27 de agosto de 2006

Man Ray, «The Gift»
Man Ray (1890-1976)
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26 de agosto de 2006


Julio Cortázar (1914-1984)


NO ME DES TREGUA


No me des tregua, no me perdones nunca.
Hostígame en la sangre,
que cada cosa cruel sea tú que vuelves.
¡No me dejes dormir, no me des paz!
Entonces ganaré mi reino,
naceré lentamente.
No me pierdas como una música fácil,
no seas caricia ni guante;
tálame como un sílex, desespérame.

Julio Cortázar

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25 de agosto de 2006


Ana Marques Gastão (1962)


Deixa-me dormir
quando
morre a noite.
Assim o amor
será absoluto
sacrifício
impassível sangue
árido prazer.

Deixa-me dormir
quando
morre a noite.
Assim o amor
guardará
uma grega ilusão
de sonho
e embriaguez.

Deixa-me dormir
quando
morre a noite.
Assim o amor
terá merecido
a dor, veloz,
insustentável
e imoderada.

Deixa-me dormir
quando
morre a noite.
Assim o amor
dir-nos-á
sois abandonados
cristos
na boca de deus.

Ana Marques Gastão

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24 de agosto de 2006


Jorge Luís Borges (1899-1986)

1964

I

Ya no es mágico el mundo. Te han dejado.
Ya no compartirás la clara luna
ni los lentos jardines. Ya no hay una
luna que no sea espejo del pasado,


cristal de soledad, sol de agonías.
Adiós las mutuas manos y las sienes
que acercaba el amor. Hoy sólo tienes
la fiel memoria y los desiertos días.


Nadie pierde (repites vanamente)
sino lo que no tiene y no ha tenido
nunca, pero no basta ser valiente


para aprender el arte del olvido.
Un símbolo, una rosa, te desgarra
y te puede matar una guitarra.

II

Ya no seré feliz. Tal vez no importa.
Hay tantas otras cosas en el mundo;
un instante cualquiera es más profundo
y diverso que el mar. La vida es corta


y aunque las horas son tan largas, una
oscura maravilla nos acecha,
la muerte, ese otro mar, esa otra flecha
que nos libra del sol y de la luna


y del amor. La dicha que me diste
y me quitaste debe ser borrada;
lo que era todo tiene que ser nada.


Sólo que me queda el goce de estar triste,
esa vana costumbre que me inclina
al Sur, a cierta puerta, a cierta esquina.

Jorge Luís Borges

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19 de agosto de 2006


Ogden Nash (1902-1971)



Pretty Halcyon Days

How pleasant to sit on the beach,
On the beach, on the sand, in the sun,
With ocean galore within reach,
And nothing at all to be done!
No letters to answer,
No bills to be burned,
No work to be shirked,
No cash to be earned,
It is pleasant to sit on the beach
With nothing at all to be done!
How pleasant to look at the ocean,
Democratic and damp; indiscriminate;
It fills me with noble emotion
To think I am able to swim in it.

To lave in the wave,
Majestic and chilly,
Tomorrow I crave;
But today it is silly.
It is pleasant to look at the ocean;
Tomorrow, perhaps, I shall swim in it.
How pleasant to gaze at the sailors.
As their sailboats they manfully sail
With the vigor of vikings and whalers
In the days of the vikings and whale.
They sport on the brink
Of the shad and the shark;
If its windy they sink;
If it isn't, they park.
It is pleasant to gaze at the sailors,
To gaze without having to sail.

How pleasant the salt anesthetic
Of the air and the sand and the sun;
Leave the earth to the strong and athletic,
And the sea to adventure upon.
But the sun and the sand
No contractor can copy;
We lie in the land
Of the lotus and poppy;
We vegetate, calm and aesthetic,
On the beach, on the sand, in the sun.

Ogden Nash

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16 de agosto de 2006


Charles Bukowski (1920-1994)

The Laughing Heart


your life is your life.
don’t let it be clubbed into dank submission.
be on the watch.
there are ways out.
there is a light somewhere.
it may not be much light but
it beats the darkness.
be on the watch.
the gods will offer you chances.
know them.
take them.
you can’t beat death but
you can beat death in life, sometimes.
and the more often you learn to do it,
the more light there will be.
your life is your life.
know it while you have it.
you are marvelous.
the gods wait to delight
in you.

