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11.6.12

ainda há muito para colher

Ainda não sei muito bem como vai terminar este meu ano de 2012. Pode ser um ano de concretizações em vários domínios, assim esteja a sorte do meu lado [porque o esforço que me cumpre fazer está a ser feito até à medula], ou pode ser o seu contrário.

Não sou, naturalmente, uma optimista, é verdade. Quando olho para o copo, a minha primeira tentação é vê-lo sempre meio vazio. Porém, porque percebi que isso não me traz vantagem alguma [ao contrário, traz-me algum sofrimento antecipado que, as mais das vezes, é perfeitamente evitável], fui procurando, ao longo da vida, contrariar sempre essa tendência. E consigo fazê-lo de tal modo que, quando dou por mim, estou a meter-me em quinhentas mil coisas em simultâneo e a acreditar piamente que vou fazer todas com o maior sucesso. Embora sinta o nervoso miudinho, acredito sempre que sou capaz e faço-me à vida. Umas vezes correu tudo bem, outras vezes só algumas coisas deram certo.

Até ao momento em que comecei a achar que não seria capaz de ultrapassar determinado obstáculo e em que alguém me confrontou com um visionamento das minhas conquistas numa espécie de "rewind" da minha vida, nunca vi isto de contrariar o meu cepticismo intrínseco como uma capacidade. Achava que o fazia porque era suposto, porque «quem não trabuca não manduca» e é preciso encarar os desafios de frente se queremos alcançar os objectivos que traçámos quando eles não são fáceis. Todavia, não é assim. Na realidade, contrariar o meu pessimismo é mais do que uma forma de estar "porque é suposto". É, verdadeiramente, uma valência que eu tenho e que posso utilizar em todos os campos da minha vida.

Nem sempre consigo fazê-lo com a mesma leveza. Há dias em que avançar contra o vento me retira do corpo pedaços de carne, me extenua, me obriga a «fazer das tripas coração» e quase me faz parar. E há dias em que essas "feridas" e esse cansaço são sentidos, mas não me derrubam e me permitem, apesar de tudo, avançar.

Não há um dia da minha vida em que, desde há uns tempos largos [falo de anos], eu não tenha consciência disto e não me aperceba exactamente de quando tenho de contrariar o meu pessimismo. Este é um dos anversos de ter metas, sei-o. Sei-o porque sempre vivi tendo propósitos, sabendo por que é que era preciso sair da cama todos os dias, mesmo quando os dias eram garantidamente cinzentos. E não houve um dia em que eu tenha ficado na cama, fosse qual fosse a cor do meu céu.

[Admito que, antes de o poder afirmar, tive de passar a minha vida a pente fino, por não querer correr o risco de fazer uma afirmação falsa. Sei que é verdade o que digo: não houve mesmo um dia em que eu tenha ficado na cama.]

Eu não posso - nem quero - queixar-me de nada. Tive alguns momentos na vida em que a sorte não me acompanhou, mas acredito que isso era o necessário para fazer de mim a pessoa que sou hoje. Acredito que as partidas que a vida nos prega servem para fazer de nós pessoas melhores, se quisermos aprender as lições. Acredito que mesmo o pior que nos sucede encerra a virtude de nos recordar, por um lado, que não devemos permitir que volte a suceder-nos e, por outro, que lhe sobrevivemos. Tudo isto se traduz numa série de "vitórias", umas pequeninas, outras enormes, que cada um vai amealhando. Superar uma "derrota" é uma "vitória", tal como superar uma perda é um ganho. Se quisermos.

