhou uma Winchester .73 e se preparava para disparar quando Michael Winner gritou que estava errado pois o roteiro dizia que ele deveria disparar com o revólver, como fizera nos takes anteriores. Para surpresa de todos presentes à filmagem, Burt Lancaster largou o rifle e foi em direção a Winner dizendo a ele: “O que você entende de westerns? Você não entende nada de westerns!” Nervoso e descontrolado Lancaster segurou Michael Winner pelas duas lapelas e gritou: “Eu vou matar você! Eu vou matar você!” Winner empalideceu e houve uma necessária pausa para que a calma voltasse. Dali a meia hora a cena ia ser refeita e Burt Lancaster perguntou a Winner com qual arma ele deveria atirar no cavalo de Robert Duvall. Ainda lívido, Winner respondeu que era com a Winchester pois não queria morrer pois tinha que terminar aquele filme...


Burt Lancaster era um ídolo para Michael Winner e continuou sendo ainda mais depois de terminadas as filmagens de “Mato em Nome da Lei”. Fizeram outro filme juntos, o suspense “Scorpio”, com Alain Delon também no elenco. Burt Lancaster sempre falou bem de Michael Winner dizendo que ele filmava rapidamente, de modo econômico e conseguia dominar todo o set de filmagem. (???) Winner também sempre se referiu a Lancaster dizendo que ele era um extraordinário ator e exigente profissional. Michael Winner se encontrou com Charles Bronson em “Renegado Impiedoso” (Chato’s Land) e depois fizeram “Desejo de Matar” (Death Wish), que teve várias continuações que deixaram ricos tanto Winner quanto Charles Bronson. Será que para fazer “Desejo de Matar” Winner não se inspirou um pouco em Burt Lancaster?

Acima Michael Winner e Charles Bronson num intervalo de filmagens de
"Renegado Impiedoso"; abaixo Lancaster e Alain Delon numa cena
de "Scorpio", thriller dirigido por Michael Winner.

Nota do CINEWESTERNMANIA: O livro “Burt Lancaster – The Man and His Movies”, de Allan Hunter, afirma que “Mato em Nome da Lei” (1971) foi o primeiro western a ser dirigido por um diretor inglês. Talvez o autor desconheça que em 1961 o diretor inglês Roy Ward Baker dirigiu o faroeste “A História de um Homem Mau” (The Singer not the Song), com John Mills, Dirk Bogarde e Mylène Demongeot.