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sábado, 20 de setembro de 2014

SEGREDOS DO ALGARVE - Texto de Lina Vedes


SEGREDOS DO ALGARVE - Texto de Lina Vedes


A partir de 1947 comecei a frequentar a escola primária da Sé de Faro, situada na parte velha da cidade, na Rua Rasquinho.

 Todas as tardes, de bata branca, obrigatoriedade escolar, saía de casa perto do Largo da Palmeira carregando a pasta com o lanche, sebenta, o livro único de leitura, uma caixa de madeira com tampa deslizante onde guardava o lápis de escrever, borracha e caneta de aparo.

 Num desses anos de escola primária, a professora D. Maria Pires e suas estagiárias, lançaram a turma na descoberta do Algarve.Cada uma de nós, individualmente ou em grupo, teria de encontrar motivos para amar não só a nossa cidade, como todo o Algarve.

 A proposta de trabalho, inovadora para a época, foi tão bem lançada que de imediato toda a turma vestiu a capa de detective/investigador e partiu à descoberta dos encantos secretos da província algarvia.Com alguma orientação fomos colocando, aos poucos no devido lugar, as peças do puzzle Algarve. Todos os trabalhos seriam «passados a limpo» para folhas de cartolina, com letra bem legível e desenhos bem executados e bem pintados
 .
 Fariam parte do nosso «jornal de parede».
Nessa tarefa nada foi esquecido.
 Descobrimos que desde Sagres a Vila Real de Santo António, desde a serra ao mar, o torrão algarvio era pitoresco e encantador, com os costumes puros da sua gente comunicativa, que fala cantando desconhecendo as asperezas da vida, abençoados pelas dádivas da Natureza.

 Como pertença deste paraíso, chamado Algarve, constatámos possuir um clima ameno, um céu azul intenso rutilante de estrelas, um sol fonte de luz e calor, um solo matizado inebriante de aromas, um mar cálido azul a espreguiçar-se pelas finas areias douradas ou moldando, com os seus embates, os rochedos da costa.


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terça-feira, 2 de setembro de 2014

JARDIM MANUEL BIVAR - Faro - Texto de Lina Vedes


JARDIM MANUEL BIVAR - Faro - Texto de Lina Vedes


 Conhecido, vulgarmente, pelo Jardim da Doca, era vivo e barulhento com imensa gente, crianças, jovens e adultos a procurá-lo para agradáveis convívios.

Os farenses, nas horas de lazer, enchiam o Jardim andando nele às cotoveladas, aos encontrões, conversando e rindo uns com os outros, indo e vindo desde o monumento a João de Deus até ao coreto.

Mantenho ainda o gosto de meditar, discorrendo placidamente, sentada num banco do Jardim da doca, olhando, ou antes, saboreando os fins de tarde, com os lindos «pores de sol» sempre diferentes e belos.
 O Jardim da cidade era também procurado para encontros profissionais (trabalhadores e empregadores), marcando-o como um verdadeiro «centro de emprego».

Nele, junto do coreto, do Aliança ou do Largo das camionetas, homens honestos de fracos recursos, peças fundamentais no xadrez social da vida (na época) procuravam contratos de trabalho ocasional. Eram trabalhadores independentes, solicitados para pequenos arranjos domésticos ou outros serviços.

Normalmente eram educados, de falas mansas, respeitosos, dispostos ao trabalho fora de horas, incluindo domingos, e mal recompensados do esforço. Creio firmemente, que história não é só o desfiar árido de acontecimentos relatados pelos compêndios, de forma cronológica. Os compêndios realçam o papel desempenhado pelos grandes senhores, esquecendo às vezes os operários que são a base da sociedade.
 História é mais do que isso!

Impõe-se o dever de realçar o factor humano e todo o legado deixado por homens iguais a nós, que doutros homens o receberam. A evolução das coisas e dos tempos não contém mistérios, somos nós os condutores dos factos, seremos nós a trabalhar para as gerações vindouras.


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sexta-feira, 15 de agosto de 2014

A BRASILEIRA - Texto de Lina Vedes



A BRASILEIRA - Texto de Lina Vedes 

  A Brasileira, café, pastelaria e geladaria, ficava onde hoje se encontra a sapataria Bruna, no cruzamento da R. de Santo António com a R. Dr. João Lúcio.

 As casas do quarteirão onde se integrava a Brasileira, umas eram térreas e outras de 1º andar. Pegando com ela tínhamos a casa da família Pêra, o edifício onde funcionava a P.I.D.E. e por fim a casa do Libório, mercearia e charcutaria.

 No outro lado da rua, na frente, a «malta masculina» do liceu e escola comercial juntava-se à saída das aulas, junto à papelaria Artys, para ver passar as «moças». Para o lado da avenida existiam umas pequenas casas e para o lado da Pontinha, pegando com a Artys, o electricista Ferreira, a retrosaria da D. Adosinda, uma casa de habitação e o relojoeiro Oliveira. Todo o quarteirão foi demolido e, no momento actual, faz parte da Praça da Liberdade.

