Quando o Ramiro Marques propôs que se descentrasse um pouco a luta dos professores do modelo de avaliação e das carreiras para o centrar mais noutras questões como o sobretrabalho dos professores, a burocracia, o "eduquês" e a empresarialização das escolas, houve muitos colegas nossos que lhe caíram em cima falando em capitulação. Eu acho que o Ramiro tem razão e que o que ele propõe não é uma capitulação, mas sim uma retirada estratégica dum campo de batalha em que estamos de momento em desvantagem (repito, de momento) para outros em que a relação de forças nos é mais favorável.
O bom general escolhe o campo de batalha, não deixa que o inimigo o escolha. Em matéria de avaliação e de carreiras, tudo indica que vamos ficar (de momento, repito) muito aquém dos nossos objectivos; mas não será uma batalha perdida, uma vez que nos terá deixado em melhor posição para vencer outras; o que por sua vez nos deixará em melhor posição quando regressarmos a esta.
Das batalhas que temos pela frente, a do sobretrabalho é a mais difícil porque é a que exige aos professores mais coragem e iniciativa individual. Antes de se desenrolar nos tribunais, onde os professores podem contar com o apoio dos sindicatos, terá que que começar no confronto directo com as direcções das escolas, confronto este em que muitos professores se sentirão sozinhos e destituídos de poder. É provável que só uma minoria entre nesta luta, mas será uma minoria que poderá fazer a diferença. Uma maneira de recrutar mais combatentes será a exigência de indemnizações elevadas, como estão a fazer, com assinalável êxito, muitos dos nossos colegas britânicos. Num artigo posterior tenciono voltar a este tema, propondo um modelo de formulário que poderá servir para desencadear processos de resistência.
No que toca a luta contra o "eduquês", temos várias vantagens do nosso lado. Nenhuma acção de propaganda do governo, por mais sofisticada ou insistente que seja, poderá convencer a maioria da opinião pública portuguesa que os programas são bons e os manuais escolares adequados. O problema, neste ponto, está em que muita gente está convencida de que a culpa de os programas e os manuais serem como são é dos professores; mas neste caso, e ao contrário do que se passa no interior das escolas, os cidadãos terão a oportunidade de "ver para crer".
Também não é difícil mostrar aos cidadãos que uma superstrutura educativa com centenas de organismos e milhares de funcionários a trabalhar fora das escolas é uma aberração que lhes sai cara. E, numa circunstância histórica em que o crash das empresas dot com há dez anos e a crise do subprime de há um ano mostraram que há algo de profundamente errado com os fundamentos do sistema económico, é sempre possível mostrar que o chamado "modelo empresarial" nem para as empresas é bom. Também sobre isto me proponho escrever mais tarde com maior desenvolvimento.
O sobretrabalho dos professores, a burocracia, o "eduquês" e a ideologia empresarial são as bases em que assenta, não só o modelo de avaliação e de carreiras de Maria de Lurdes Rodrigues, mas também o de Isabel Alçada. Minemos estas bases, e quando voltarmos ao actual campo de batalha estaremos em vantagem.
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quinta-feira, 7 de janeiro de 2010
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