Segundo o
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Gabriela Canavilhas, Pianista de causas
Posted: 23 Oct 2009 08:30 AM
A pianista e gestora cultural Gabriela Canavilhas será a partir de segunda feira, dia 26, a nova ministra da Cultura. Quando estava à frente da Associação Música - Educação e Cultura, entidade que gere a Orquestra Metropolitana de Lisboa o JL traçou-lhe o perfil que agora aqui republicamos.
É uma das mais talentosas pianistas portuguesas. Apaixonou-se pela obra de Schubert, mas foi a tocar música de câmara de compositores portugueses que fez escola. Depois de ter editado sete álbuns e passado por muitos palcos nacionais e internacionais, aceitou, em 2003, ficar à frente dos destinos da Associação Música – Educação e Cultura, que gere a Orquestra Metropolitana de Lisboa (OML). Gabriela Canavilhas, 46 anos, é uma pianista de causas. Acredita que os artistas têm um papel social importante e sempre o tomou nas mãos ao defender as obras de compositores portugueses. Na OML quer subir a fasquia e conta ao JL os planos para o futuro
Foi o cheiro do primeiro piano em que tocou que lhe guiou os passos. O perfume ficou-lhe colado à pele, à memória e ao coração. Hoje, sempre que pensa nas notas de uma partitura, inspira, e recorda o aroma desse instrumento «antigo, preto, nobre». Gabriela Canavilhas tinha então 12 anos e acabava de receber a sua primeira aula no Conservatório de Ponta Delgada, com a professora Natália Silva. Não começava cedo. «Nos Açores, ter uma formação musical não era tão vulgar quanto isso. Mas tive pais atentos que resolveram pôr-me a estudar.» Podia ter sido apenas um complemento da sua educação, mas acabou por revelar-lhe o verdadeiro talento. Nessa primeira aula, desconhecendo ainda o nome das notas, tocou com a professora uma peça a quatro mãos. E a pouco e pouco a linguagem musical foi sendo cada vez mais fácil de falar – embora reconheça que se tivesse começado mais cedo poderia ter chegado mais longe como instrumentista. «É determinante começar cedo até para moldar o físico ao instrumento. Além disso, as obras que se aprendem nessa altura, ficam consolidadas no corpo de uma forma muito mais intensa do que as que se estudam depois dos 25 anos.»
A adolescência foi um tempo cheio de actividades musicais, mas não só. Com as duas irmãs teve aulas no atelier de uma pintora, onde aprendeu a misturar pigmentos, a preparar telas, a segurar nos pincéis e todas as muitas técnicas da arte. A sua irmã mais velha, hoje poetiza e pintora, «estava ligada a tudo quanto era movimento radical e, sempre que havia algo que fosse um corte na tradição, lá estava ela. E levava as irmãs.» Os pais – pai militar, e mãe professora – a tudo assistiam sem grandes interferências. «Em plenos anos 70, estávamos entregues a nós próprias, com o apoio da família, mas com a liberdade para crescer e conhecer o mundo.» O universo da música começara a tornar-se cada vez mais sério para Gabriela e a irmã mais nova – hoje também pianista, a viver na Noruega – mas, como diz entre risos, «os pais só se aperceberam disso quando começaram a ver o nosso nome nos programas dos concertos.»
Acabado o liceu, sempre com boas notas, partiu da ilha rumo ao Curso Superior de Piano do Conservatório de Lisboa. Tinha 17 anos e a viagem não a assustava. Nascida em Angola – por acaso, durante uma comissão do pai – sempre se sentiu 100% açoriana e por isso herdeira de uma tradição de «cidadãos do mundo». «O facto de vivermos no meio do mar, com laços estreitos com os Estados Unidos e o continente, faz com que estejamos em permanente viagem, o que facilita muito a circulação. Vir estudar para Lisboa foi naturalíssimo», diz com um ligeiríssimo sotaque das ilhas.
À chegada encontrou um verdadeiro mestre: o professor António Menéres Barbosa. «Foi e é um transmissor de uma velha escola de piano que se tem vindo a perder: a da excelência.» Não lhe perdoava nenhum tipo de defeito sempre na busca da perfeição. Foi duro, reconhece, mas muito estimulante. Pois, como Gabriela Canavilhas costuma dizer, «nada é pior do que um artista satisfeito.»
À conversa com as notas
No Conservatório teve também aulas de música de câmara com Olga Pratz, com quem descobriu o prazer de tocar em conjunto. Gabriela Canavilhas fascina-se com o intimismo que se pode atingir nesta «conversa» entre músicos. Cada fala traz algo novo à discussão e o que se bebe de uns e de outros é sempre mais do que nos solos. Nessa «embriaguez» de querer aprender tudo o que se relacionasse com este tipo de música, resolveu partir para Siena e participar nos famosos cursos de Verão da Accademia Musicale Chigiana. Durante três inesquecíveis meses, tocou com músicos do Japão, Coreia, Alemanha ou Austrália, formando vários trios, quartetos, quintetos, num ambiente em que as tradições da Toscânia se misturavam com todas as notas. Saiu de Siena com um diploma de mérito. Depois voltou a Lisboa e acabou o curso. Começou então a sua aprendizagem no palco e surgiram vários convites para participar em diversos agrupamentos de música de câmara. Mas a pianista sempre gostou muito mais do estudo e dos ensaios do que dos concertos propriamente ditos. «Não há nada mais difícil do que subir a um palco e provar, através da linguagem da arte, toda a preparação que foi necessária para chegar ali. Mas quando se reúnem as condições ideais – um bom piano, um público atento, um artista concentrado – podem acontecer momentos verdadeiramente mágicos que compensam o intérprete de todo o esforço.»
