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segunda-feira, 28 de agosto de 2017

Romance Histórico | "Café Amargo", de Simonetta Agnello Hornby | Clube do Autor




Crítica por Isabel de Almeida | Crítica Literária | Jornalista | Blogger Literária:

" (...) embora devesse dar prioridade à instrução dos filhos varões em relação à sua adorada filha, encorajava-a a considerar-se igual a qualquer outra pessoa e a fazer-se respeitar, numa realidade em que era impensável as mulheres terem direito a voto."

Café Amargo, da autora Siciliana Simonetta Agnello Hornby é um brilhante romance histórico que nos traça o percurso de vida da protagonista - Maria - uma mulher forte, determinada, e que sempre lutou para conciliar da melhor forma a rígida tradição cultural da Sicília que secundariza o papel da mulher, afastando-a de questões como a cultura ou a política, com a sua mentalidade mais aberta, o seu espírito naturalmente curioso, a sua paixão pela música e pelo conhecimento em várias áreas, fruto dos princípios transmitidos pelo seu progenitor - Ignazio Marra, um Advogado socialista fiel à causa política que abraçou.

A acção vai acompanhando, com detalhes que resultam de um apurado trabalho de investigação documental, três momentos distintos da história da Sicília (e de Itália), o final do Século XIX ( quando se inicia a trama) quando os grandes proprietários começam a ver chegar ao fim o sistema económico feudal que ainda persistia na ilha; a I Guerra Mundial e o pós-guerra, a ascensão do Regime Fascista de Benito Mussolini; a II Guerra Mundial e os violentos bombardeamentos que deixaram um rasto de destruição na Ilha, em especial na bela cidade de Palermo.

A obra é também, assumidamente, uma saga familiar, e reúne um extenso leque de personagens principais e secundárias, apresentando complexidade nestes laços familiares que, também eles, sustentam de forma exímia a intriga e diversos conflitos inerentes ao desenvolvimento da acção, por isso, pareceu-nos bastante pertinente e útil o Índice das personagens principais que a autora inseriu no final da obra (páginas 353 e 354 na edição Portuguesa).

Os Marra, de que é representante o Patriarca Ignazio, são uma família tradicional com modestos recursos económicos, têm quatro filhos: Maria (a nossa protagonista), Filippo, Nicola e Roberto e acolheram no seu seio Giosuè  Sacerdoti (filho de Tonino, um Judeu de Livorno, amigo de Ignazio que faleceu mas antes pediu que este cuidasse do filho), Maricchia e Egle Malon (também acolhidas por caridade). Ignazio casou-se com Titina Tummia (muito mais jovem que ele e originária de uma família nobre que nunca viu com bons olhos esta união matrimonial) e vivem uma sólida relação amorosa que os faz enfrentar juntos todos os obstáculos que vão surgindo, inclusive, o facto de Ignazio, apesar de ser um excelente Advogado, ser muitas vezes ignorado por potenciais clientes devido à sua visão política.

Os Sala são uma família rica e influente, proprietários de minas de Enxofre e de um vasto património, e irão ficar ligados aos Marra através do casamento entre Maria  Marra e Pietro Sala, que se apaixona à primeira vista pela bela jovem que vê pela primeira vês em casa do pai, Ignazio, quando ali se dirigiu para tratar da compra de uma propriedade.

A primeira parte da trama corresponde ao enamoramento de Pietro Sala (um bon vivant, habituado a uma vida luxuosa, a gastos dispendiosos, ao convívio com a alta sociedade Europeia, a coleccionar arte e animais e plantas exóticos), e aqui surge a reflexão sobre a condição da mulher na sociedade ainda feudal da Sicília, Maria que sempre sonhara formar-se e ser professora aceita casar-se com Pietro, um homem mais velho que ela, que não ama, sentindo que, assim, libertará os pais do peso do seu sustento, sendo certo que estava disposta a trabalhar para sustentar os estudos dos irmãos e até de Giosuè (o seu melhor amigo, e que foi criado como se de mais um filho da família se tratasse). 

Giuseppina (Baronesa Tummia, por haver casado com Peppino Tummia, irmão de Titina), Sistina e Graziella ( irmãs de Pietro Sala) nunca aceitam Maria, que consideram inferior socialmente, e que lhes causa inveja devido ao facto de,  por ser uma pessoa bonita, inteligente, naturalmente sensível e bondosa, conquistar as boas graças do Sogro - Vito Sala - e aprender até a lidar com Anna, a sogra que se encontra mentalmente doente, serão firmes oponentes de Maria, a qual sempre irão hostilizar e criticar abertamente, não escondendo o quanto a odeiam.

As personagens mais fortemente modeladas e cuja evolução psicológica e amadurecimento vamos presenciando são precisamente Maria e Giosuè, que virão a descobrir que entre ambos existe uma relação que vai bem mais além da fraternidade, na medida em que viverão um amor sincero, forte, e que irá enfrentar duras provas como a distância física, as convenções sociais ( Maria é ainda uma mulher casada e mãe de família), o horror da II Guerra e o racismo e anti semitismo bem marcantes aos quais Giosuè não passará totalmente incólume,  muito embora comece por se afirmar enquanto Militar e consultor do regime Fascista, a verdade é que tudo mudará na sua vida com o surgimento do anti-semitismo muito por contaminação do regime Nazi, com o qual o Fascismo irá compactuar.