 Inicialmente a Brasileira pertencia a uma sociedade formada entre o senhor Inácio, o   «Rola»para os amigos, e o senhor Baleizão, tendo este último o segredo da confecção de gelados, mantendo-o bem seguro.

 Esses gelados eram vendidos não só na Brasileira como pela cidade. Eram transportados num triciclo a pedal que, no conjunto, formava uma espécie de proa de barco, que continha vasilhas metidas no meio do gelo, nas quais iam os gelados de baunilha e chocolate.

 Eram vendidos em forma de corte (sandes), custavam 5 ou 10 tostões e era interessantíssimo ver como o vendedor procedia para fazer a sandes gelada: a bolacha era colocada na maquineta, por cima o gelado que era alisado com a espátula, outra bolacha, carregar na mola e deliciar o cliente…Nada mais agradável do que os gelados do Baleizão que faziam crescer água na boca, só de olhar.

 Mais tarde surgiu a novidade do «kibom», que custava 15 tostões e era gelado envolvido em chocolate e enrolado em prata… Na vida comi dois ou três e dos mais baratos; um por semana, precisando estar com sorte!




domingo, 29 de junho de 2014

COSTUREIRAS E MODISTAS - Texto de Lina Vedes


COSTUREIRAS E MODISTAS - Texto de Lina Vedes 

 Nos anos 40 e até 50, era hábito em minha casa e em muitas da cidade contratarem costureiras duas ou três vezes no ano. Geralmente iam no início do Outono e da Primavera, recebiam pagamento diário, com direito a almoço e lanche. O pronto-a-vestir era nulo ou desconhecido para a maioria dos farenses.

Essas costureiras executavam peças de vestuário íntimo e remendavam o necessário, porque na altura, o principal lema de vida consistia no «aproveitar». O saber remendar era uma arte e lembro-me, da trabalheira que dava, pôr fundilhos em cuecas de homem, ou «seresir» calças de tecido, que se haviam rompido ou gasto com o uso. Hoje, já não se encontra quem faça tais trabalhos.

A mãe tinha uma costureira contratada, que permanecia em nossa casa duas semanas, duas vezes no ano, e contava com a ajuda da avó, da tia e minha, embora as constantes asneiras levassem ao meu afastamento. Já não lembro, se o fazia para me libertar, pois fui sempre adversa a trabalhos de paciência!...

A mãe alertava-me:
 - Como queres casar, se não aprendes a pôr uns fundilhos em cuecas de homem, ou a pregar botões e fazer as casas?
 A nossa costureira Isabel estava separada do marido, por ser maltratada por ele e pela sogra. Chegou ao limite do sofrimento, o que era raro na época, e abandonou a casa e os filhos. Só contactava com eles quando trabalhavam em lugares conhecidos da sogra e com a aceitação dos empregadores. Vivia num quartinho e o que ganhava na costura mal dava para sobreviver. A vida era amarga por não ter os filhos junto dela e porque mulher separada de marido, socialmente, não era bem aceite.

Havia lemas incríveis, considerados exemplares para o bom funcionamento do lar, que sujeitavam as mulheres aos homens.
 As esposas, por norma, eram obrigadas a:
 - Ter a casa sempre arrumada e limpa, fazer ao marido os petiscos de sua predilecção, pondo-lhe tudo na mesa e servindo-o;
 - Nunca saturar o esposo com problemas da vida doméstica e contentar-se com o dinheiro cedido para o sustento familiar;
 - Não irritar nem saturar o homem e se desconfiasse de infidelidade (eram todos), amá-lo ainda mais;
 - Estar sempre disposta às suas exigências matrimoniais;
 - Afastar-se de todas as tentações extra conjugais..



 

quinta-feira, 29 de maio de 2014

BARCAS E BARCOS NA DOCA - Texto de Lina Vedes


BARCAS E BARCOS NA DOCA - Texto de Lina Vedes 

 Na década de 40 e princípios da de 50, as vias de comunicação terrestre eram insuficientes havendo ainda o inconveniente da Serra do Caldeirão ser uma verdadeira barreira quase intransponível. Para reforçar esse défice recorria-se ao transporte marítimo de pessoas e cargas.

 Na Rua Conselheiro Bívar, conhecida por Rua do Chiado, existiam escritórios de intermediários, que negociavam a utilização de barcos de carga que transportavam cortiça, toros de madeira, sal, seiras de figos secos, alfarroba triturada e o seu caroço…
E é fácil imaginar o decorrer dessa situação, banindo a realidade actual, retirando os edifícios do Hotel Eva, Capitania e a Rodoviária.

 Teríamos um descampado de terra batida com imensos carros de besta, aguardando o frete, com o cheiro característico dos excrementos dos animais e o burburinho de homens, cuidando deles, excitados e com a esperança de ganhar o dia.
 Ao longo da manhã o barulho adensa com a chegada de carroceiros trazendo mercadorias, que são despejadas ali, perto das barcas, em frente da Alfandega e transferidas para elas pelos estivadores.

 O vaivém é permanente com a intervenção reguladora dos intermediários e do guarda-fiscal que tudo examina. Há uma guarita situada no local de transbordo e uma outra perto dos bombeiros.
 Na doca, acostados, encontram-se barcos e barcas.
 As barcas, sem motor, só transportam as mercadorias para além da barra, local onde são esperadas por navios fundeados.

