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14 julho 2008

O DESMITOS NO SEU MELHOR _ Perguntas dos leitores

A troca destes comentários entre a Gi, o António, o Miguel Carvalho e o Tiago foi extremanente estimulante e informativa. Obrigado a todos. É exactamente para este tipo de debates que o Desmitos foi criado. Como estive sem apoio escolar nas últimas duas semanas para os meus filhos, não me foi possível até agora responder adequadamente ao debate. Aqui vão mais algumas reflexões:
  1. O António afirma: "o PIB e consequentemente o rendimento per capita é hoje 22% superior ao que era há 12 anos atrás. Como é possivel então esta enorme sensação generalizada de crise, lojas e restaurantes a fecharem e a enorme sensação de perca de poder de compra. Com raras excepções, julgo que a generalidade das pessoas se sente hoje mais pobre do que há 12 anos. E isso nota-se claramente no comportamento das pessoas. Não creio que isto seja uma mera ilusão." É verdade que o PIB cresceu entre 1 a 2 por cento nos últimos anos. Quando o PIB por habitante cresce a 1 por cento ao ano, leva 70 anos para que o PIB per capita duplique. 70 anos. O que quer dizer que em 10 anos, pouca diferença se irá notar nos rendimentos dos particulares. Por outro lado, como o debate indicou, em parte, a resposta a este aparemte paradoxo pode ser atribuída ao endividamento das famílias. Há 12 anos muitas das nossas famílias (sobre)endividaram-se para poderem comprar carros, casas, CDs, aparelhagens, viagens ao Brasil e muitas outras coisas. Ou seja, o consumo foi imediato, mas o pagamento foi faseado por alguns anos. Doze anos mais tarde, muitas famílias continuam a pagar as suas casas, os seus cartões de crédito, e as suas viagens ao Brasil. Por que o fazem, e por que estão demasiado endividadas, agora não podem comprar carros novos, viajar para o Brasil (ou outros lugares) e/ou embarcar em grandes loucuras consumistas. Por isso, é natural que haja mal-estar: as dívidas persistem mas o consumo não aumenta. Isto passou-se em vários países, mas em Portugal foi pior, porque atingimos níveis de endividamento superiores.
  2. Desigualdades de rendimentos. A hipótese avançada pelo Tiago faz todo o sentido. No entanto, há igualmente outros factores a considerar. Não só o aumento do PIB foi muito reduzido, como também não há grandes sinais que as desigualdades sociais estejam a aumentar em Portugal. As desiguldades são grandes e graves, mas não parecem estar a aumentar.
  3. Confiança dos consumidores. O Miguel fala de um assunto pertinente, a baixa confiança dos consumidores, que não dá mostras de aumentar. Indepedentemente da importância do consumo, mais do que a confiança dos consumidores, é vital haver uma recuperação da confiança dos investidores. Porquê? Porque o consumo quase sempre avança ou recua ao ritmo do PIB, enquanto o investimento responde 2 a 3 vezes mais do que o PIB. Ou seja, quando o PIB cresce 10%, o investimento cresce 20 ou 30%, quando o PIB cai, o investimento cai muito mais. Por isso, o melhor indicador de retoma económica é a confiança dos investidores. Quando estes(as) tiverem mais optimistas, podemos estar certos que a retoma estará à porta.