Já Pietro virá a revelar um lado negro, que apenas vai sendo revelado no decurso da trama, e que, curiosamente, dará a Maria a oportunidade de se afirmar como uma mulher forte, lutadora, responsável e merecedora do afecto e apreço do sogro Vito, assumindo o papel de defensora do património dos filhos Anna, Vito e Rita, entrando na gestão directa dos negócios da família, nomeadamente, das Minas de Enxofre.

Especialmente marcante e pungente, duma violência extrema, é o retrato que a autora nos apresenta da vida nas minas de Enxofre, deixando marca indelével na memória do leitor as condições de vida desumanas a que são sujeitos os aprendizes de mineiro, que vêem mesmo a vida encurtada devido a tal facto e que nos mostra uma realidade bastante cruel que resulta de uma visão ainda feudalista da sociedade Siciliana ainda herdeira de outras eras mais recuadas.

A escrita da autora é densa, rica em detalhes, requer concentração na sua leitura, não sendo esta uma obra que aconselhemos a ler de ânimo leve, mas não é, de todo, fastidiosa  esta leitura, é sim envolvente, arrebata-nos a alma, espicaça-nos o pensamento, enriquece-nos o conhecimento e faz-nos pensar na evolução da sociedade, no muito que mudou, e no outro tanto cuja semente permanece adormecida mas assustadoramente pronta a germinar de novo, sendo disto exemplo: o preconceito perante minorias, o racismo, novos tipos de colonialismo (revistos e actualizados e de que podemos considerar um bom exemplo o valor do petróleo), o risco de novos conflitos mundiais (com o perigo acrescido de meios bélicos ainda mais potentes e evoluídos).

O romantismo e a sensualidade também marcam presença, através da belíssima  e marcante e intensa história de amor entre Maria e Giosuè, cabendo destacar a troca epistolar entre ambos durante a II Guerra.

Também importa destacar a extrema riqueza de detalhe com que a autora faz a descrição das paisagens da Sicília, e do interior e vivência quotidiana dos vários núcleos familiares, ao longo dos vários períodos históricos que são percorridos na obra. A riqueza do registo descritivo despertará nos leitores uma nítida imagem mental que, certamente, evoca o nosso imaginário e tem o risco de suscitar o desejo de partir à descoberta dos cenários físicos onde se desenrola a narrativa, fica-nos ao menos o sonho de desvendar Palermo e cada recanto da Sicília ainda desconhecido, ou a revisitar, se for o caso.

Para concluir, é muito interessante analisar a evolução da metáfora pessoal e de narrativa familiar que contém a expressão que dá título ao livro, e que foi traduzida literalmente ( e em boa hora), "café amargo" pode ser caracterizado enquanto o percurso pessoal de amadurecimento e afirmação da alma muito feminina e da determinação, coragem e resiliência de Maria ao longo do seu percurso de vida.

Tudo é perfeito neste livro, de tal forma que intuo que, depois do muito que referi, irei lembrar-me de outros tantos aspectos  que o tornam fascinante e inesquecível, atrevo-me a sugerir uma nova leitura numa viagem a Palermo.


" - O amor à primeira vista, consome-te.(...)"


" Não estou apaixonado por ti, eu vivo de ti...Maria (...)"


Ficha Técnica do Livro:

Título: Café Amargo

Autora: Simonetta Agnello Hornby

Editora: Clube do Autor

Edição: Junho de 2017

Nº de Páginas: 368

Classificação: 5/5 Estrelas


Género: Romance Histórico

quarta-feira, 26 de outubro de 2016

[Histórico] "Os Espiões do Papa", de Mark Riebling [Editorial Presença]


Ficha Técnica:

Título: Os Espiões do Papa

Autor: Mark Riebling

Colecção: Biblioteca do Século

Edição: Outubro de 2016

Editora: Editorial Presença

Nº de Páginas: 424

Nota: O exemplar da obra foi gentilmente cedido pelo editor para artigo de crítica literária.

Saiba mais detalhes sobre a obra AQUI





Crítica por Isabel Alexandra Almeida para o Blog Os Livros Nossos com jornal Nova Gazeta:


O ensaio histórico Os Espiões do Papa, integra a colecção Biblioteca do Século, com chancela Editorial Presença, e reúne todas as características necessárias para se tornar numa obra de referência, sustentada sobre um excelente edifício de  pesquisa de relevantes arquivos e documentos que retratam o ambiente da espionagem e contra-espionagem envolvendo o Vaticano e o Papa Pio XII no decurso da II Guerra Mundial.