 Os barcos, motorizados e com velas, deslocam-se para Lisboa, Porto, Viana do Castelo, para Espanha e Huelva, Algeciras, Chiclana e para Marrocos a Casablanca, Tanger, Safi…



domingo, 11 de maio de 2014

O Dr. Silva Nobre e o meu braço partido - Texto de Lina Vedes


O Dr. Silva Nobre e o meu braço partido - Texto de Lina Vedes

Data – Maio de 1948
 LOCAL – CASA DO ALENTEJO, situada, na altura, na Rua Baleizão, num 1º andar, por cima da SALCO – Sociedade Algarvia de Combustíveis.

 Aconteciam, nesse local, encontros semanais de alentejanos, residentes em Faro. Como «penetra»e vizinha, partilhava, por hábito, dos convívios dos nascidos no Alentejo.

 Com gente da minha idade, a brincadeira consistia em escorregar no soalho encerado. Dava balanço com uma corrida e tentava equilibrar-me, deslizando pelo chão. Já tinha determinada técnica e considerava-me campeã, pois aguentava-me mais tempo que os outros.

 Sucedeu, talvez por excesso de confiança, correr, lançar-me como se os sapatos fossem patins, mas por motivo imprevisto, estes travaram repentinamente, obrigando-me a saltar e cair desamparada. Por instinto, devo ter esticado o braço esquerdo. Oiço um estalo, levanto-me de imediato, e vejo o braço com algo, a sobressair sob a pele. Com a mão direita componho o «defeito» e fico pressionando o pulso, parando com a brincadeira.

 Alguém reparou na minha atitude, encolhida a um canto, assustada, com receio da reprimenda. Chamam a mãe, que me leva de imediato ao hospital, que ficava junto da Igreja da Misericórdia, em frente ao Jardim.

As portas estavam fechadas, tanto a principal como as laterais. A todas, minha mãe bateu, mas não se abriram.Chega outro doente com urgência e os batuques nas portas duplicaram. Junta-se gente a refilar, pelo procedimento habitual das freiras.



 

segunda-feira, 28 de abril de 2014

O CULTO DA MESA - Texto de Lina Vedes


O CULTO DA MESA - Texto de Lina Vedes

 Em tempos idos, não podem ser muitos, porque não me considero velha (nasci em 1940)… cada acontecimento era festejado com um envolvimento característico. Explico melhor acrescentando que, só na altura da Páscoa, apareciam as amêndoas doces, os folares e outros. Pelo Natal, era a vez do bolo-rei, filhós, empanadilhas, peru, não permitindo o enjoo dessas novidades, tornando-as bastante desejáveis.

A situação financeira da minha família não era pródiga, seríamos remediados para menos. Não havia fome, mas contenção na quantidade considerada de luxo. Um bolo, era tão raro, que bastava a palavra para encher a boca de água e qualquer um era apreciado até à última migalha.

O pão era a base de tudo. Aos lanches ou ao pequeno-almoço, poderia ser comido com azeite e açúcar, com banha corada (levando alho, pimentão, louro, salsa, tudo frito), com toucinho cru ou cozido, frito em azeite, envolvido com leite e ovos (fatias douradas)… Fiambre, queijo, paio, mortadela ou manteiga eram produtos raros.

As frutas, só se comia, as da época. Desconheciam-se muitas qualidades hoje consideradas vulgares, como as anonas, kiwis, mangas, papaias e outras. Também existiam as frutas inacessíveis ao orçamento familiar – ananás, morangos, cerejas…

O leite, era recebido, diariamente, pela manhã e fervido. Criava uma «nata» que era retirada e colocada num recipiente com uma pedrinha de sal. Ao fim de dias era batida, energicamente, e servia de manteiga.

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quinta-feira, 17 de abril de 2014

Procissões da Quaresma - Texto de Lina Vedes


Procissões da Quaresma - Texto de Lina Vedes 

 Tive o privilégio de viver, em jovem, na actual Rua 1º de Maio, local por onde passavam quase todas as procissões de Faro.

 Ao recordá-las, principalmente as realizadas durante a Quaresma, não posso deixar de focar, o padre José Gomes da paróquia de S.Pedro, homem ímpar na organização e incrementação de procissões.

 Este padre morador no edifício, hoje intitulado Via Valadim, na Rua Tenente Valadim, ao tempo conhecida por rua dos Cavalos, durante o dia fazia vários percursos de sua casa à igreja, passando pela Rua Filipe Alistão, sempre apressado, cumprimentando à esquerda e direita.

 Cativava com a sua simpatia, os sermões eram agradáveis, versando simplicidade, conseguindo descer ao nível dos seus paroquianos.
 Não necessitava, como acontece na actualidade, de cábulas para avivar a memória, nada esquecia, porque tudo era dito com sentimento, e todos bebiam dessa honestidade, franqueza, alegria e sinceridade.

 Subia ao púlpito situado na nave central da igreja e pregava, colocando a voz com saber de mestre, criando momentos emocionantes, grandiosos e apoteóticos.
 A sua morte prematura, num acidente de viação, na estrada de S.Brás perto de Faro, foi chorada e sentida profundamente e a sua falta, deixou uma lacuna, nunca substituída.