Quando me olho ao espelho não me deslumbro com o que vejo. Vejo, tão-somente, alguém que chegou até onde eu estou inteira e sem mazelas de maior. Sei que as minhas grandes "derrotas" ainda estão por vir e não tenho a certeza de que lhes sobreviverei inteira, como até aqui. Não tenho a certeza, mas tenho a esperança, porque sei que tenho as valências necessárias para, pelo menos, lhes fazer frente. E também porque não estou e não me parece que alguma vez vá ficar sozinha na minha vida. Tenho o privilégio de ter nela gente maravilhosa, pessoas que me incentivam, que me ajudam, que me reforçam. Uma mão cheia de pessoas decentes com quem me cruzei por laços de sangue ou mero acaso, que já me deram provas mais do que suficientes, em momentos em que poderiam ter dado provas do oposto, de que são isso mesmo que lhes chamei: pessoas decentes.

Não sei se vou concretizar todos os objectivos que tracei para este ano de 2012, mas sei que vou lutar por eles com todas as minhas forças. Não sei, ainda, como terminará este ano, mas tenho esperança de que termine exactamente como imaginei e me estou a empenhar para que suceda. Olho para as "barreiras" que tenho de saltar nesta corrida e "tiro-lhes as medidas". Olho para as minhas pernas e acredito que terão a destreza necessária para se elevarem acima delas. "Treino" todos os dias para que assim seja.

A vida pode ser objecto de um sem número de metáforas, mas todas elas têm de contemplar o bom e o mau. E se eu já ganhei tantas medalhas, por que raio haverei de pensar que não serei capaz de ganhar mais umas quantas neste ano de 2012? «Até ao lavar dos cestos, é vindima», disseram-me uma vez, num momento de grande desânimo. Pois bem: ainda há muito para colher.

© [m.m. botelho]

9.12.11

amargo de boca

Abomino gente mentirosa. Considero aberrante gente que eterniza situações com trotes, que prolonga coisas que podiam estar esclarecidas há séculos desde que a verdade, por muito que envergonhasse, fosse admitida. Cada um assumia a sua quota de responsabilidade, pagava os encargos que lhe incumbissem e ia à sua vida.

A mentira corrói, destrói as relações - ou o pouco que resta delas - e afasta definitiva e irremediavelmente as pessoas.

A maior parte das vezes, prolongar estas situações é não só desnecessário como contraproducente. Do pouco que podia aproveitar-se, fica nada. E o nada é quase sempre sinónimo de amargo de boca para os que ainda dão para esse peditório.

Não é o meu caso. Felizmente, já não é o meu caso.

© [m.m. botelho]

19.11.11

o que para uns é evidente, para outros é insondável

«S
ó não perde amigos
quem não se interessa pelas amizades».
Escrito pelo perspicaz Eremita no «Ouriquense».

Uma questão de sensibilidade. E de bom-senso, claro.

© [m.m. botelho]

17.10.11

promessas, juras e decisões

Há um povo, não sei se os ingleses, se os americanos, não faço ideia, que tem um ditado popular ou algo do género que, traduzido, diz assim: «Não faças promessas quando estás feliz, nem juras quanto estás zangado».

Há uns dias, ao telefone, a meio de uma conversa comigo, a minha Amiga J. disse-me: «Amanhã é outro dia e depois pensas nisso melhor. Não decidas nada à noite». Imediatamente, lembrei-me da tal frase supra citada e disse à J. que, graças a ela e porque achava que me tinha dado um belíssimo conselho, passaria a dizer a frase assim: «Não faças promessas quando estás feliz, juras quando estás zangado, nem tomes decisões à noite».

Não tomei. E no dia seguinte voltei a pensar sobre o assunto e as coisas acabaram por se resolver por elas mesmas. Ainda bem que atendi ao que me disse a J., mas isso é o que menos importa. O que mais importa é que eu sou sortuda o suficiente para ter na minha vida quem me diga frases como a que a J. me disse, sortuda o suficiente para ter quem me escute e pense comigo sobre as coisas que me inquietam.

O conselho foi-me útil. Fica aqui, para quem o quiser usar.

© [m.m. botelho]

27.9.11

«dança dos desacomodados»

Extraordinária, a capacidade que todos temos de empurrar para cima dos outros a responsabilidade pelas situações que nós mesmos criámos com os nossos comportamentos ou as nossas palavras. Já sei disto (aprendi), mas não cesso de me espantar com a frequência com que acontece e com o facto de acontecer a toda a gente.