Mark Riebling destaca-se pela proeza de ter produzido um ensaio histórico sério, credível, mas que proporciona uma leitura acessível, entusiasmante e que agarra o leitor de forma sólida, ao longo de toda a narrativa, revelando-nos personagens fortes, corajosas e que conquistaram, por direito próprio, o seu lugar na história contemporânea, sendo de destacar Pio XII, que chegou mesmo a ser injustiçado ao ser considerado apoiante do regime Nazi e de Hitler, o que não poderia estar mais longe da verdade, conforme decorre da leitura desta obra.

Assume papel de relevo nesta narrativa Josef Müller, advogado Alemão, um homem carismático, íntegro, destemido e inteligente, que nunca hesitou em arriscar a própria vida em nome dos ideais de liberdade e democracia nos quais acreditava, assumindo o controlo e organização de diversas iniciativas de espionagem, fazendo a ligação entre o Vaticano e as forças religiosas civis e militares que, sob o signo do segredo, procuravam pôr fim à barbárie causada pelo Nazismo. Um protagonista verdadeiramente fascinante, com o qual empatizamos facilmente.

É perceptível ao leitor a posição bastante delicada em que Pio XII se viu colocado, uma vez que agir em nome do Vaticano - um Estado Autónomo - poderia agudizar ainda mais a já visível tensão de uma Europa em Guerra e colocar em risco princípios de Direito Internacional e actuar enquanto figura de proa da Igreja Católica poderia colocar em risco a segurança do Vaticano, perante a ameaça Nazi. Muitas vezes, Pio XII calou perante o mundo a sua dor e a sua revolta perante a perseguição e destruição de milhares de Judeus, é, portanto, um homem humano e solidário  aquele que aqui encontramos, a par do político e diplomata hábil, astucioso e algo frio que tantas vezes a história procurou apresentar.

A leitura desta obra surge como uma verdadeira pedrada no charco em termos daquilo que sempre tivemos por certo acerca deste período negro da história contemporânea da Europa e do mundo. Por vezes, os factos históricos, tal como nos são transmitidos inicialmente, dão azo a generalizações erróneas. O presente ensaio mostra-nos toda a rede de resistência interna Alemã ao regime Nazi, o apoio discreto mas eficaz do Vaticano a estas acções.

Interessante também são as reflexões no âmbito da filosofia política e religiosa que permitiram a estes homens justificar perante o mundo e perante as próprias consciências a eventual necessidade de cometimento de tiranicídio na pessoa de Hitler.

Com a estrutura própria de uma obra de ficção, onde nem sequer falta uma elevada dose de permanente suspense, perigo e intriga, heróis e vilões, justiça e injustiça, tudo em crescendo até ao desenlace final, num ritmo e envolvência verdadeiramente arrebatadores.

Brilhante, assente numa sólida base de pesquisa, e bastante revelador. Indispensável para quem goste de história.


terça-feira, 29 de março de 2016

[Histórico] " A Vingança dos Tudor", de C. W. Gortner [Topseller]

Ficha Técnica:

Título: A Vingança dos Tudor


Autor: C. W. Gortner


Edição: Fevereiro de 2016


Editora: Topseller [Grupo 20/20]


Páginas: 304

Classificação atribuída no GooReads: 5/5


Género: Romance Histórico/Época Tudor




[Sinopse]:

Em 1558, após a morte da Rainha Maria, Isabel Tudor ascende ao trono.

Brendan Prescott, o espião privado de Isabel, é chamado à corte inglesa, depois de um exílio de quatro anos na Suíça. A rainha incumbe-o então de investigar o desaparecimento de uma das suas aias, Lady Parry, que tinha ido visitar a família a uma aldeia distante e nunca mais foi vista.

Ao chegar ao destino, e após conhecer os familiares de Lady Perry, Prescott apercebe-se de que estes escondem um segredo que poderá pôr fim ao reinado de Isabel. O desenrolar dos acontecimentos leva-o também a ter a certeza de que alguém se quer vingar. Resta saber se o alvo da vingança é Isabel ou ele próprio.

Numa atmosfera repleta de segredos, Prescott lutará até ao fim para cumprir a sua missão, procurando nunca pôr em causa aquilo por que sempre lutou: a sua lealdade à rainha. 


Crítica por Isabel Alexandra Almeida para o Blogue Os Livros Nossos:


A Vingança dos Tudor, de C. W. Gortner, é um romance histórico cuja acção decorre em 1558, durante os preliminares do Reinado de Isabel I [filha de Henrique VIII e Ana Bolena], onde voltamos a encontrar Brendan Prescott, o fiel espião ao serviço de Isabel, que é retirado do exílio forçado em Basileia por exigência real, tendo por incumbência descobrir o paradeiro da Aia preferida da Rainha - Lady Parry.

De volta à Corte, Brendan reencontra o seu amor perdido - Kate Stafford, Aia da rainha - e um dos seus mais ferverosos inimigos - Robert Dudley, um nobre com uma relação algo ambígua mas muito próxima de Isabel I, que não esqueceu a intervenção de Brendan contra a ambição da família Dudley, no passado.

O leitor vê-se mergulhado no clima de intriga, alta tensão, perigo e traição da Corte Tudor, sendo o autor exímio em manter o suspense e o mistério ao virar de cada página.