 Dia de procissão era dia de festa e em muitas casas celebrava-se a ocasião, estreando roupa nova e engalanando as janelas com as melhores e mais ricas colchas, guardadas nas arcas.
 Muita gente vinha para a cidade, principalmente das hortas circundantes, porque era dia de desobriga de promessas, e poderemos acrescentar, que nada havia de mais útil, do que uma boa procissão, para fazer sair da monotonia habitual.

 Todas elas obedeciam e obedecem a uma ordem, um cerimonial, fácil de resumir. Abriam com o transporte de um guião enorme, levado por homens possantes, porque é difícil de equilibrar, e que consoante o objectivo da procissão, variava na cor, no tecido, no bordado.



quinta-feira, 3 de abril de 2014

Visita às Igrejas - Texto / Crónica de Lina Vedes


Visita às Igrejas - Texto / Crónica de Lina Vedes 

 Pela Páscoa, na altura da Semana Santa, era tradição, e toda a cidade se envolvia nela, visitar as igrejas de Faro, na quinta-feira à noite.

 O circuito percorrido era quase imposto, com naturalidade, devido à localização das igrejas a visitar – S.Pedro, Misericórdia, Sé, S.Francisco, Pé da Cruz, Carmo.

 Poder-se-ia iniciar por qualquer delas, indo para a esquerda ou direita, caminhando em carreirinha, uns atrás dos outros, encontrando outros, no mesmo percurso, em sentido contrário.

 Partindo da Misericórdia, passávamos o Arco da Vila, subíamos a R. do Município, atingindo a Igreja da Sé, com o largo iluminado a receber os farenses. Saindo da Sé íamos junto à Escola do Magistério Primário, actualmente desactivada, para o Largo das Freiras, hoje Praça Afonso III, sendo à data, o Convento de Nossa Senhora da Assumpção, um edifício fechado, descaracterizado, um armazém de cortiça. Passávamos debaixo do Arco do Repouso, que tinha 2 ou 3 habitações no seu interior, atravessávamos o Largo de S.Francisco em direcção à Igreja do mesmo nome.

 Após a visita, continuávamos pela R. dos Caçadores 4, cortávamos na R. Bocage até à Igreja do Pé da Cruz. Saídos do local, percorríamos a R. Pé da Cruz para alcançar a Pontinha e, onde actualmente existe o edifício da Comissão de Coordenação da Região do Algarve (CDR), era um descampado escuro. Algumas vezes, esse espaço serviu para a montagem de um barracão o «Teatro Desmontável»que muito animou os amantes de espectáculos.

E à Pontinha, virávamos para o R. Vasco da Gama, cortávamos para a Batista Lopes, derivávamos para a R. do Alportel junto do edifício dos Correios antigos, até ao Largo de S.Pedro. Atravessávamos o jardim e o Largo do Carmo, para a Igreja do mesmo nome. Descíamos, de novo, e encaminhávamo-nos para a R.Filipe Alistão, depois da visita a S.Pedro.


sábado, 8 de março de 2014

Doutor Joaquim Magalhães – récitas do 6ºano - Texto de Lina Vedes

 
 
Doutor Joaquim Magalhães – récitas do 6ºano - Texto de Lina Vedes 
 
Na década 50, vivíamos um regime sisudo e intolerante que pretendia encaminhar-nos para a OBEDIENCIA absoluta e nos obrigava a travar todos os sentimentos de AMOR e atracção sexual.
 
 Para os nossos superiores, professores, pais e até padres, a FELICIDADE não existia, exerciam a autoridade como segredo do poder, numa verdadeira atitude repressiva.
 Todos eles eram «donos» do saber e da razão, em todas as circunstâncias, exigindo de nós, submissão. Se não se aceitasse o caminho indicado por eles, seríamos excluídos da sociedade.
 
 Na escola apontavam-nos, como exemplo a seguir, as façanhas de heróis que morreram na defesa da Pátria. As aulas de História ou de Organização Política não focavam o essencial, não eram esclarecedoras e muitos de nós vivíamos no analfabetismo político, julgando-nos os «melhores do mundo» (ensinavam-nos isso) …
 
O Dr. Joaquim da Rocha Peixoto Magalhães, um algarvio de adopção, professor de Português e Francês, era totalmente compreensivo, sabedor e respeitador da dignidade dos alunos. Não usava violência física nem moral para manter a ordem.
 
Como pessoa, todo ele era coração, nunca deixando escapar durante as aulas, uma boa poesia, ensaiando-a, permitindo que alunos mais vocacionados a representassem para deleite de todos.
 Procurava todas as oportunidades para ler poesia francesa, iluminando o nosso espírito apático, inculto, pouco esclarecido nesse âmbito.
 

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

O MENINO XICO - Texto de Lina Vedes

 
 
O MENINO XICO - Texto de Lina Vedes
 

Nasceu puro e continuou pela vida fora, mantendo a ingenuidade de menino com um sorriso amplo, olhos brilhantes de alegria, a transmitirem aos outros que a vida deve ser encarada de maneira singela e descontraída.
 