07 julho 2008

QUE PIB? QUE INFLAÇÃO?_ Perguntas dos leitores

A António coloca as seguintes questões sobre o PIB e sobre a inflação:
"Quando se diz por exemplo que o crescimento do PIB é de 1.5% estamos a falar de preços constantes ou preços correntes? É que se falarmos de preços constantes significa que de facto houve um crescimento económico de 1.5%. Isto é, que os cidadãos da região económica que registou esse aumento produziram na realidade mais 1.5% de riqueza. O que apesar de tudo não me parece muito mau. Mesmo 1% não me parece horrivel. E se quer que lhe diga, 0% a preços constantes também me não parece horrivel. Quer apenas dizer que em determinado ano os cidadãos de determinada região económica mantiveram o nivel de riqueza do ano anterior. Portanto ser bom ou mau nessas condições depende apenas do nivel de riqueza que essa região produziu anteriormente. Contudo se estramos a falar de valores a preços correntes então o caso muda de figura. Temos de "descontar" a inflação para podermos comparar. Neste caso a região económica terá de ter tido um crescimento pelo menos igual à inflação da sua região para que se possa concluir que a sociedade não terá ficado mais pobre do que no0 ano anterior. E qualquer décima que cresça acima da inflacção significa que a sociedade se tornou um pouco mais rica que no ano anterior.Outro aspecto a ter em conta é o grau de credibilidade do valor da inflação apurada. É evidente que tanto os governos como os bancos centrais têm interesse em não reconhecer taxas de inflação altas, já que o seu reconhecimento dava argumentos para elevados crescimentos da massa salarial o que constitui por si só mais um factor de tensão inflacionista, quer pelo lado do rendimento disponivel quer pelo lado do aumento do custo da produção. Por isso anda-me a parecer que anda muita gente a fazer mal as contas ou a considerar um cabaz que não traduz a realidade do consumo para fazer baixar os valores apurados da inflação. Não serei só eu a ter esta impressão e já há ex-ministros das finanças a levantar essa suspeita."
  1. Os números do PIB quase sempre são apresentados tendo em conta a inflação. Como o António refere, seria muito má ideia apresentar os dados em termos nominais. Se assim fosse, o PIB seria inflacionado pela subida dos preços. Por exemplo, como já aqui falámos, no Zimbabwe a taxa de inflação atinge os 150 mil por cento ao ano. Como o PIB a preços correntes mede o valor de tudo o que se produz num país (isto é, os preços de todos os bens e serviços multiplicados pelas quantidades transacionadas), então o PIB do Zimbabwe está a crescer e a taxas fantásticas. No entanto, se medirmos o PIB do Zimbabwe a preços constantes (isto é, temos X bens e serviços transacionados, mas assumimos que os preços desses produtos são de, por exemplo, 1999), então facilmente concluiremos que o PIB desse país tem decaído substancialmete nos últimos anos. O mesmo se passa em Portugal. Os dados do PIB são quase sempre os do PIB real (i.e. ajustado da inflação). E por isso, a variação é real e não motivada pela subida dos preços. Não temos que nos preocuparmos sobre isso.
  2. Quanto à taxa de inflação, como já aqui falámos, é verdade que há alguns problemas e dificuldades associados ao cálculo dessa taxa. Porém, a metodologia utilizada pelo INE e por outros institutos de estatística nacionais é comum a nível internacional (com algumas diferenças nacionais). O cabaz é determinado assumindo os hábitos de consumo de um cidadão médio. Como é uma média, não leva em linha de conta as taxas de inflação de acordo com os diferentes consumidores. Por exemplo, o cabaz de consumo dos consumidores mais pobres inclui uma maior percentagem de gastos em comida do que o cabaz dos mais ricos. Como os preços alimentares têm crescido mais do que outros produtos, os mais pobres têm taxas de inflação mais elevadas do que os mais ricos. No entanto, quando achamos a média, estas diferenças desaparecem. É esta uma das razões porque a taxa de inflação ainda não é muito significativa, apesar do aumento do preço do petróleo e dos bens alimentares

Obrigado

11 maio 2008

O SUPEREURO E AS EXPORTAÇÕES NACIONAIS_ Perguntas (16)

O Luís Leitão comenta e pergunta:
"Olhando bem para os números, talvez o impacto que a valorização do Euro tem nas nossas exportações, se calhar não será tão estrondoso como se possa pensar à primeira vista. Olhando para os dados do Eurostat (http://tiny.cc/9kP8e) ficamos a saber que no período de 2003 a 2007, as trocas comerciais entre Portugal e os estados-membros da UE-27 decresceu apenas 4% (4,4% nas exportações e 4,1% das importações). Se considerarmos ... que neste período houve uma valorização de 70% do Euro face ao dólar, penso que "não será por isso que o gato deixará de ir às filhoses". Além disso, convém lembrar que Portugal continua a ser um dos países da União Europeia que mais trocas realiza so seio da UE-27: 75,4% do total das importações e 76,7% do total das exportações nacionais é feito dentro do espaço económico europeu. Outro ponto a assinalar é o elevado grau de integração dos 27 Estados-membros: cerca de 65% por cento do comércio realizado por estes países é actualmente feito dentro da UE e sem influência directa de valorizações cambiais. Significa que a maioria das exportações e das importações é feita no espaço europeu. Todavia, poderemos sempre argumentar que, sendo a Alemanha, a França e a Inglaterra os motores do crescimento europeu e os grandes polos de destino das nossas exportações, e que fazem depender perto de 40% das suas exportações do mercado além fronteiras europeias que, por arrastamento, a valorização do Euro acabará por influenciar indirectamente as exportaçoes portuguesas. Porém, é tudo uma questao de relativismo. Por isso, deixo uma questão para a qual não tenho resposta: qual é o real impacto da valorização do euro nas exportações portuguesas?"
Luís,
Obrigado pelos excelentes dados e pelo comentário. É verdade que é tudo uma questão relativa. Mesmo assim, é de assinalar que entre 1999 e 2007, houve um declínio considerável (em termos relativos) das nossas exportações na UE. A UE ainda é o nosso principal cliente, pois, como afirma, 76.5% das nossas exportações destinam-se ao mercado europeu. É bastante, sem dúvida. No entanto, é preciso também dizer que em 1999, este valor era 84,2%. Ou seja, houve um declínio de 7.7 pontos percentuais neste indicador. Em parte, isto explica-se pela maior diversificação das exportações portuguesas para outros destinos. Mesmo assim, é patente que que houve uma acentuada quebra de tendência e esta quebra não é necessariamente "normal". Vejamos porquê.
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Quando os países se juntam num acordo de integração económica, quase sempre os fluxos comerciais são redireccionados para os novos parceiros económicos. Quando os países em causa são vizinhos ou quase (ie. pouco distantes geograficamente), este tendência de integração costuma aumentar (quase) anualmente. Foi exactamente isto que aconteceu quando aderimos à então CEE.
Neste sentido, o que é de assinalar é que esta tendência de crescente integração (ou redireccionamento das nossas exportações) foi quebrada sistematicamente nos últimos anos. Qual a causa? Uma diversificação dos mercados-destino das nossas exportações (o que é de saudar), ou a menor competitividade dos nossos produtos?
A resposta é um misto destas razões. Porém, alguns estudos indiciam que tem havido uma perda de competitividade das nossas exportações. Porquê? Porque o euro forte diminui a atractividade dos nossos produtos (que concorrem com os bens de outros países dentro e, principalmente, da eurolândia) e porque as nossas exportações mais "tradicionais" têm sofrido maior concorrência dos países da Europa de Leste e da Ásia.
Qual é o verdadeiro impacto do euro nas nossas exportações? É difícil destrinçar o efeito euro forte deste efeito da maior concorrência dos produtos dos países fora da Eurolândia. Ainda assim, é inegável que uma moeda forte tem penalizado grandemente muitas das empresas que subsistiam "artificialmente" devido às diversas desvalorizações do escudo.
Até às nossas empresas se ajustarem completamente às realidades de uma moeda forte, é natural que as exportações continuem a ser algo penalizadas.