A narrativa apresenta desta feita dois grandes momentos narrativos, um em Londres, na residência Real de whitehall e na taberna de Shelton [o pai de Brendan] e um segundo momento que decorre numa remota zona rural de Inglaterra - Whitern Sea, na decrépita mansão de Lorde e Lady Vaughan, denominada  Vaughan Hall, onde o nosso herói porá a prova os seus dotes de detective, procurando desvendar o mistério que envolve o desaparecimento da Aia da Rainha, Lady Parry [Tia de Lorde Vaughan].

O livro é rico em contrastes sociais que bastante enriquecem a trama. Em Londres, encontramos o ambiente luxuoso da Corte Isabelina, com todo o fausto e futilidade dos cortesãos interessados em bajular e agradar à futura rainha; mas longe de Whitehall, nos arredores lamaçentos da cidade, encontramos a Taberna de Sheldon e da mulher Nan, num meio onde vivem as camadas mais pobres da sociedade, onde é visível o abuso de álcool, a prostituição e a luta diária pela sobrevivência.

Por sua vez, em Vaughan Hall encontramos uma família nobre que atravessa dificuldades financeiras, que sofreu a recente perda do seu jovem herdeiro, vítima de febres, e que esconde obscuros segredos, onde nada nem ninguém é, afinal, o que pareceria ser, numa primeira análise.

Facilmente sentimos empatia por Raff, o jovem e maltratado criado da família Vaughan, uma criança especial, que vive num mundo de fantasia, como escape para a dura realidade em que lhe cabe viver.

Um romance histórico bastante rico, onde não faltam segredos, vingança, acção, perigo, e a inteligência de Brendan, como a sua maior aliada para solucionar o enigma que lhe coube em sorte, em mais uma prova da sua devoção a Isabel I.

Também um tom romântico fica assumido na questão: será a lealdade de Brendan à rainha conciliável com o seu amor por Kate? Como distinguir entre aliados e inimigos?  Esta e outras questões estão apenas à distância das páginas deste livro de leitura deveras envolvente.




quarta-feira, 26 de agosto de 2015

[Histórico] "Aconteceu no Verão", de Beatriz Williams [Asa]

Ficha Técnica:


Título: Aconteceu no Verão


Autora: Beatriz Williams


Editora: Asa [Grupo LeYa]


Edição: 2015


Nº de Páginas: 384


Género: Romance Histórico


Classificação Atribuída no GR: 5/5 Estrelas



Crítica por Isabel Alexandra Almeida para o Blog Os Livros Nossos:


   Aconteceu no Verão é um romance histórico escrito de forma brilhante. A acção decorre nos Estados Unidos, num local ficcionado pela autora, mas baseado num local real e  com referência a uma terrível tempestade que, em plenos anos 30, causou muitas perdas humanas.

  Em Rhode Island, 1938, Lily Dane passa férias na residência estival da família, na companhia dos pais e da sua pequena irmã Kiki, reencontrando-se com fantasmas do seu passado recente, ao ser surpreendida pela chegada  de Budgie Greenwald [em tempos a sua melhor amiga da juventude] e de Nick Greenwald [o grande amor de Lily], um casal que não é bem aceite pela comunidade local, devido ao facto de a sua ligação ter ido contra todas as expectativas, sendo conhecida a paixão entre Lily e Nick.

   A alta sociedade de Nova Iorque reúne-se religiosamente naquela pequena localidade, sendo um local de encontro habitual o Clube de Seaview, onde decorrem jantares, jogos e outros eventos sociais, sob a supervisão apertada da rígida Senhora Hubert, que dita as regras do politicamente correcto e aceitável naquele contexto.

   Lily leva uma existência algo monótona, focada na sua pequena irmã kiki, à qual cuida como se de de uma filha se tratasse, deixando no ar uma ambiguidade quanto à ligação familiar de ambas. A grande confidente de Lily é a sua tia Julie Van der Wahl, uma socialite arrojada, que se notabilizou por alimentar as colunas de escândalos, tendo-se divorciado do Advogado Peter Van der Wahl, e vivendo cada dia intensamente, numa atitude carpe diem e sem dar oportunidade de qualquer interferência no seu modo de vida bastante independente, sendo uma personagem bastante forte e com a qual facilmente empatizamos, por ser bastante directa e frontal na sua abordagem à evidente hipocrisia do meio onde se move.

   Curiosamente, apesar de se ir denotando que algo não ficou totalmente resolvido na relação entre Nick e Lily, estes convivem socialmente e de forma próxima, perante o regresso de Nick e Budgie a Rhode Island, mas é nítido que Budgie é uma mulher bastante instável, fútil e manipuladora, que irá mesmo arrastar a ingénua Lily para uma relação amorosa com Graham Pendleton, um jogador de Basebol que fazia também parte do seu grupo de amigos dos tempos de estudantes.

  Nick é um homem íntegro, honesto, assume compromissos morais, ainda que com tal atitude deixe de ir atrás do que realmente deseja para si mesmo, e para a sua felicidade.