 Nunca perdeu essa vontade de rir, pondo a alma a descoberto com humildade sem ser submisso, com despreocupação mas sem descuidos.
 
Vivia o presente como uma dádiva diária, esquecido do passado e sem se preocupar com o futuro, acreditando plenamente no poder dos sorrisos, da dança, da música. Era aí que ele encontrava a sua verdade, o seu sentido de justiça, de paz, de sonhos, de imaginação…e construía os seus castelos.
 
Não era ambicioso, a sua vida era simples, sem complicações, ganhava o dia-a-dia como moço de fretes, vivendo na bendita ignorância da competição, afastado das preocupações e dos aborrecimentos causados pelo desejo de subir na vida, atributo abraçado por todos os homens.
 
Quando jovem, vivia na rua da Madalena e procurava trabalho na Estação dos caminhos de ferro, no Largo das camionetas, nas tascas, nas pensões, em casa comerciais, nos barcos da doca, no largo onde hoje está o Hotel Eva, local dos carroceiros de mudanças.
 
Carregava nas costas ou à cabeça tudo o que lhe encomendavam, mantendo o seu passo gingão e o infindável sorriso que lhe escancarava a boca.

Leia este tema completo a partir de 19 de Fevereiro carregando aqui.

 



domingo, 2 de fevereiro de 2014

Chamava-se Maria João - Texto / Crónica de Lina Vedes

    
 
Chamava-se Maria João

Texto / Crónica de Lina Vedes

 

Era linda, uma autêntica boneca, ataviada com harmoniosos vestidos elaborados pela mãe. Grandes saiotes engomados salientavam a roda das saias, laçarotes, rendas e fitas completavam o conjunto que nem a bata liceal, obrigatória, conseguia encobrir.

Era simpática, com um sorriso permanente a abrir-lhe os lábios e um brilho no olhar revelando um interior bondoso, pacífico e compreensivo.

Nos intervalos das aulas isolava-se sem o à-vontade necessário para se aproximar das colegas que, em grupo, riam falando sobre sexo ou contando anedotas.

Era bem comportada cumprindo, na íntegra, todas as regras de convivência, decoro e boas maneiras, estabelecidas pela sociedade, sabendo dosear a sua aplicação.

Era aluna exemplar que durante as aulas sabia ouvir as matérias explicadas pelos professores, que a estimavam e elogiavam. As notas finais fazendo jus ao seu empenho não a levavam a distanciar-se como ser superior aos outros.

Era filha única e prendada, de pais zelosos e preocupadíssimos com a sua «menina».

Rodeada de múltiplos cuidados tinha explicador particular que ia a casa, ajudá-la na aquisição das matérias. Recebia, igualmente, aulas de piano e a mãe conduzia-a nos segredos culinários e na arte dos bordados.

Era católica, ia à missa da Sé todos os Domingos e comungava. Saía de casa ladeada pelo pai e pela mãe, vestidos a rigor, com comportamento exemplar a ser seguido por todos.
 

domingo, 8 de setembro de 2013

Passeio a Lisboa - Texto de Lina Vedes

 
Passeio a Lisboa - Texto de Lina Vedes 
 
O dono dos grandes armazéns Dinfer, em Lisboa, era tio do meu pai. Todos da família eram do Coelhal, Figueiró dos Vinhos, e tinham abandonado o local de nascença por falta de mercado de trabalho. Era um meio rural de fracos recursos. Esse tio, Manuel José, fixou-se em Lisboa estabelecendo-se com sucesso, criando esses armazéns onde trabalhava com os cinco filhos.
 
O Alberto vinha muito a Faro como viajante representando a casa, vendendo às lojas os seus múltiplos artigos.

 Muitas vezes prometeu levar-me a conhecer Lisboa. Ir a Lisboa era uma ambição minha… desmedida. Lá, até se falava dizendo correctamente «ei»…leite, dei-te, manteiga…
Num dia de férias de verão surgiu a oportunidade e abalei de carro, com o primo Alberto, até à capital; tinha 12 anos.
 
 A viagem foi longa porque a Serra do Caldeirão, com as suas curvas, era uma barreira que separava o Algarve do Alentejo e o primo ia parando, a fazer venda e promoção dos seus artigos. Os armazéns Dinfer, além de retrosaria, vendiam tecidos, calçado, chapelaria, roupa interior e tinham-se lançado, na altura, na confecção. Como pioneiros do «pronto-a-vestir», a tarefa era árdua pois obrigava a convencer os consumidores, à mudança de hábitos.

Saímos de Faro pela manhã e iniciámos a travessia do Tejo ao anoitecer.
 Lembro-me de ter frio, de procurar um casaco para me agasalhar e ficar extasiada com as luzes que via brilhando ao longe, intensamente, e em grande quantidade.

 
- Ali é Lisboa – disse meu primo Alberto.
 Compreendi, nesse momento, porque me disseram várias pessoas ao saberem que ia de visita à capital:
- Vais a Lisboa, leva um calhau para meteres na boca.
 
