O filme «127 Hours» [2010], de Danny Boyle, relata a história verídica de Aron Ralston que, em 2003, ficou preso com um braço esmagado num desfiladeiro no fundo do Blue John Canyon, depois da derrocada de uma rocha.
A dado passo, voltado para uma câmara de filmar que levava consigo, Aron diz estas palavras: «Esta pedra esteve à minha espera toda a minha vida. E toda a vida dela. Não é incrível? Desde que era só um pedaço de meteorito há um milhão de biliões de anos. Lá no Espaço. Tem estado à espera. Para aterrar aqui. Precisamente aqui. E eu, eu tenho caminhado em direcção a ela toda a minha vida. O meu ADN trouxe-me direitinho até aqui. Desde o minuto em que nasci. Todas as vezes que respirei, todas as acções que empreendi foram-me trazendo a isto. A esta pequena fissura na crosta da Terra. A esta pedra. Cósmico. Incrível. Deslumbrante.».
Nunca fui muito receptiva à ideia de que a nossa existência está predeterminada. No entanto, confesso que, às vezes, dou por mim a pensar que o que me acontece tinha mesmo de me acontecer. É como se sentisse que algumas alegrias e alguns tormentos - especialmente alguns tormentos - me estavam reservados para que, através deles, possa empreender as necessárias batalhas que me tornarão mais forte, mais independente, mais matura, mais Mulher.
Defendo que as lágrimas são tão indispensáveis a uma vida plena como os sorrisos. O bom reforça-nos, solidifica-nos, impulsiona-nos, mas é o mau que nos revolve, que nos sacode o corpo e a mente e nos leva a expelir as cargas que vamos colocando sobre os ombros e que tornam a nossa viagem mais lenta.
À medida que vamos criando as nossas estruturas, sabemos que haverá de ser nelas que encontraremos tanto o bom, como o mau. Sabemos, de antemão, que haverá de ser quem nos ama que nos ferirá, que haverá de ser quem tem a nossa confiança que a trairá, que haverá de ser quem cuidamos que nos menosprezará. Os outros, a quem não devotamos e que não nos devotam nenhum destes sentimentos, não têm a virtualidade de o fazer.
Talvez seja por isso que eu sou capaz de pressentir quando alguém haverá de me retirar o tapete: porque uma série de passos - desde a baixa das defesas à concessão de determinado estatuto na minha vida -, ainda que não dados com essa intenção, acabou por conduzir a isso, porque aquela situação esteve toda a vida à minha espera, porque fui eu mesma que, ainda que não soubesse, caminhei para ela, porque aceitei correr os riscos. Do mesmo modo que sou capaz de pressentir quando algo de positivo me está reservado e, contra todas as probabilidades, opiniões alheias, ventos e marés, sei que o conseguirei alcançar.
Não creio que estes acontecimentos sejam inevitáveis, destino, sorte traçada. Prefiro encará-los como consequências. Consequências que talvez nós busquemos, que talvez estejam lá para nós desde sempre. Ou então, é tudo obra do acaso, que também haverá de ter o seu papel a desempenhar no meio de tudo isto. Quem sabe? Creio que é mesmo como diz Aron Ralston em «127 Hours»: «Não, vocês não percebem. Eu sei que não percebem. Mas, para mim, faz sentido. Todo o sentido. Tinham de estar aqui.».
© [m.m. botelho]
A dado passo, voltado para uma câmara de filmar que levava consigo, Aron diz estas palavras: «Esta pedra esteve à minha espera toda a minha vida. E toda a vida dela. Não é incrível? Desde que era só um pedaço de meteorito há um milhão de biliões de anos. Lá no Espaço. Tem estado à espera. Para aterrar aqui. Precisamente aqui. E eu, eu tenho caminhado em direcção a ela toda a minha vida. O meu ADN trouxe-me direitinho até aqui. Desde o minuto em que nasci. Todas as vezes que respirei, todas as acções que empreendi foram-me trazendo a isto. A esta pequena fissura na crosta da Terra. A esta pedra. Cósmico. Incrível. Deslumbrante.».
Nunca fui muito receptiva à ideia de que a nossa existência está predeterminada. No entanto, confesso que, às vezes, dou por mim a pensar que o que me acontece tinha mesmo de me acontecer. É como se sentisse que algumas alegrias e alguns tormentos - especialmente alguns tormentos - me estavam reservados para que, através deles, possa empreender as necessárias batalhas que me tornarão mais forte, mais independente, mais matura, mais Mulher.
Defendo que as lágrimas são tão indispensáveis a uma vida plena como os sorrisos. O bom reforça-nos, solidifica-nos, impulsiona-nos, mas é o mau que nos revolve, que nos sacode o corpo e a mente e nos leva a expelir as cargas que vamos colocando sobre os ombros e que tornam a nossa viagem mais lenta.
À medida que vamos criando as nossas estruturas, sabemos que haverá de ser nelas que encontraremos tanto o bom, como o mau. Sabemos, de antemão, que haverá de ser quem nos ama que nos ferirá, que haverá de ser quem tem a nossa confiança que a trairá, que haverá de ser quem cuidamos que nos menosprezará. Os outros, a quem não devotamos e que não nos devotam nenhum destes sentimentos, não têm a virtualidade de o fazer.
Talvez seja por isso que eu sou capaz de pressentir quando alguém haverá de me retirar o tapete: porque uma série de passos - desde a baixa das defesas à concessão de determinado estatuto na minha vida -, ainda que não dados com essa intenção, acabou por conduzir a isso, porque aquela situação esteve toda a vida à minha espera, porque fui eu mesma que, ainda que não soubesse, caminhei para ela, porque aceitei correr os riscos. Do mesmo modo que sou capaz de pressentir quando algo de positivo me está reservado e, contra todas as probabilidades, opiniões alheias, ventos e marés, sei que o conseguirei alcançar.
Não creio que estes acontecimentos sejam inevitáveis, destino, sorte traçada. Prefiro encará-los como consequências. Consequências que talvez nós busquemos, que talvez estejam lá para nós desde sempre. Ou então, é tudo obra do acaso, que também haverá de ter o seu papel a desempenhar no meio de tudo isto. Quem sabe? Creio que é mesmo como diz Aron Ralston em «127 Hours»: «Não, vocês não percebem. Eu sei que não percebem. Mas, para mim, faz sentido. Todo o sentido. Tinham de estar aqui.».
© [m.m. botelho]