   A pouco e pouco, o leitor vai assistindo ao desenrolar da trama, com diversos segredos e peripécias que se encontram envoltos em suspense, tornando a leitura do livro verdadeiramente compulsiva, numa ânsia em crescendo de desvendar os mistérios que envolvem a vida dos nossos protagonistas.

   A narrativa vai alternando o passado recente [1931] e o presente [1938], dando-nos a perspectiva da evolução das personagens, até ao desenlace final, marcado por momentos de elevadíssima tensão psicológica.

   Incrivelmente romântico, intenso e com um ritmo bastante acelerado, esta obra literária traça-nos um retrato da alta sociedade norte-americana dos anos 30, ainda no rescaldo da crise de 1929, que deixou um amargo rasto de mudança numa prosperidade que tinha algo de muito ilusório, como a história mundial viria a demonstrar, pelo que encontramos a junção perfeita entre ficção e contexto histórico e social, que  se revela verdadeiramente fascinante para os leitores de romances históricos.


   

   

terça-feira, 7 de abril de 2015

[Histórico] " A Herança Bolena", de Philippa Gregory [Planeta]


Ficha Técnica:

Título: A Herança Bolena

Autora: Philippa Gregory

Série: Os Tudor

Editora: Planeta

Edição: Março de 2015

Páginas: 472

P.V.P.: 19,95€

Género: Romance Histórico

Classificação GR atribuída pelo blog: 5/5 estrelas

Crítica para o Blog Os Livros Nossos por: Isabel Alexandra Almeida


   A Herança Bolena, de Philippa Gregory, é um soberbo romance histórico tendo como pano de fundo a vivência no clima de intriga, sensualidade, traição e intricados jogos de poder e política bem presentes na corte de Henrique VIII de Inglaterra, em plena época Tudor.

   Este romance surte perante os olhos do leitor escrito numa perspectiva assumidamente feminina e intimista, e no decurso da leitura vamos assistindo à construção da teia narrativa pela lente de três protagonistas femininas, que assumem também o papel de narradoras participantes.

   Joana Bolena, Viscondessa Rochford, é uma mulher determinada, inteligente e astuta, mas que transporta no seu íntimo o peso de ter desempenhado um papel de relevo na condenação à morte do marido - Jorge Bolena - e da cunhada - Ana Bolena - ambos eliminados por decisão do Rei Henrique VIII. Joana é uma personagem ambígua, permanentemente dividida entre aquilo que sente seria uma conduta adequada e correcta em termos morais e humanos, e as condições que, por vezes, se vê forçada a aceitar em prol da sua própria sobrevivência, ainda que tal implique trair os que estima e ama. Numa sociedade onde os homens de poder tudo controlam e onde as mulheres se vêem forçadas  pelo contexto envolvente a trair família, amigos e aqueles a quem deveriam servir lealmente, Joana acaba por se revelar um peão de peso no xadrez sabia e perversamente planeado pelo seu poderoso tio - Tomás Howard - Duque de Norfolk.

   O Duque de Norfolk assume-se como um dos vilões da trama, é um homem sem escrúpulos, habituado a usar as mulheres da sua família como meros instrumentos para atingir os seus fins de ascensão social e política, sendo próximo do instável e perturbado Henrique VIII.

   Outra protagonista feminina é Catarina Howard, de apenas 14 anos, sobrinha do poderoso Duque de Norfolk, é por este encaminhada para a corte, onde deverá servir como Aia a rainha Ana de Clèves, sendo mais tarde orientada para seduzir o velho rei e tornar-se rainha. Catarina é uma jovem imatura e ambiciosa, mas não muito inteligente. É fútil, licenciosa e vaidosa, tendo mantido relações amorosas ilícitas em casa de sua avó - a Duquesa de Norfolk, a qual não deu à neta uma educação cuidada. Sonha em ascender socialmente e vai sempre avaliando o seu aspecto físico e  os bens que vai adquirindo, nomeadamente, vestidos novos ou jóias. Irá atrair as atenções do Rei Henrique VIII, que fica fascinado com a sua beleza e graciosidade, mas surge uma forte atracção entre Catarina e Thomas Culpepper que poderá deitar a perder os planos de ascensão social da jovem.

  Ana de Cléves, filha do Duque de Cléves, é enviada para contrair matrimónio com Henrique VIII de Inglaterra, de modo a reforçar uma aliança política inicialmente vista como vantajosa para ambas as partes, porém, o casamento revela difícil de consumar, e acabará por chegar a um fim antecipado, sendo-lhe conferido o estatuto de irmã do Rei. Ana é uma jovem doce, bondosa e sofredora. Inicialmente, vê o casamento como uma possível libertação do jugo maldoso do irmão sobre si, mas cedo percebe que a corte Inglesa dos Tudor é um local inóspito, e onde corre risco permanente de cair em desgraça perante o Rei e ser condenada à morte. Vive momentos de puro terror, com receio pela própria vida, mas torna-se amiga leal da enteada Maria, sendo também próxima da enteada Isabel.