06 maio 2008

O DÓLAR E O SUPEREURO _ Perguntas dos Leitores (15)

O Miguel F. Carvalho pergunta...
"1 - Como é que o dólar, que foi sempre nos últimos tempos a moeda âncora da economia mundial se conseguiu depreciar tanto em relação ao Euro nos últimos anos? E até que ponto essa situação vai afectar ainda mais as exportações europeias nos próximos tempos?
2 - como é que se justifica o aumento exponencial do preço do crude nos mercados internacionais, já que, apesar do aumento do consumo chinês e indiano, a produção não tem sofrido quebras nos últimos anos? Será que a lei do mercado está a ser gradualmente substituída por uma lei da especulação? Dá-me a impressão que estes aumentos são muito mais psicológicos do que derivados da lei da oferta e da procura, não?"
1. As moedas valorizam-se ou desvalorizam-se de acordo com uma série de factores, dos quais se salientam o diferencial das taxas de juro entre os países, o diferencial do crescimento económico (e da produtividade) entre os países, e a especulação. Há outros factores, mas estes são bastante importantes para explicar a evolução cambial de uma moeda em relação a outra.
O diferencial das taxas de juro é importante, porque quando os juros no nosso país são mais elevados do que noutro país, os nossos activos são mais procurados. Nomeadamente, há muitos títulos (como as obrigações do tesouro) cujos rendimentos/dividendos aumentam com as taxas de juro. Deste modo, se as nossas taxas de juro aumentarem em relação aos outros países, os nossos títulos (como as obrigações) são mais procurados, aumentando a procura da nossa moeda. Quando a procura da nossa moeda aumenta, o preço da moeda também aumenta. Isto é, a nossa moeda valoriza-se.
Tudo isto para dizer que uma das razões principais para a valorização do euro deve-se em parte à manutenção de taxas de juro europeias mais elevadas do que as americanas. E, ainda por cima, com a descida vertiginosa das taxas de juro americanas nos últimos meses, o diferencial dos juros europeus e americanos aumentou ainda mais, colocando ainda mais pressão para o euro se valorizar.
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Como é isto afecta as exportações europeias? Negativamente. Pelo menos a curto prazo. A longo prazo, as exportações europeias (e portuguesas) dependem das nossas vantagens comparativas, bem como de outros factores como a produtividade. No entanto, as taxas de câmbio são bastante importantes a curto prazo e, por isso, é natural que as exportações europeias continuem a sofrer.
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2. Em parte, o aumento do preço do crude justifica-se pelo dinamismo sem precedentes da economia mundial nos últimos anos, principalmente dos países subdesenvolvidos (dos quais se destacam a China e a Índia). No entanto, há outros factores, tais como o facto da OPEC (o cartel dos países exportadores do petróleo) ainda não ter feito nada para baixar os preços do crude através de um aumento da oferta. Não o fazem porque há muitos países (e governos) a beneficiarem da subida do preço do crude.
Por outro lado, a subida dos preços petrolíferos não tem sido ainda mais danosa porque o dólar se tem desvalorizado muito, o que tem amortecido o impacto da subida dos preços (como já falámos aqui). Finalmente, existe obviamente o factor especulação, que tem ajudado à manutenção dos preços altos.

