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The aim of life is appreciation; there is no sense in not appreciating things; and there is no sense in having more of them if you have less appreciation of them.


..........................................................................................................Gilbert Keith Chesterton
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segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Externalidades

Antes da blogosfera eu não sabia o que eram externalidades. Os economistas que eu conhecia - ou seja, os que têm acesso aos media e desempenham cargos políticos - nunca falavam nelas. Se encerravam uma via férrea, por exemplo, apresentavam, como explicação suficiente, o facto de ela dar prejuízo. As perguntas que eu me punha, a que estes economistas nunca responderam, eram estas: davam prejuízo a quem? E a quem dava prejuízo o seu encerramento? E qual dos dois prejuízos era maior?

Falavam-me em racionalidade económica e diziam-me que esta exigia que se procedesse em todos os casos a uma análise custo-benefício; mas parecia-me evidente que a selecção que faziam dos custos e dos benefícios a considerar era ideológica e política e não técnica ou científica.

E era assim que eu pensava que todos os economistas pensavam. E se a ciência económica era isto, então pouca diferença havia entre ela e a astrologia: era um sistema de crenças com a sua lógica própria e inegável consistência interna, mas capaz de subsistir apenas porque ignorava propositadamente a realidade exterior. E o pior é que esta espécie de superstição se arrogava o estatuto de explicação totalizante e única do Homem e do Mundo.

A blogosfera veio ensinar-me que havia alternativa a esta ideologia totalitária. Não só havia vida para lá da Economia, como havia Economia para lá do João Miranda.
Primeiro encontrei o Ladrões de Bicicletas, depois O Valor das Ideias, depois, por intermédio deste último, o Da Minha Profunda Ignorância. Tomei nota do Prémio Nobel de Joseph Stiglitz, das suas posições contrárias à doutrina hegemónica, e do aval dado por ele ao Disater Capitalism da jornalista Naomi Klein. Alfredo Saad Filho e Deborah Johnston deram-me a ler uma antologia de economistas heterodoxos. Henry A. Giroux mostrou-me que o neoliberalismo não conduzia à liberdade, mas exigia, pelo contrário, um sistema autoritário e anti-democrático que o impusesse aos povos. E David Harvey mostrou-me que a doutrina "definitiva" de Milton Friedman não passava, afinal, duma ideologia fabricada por encomenda e segundo um caderno de encargos para favorecer certos interesses bem definidos. Comecei a ler regularmente The Conscience of a Liberal de Paul Krugman - outro laureado com o Prémio Nobel.

Entretanto veio a crise do subprime e começou a estabelecer-se um novo consenso sobre a necessidade de o Estado investir e criar emprego. Em Portugal formou-se um partido a favor das obras públicas e outro contra elas. Neste último militam os economistas mediáticos, que por coincidência têm militado também no establishment político e financeiro. Continuam a recusar-se a ter em conta as externalidades, que são difíceis de calcular.

A isto respondem os primeiros que quem não tem em conta as externalidades é pura e simplesmente incompetente para fazer uma análise de custos/benefícios, especialmente no que toca a decisões que relevem de políticas públicas. E eu, cá da minha ignorância, dou-lhes razão. Há muitas coisas que não sei, mas sei o que são externalidades em economia.

E o que são elas, afinal? Tratando-se duma explicação de um leigo para outros leigos, o melhor é dar um exemplo concreto.

Anteontem visitei o Museu Guggenheim em Bilbau - exactamente o tipo de obra financiada com dinheiro dos contribuintes que causa urticária aos nossos economistas do regime. Paguei por dois bilhetes 25,00€, que constituíram um proveito directo para a instituição. De hotel e alimentação, paguei quatro vezes mais - que nunca pagaria se não tivesse interrompido a minha viagem com o propósito exclusivo de visitar o museu. Estes 100,00€ entram naquilo a que os economistas chamam uma externalidade positiva - um proveito difuso que é extremamente difícil de calcular com antecedência mas que pode exceder em muito o proveito directo.

Quem suportou os custos? Quem aufere os proveitos? Para ambas as perguntas a resposta é: acima de tudo, os contribuintes bascos e a cidade de Bilbau (a Fundação Solomon Guggenheim só entrou com a marca e com o know-how, pelo que de resto se fez pagar; e Madrid não pagou uma peseta que fosse).

Sem o Museu Guggenheim, a cadeia de hotéis que me alojou não se teria provavelmente instalado em Bilbau - ou teria construído um hotel em vez de dois, ou dois mais pequenos, gerando menos emprego; ou ter-se-ia instalado na mesma, gerando menos lucros.

Do ponto de vista dos custos e dos benefícios, a maior diferença entre o Guggenheim, por um lado, e por outro a Casa da Música ou o Centro Cultural de Belém está em que o primeiro foi construído dentro do prazo e do orçamento; mas isto é a excepção em qualquer parte do mundo.

De modo que a minha posição em relação às grandes obras públicas previstas para os próprios anos em Portugal não se centra na questão de deverem ser feitas ou não. Acho que devem ser feitas, com a possível excepção da terceira auto-estrada entre o Porto e Lisboa. A questão está, para mim, em evitar as derrapagens orçamentais e a corrupção que lhes está associada - diminuindo assim o risco de os benefícios, para a nossa geração e para as futuras, não cobrirem os custos.