  Henrique VIII é um homem perturbado ao nível mental, nega estar envelhecido e ter perdido a beleza e a força da juventude. É instável nos relacionamentos amorosos, imaturo,  facilmente manipulado pelos seus homens de confiança, e capaz de actos extremos de generosidade e crueldade. Da leitura do livro, ficamos na dúvida se estamos perante um vilão, ou se não será também, de algum modo, vítima de circunstâncias que o rodeiam e de uma corte que fervilha de interesses ocultos, traição e intriga política e palaciana.

   A acção decorre entre Julho de 1539 e Janeiro de 1547, no século XVI e denota ter por base uma detalhada e rigorosa pesquisa histórica que muito enriquece o trabalho da autora.

  A linguagem mais e menos formal, os cenários variados, os trajes e rituais e toda a  descrição da vida na corte mostram-se feitos de uma forma que nos transmite uma imagem visual bastante rica. As personagens mostram-se muitíssimo bem construídas e acedemos facilmente ao seu mundo interno ( em termos psicológicos). 

  A nosso ver, a leitura deste romance suscita-nos também reflexões importantes acerca da condição feminina nesta época e contexto históricos. Um fascinante retrato de uma época histórica bastante conturbada.





sexta-feira, 26 de setembro de 2014

[Histórico] "O Segredo dos Tudor", de C. W. Gortner [Topseller]



Autor: C. W. Gortner

Edição: Setembro de 2014

Editora: Topseller [Grupo 20/20]

Páginas: 352

Preço: 20,99€

Género: Romance Histórico

Saiba mais detalhes sobre esta e outras obras AQUI


Crítica por Isabel Alexandra Almeida para o Blog Os Livros Nossos:

   O Segredo dos Tudor é um brilhante romance histórico que nos traça um retrato bastante detalhado e dinâmico da corte do Rei Eduardo VI (filho de Henrique VIII) e do clima de perigo, intriga, traição e lealdade que então se vivia em Inglaterra, decorrendo a acção em 1553, entre Londres e outros locais circundantes.

 O protagonista da trama é Brendon Prescott, um jovem abandonado e acolhido pela poderosa família Dudley, é chamado a assumir as funções de escudeiro de Robert Dudley, em Londres na corte de Eduardo VI, o jovem rei que vive sob o jugo manipulador do seu perverso e astuto conselheiro - João Dudley - Duque de Northumberland - pai de Robert.

 Tendo sido confiado aos cuidados de uma serviçal - a saudosa Dona Alice - Prescott é um jovem culto, tendo desenvolvido o gosto por livros e por novas aprendizagens, embora tenha sido punido por Lady Dudley, a matriarca da família, que nunca escondeu a contrariedade de dar guarida ao jovem órfão.

 Num fascinante retrato da época dos Tudor, iremos assistir ao desenrolar de uma narrativa emotiva, com um excelente ritmo, sendo permanente o suspense e a tensão que agarram  o leitor às páginas do livro, não faltando mistérios, dramas, traições, amores, lealdades que se perdem e que conquistam, e cenas de acção e perigo verdadeiramente arrebatadoras.

  Trata-se de uma época em que tudo se joga, para escolher o sucessor de Eduardo VI, e na corrida para o trono encontram-se pessoas bastante diferentes em termos de personalidade, fé e perspectivas de vida. De um lado, temos Maria Tudor, filha de Catarina de Aragão e de Henrique VIII, criada na fé Católica e defensora do Papa e dos interesses de Roma, que sendo em bom rigor herdeira de uma linha legítima, é amada por uns e detestada por outros, pelo facto de renegar a decisão de seu pai Henrique VIII ao recusar a religião Católica. Maria é uma mulher inteligente, orgulhosa e determinada, mas mostra-se dura e receosa de depositar confiança em que se lhe mostre favorável, pois foi vítima de várias traições e sabe poder ter a sua liberdade e determinação ameaçadas.

   Uma das personagens mais fascinantes do romance, pelo retrato humano que da mesma é traçado, é a Princesa Isabel Tudor (que mais tarde viria a ser rainha de Inglaterra - Isabel I), uma jovem cativante, sedutora embora não seja particularmente bela, deixa marcas em quem a conhece. Corajosa, Isabel arrisca a sua liberdade desafiando os poderosos Dudley, que não hesitam em considerá-la mais um peão no jogo de Xadrez do poder real, e que conspiram para dominar o trono de Inglaterra a seu bel prazer.  Apaixonada por Robert Dudley, ainda assim, não cede totalmente às emoções, deixando que os interesses da Inglaterra se sobreponham aos seus interesses pessoais, encontrará em Prescott um fiel e inesperado aliado num clima de intriga e risco constantes.

 Muitas outras personagens secundárias se movimentam à volta do núcleo mais central de protagonistas, e todas elas desempenham um papel de relevo na economia da narrativa. Desde o jovem Peregrine, um miúdo astuto que se revelará um bom amigo de Prescott, à Duquesa de Suffolk, Lady Jane Grey (filha da Duquesa de Suffolk), Lady Dudley, Guilford Dudley (o filho predilecto de Lady Dudley), Mestre Secretário Cecil, e Kate Stafford (Aia da Princesa Isabel Tudor).