05 maio 2008

INFLAÇÃO E DESEMPREGO _ Perguntas dos Leitores (14)

O Quebra Ossos pergunta:
"Sendo a inflação inversamente proporcional ao desemprego, qual a posição que defende em relação à problemática “Desemprego ou inflação”? Qual a sua opinião em relação às medidas tomadas, pelas entidades competentes (europeias e nacionais), nesta matéria?
Uma dos temas mais debatidos na Economia é a suposta relação inversa entre a taxa de inflação e desemprego, tecnicamente chamada de curva de Phillips. A ideia é simples. Numa recessão, existe menos procura de bens e serviços, o que faz com que os preços tendam a baixar (ou, pelo menos, a crescer menos rapidamente). Por outro lado, como nas recessões a produção de bens e serviços tende a diminuir, as empresas vêem os seus stocks a acumular-se nos seus armazéns e, consequentemente, são forçadas a diminuir as suas produções. Como há menos produção, há menos necessidade de manter os mesmos postos de trabalho, de maneira que os despedimentos aumentam e a taxa de desemprego cresce. Neste sentido, quando há recessões, quase sempre há uma descida dos preços bem como um aumento do desemprego. Assim, a inflação e o desemprego movem-se em direcções opostas: a inflação cai e o desemprego aumenta.
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A mesma lógica também se aplica às expansões económicas. Quando há mais crescimento económico, há maior procura de trabalhadores, e o desemprego diminui. Por outro lado, a expansão conduz a um aumento dos rendimentos, e a procura de bens e serviços cresce. Como há maior procura, os preços tendem a subir, e a inflação aumenta. Isto é, em períodos de expansão, (quase sempre) os preços sobem e o desemprego diminui. Ou seja, mais uma vez, o desemprego e a inflação andam em direcções contrárias.
Ora, como o desemprego e a inflação andam desencontrados e em direcções opostas, parece que os governos têm um menu de alternativas entre taxas de inflação e o desemprego. Se um governo (tradicionalmente de esquerda) abomina o desemprego, a solução é simples: o Estado gasta mais, o que aumenta a procura global de bens e serviços, aumentando o emprego. Em contrapartida, os preços sobem, devido à mesma maior procura de bens e serviços. Se, por outro lado, um governo (tradicionalmente de direita) se preocupa mais com a estabilidade macroeconómica, então a prioridade é dada à estabilidade dos preços (isto é, a taxas de inflação pouco elevadas). Gasta-se menos, contraindo a procura de bens e serviços, o que diminui a pressão nos preços. Como se gasta menos, há menos procura de bens e serviços, e as empresas reduzem as suas produções, cortam nas suas forças de trabalho, o que faz subir o desemprego.
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E assim, à primeira vista, é fácil. É só escolher a combinação inflação-desemprego que mais nos satisfaz e tudo se resolve. Ou... será que não?
O problema com este raciocínio é que só funciona nos chamados choques da procura. Se o choque em causa for do lado a oferta, as coisas já não são tão simples e a relação inversa entre desemprego e a inflação simplesmente desaparece. Vejamos porquê.
Suponhamos que, como está a acontecer actualmente, os preços dos produtos petrolíferos aumentam significativamente. Devido à importância do petróleo como fonte de energia, os aumentos dos preços dos produtos petrolíferos faz aumentar os restantes preços, o que causa um aumento da inflação. Por outro lado, o aumento dos preços do petróleo aumenta os custos das empresas, o que as leva a cortar outros custos, tais como os salários... Para sobreviverem, muitas empresas diminuem as suas forças de trabalho, o que faz aumentar o desemprego.
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Ou seja, num choque de oferta como este (um choque negativo), a inflação sobe e o desemprego também. Não há nenhuma relação inversa entre as duas variáveis. O oposto ocorre com os choques de oferta positivos, principalmente quando há uma aceleração das inovações tecnológicas. Nestes casos, se um governo insistir em escolher um menu de baixas taxas de inflação e mais desemprego ou vice-versa, tal governo estará a cometer um grave erro de política económica. A curva de Phillips não existe nos choques de oferta.
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Portanto, o que é que defendo na relação inflação-desemprego: prudência. A relação nem sempre existe e é imperioso não ser dogmático nesta matéria. O que é que prefiro? Mais desemprego ou mais inflação? Depende das circunstâncias. Ninguém gosta de mais desemprego, mas às vezes a estabilidade dos preços é importante para estabilizar a economia a atrair mais investidores.
Nesta matéria, como tantas outras em Economia, não há respostas lineares. E ainda bem, digo eu.

02 maio 2008

INFLAÇÃO E O PREÇO DO PETRÓLEO _ PERGUNTAS (13)

A Gambozina pergunta:
"Com o aumento constante e quase vertiginoso do preço dos combustiveis no nosso país, como é que os valores da inflação estão relativamente controlados? Não é suposto o custo de todos os produtos dependerem mais ou menos directamente do preço dos combustiveis? Então porque é que não se reflecte? As empresas estão a assumir esse aumento de custo e ganham menos?"
A inflação não tem sido mais elevada porque o dólar americano tem-se desvalorizado consideravelmente em relação ao euro. Como o petróleo é negociado em dólares, a subida do preço do crude não é totalmente reflectida nas nossas contas quando o importamos. Um euro forte significa exportações mais caras, mas importações mais baratas. Por isso, importamos o petróleo menos caro devido à subida do euro. E assim a inflação importada não é tão significativa.
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O gráfico abaixo reflecte exactamente o diferencial entre os preços do petróleo em dólares ($) e em euros. Como podemos ver, o preço do crude tem subido mesmo em euros, mas tem crescido muito mais em dólares. Se não fosse a desvalorização do dólar, estaríamos a importar bens (como o petróleo) bem mais caros e a inflação seria bem mais preocupante.