Claro que chegar à conclusão que fomos nós e não o outro quem criou a situação é o passo n.º 1 (o mais complexo e também o mais difícil) na tomada de consciência de que a responsabilidade pela criação da situação é nossa e não do parceiro de modo a, quem sabe, tentar contrariar essa tendência tão frequente e tão comum nas relações humanas.

Chamo a este processo «dança dos desacomodados». Porque houve dias em que também eu fui muito comodista e, mesmo sem grande jeito para a bola, às vezes lá caía na tentação de "chutar para canto", que é como quem diz, de pôr a responsabilidade das situações criadas por mim nos ombros do outro. Depois isso começou a incomodar-me e eu aprendi que, das duas uma: ou se é desacomodado ou não se aprende a viver.

Há que dançar esta dança, nem que para isso seja necessário ir ter umas aulas com um bom instrutor. Há que fazê-lo, há que aprender, porque quem tira as maiores vantagens desse passo acertado somos nós mesmos.

© [m.m. botelho]

23.3.08

encontros acidentais

Não soubesse eu ver-te tão transparente
E teria sido apenas
Um encontro acidental
Uma simples vertigem
Dum desporto radical


Carlos Tê, Competência Para Amar

A maior parte das pessoas que acabam por fazer parte da nossa vida entram-nos pela porta dentro sem que dêmos conta. Os dias sucedem-se e, com eles, mais ou menos encontros, quase sempre acidentais. Os grandes amigos, aqueles que guardamos no peito, que resguardamos como peças preciosas ou jardins ocultos onde só nós queremos ser senhores do privilégio de entrada, vieram até nós, as mais das vezes, trazidos pelas vagas do acaso. Os cenários são do mais improvável que a imaginação humana consegue idealizar: mesas de café, semáforos fechados, manifestações de protesto, encontrões em passeios apinhados, aulas absolutamente desinteressantes, casamentos de família e – porque não? – a Internet. E eis senão quando a ponte está lançada, o novelo de lã atirado para o lado de lá e as conversas vão fluindo naturalmente como um longo cachecol que um dia, predizemos, haveremos de usar quando o Inverno for rigoroso cá para os lados da Península Ibérica.

Os encontros acidentais costumam produzir melhores efeitos do que os pormenorizadamente preparados. A quem é que nunca sucedeu conhecer uma pessoa especialíssima – viríamos a descobri-lo mais tarde – num «bad hair day» ou naquele exacto dia em que o almoço deixou como vestígio inocultável uma gigantesca nódoa de vinho na camisa? E, ainda assim, foi precisamente porque tínhamos os cabelos em desalinho ou parecíamos crianças de cinco anos a quem a mãe se esqueceu de pôr o babete que essa pessoa fixou os olhos em nós, nos sorriu e, solícita, se propôs resgatar-nos às gargalhadas mundanas que destruiriam para sempre o nosso ego, convidando-nos para bebermos um copo mais logo, depois do jantar. E depois do copo, novamente, a história do novelo de lã e do cachecol.

As amizades especiais nascem, inúmeras vezes, assim, de encontros acidentais que não esperávamos, nos quais não acreditávamos e que jurávamos a pés juntos serem coisa de argumento "hollywoodesco" ou telenovela da tarde. A verdade é que a vida é, frequentemente, assim mesmo, um guião que não lemos, uma prova para a qual não estávamos preparados, um imenso ponto de interrogação diante dos olhos para o qual não temos resposta porque nem sequer estamos certos de que percebemos bem a pergunta. E, às vezes, com a dose exacta de fortuna e, quem sabe, a conjugação certa de algo que nem sabemos que existe, os resultados são os melhores. Resta a cada um de nós, felizes destinatários da oportunidade que o imprevisto nos deu, fazer bom uso disso.

[Também publicado em PNETcrónicas.]

© Marta Madalena Botelho

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