 
 
 
 

 

sábado, 24 de agosto de 2013

MULHER ESCRAVA - Texto de Lina Vedes

 
MULHER ESCRAVA - Texto de Lina Vedes
 

Madalena nasceu em 1920, na cidade de Faro, numa casita situada num largo de terra batida conhecido pelo «alto da caganita». Os pastores de cabras passavam por lá com os seus rebanhos e estas inundavam o recinto com as suas «caganitas» – daí o nome.
 
O pai de Madalena era pescador e, nas horas vagas, entretinha-se pelas tabernas da vizinhança. A casa era para dormir, o mar para trabalhar, a tasca para o divertimento afogando no vinho a dureza da vida. Nada mais lhe despertava interesse. A mulher servia, exclusivamente, para o servir e cuidar da casa e dos filhos.
 
Por descuido e ignorância, a parteira/curiosa chamada para o parto, não se apercebeu de uma infecção que generalizou e levou, em pouco tempo, a mãe de Madalena à morte.
 
Uns tios maternos, já idosos e sem filhos, que viviam na Rua Nova perto da igreja do Pé da Cruz, numa fileira de casas desniveladas das do outro lado da rua, levaram a menina, com eles, para a criarem. O pai ficaria com o outro filho de 3 anos na casa dos avós paternos residentes, como ele, no Largo Silva Porto…o das «caganitas»…
 
Num dia de grande animação alcoólica, o marítimo, cheio de coragem, resolve bater à porta da rua Nova e exigir a devolução da filha. Gera-se confusão com gritaria, ameaças, pragas, acabando com murros e pontapés. Estatelado no meio do chão, rodeado de pessoas adversárias ao seu intento, ameaçou voltar e jogar ao poço, o tio da mulher, se não lhe entregassem a menina.
 
Os dois irmãos, ainda pequenitos, viveram para sempre, separados por ódios familiares.
 Madalena era muito bonita. Alourada, de olhos castanhos esverdeados era o encanto dos tios que pretendiam esmerar-se na sua educação.
 
Muito cuidada e querida, criança/objecto, servia-os como adorno e satisfação pessoal, sendo vista como um ser, sem importância e sem «quereres».

 
 
 


 

domingo, 11 de agosto de 2013

Férias em Vila de Frades - Texto de Lina Vedes

 
Férias em Vila de Frades - Texto de Lina Vedes
 
Estamos em Julho de 2007.
 Como é possível ter conseguido reter na memória umas férias passadas no Alentejo em 1946/47?
 Claro, desse passeio a Vila de Frades, Cuba, existem lacunas, pontos completamente apagados. No entanto, há episódios que permanecem, tão nítidos, que me dão a sensação de terem acontecido ontem.
 
Sei que o passeio foi em tempo de Verão e que na casa para onde fui circulavam pessoas, todas mais velhas do que eu. Não sei porquê e como fui para lá, quanto tempo lá estive, o nome e a cara das pessoas que me receberam, e como regressei.
 Tinha 6 ou 7 anos.
 
Sempre vivi em Faro, que na altura mais parecia uma vila (embora capital), com pequenas habitações, trânsito automóvel quase nulo e todos a conhecerem todos.
 Nunca saíra da casa dos pais, e talvez por isso, a absorção de todas as vivências foi integral.
 Vila de Frades era um local pacato, tranquilo, totalmente diferente de Faro.
A primeira imagem que guardei, religiosamente, é de uma rua que subia e curvava à esquerda, com casas térreas, alinhadas, muito branquinhas, com grandes chaminés, com postigos nas portas e degraus de acesso.
 Lembro as noites sentados em grupo, no sítio onde cozinhavam, debaixo da chaminé, a contar histórias, anedotas, poesias, rezas, a entreter o tempo.
Uma senhora fazia meia, mas interrompia o trabalho lançando aos outros a sua sabedoria e experiência de vida. Como gostava de ouvi-la e como ela conseguia encantar, não só a mim, mas a todos os que a rodeavam. Todos bebíamos as suas palavras, um legado do passado, transmitido ao presente que haveria de se oferecer ao futuro.
 
Havia noites que não ficávamos em casa, íamos para a rua, com cadeirinhas baixas para nos sentarmos.
 O ar que respirávamos era puro, parecia santo. A conversa focava o trabalho, a luta pelo pão, pela sobrevivência, revelava o amor pela terra, pela família, pelos amigos, todo o sofrimento da alma.
 
 
 
 
 
 

sábado, 20 de julho de 2013

70 ANOS DE VIDA!!!!!!!!! - Texto de Lina Vedes

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70 ANOS DE VIDA!!!!!!!!! - Texto de Lina Vedes  
 
- VELHA!!!!!!!! - Dirão os jovens adolescentes e as crianças! - é velha – dirão os trintões e até os quarentões!  Eu direi: - Velha…! Talvez!...  A carcaça, o exterior revela de facto a idade…rugas, corcunda, joelhos e tornozelos inchados, sensibilidade aos excessos… Mas o interior, o sentir, o correr dos pensamentos…aí não existem rugas nem «papos» desconfortáveis…
 
Perguntem a um septuagenário: - Você sente-se velho? - Não! Eu quero e desejo. Eu sinto e amo.  Eu estou viva… vivo!  Nos meus sentimentos perdura a juventude.
 