Quanto ao repertório, sempre preferiu tocar compositores portugueses. «Acredito que temos obrigação de contribuir para a divulgação dos nossos músicos», afirma convicta. No princípio dos anos 90, quando começou a tocar em público e a gravar – tem sete álbuns editados – houve também o boom dos jovens compositores portugueses, de Eurico Carrapatoso a Sérgio Azevedo, com quem criou boas relações. Aliás, algumas das peças que lhe deram mais prazer tocar foram as que Carrapatoso escreveu para o trio Vocalizos, que a pianista formou com Ana Ferraz e António Costa, e que, entre outros, apresentava também peças de Victorino de Almeida ou Pinho Vargas. Seguiram-se mil actividades, desde concertos em que tocou obras de vários compositores portugueses, a recitais dedicados a Vianna da Mota, Alfredo Keil, Lopes-Graça ou Augusto Machado, e a participações nos mais variados festivais nacionais e internacionais – tocou nos Estados Unidos, Brasil, Itália, Macau ou Alemanha. Na Antena 2 (RDP), ao longo dos anos, participou nos programas O Despertar dos Músicos, A Quatro Mãos, A Força das Coisas e Império dos Sentidos. Fundou ainda o projecto do Festival Música Atlântico, que decorre nos Açores há já nove anos. «Foi uma pedrada no charco que começou a integrar os Açores no roteiro das grandes produções», diz com orgulho. Gosta de colaborar nas actividades da sua terra e chegou mesmo a ser assessora do director regional da Cultura. Aliás, acredita que, com mais ou menos visibilidade, todos temos uma quota-parte de responsabilidade social. «Cada vez tenho mais desprezo pelas pessoas que não se revêem na sociedade em que vivem.»
Subir a fasquia
Foi pela «consciência de serviço público» que, em 2003, resolveu aceitar o convite dirigido pela vereadora da Cultura da Câmara Municipal de Lisboa (CML), para a direcção da Associação Música – Educação e Cultura que gere a Orquestra Metropolitana de Lisboa (OML) e a Orquestra Académica Metropolitana. Precisou de «arrumar a casa» e não foi fácil. A situação financeira que encontrou – após a saída da direcção do maestro Miguel Graça Moura – era «devastadora». Os seus objectivos foram preservar a instituição, assegurar a estabilidade da casa, melhorar a qualidade da orquestra e primordialmente prosseguir o trabalho de formação em simultâneo com divulgação musical e a performance. «Num ano e meio estava consolidado o projecto artístico e recuperado o caminho ascendente da orquestra e das escolas», conta. Mas nesse processo deixou de tocar piano. Os primeiros dois anos foram de tal forma duros que temeu não saber já ler partituras. Concentrou-se na tarefa que tinha em mãos. Pôs o piano em espera e, passados quatro anos, sente que há da parte do presidente da CML, António Costa, «uma vontade política forte de encerrar definitivamente os problemas do passado que se prendiam com questões financeiras.» Por isso aceitou a recondução no cargo – por mais três anos – e espera que políticos e fundadores cumpram as suas promessas. Gabriela Canavilhas pretende cumprir com o que acredita ser a obrigação da instituição: contribuir para o desenvolvimento intelectual e para a exigência do público. «O público tem de ser respeitado e acarinhado. É preciso fazê-lo subir à grande música. Os espectadores merecem que se apresentem mais do que high lighs da música clássica.»
De há dois anos para cá voltou a tocar. E, como nunca perdeu o contacto com os músicos da orquestra e com os maestros convidados, sente que as soluções musicais que hoje encontra lhe surgem naturalmente. Mas onde tudo soa melhor é no seu refúgio em Aviz, no Alentejo. Sabe que precisa de sair do reboliço da cidade e acalmar, ali, no contacto com a natureza. Sentada ao piano de cauda, com vista para o campo, encontra-se consigo própria. Ao fim de semana fica muito tempo a tocar. O marido, militar, não a acompanha a quatro mãos, prefere escutar, e sempre a apoiou em todos os seus passos. A filha, Joana, 23 anos, tocou vários instrumentos mas, embora seja «uma ouvinte atenta», pôs a música de lado para se dedicar ao jornalismo.
Nessas horas que dedica às teclas, Gabriela Canavilhas faz sobretudo escalas técnicas para voltar a treinar os dedos, mas não só. Anda a estudar um pouco de Schumann e uns improvisos de Schubert, o seu compositor preferido. «Tem uma emoção, poesia, intensidade e densidade que me tocam particularmente», explica. Além disso, prepara o concerto de Mozart, K 482 – com que passou no exame final do Conservatório. «Nunca o toquei com uma orquestra», diz com um sorriso na voz. Quem sabe se para o ano?"
(transcrevo com a devida vénia, como se diz...)
toda gira, e ainda por cima excelente pianista!
ah grande Sócrates!
fotos acima: http://dn.sapo.pt/inicio/artes/interior.aspx?content_id=1399625&seccao=M%FAsica
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