  Com uma linguagem formal, mas acessível, que bem caracteriza a formalidade da época histórica que serve de cenário à acção, C. W. Gortner consegue construir uma fascinante narrativa onde se articulam sabiamente ficção e factos históricos, como se perante os nossos olhos desfilasse um filme de época, e levando os leitores a experienciar cada emoção e a querer desvendar os segredos da peculiar e fascinante família Tudor. 

 O retrato de uma época brilhantemente conseguido pelo autor certamente conquistará muitos adeptos para esta leitura. 

Classificação atribuída no GooReads: 5/5 estrelas








domingo, 19 de janeiro de 2014

[Histórico] "Sonhos de Papel", de Ruta Sepetys [Asa]



Título - Sonhos de Papel

Autora - Ruta Sepetys

Editora - Asa [Grupo LeYa]

Ediçao -  Janeiro de 2014

Páginas - 384

Género - Romance / Romance Histórico

Crítica por Isabel Alexandra Almeida para o Blog Os Livros Nossos:

   Sonhos de Papel, de Ruta Sepetys, é um romance de época, cuja acção decorre nos anos 50, na misteriosa e fascinante Nova Orleães, onde vamos encontrar um núcleo de personagens bastante fortes vivendo uma acção bastante intrincada e que agarra o leitor às páginas do livro, tornando o acto da leitura um prazer verdadeiramente compulsivo.

  Como personagem central temos a jovem Josie Moraine, filha de uma prostituta de luxo - Louise Moraine - que procurando afastar-se da influencia perniciosa da mãe, é acolhida por caridade no prédio de uma livraria do Bairro Francês de Nova Orleães, onde trabalha em troca de alojamento, desenvolvendo uma relação deveras próxima e especial com a leitura, tornando-se esta um espaço de evasão muito seguro e apetecível para esquecer os problemas, pressões e desafios constantes do dia-a-dia.

  Josie não só não encontra na mãe a figura de suporte e protecção que seria expectável e desejável, como a mesma acaba por constituir um perigoso factor de elevado risco para a vida da filha, na medida em que Louise é uma pessoal destituída de inteligência ou escrúpulos, sonhando com um enriquecimento fácil, com uma carreira em Hollywood, e envolvendo-se numa relação amorosa destrutiva com Cincinnati, um criminoso com ligações à Máfia, e que a arrasta para uma vida de maus tratos, sonhos desfeitos e crime.

   Estranhamente, é no mesmo meio onde tudo apontaria para um destino diferente, que Josie encontra bons amigos, que a rodeiam de carinho, apoio e ajuda, e até mesmo protecção num meio inóspito.

  Charles Marlowe, escritor e livreiro, é o dono da livraria Marlowe, que acolheu Josie e a envolveu no mundo dos livros, acabando por ser uma figura paterna.  Willie, a dona do bordel onde Louise trabalhou até partir, acaba por se revelar a grande figura de suporte de Josie, e revela-se uma mulher bondosa, que se esconde sob uma capa de frieza que não passa de uma máscara. Willie é uma personagem bastante forte e verdadeiramente fascinante.

   Cokie, motorista de Willie, é um dos melhores amigos de Josie, acreditando que a jovem conseguirá algo que parece impossível até à própria, e que corresponde à possibilidade de Ingresso no Smith College, uma exclusiva Universidade Feminina de onde já saíram grandes nomes da literatura Universal como Margaret Mitchell - autora de "E Tudo o Vento Levou" - numa época em que se fazia ainda sentir forte segregação social, e uma nítida divisão entre classes sociais, onde nem sempre o mérito seria garantia de sucesso na vida - Josie havia sido uma das melhores alunas do secundário, mas não seria garantida a sua entrada numa Universidade tão exlclusiva, com rígido processo de admissão.

   Na parte alta da cidade vivem os cidadãos abastados, num verdadeiro mundo à parte, e considerando-se superiores a todos os habitantes do turístico e, por vezes, mal afamado, Bairro Francês. A nata da sociedade de Nova Orleães habita em belas mansões na parte alta da cidade, vestem segundo a última tendência da moda, mas levam uma existência fútil e vazia, e os bons pais de família, em alguns casos, frequentam os bordeis do Bairro Francês, ou procuram amantes que os façam sentir-se eternamente jovens e desejáveis. A autora descreve de forma bastante envolvente estes contrastes e hipocrisias da sociedade da época.

   Personagens também importantes, no núcleo que circunda a protagonista, são Patrick Marlowe, filho de Charles, que gere a livraria com Josie, sendo ambos bastante cúmplices, e Jesse - um rapaz simples, que vive com os avós, vende flores e é mecânico, também ele de origens humildes e filho de pais bastante disfuncionais, é amigo de Josie, mas acalenta a esperança de ser algo mais que isso. É terno, honesto e divertido.