Figura: http://www.eurotrib.com/story/2008/3/12/143238/164

02 abril 2008

EXPLICANDO O ZIMBABUÉ _ PERGUNTAS DOS LEITORES (12)

Ainda sobre o Zimbabué, o Marco Bento pergunta: "Como foi possível chegar a uma situação dessas? Como se poderá sair desta situação? Que medidas imediatas se deverão tomar? É pertinente falar-se em nacionalizações?"
A situação desesperada que se vive no Zimbabué tem uma causa principal: as más políticas do governo. Que tipo de políticas? O Zimbabué tem muitas, desde a problemas de corrupção crónica até ao populismo desestabilizador do governo. No entanto, a pior de todas é claramente a tentativa de obter receitas para o Estado através da criação de moeda.
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Apesar de ter assumido proporções devastadoras, o caso do Zimbabué é relativamente típico de um país subdesenvolvido com graves problemas fiscais. A grande maioria dos governos dos países mais pobres enfrenta uma grande dificuldade: a base fiscal é reduzida. Isto é, a quantidade de gente que paga impostos é diminuta. Consequentemente, os governos têm que arranjar outros meios para financiar as suas despesas, tanto civis (i.e. educação, saúde, construção de estradas, etc) como militares. Qual é a solução arranjada? Imprimir dinheiro.
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No início, um aumento da quantidade de dinheiro imprimida poderá dar algum impulso positivo ao governo. No entanto, aos poucos e poucos, a inflação começa a subir, corroendo os salários reais dos trabalhadores. O governo responde imprimindo ainda mais dinheiro. E mais. E mais. E mais. E a inflação cresce mais e mais e mais. A certo ponto a taxa de crescimento dos preços (a inflação) assume valores astronómicos. É considerada uma hiperinflação quando é mais do que 20 por cento ao mês.
As hiperinflações são devastadoras e são a maneira mais rápida de destruir uma economia. O dinheiro perde todo o valor e as pessoas voltam a negociar utilizando a troca directa. Foi assim na Alemanha em 1923 (quando a hiperinflação atingiu os triliões por cento), na Hungria em 1956, bem como em vários países africanos e da América Latina.
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Como parar a inflação? Acabando de um dia para o outro com a impressão de dinheiro. Mais do que outras políticas (como nacionalizações ou outras medidas fiscais), o fim da hiperinflação é a prioridade das prioridades. Após esse objectivo ter sido atingido, o governo pode preocupar-se em governar uma vez mais.

08 março 2008

POBREZA MUNDIAL (2) _ PERGUNTAS DOS LEITORES

A Gi pergunta: "Segundo uma teoria que ouvi recentemente, é natural que países como a Índia ou a China, ou os países do leste europeu, cresçam mais depressa do que os países desenvolvidos porque têm mais que crescer.Ou seja, a Europa e a América do Norte já atingiram níveis de desenvolvimento tais que os incrementos são relativamente pequenos, enquanto a Índia, etc, ainda têm muito que progredir, e qualquer progresso tem maior impacto.Não sei se me consegui explicar (probably as clear as mud). À primeira vista, faz sentido, mas parece contradizer o facto de os países mais prósperos terem crescido mais depressa até aqui.Quanto aos realmente atrasados (Chade, Moçambique, Timor) parecem nem saber como começar...O que lhe parece, Álvaro?"
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A teoria está perfeitamente correcta e está na mesma linha do que as principais teorias de crescimento económico. Esta é a chamada (e famosa) convergência real. Os países ricos têm uma grande abundância de recursos (e de capital, tais como fábricas, edifícios, etc) enquanto os mais pobres têm uma grande escassez. Deste modo, acrescentar uma unidade adicional de capital num país avançado tem um retorno mais pequeno do que num país pobre. Isto é, construir uma fábrica nos Estados Unidos não irá acrescentar muito ao produto nacional americano, enquanto uma nova fábrica no Chade tem um grande impacto.
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Isto nem sempre se verifica (isto é, a maior parte dos países pobres continua a crescer a taxas mais baixas do que os países ricos), mas é esta lógica que explica (parcialmente) porque é que países como Singapura, a Coreia o Botswana e até Portugal cresceram e crescem a taxas mais elevadas do que as economias mais avançadas.
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E já agora, é verdade que a maioria dos países pobres "não sabe" (ou "não pode") onde começar, mas esse não é o caso de Moçambique, que é um autêntico milagre económico ou em vias de se tornar. (Dentro de uns dias escreverei um post sobre este tema.)