Desejo que me oiçam, que me «tirem» para uma dança, que se lembrem de mim como pessoa válida capaz de assumir responsabilidades…confiável.  Avancei na vida muitos anos mas esse avanço não me retirou o prazer de ouvir uma boa música, uma boa representação teatral, uma boa leitura, um bom convívio…
 
Aprendi a saborear a vida de maneira diferente valorizando e descobrindo no quotidiano factos novos que me tinham escapado durante a juventude. Aprofundo o que vejo, leio ou escuto, sem pressas, procurando retirar o máximo prazer.  Aprendi igualmente a olhar o passado, analisá-lo por outro prisma, senti-lo com outro prazer, como se esse tempo, não tivesse sido meu mas o de outra pessoa.
 
Recuo anos de vida, sobrevoando nas recordações a década de 40, altura do meu nascimento, na cidade de Faro e sinto o cheiro de ruas sujas, cheias de pó, recheadas de bandos de crianças abandonadas, andrajosas, famintas, sem escola e de mendigos às portas das igrejas e das casas - gente descalça, mal tratada, ignorada, vestida de negro com grandes xales e lenços na cabeça.  Estávamos no rescaldo da guerra!  Sinto também a pressão, o peso autoritário exercido pelo lema do governo – Deus, Pátria e Família!






domingo, 14 de julho de 2013

A Feira de Nossa Senhora do Carmo - Texto de Lina Vedes

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A Feira de Nossa Senhora do Carmo - Texto de Lina Vedes 
 
Acontecia a 15 de Julho, durante 3 ou 4 dias, no Largo do Carmo, já a «malta» do Liceu abalara de férias, excepto os que tinham exame do 2º, 5º e sétimos anos. A falta dessa juventude notava-se, mas proporcionava aos da terra, um contacto mais íntimo.
 
Ao longo do ano, em minha casa, havia determinadas épocas destinadas a estrear roupa nova, e a feira do Carmo, a seguir à Páscoa, dava-me esse consolo. Estávamos em plena época romântica (anos 50), transpirávamos feminilidade. A moda ditava vestidos bem rodados, cingidos ao corpo, cintura marcada e fina com a saia até meio da perna, sapatos colegiais e soquetes, cabelo apanhado em «rabo-de-cavalo», preso com fitas e muita brilhantina.
 
Lembro-me, com nitidez impressionante, numa tarde de feira, estar agarrada ao carrossel, numa fila interminável, para acesso ao mesmo, e ficar dominada, em absoluto, pela música colocada, em altos berros, o «Rock’ and roll».
 
Nunca ouvira tal som, e sair da habitual música romântica e ser sacudida, inesperadamente, pelo ímpeto do rock, foi o máximo, como diria, actualmente, a minha neta.
 
O carrossel que transmitia a novidade, ficou rodeado por uma juventude delirante, que por instinto se sacudia e ensaiava, mesmo ali em conjunto, passos impetuosos de dança. Até a mãe e outras mães, que ali se encontravam, porque uma menina não ia sozinha à feira, bebiam da alegria contagiante e apelativa, transmitida pelo som.
 
 
 
 

 

sábado, 29 de junho de 2013

5 irmãos - 5 caminhos - Texto de Lina Vedes

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5 irmãos - 5 caminhos - Texto de Lina Vedes  
 
Odeleite, concelho de Castro Marim, distrito de Faro, por volta de 1890 era um aglomerado de casas habitadas por gente humilde, honesta e trabalhadora.
 
Devido à estagnação económica não existia trabalho que absorvesse a população potencialmente activa. Os poucos salários praticados não resolviam as exigências mínimas dos habitantes obrigando-os a emigrar para além do Guadiana. Muitos laços de família, de amizade, de negócio ou de trabalho se firmaram entre as duas margens do rio, unicamente, fronteira politica.
 
Perto da ribeira de Odeleite um jovem casal ocupa uma pequena casa térrea e, num curto espaço de dez anos, trazem ao mundo cinco filhos – Manuel, Joaquim, José, Amélia e Rosa.
 
Trabalhavam de sol a sol não se permitindo pausar e colocando os filhos a colaborar com eles, logo a partir dos 5/6 anos de idade.
 
Sem emprego fixo o pai «jogava mão» a tudo que lhe alimentasse a família. O pouco dinheiro que entrava na casa destinava-se à compra de roupa, sapatos, o necessário para a escola, produtos adquiridos na mercearia/tasca como azeite, açúcar, petróleo…e, outros artigos indispensáveis à sobrevivência, eram objecto de trocas…
 
O pai tanto trabalhava nas terras que rodeavam a casa semeando e colhendo favas, ervilhas, couves, cenouras, cebolas, alhos, tomates…como ia pelos matos caçar ou pescar na ribeira.
 
A mãe lidava em casa, mantendo o fogo aceso nas lajes da lareira, fazendo os jantares da família, lavando a roupa na água corrente e límpida da ribeira, utilizando cinza para lhe retirar o encardido, corando-a e pondo-a a secar em cima das moitas. A seu cargo havia ainda a criação de galinhas um ou outro coelho e um porco, alimento que, no futuro, daria para comerem nos dias invernosos.
 
