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sábado, 14 de abril de 2012

Gaibéus - Alves Redol


É um prazer enorme reler um livro destes, quase trinta anos depois de o ter feito pela primeira vez.
É isto o neo-realismo, estilo do qual Gaibéus é um dos maiores estandartes. Numa palavra, neo-realismo é a verdade. Nua e crua. As condições de vida e os dramas dos mais pobres, de uma população esquecida pelo poder político da época, que, aparentemente, se limitava a sobreviver. E digo “aparentemente” porque Gaibéus mostra-nos de forma clara uma alma enorme que ultrapassa as limitações da vida e das condições materiais da existência.
Alves Redol foi, sem dúvida, um dos maiores escritores portugueses do século XX; a sua escrita é límpida, clara, visual. A sua escrita foi uma voz de revolta, uma voz de denúncia mas também e acima de tudo, uma voz de solidariedade. A criação artística, brilhante aliás, aqui não é mais do que uma arma ao serviço da justiça social pela qual tanto lutaram os grandes escritores deste tempo (meados do século XX, em plena ditadura salazarista). Muito se tem escrito sobre as intenções políticas destes escritores (Alves Redol, Soeiro Pereira Gomes, Carlos de Oliveira, etc.). No entanto, há aqui algo mais nobre do que a política e até do que a própria arte: a solidariedade. Se Redol foi comunista isso é o que menos interessa: foi um enorme escritor e um enorme ser humano.
Neste livro descrevem-se com invulgar sentimento as vidas dos camponeses sazonais nas lezírias, vítimas de exploração por parte dos grandes latifundiários da região; no entanto, a mensagem de Redol não vai apenas no sentido de acusar esses exploradores; ele faz nesta obra um apelo à única via possível para resolver o problema: a união entre os trabalhadores, tantas vezes impedida pelas rivalidades entre grupos. A união faz a força; a solidariedade é indispensável para combater a exploração por essa desunião convém a quem vive da exploração.
Fácil é concluir que um livro destes só pode ter sido uma bandeira de todos aqueles que sofreram com a ditadura. Independentemente da política partidária; isso pouco interessa. Gaibéus foi um dos livros mais importantes do século XX português.

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Constantino Guardador de Vacas e de Sonhos - Alves Redol

Constantino Guardador de Vacas e de Sonhos é um livrinho ingénuo, puro, transparente, apaixonado. Alves Redol, um dos maiores vultos da literatura portuguesa do século XX apresenta-nos aqui um dos exemplares mais puros do neo-realismo português, no seu estado mais puro e naif.
Constantino é um menino como qualquer outro. Frequenta a escola primária, é inteligente mas prefere contar ninhos em vez de saber de cor os afluentes do Mondego ou do Guadiana. O único afluente que lhe interessa é o Trancão, que no seu sonho o levará ao Tejo e ao grande Mar. Constantino guarda vacas como quem guarda sonhos, transportando-os numa alma risonha que encara o futuro com aquela nuvem de sonhos que só a infância nos pode oferecer.
Para quem, como eu, cresceu no campo, ler este livrinho é uma bela viagem à infância; ou melhor, ao que de mais belo tem a infância no campo: os ninhos que se contam e cujo segredo se guarda como tesouro, o trepar às árvores como quem do alto vê o futuro, as aventuras no rio onde se aprende a nadar à custa de sustos e goladas de água, as travessuras nos quintais e, acima de tudo, aquele viver irmanado com a natureza, com os pássaros, as plantas, os animais domésticos, etc.
Nem a impiedosa palmatória, nem as más condições da vida no campo, impediam Constantino de ser feliz. Porquê? Porque ele tinha um sonho. Não interessa se o realizou; não interessa sequer se era realizável; o importante é que o guardou. Assim, por detrás de uma narrativa aparentemente ingénua, Alves Redol transmite-nos uma mensagem que devemos reter e recordar sempre: o sonho é que nos guia; o sonho é que nos faz viver.
Em resumo, um livrinho imperdível, de leitura muito agradável, numa linguagem simples do povo que somos nós; um testemunho cristalino das raízes mais profundas de onde todos nascemos: da terra-mãe.