03 março 2008

CUSTO DE VIDA


"O Governo ou o INE falam de uma inflação anual de 2.9%.Ora eu, desde janeiro de 2006 passei a guardar as facturas de uma grande superficie onde compro habitualmente quase tudo... [concluindo que os preços subiram bem mais do que 3 por cento]. Ora se os produtos que constituem nas despesas essenciais e diárias dos portugueses cresceram bem a cima dos 2.9% ( e isso é a sensação de todos os portugueses) e que eu posso garantir pois guardei todas as facturas dos produtos de supermercado durante mais de um ano, como é possivel chegar aos 2.9% de inflação do Governo? Quais os produtos ou serviços que têm tanto peso nos orçamentos familiares que tenho baixado tanto de preço de forma a chegar aos 2.9%."
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A taxa de inflação portuguesa é obtida através de um cabaz de produtos que, em média, os(as) portugueses(as) consomem. Portugueses(as) de todo o país (continente e ilhas). O INE pondera o crescimento dos preços pelas diversas regiões e pelos vários produtos para chegar ao valor final. Dito isto, vejamos o que os números do INE nos dizem. A tabela acima indica as categorias de produtos (agregados) que entram no cabaz de preços nacionais. A primeira coluna dá-nos o crescimento dos preços por produto e a segunda informa-nos da importância desse produto no cabaz de bens e serviços consumidos em média pelos(as) portugueses(as).
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Como podemos verificar, a nível nacional, os produtos alimentares constituem a maior componente de consumo dos portugueses, logo seguidos pelos transportes e pela habitação. Quais foram as maiores subidas de preços em 2007? As despesas com a saúde (7.4%), o álcool e o tabaco (5.3%), a educação (3.8%) e os gastos com a habitação (3.6%).
Porque é que a inflação não foi mais elevada do que 2.9% a nível nacional? Porque, até Dezembro, as despesas com a alimentação cresceram somente 2.3% (com variações regionais, certamente) e porque as categorias de produtos que mais subiram têm um peso menos elevado no total de despesas. Por outro lado, alguns produtos e serviços tiveram subidas de preços quase negligenciáveis e outros registaram inclusivamente descidas de preços (ex. as comunicações).
Resultado: quando se faz a média (ponderada pela importância relativa no cabaz) da subida de preços, a média nacional da inflação foi inferior a 3 por cento.
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Note-se que isto não quer dizer que não existam subidas de preços mais elevadas nalgumas regiões (pode ser o caso na região onde o António reside), nem sequer que certas categorias de produtos (p. ex. certos alimentos como o pão) tenham subido mais do que a média não agregada . Por exemplo, os preços dos produtos hortícolas baixaram em 2007, enquanto que o preço dos cereais (e do pão) aumentou (no final do ano).
Dito isto, refira-se também que a situação irá provavelmente alterar-se devido à recente subida dos preços do petróleo e dos produtos alimentares. Aliás, as estatísticas de Janeiro já o demonstram.

27 fevereiro 2008

ECONOMIA VERDE _ COMENTÁRIO DOS LEITORES (10)

Martim Ayres, estudante de História na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, tem o seguinte comentário e pergunta:
"Foi me oferecido o livro "Os mitos da economia portuguesa" e gostei imenso. Os meus conhecimentos de economia são muito poucos e resumem-se ao que aprendi dentro da história e geografia e das ciências sociais e humanas. Sempre gostei de Economia, mas a minha escola secundária não a ofereceu como opção dentro da área de ciências sociais e humanas, embora a tivesse para os alunos de economia. Espero que perdoe qualquer incoerência no meu discurso. Dentro do que eu consegui entender de economia sempre gostei do conceito do estado providência. Fazia-me sentido uma economia virada para o poder de compra e o consumo. Com este livro entendo que o estado providência provoca um crescimento económico sustentado num modo de vida e não na competitividade, qualidade e inovação dos actores dessa economia.
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No entanto restaram-me algumas dúvidas. Entendo que as economias ocidentais estão totalmente baseadas no consumo de petróleo. Deve se a três planos, o da produção de energia eléctrica, o dos combustíveis para transporte e o plano da matéria prima plástica. Estes três planos sustentam a economia e é nos impossível de pensar uma economia sem a interligação entre os três. Sei que o abrandamento das economias europeias está ligado e este facto, cada vez que o preço do petróleo aumenta, estes três planos tornam-se mais dispendiosos, e a economia menos competitiva. A pergunta que faço é se será um hipotético plano de reforma total da economia, focado na substituição da produção de energia em derivados de petróleo, na substituição dos combustíveis fosseis para os transportes e na substituição do plástico como matéria prima (ou uma lei que o obrigasse a ser totalmente reciclado); ao diminuir o peso do consumo do petróleo (e logo o preço também), e ao mesmo tempo ajudando definitivamente para a redução de emissões (um plano dois em um!) não seria potencializador das economias ocidentais? Ou seja, até que ponto é que uma economia "verde", não seria mais competitiva? E em relação aos países de 3º mundo e em desenvolvimento, os novos "grandes consumidores de petróleo" com quem nos competimos agora, essa economia verde não seria uma mais valia para nós (ou a sua ausência um "handicap")? E uma essa hipotética diferenciação entre o ocidente "verde" e o resto do mundo seria positiva? Seria uma economia "verde" capaz de manter o modelo social europeu e o estado providência? É uma economia "verde" o "pesadelo" do neoliberalismo?"
Caro Martim,
Obrigado pelas suas palavras e pela sua mensagem. Será de facto a economia antagonista da economia de mercado? Será uma "economia verde" incompatível com o modelo social europeu? A resposta a estas duas perguntas é, cada vez mais, negativa. Há algumas décadas era, sem dúvida, verdade que a Economia era vista como inimiga da preservação do ambiente. Em certo sentido, isso ainda é verdade, principalmente nos países em desenvolvimento, onde as estratégias de industrialização são frequentemente penalizadoras do ambiente. Só para dar um exemplo e se estiver interessado, o New York Times tem uma série de artigos sobre o incrível crescimento da economia chinesa e as repercussões que este crescimento desenfreado tem tido sobre o meio ambiente na China (a série chama-se "Choking on growth").
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Dito isto, é cada vez mais claro que um número crescente de economistas e de empresas vêem o ambiente (a sua "economia verde") como um mercado como um potencial tremendo. Há cada vez mais empresas a investir em carros híbridos. Há cada vez mais companhias a investir em energias alternativas. Há cada vez mais empresas a fazer o marketing dos produtos "verdes". Mesmo na América do Norte (o supra-sumo das sociedades consumistas), ser-se verde é cada vez mais "cool". Ou seja, mais que um desafio, a apetência dos consumidores por produtos menos nefastos ao ambiente tem levado à introdução de novos produtos e novas tecnologias mais "verdes".
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O mesmo se passa com a procura de novas fontes de energia e com tecnologias menos nocivas e mais eficientes energeticamente. O que falta saber é se esta alteração dos hábitos de consumo e de investimento terá um impacto real sobre a sustentatibidade do meio ambiente. Em relação às alterações climáticas, a resposta é provavelmente negativa. É por isso que ainda existe espaço para o Estado intervir, quer a nível legislativo, quer a nível da introdução de incentivos que facilitem a transição para uma economia mais "verde". E é por isso que ainda existe espaço para o debate (que será aqui continuado em posts futuros).