Os filhos ajudavam indo ao moinho do «tio Bertolino», que ficava num monte próximo, trocando peixe ou caça que o pai conseguira apanhar, por farinha de trigo para a mãe amassar o pão ou de milho para as papas. As crianças gostavam de ir ao moinho fazer a encomenda das farinhas pois assistiam ao rodar das velas e das mós e traziam «mimos» do moleiro – um balaio de figos, cachos de uvas, alfarrobas…
 
 
 

 

domingo, 16 de junho de 2013

Primeiro dia da Escola Primária - Texto de Lina Vedes -

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Primeiro dia da Escola Primária - Texto de Lina Vedes -
 
Nos anos 40 entrávamos na escola com 7 anos de idade.
 
As aulas começavam a 6 de Outubro e acabavam a 15 de Junho, havendo ainda férias pelo Natal e pela Páscoa (15 dias cada). Também se respeitavam os feriados nacionais e religiosos, ao longo do ano. Aos sábados, tínhamos actividades da mocidade portuguesa, nas quais aprendíamos a respeitar e obedecer às leis estabelecidas por Deus, pela Pátria e pela Família.
 
Lembro-me, perfeitamente, do meu primeiro dia de escola primária.
Nesse ano, foi inaugurada a escola do Carmo, de Plano Centenário.
 
Na minha zona habitacional frequentávamos uma escola, num edifício já velho, na rua Serpa Pinto (onde funcionou a Protecção às Raparigas).
 
A abertura dessa escola originou uma confusão enorme, na distribuição das crianças, obedecendo ao local de residência, com base no recenseamento escolar.
 
No primeiro dia de escola, levada pela mão da minha mãe, dirigimo-nos à rua Serpa Pinto. Havia uma fila enorme e barulhenta, de mães e filhas (os homens/pais não entravam nesta guerra), que pretendiam saber que escola lhes havia sido atribuída.
 
Nesse tempo, os rapazes frequentavam a escola no turno da manhã e as raparigas no da tarde. Não era permitida a união de sexos opostos, embora nos locais com fraca população escolar, as turmas pudessem ser mistas.
 
Nesse meu ensaio de entrada na escola, esperámos imenso tempo, na fila, até que alguém consultando um livro, nos indicou, que o meu nome estaria na escola nova do Carmo.




sábado, 8 de junho de 2013

Outros tempos…o dos avós! - Texto de Lina Vedes


Outros tempos…o dos avós! - Texto de Lina Vedes  
 
Arminda da Silva Pinto nasceu em Vilar, freguesia de Castanheira de Pêra, Pedrógão Grande, em 1884 e faleceu em Faro a 15/02/1959.  Era filha de um proprietário da região.
Casou no Coelhal, na igreja matriz, em 1906 e teve três filhos nascidos em casa, 2 rapazes e 1 rapariga: Alfredo, Manuel e Nascisa.  Veio morar para Faro em 1918.
 
Educada para servir os outros, com todos os valores inerentes a essa missão, sabia, na íntegra, tratar da arrumação e limpeza da casa, cozinhar, fazer e cuidar da roupa, bordar e economizar o máximo. Além destas características, há a acrescentar a submissão natural, sem revolta, sabendo aceitar, humildemente, as exigências do marido – o seu dono.
 
Nunca praguejou, nunca esteve a uma janela olhando a rua, nunca usou roupas ousadas (a cava de um vestido fazia parte dessa ousadia) … nunca foi a um médico mostrar-se, e bem doente esteve, pois o marido era homem de muitas experiências extra conjugais, e contagiava-a com doenças venéreas. Tratava-se com mesinhas caseiras, utilizando água das malvas.
 
A par de todas estas particularidades, sofreu na vida outros desgostos.  O marido era déspota, patrão de tudo e de todos, com exigências sem contrapartidas. Exigia obediência total da mulher, dos filhos, chegando a castigá-los severa e impiedosamente. Na lei dele (conduta usual dessa época), filhos do sexo masculino, rua aos 15 anos – não existia compaixão.
 
Arminda sofreu ainda a morte do filho mais velho e da mulher dele, tendo de ficar com a neta. Pouco mais tarde morre a única filha e a neta, todos com tuberculose, entre 1936 e 1944.
 
Canalizou e acalmou a dor voltando-se para a casa, onde tinha um jardim com flores lindas, em centenas de vasos.  Sempre fez tudo pelo lar e pelos outros e nunca teve um tostão, nem viu o seu esforço reconhecido.
 
Tentou transmitir aos netos a docilidade, a paciência, a resignação. Nunca impôs, nunca governou…nem a si própria. Toda a vida chorou, ocultando o seu sofrimento, não fosse incomodar ou provocar a incompreensão, principalmente, a do marido.
 
Lembro-me bem dela, morando na R. Frederico Lécor; casa enorme, com um grande quintal, tanque para a rega, muitas árvores de fruto e sobretudo flores, muitos vasos com flores… Ia, algumas vezes, passar semanas a casa de Arminda, embora morasse também em Faro com os meus pais.