Charles Bukowski


Tom Waits e Bono recitam Bukowski

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15 de agosto de 2006


José Agostinho Baptista (1948)

Parte-se

Parte-se,
como uma ânfora desmedida,
o meu coração.
É Junho,
começam a abrir-se as flores da melancolia.

Desço os degraus da casa e da terra.
Fecho os olhos.
E por dentro da sua cor,
por dentro da sua luz verde,
esses olhos partem para o mar,
quando o crepúsculo cai do outro lado dos
espelhos

Parece que os girassóis se erguem na berma
das estradas.
Parece que as cegonhas dormem.

Nem tu,
cujo rosto vi desenhar-se tantas vezes no
rosto da lua, me poderás salvar.

José Agostinho Baptista, Esta Voz é Quase o Vento

9 de agosto de 2006


Philip Larkin (1922-1985)


This Be The Verse

They fuck you up, your mum and dad.
They may not mean to, but they do.
They fill you with the faults they had
And add some extra, just for you.

But they were fucked up in their turn
By fools in old-style hats and coats,
Who half the time were soppy-stern
And half at one another's throats.

Man hands on misery to man.
It deepens like a coastal shelf.
Get out as early as you can,
And don't have any kids yourself.

Philip Larkin

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8 de agosto de 2006


Sara Teasdale (1884-1933)


The Song For Colin

I sang a song at dusking time
Beneath the evening star,
And Terence left his latest rhyme
To answer from afar.

Pierrot laid down his lute to weep,
And sighed, "She sings for me."
But Colin slept a careless sleep
Beneath an apple tree.

Sara Teasdale



Outra nascida a 8 de Agosto escreveu

O teste


Por vezes, dobramos a esquina e temos um encontro imediato com o passado. E somos surpreendidos com o coração que já não salta. E damos conta de que o tempo faz coisas inacreditáveis. E vamos dormir descansados, a sorrir, e a pensar porque é que isto não aconteceu há mais tempo. Amanhã é outro dia. Não... amanhã, são todos os dias depois do dia de hoje. Vai estar sol, de certeza.

Parabéns, Romã!

7 de agosto de 2006

Emil Nolde, «Mar de Outono»
Emil Nolde (1867-1956)
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2 de agosto de 2006


José Afonso (1929-1987)


Que Amor Não me Engana

Que amor não me engana
Com a sua brandura
Se de antiga chama
Mal vive a amargura

Duma mancha negra
Duma pedra fria
Que amor não se entrega
Na noite vazia

E as vozes embarcam
Num silêncio aflito
Quanto mais se apartam
Mais se ouve o seu grito

Muito à flor das águas
Noite marinheira
Vem devagarinho
Para a minha beira

Em novas coutadas
Junto de uma hera
Nascem flores vermelhas
Pela Primavera

Assim tu souberas
Irmã cotovia
Dizer-me se esperas
O nascer do dia

José Afonso


1 de agosto de 2006


Herman Melville (1819-1891)


Chamem-me Ismael. Há alguns anos, quantos ao certo, não importa, com pouco ou nenhum dinheiro na bolsa, e sem nada de especial que me interessasse em terra, veio-me à ideia meter-me num navio e ver a parte aquática do mundo. É uma maneira que eu tenho de afugentar a melancolia e regularizar a circulação. Sempre que na minha boca se desenha um esgar carrancudo; sempre que me vai na alma um Novembro húmido e cinzento, sempre que dou comigo a deter-me involuntariamente em frente das agências funerárias ou a engrossar o séquito de todos os funerais com que me deparo; e, especialmente, sempre que me sinto invadido por um estado de espírito de tal maneira mórbido, que só os sólidos princípios morais me impedem de descer à rua com a ideia deliberada de arrancar metodicamente os chapéus a todos os transeuntes, nessa altura, dou-me conta que está na hora de me fazer ao mar, quanto antes. É o meu estratagema para evitar o suicídio. Catão lança-se sobre a espada com um floreado filosófico; eu, calmamente embarco. Nada há de surpreendente nisto. Embora não se dêem conta, tal como eu, quase todos os homens acalentam, mais tarde ou mais cedo, este desejo de mar.

Herman Melville, Moby Dick
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