© Wulffmorgenthaler [15.12.2009]
Com o aproximar do final do ano é comum serem publicadas em blogues listas de tudo e mais alguma coisa. As mais comuns são as listas de concertos, filmes e livros do ano, uma espécie de estatuição dos autores dos blogues onde afirmam as suas eleições e, simultaneamente, sem pudor exibem a sua necessidade de evidenciar o quão eruditos e culturalmente actualizados são, antes de tudo o resto que posso admitir motive a publicação de posts do género. Sem rodeios e sem ironia: todos os bloggers são narcisistas e ser blogger e admiti-lo é um bom começo.
Não me parece que venha algum mal ao mundo por se mencionarem concertos, filmes e livros em blogues, sendo até muito útil. Foram muitas as vezes em que um filme ou um livro me escaparam e nos blogues encontrei a referência que mo revelou. O que já me parece absolutamente dispensável é a hierarquização desses itens e por vários motivos. Em primeiro lugar, porque a ordenação das listas corresponde sempre a critérios subjectivos, estabelecidos pelo autor do blogue e, regra geral, não partilhados com os leitores. Depois, porque me parece descabido comparar livros escritos em registos completamente diferentes, como por exemplo, policiais e poesia, tal como me parece descabido comparar concertos de registos tão díspares como, por exemplo, Nitin Sawhney no Coliseu dos Recreios e Daniel Barenboim no Grande Auditório da Gulbenkian. Por outro lado, não vejo qualquer utilidade em hierarquizar o produto da criação cultural a não ser em dois títulos: o bom e o mau, o recomendável e o evitável - ainda que essa classificação possa ter uma generosa dose de subjectividade, também.
É frequente ler comentários no espaços de crítica dos jornais onde os leitores discordam da apreciação feita pelo crítico. Provavelmente, isto sucede porque os critérios do crítico e do leitor são bastante diferentes. Todavia, a crítica tem sentido como apreciação da obra, o que já não me parece suceder com a hierarquização.
A verdade, porém, é que o mundo dito cultural está organizado em listas. É assim, desde logo, para a atribuição de prémios. O que importa é que cada um de nós não fique refém dessas classificações organizadas e possa apreciar, por exemplo, uma película que nem sequer foi nomeada para os Bafta Awards com o mesmo deleite com que aprecia o vencedor da categoria de melhor filme. E quando digo apreciar, refiro-me a apreciar por si, pelos seus critérios, pelos seus gostos pessoais, pelos seus próprios interesses, que são certamente tão diversificados como as folhas de um choupo.
Pela minha parte, não perco um minuto a classificar e hierarquizar o que vi, li e ouvi. Destrinço o bom do mau, para repetir (às vezes, muito) o primeiro e evitar o segundo. De resto, guardo para mim a recordação do que senti quando usufruí de cada um dos momentos que esses filmes, concertos e livros me proporcionaram, com a consciência de que cada um deles foi diferente, desde logo porque eu também não sou a mesma a todo o tempo. Do mesmo modo, não dou grande importância às listas que são publicadas, embora respeite as escolhas. O que eu não consigo mesmo é ver nelas utilidade e razão de ser.
© Marta Madalena Botelho
Não me parece que venha algum mal ao mundo por se mencionarem concertos, filmes e livros em blogues, sendo até muito útil. Foram muitas as vezes em que um filme ou um livro me escaparam e nos blogues encontrei a referência que mo revelou. O que já me parece absolutamente dispensável é a hierarquização desses itens e por vários motivos. Em primeiro lugar, porque a ordenação das listas corresponde sempre a critérios subjectivos, estabelecidos pelo autor do blogue e, regra geral, não partilhados com os leitores. Depois, porque me parece descabido comparar livros escritos em registos completamente diferentes, como por exemplo, policiais e poesia, tal como me parece descabido comparar concertos de registos tão díspares como, por exemplo, Nitin Sawhney no Coliseu dos Recreios e Daniel Barenboim no Grande Auditório da Gulbenkian. Por outro lado, não vejo qualquer utilidade em hierarquizar o produto da criação cultural a não ser em dois títulos: o bom e o mau, o recomendável e o evitável - ainda que essa classificação possa ter uma generosa dose de subjectividade, também.
É frequente ler comentários no espaços de crítica dos jornais onde os leitores discordam da apreciação feita pelo crítico. Provavelmente, isto sucede porque os critérios do crítico e do leitor são bastante diferentes. Todavia, a crítica tem sentido como apreciação da obra, o que já não me parece suceder com a hierarquização.
A verdade, porém, é que o mundo dito cultural está organizado em listas. É assim, desde logo, para a atribuição de prémios. O que importa é que cada um de nós não fique refém dessas classificações organizadas e possa apreciar, por exemplo, uma película que nem sequer foi nomeada para os Bafta Awards com o mesmo deleite com que aprecia o vencedor da categoria de melhor filme. E quando digo apreciar, refiro-me a apreciar por si, pelos seus critérios, pelos seus gostos pessoais, pelos seus próprios interesses, que são certamente tão diversificados como as folhas de um choupo.
Pela minha parte, não perco um minuto a classificar e hierarquizar o que vi, li e ouvi. Destrinço o bom do mau, para repetir (às vezes, muito) o primeiro e evitar o segundo. De resto, guardo para mim a recordação do que senti quando usufruí de cada um dos momentos que esses filmes, concertos e livros me proporcionaram, com a consciência de que cada um deles foi diferente, desde logo porque eu também não sou a mesma a todo o tempo. Do mesmo modo, não dou grande importância às listas que são publicadas, embora respeite as escolhas. O que eu não consigo mesmo é ver nelas utilidade e razão de ser.
© Marta Madalena Botelho