15 fevereiro 2008

AVALIAÇÃO DOS PROFESSORES (3) _ COMENTÁRIOS DOS LEITORES

O Rolando Almeida, filósofo e professor no ensino secundário, tem a seguinte opinião sobre as avaliações:
"Aproveito para deixar uma dica: o mesmo Ministério que pretende avaliar os professores, é também aquele que promove um sistema de ensino com o minímo de exames para os alunos. Ora, o exame nacional para os alunos é simultaneamente um dos melhores instrumentos para avaliar simultaneamente o aluno e o trabalho do professor e de uma forma muito simples: vamos supor que eu tenho 4 turmas que vão a exame final. Se nas 4 turmas tiver um desnivelamento de notas de frequencia e de exmame numa percentagem considerável, há ou não matéria para inquirir o professor sobre o que se passou com o seu trabalho?? O sistema de avaliação proposto pelo Ministério é um poço sem fundo. Não existe nele qualquer factor motivador para a profissão e , mais grave que tudo, é um sistema que desconsidera de forma escandalosa a qualidade do ensino. Porque não propôs o Ministério um sistema de avaliação a ser implementado gradualmente? É que como o pretende fazer só é de esperar um resultado possível: fugas permanentes à lei e trabalho em cima do joelho. De sistema de avaliação de professores, o novo ECD só tem mesmo o nome. Está muito na moda em falar de sistemas de avaliação até para as formigas, mas estou muito céptico da justiça da maior parte dos sistemas de avaliação implementados pelas empresas. E existe ainda um aspecto muito subtil neste ECD imposto pelo Ministério - é que ele pretende, mesmo que falsamente - colmatar as falhas de formação do sistema de ensino superior português, mas não premiando os bons, apenas considerando os mediocres."

14 fevereiro 2008

MEZZOGIORNO OUTRA VEZ

Vários leitores comentaram o post sobre o Mezzogiorno.
A Gi questiona: "E se separássemos o Porto/Minho do restante Norte, este ainda estaria mais estagnado, não é? Seria mesmo uma vergonha. E veríamos a realidade da área do Porto. Porque é que a estatística não os separa?"
A divisão das regiões (as chamadas NUTS) foi feita há duas décadas, quando entrámos para a então CEE e adoptámos os critérios contabilísticos europeus. Porque Portugal é pequeno, achou-se conveniente dividir o país entre o Norte, Centro, Lisboa e Vale do Tejo, Alentejo e Algarve, mais os Açores e a Madeira. Também concordo que teria feito mais sentido separar o Porto do Norte interior (apesar que, feito isso, poderia haver também a tentação de separar o Centro interior e o litoral, etc). Com efeito, não ficaria muito surpreendido se isso acontecesse dentro de uns anos. Alías, já o fizemos. Há uns anos atrás a região lisboeta incluía Lisboa e Vale do Tejo, mas agora não. Porquê? Porque Lisboa tem níveis de vida superiores ao Vale do Tejo e acima, inclusivamente da média europeia. Para não se perderem os subsídios europeus para esta região (os fundos só são atribuídos a regiões com rendimentos por habitante com menos de 75 por cento da média europeia), mudou-se a divisão regional (com permissão e aprovação da própria UE!) e retirou-se o Vale do Tejo da Região Lisboa. Porque não fazer o mesmo com a região nortenha? Penso até que esse artifício contabilístico fazia mais sentido do que retirar umas pequenas áreas da zona lisboeta.
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Um outro leitor diz: "Fico feliz pelo Alentejo não ser a região mais pobre do país como frequentemente é proferido na comunicação social"
Pois não é. E nem é sequer a região menos produtiva do país, contrariamente ao que nos fazem crer as anedotas. O "Mitos" fornece mais dados sobre o assunto.
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O JAM afirma "não vejo motivos para satisfação (naquele quadro do PIB por habitante em % por habitante da UE a 27) sobre a tendência portuguesa desde 2000 até 2005. Parece-me que, em termos gráficos, a tendência é descendente. Penso até que a aparente convergência a 27 (que inclui já o alargamento a leste) não deveria ser tida como uma convergência real por excesso mas sim aparente por defeito"
Tem toda a razão. Entre 2000 e 2004, Portugal divergiu em relação à média europeia. A pequena (pequeníssima, mesmo) convergência que se registou foi somente entre 2004 e 2005. Porque é que a salientei? Porque poderá (esperemos) uma inversão de tendência. Veremos se se mantém. Em relação aos alargamentos, todos estes números incluem 0s 27, antes e depois do alargamento. O Eurostat (o organismo estatístico da UE) tem estatísticas harmonizadas. Quando estes números são apresentados já incluem os países do(s) alargamento(s), antes e depois deles se concretizarem.

13 fevereiro 2008

O EURO E A COMPETITIVIDADE _ PERGUNTAS DOS LEITORES (5)

O António levanta novamente questões muito interessantes neste post. Irei responder à questão das reformas dentro em breve (o mesmo se passa com a pergunta sobre os impostos). Entretanto, o António pergunta:
"Gostava que você comentasse esta cegueira do BCE que parece achar que a economia europeia respira saúde e que está imune à recessão vinda dos USA. Não era sequer preciso a recessão americana para nos preocupar. Basta o elevado valor do Euro para permitir antever a curto prazo enormes dificuldades à economia europeia por perca de competitividade. Será que pode haver tanta miopia? Não se esqueça. Eu, pobre António declaro que vamos levar com uma valentíssima crise. Pode vir ao retardador. Mais vai ser do tipo pegajoso. Tipo alcatrão."
Como expliquei em parte neste post, o problema da inacção do BCE (Banco Central Europeu) resulta em parte do seu próprio mandato. Segundo os seus estatutos, o BCE tem só uma obrigação: a estabilidade dos preços. Nada mais. Contrariamente, a Fed tem dois mandatos, a estabilidade dos preços e obom funcionamento da economia. Quando existe uma crise na economia americana, a Fed pode e deve intervir. Quando existe uma crise na Eurolândia, o BCE não tem obrigação de o fazer. Principalmente quando a inflação não está completamente sob controlo, como acontece actualmente.
Ora, ao manter as taxas de juro inalteradas, o BCE claramente sabe perfeitamente que o euro vai-se valorizar ainda mais contra o dólar, afectando a competitividade das nossas empresas exportadoras (pois as exportações ficam mais caras). Porque é que o BCE não se interessa? Porque um euro forte significa importações menos caras, e assim as economias europeias importam o petróleo mais barato. Como o preço ouro negro tem estado muito elevado e como os preços dos produtos petrolíferos têm um grande impacto sobre a inflação de qualquer economia, um euro mais caro implica petróleo não tão caro e... menores pressões inflacionistas. E é só isso que o BCE se preocupa. Para bem e para mal.

10 fevereiro 2008

JUROS E O EURO _ PERGUNTAS DOS LEITORES (4)

O Sérgio Leal pergunta: "Esta conjuntura, especialmente com a valorização do euro, nao quer dizer que o banco central europeu vai ter que necessariamente baixar a taxa de juros de modo a poder competir nos mercados internacionais? como é que a Mercedes e a BMW vão vender nos Estados Unidos? Será que os mercados asiaticos vão ajudar a conter a crise? Serão estes mercados neste momento fortes o suficiente para ajudar as exportacoes europeias?"
Se os europeus querem que o euro páre de se valorizar é preciso fazer com que o diferencial das taxas de juros entre os Estados Unidos e a Europa deixe de aumentar. Como a tendência dos Estados Unidos é de descida, as taxas de juro europeias têm que baixar para que o euro estabilize. Será que isso irá acontecer? Provavelmente. No entanto, é também provável que as taxas de juro europeias não baixem tão rapidamente como as americanas. Porquê? Porque existem alguns indícios de um aumento da inflação na Europa e por causa do próprio mandato do Banco Central Europeu. O BCE tem como responsabilidade somente a estabilidade dos preços. Contrariamente à Fed, nada no mandato do BCE exige que o banco europeu se preocupe com a economia real, só com a subida dos preços. E assim não é de esperar que o BCE se preocupe em demasia com a evolução das exportações europeias.
O que é que os europeus podem fazer? Sem dúvida que parte da resposta das empresas europeias à subida do euro tem que passar por uma diversificação dos mercados. E sem dúvida que a evolução das economias asiáticas é fundamental para diminuir o impacto de uma possível recessão na economia americana.