   Numa história plena de ternura, duras críticas sociais a uma certa época e uma certa mentalidade muito peculiar, Ruta Sepetys consegue também conferir à história um toque de mistério, com um crime a desvendar, e muitas peripécias e twists irão afectar as vidas das personagens.

   Uma leitura envolvente, que nos transporta facilmente para os ambientes e situações descritos, com personagens que facilmente amamos, protegemos ou detestamos, consoante assumam o papel de heróis ou de vilões. Não nos custa muito imaginar e até antever que possa, num futuro próximo, ser elaborado o argumento de um filme, tendo por base este romance fabuloso e fascinante.

   A devorar num sofá perto de si!


Cotação GR atribuída:5 estrelas





   


terça-feira, 20 de agosto de 2013

[Histórico]" Uma Casa de Família", de Natasha Solomons [ASA]



Título: Uma Casa de Família

Autora: Natasha Solomons

Editora: ASA [Grupo LeYa]

Edição: 2013

Páginas: 416

Género: Romance Histórico


Saiba mais detalhes sobre a obra AQUI


Crítica por Isabel Alexandra Almeida para o Blog Os Livros Nossos:



   Uma Casa de Família, de Natasha Solomons, é um romance histórico por excelência e em todo o seu esplendor.

   A acção tem início em 1938, nas vésperas do terror da II Guerra Mundial, mas num momento em que Viena de Áustria começa a sentir a ameaça sobre a comunidade Judaica. 

  Elise Landau é a mais nova das duas filhas da culta família Landau, destacado elemento da Burguesia Vienense, sendo a mãe Anna, Mezzo Soprano, o pai, Julian um escritor de relevo e algo rebelde, e Margot, a filha mais velha, entretanto casada com Robert (académico).

   Temendo pela integridade física da família, os Landau tomam as necessárias diligências para que Elise encontre refúgio em Inglaterra, onde irá viver numa mansão histórica de uma ilustre família Inglesa, assumindo as duras funções de criada, deparando-se com as dificuldades inerentes a uma mudança radical na sua vida.

   Exilada no período antes da guerra, quando esta é já praticamente inevitável, Elise parte angustiada  para um país cuja língua e a tradição são totalmente diferentes, e indo enfrentar a humilhação de ser tratada numa condição social bastante diversa aquela de que usufruía na terra Natal, onde levava uma existência de algum prestígio e privilégios, com uma vida social bastante animada, e frequentando os mais elevados círculos culturais de Viena.

   Mal dominando o Inglês, Elise enfrenta a hostilidade dos empregados da Mansão Tyneford, nomeadamente do rígido e formal mordomo Senhor Wrexham, a cozinheira e governanta Senhora Ellsworth, encontrando inicialmente apenas algum apoio junto de poucas pessoas na propriedade.

   Com uma lista diária e interminável de tarefas, Elise encontra forças na esperança de conseguir reunir-se com a sua família nos Estados Unidos, para onde seguirão antecipadamente a irmã e o cunhado, bem como os pais Anna e Julian Landau.

   Inesperadamente, a vida quase insuportável de Élise adquire um novo fulgor com a chegada do divertido Kit, o herdeiro da família Rivers, de quem se torna bastante próxima, sendo olhada de lado pelas raparigas da alta sociedade local, que insistem em humilhá-la, bem sabendo que ela se encontra entre dois mundos, não sendo, na verdade, uma criada, nem um membro da nobreza tradicional.

   Numa narrativa de tensão permanente, vamos assistindo ao agudizar do clima político internacional, até que a Inglaterra se veja arrastada para o esforço de guerra, impondo pesados sacrifícios aos seus habitantes, e em simultâneo, vamos acompanhando o percurso de vida de Elise, que acaba por encontrar algum conforto na sua vida de exilada, ganhando o respeito do patrão - o senhor Rivers, fazendo novos amigos, como a alegre Poppy, ou o simpático Will.

   Aquando do seu exílio, Elise é também a fiel depositária do último manuscrito do seu pai, que temendo perder o livro, esconde uma cópia do mesmo no interior de um velho Violino que a jovem leva consigo para solo Britânico.

   Nos momentos de saudade e nostalgia, ou em ocasiões especiais, Elise possuiu como que um talismã que é também uma mensagem de esperança num possível futuro melhor, mas também a peça que simboliza o seu passado familiar e cultural - o belo colar de pérolas que a mãe - Anna - lhe fez chegar escondido na bainha de um vestido.

   Toda a obra se mostra escrita numa linguagem bastante cuidada, sendo mesmo simbólica e poética em alguns excertos. A ternura, o amor, o espírito de sacrifício, a luta pela sobrevivência, os ideais a defender, a lealdade, a solidariedade perante a adversidade, os valores da família e o peso positivo e menos positivo das tradições, são estes os detalhes que bastante enriquecem este romance e o tornam marcante, inesquecível e muito especial.

   Com diversas peripécias, e twists finais que prometem arrebatar e enternecer o leitor, estamos perante uma obra de excelência, plena de pormenores históricos e culturais, mas também, constituindo uma boa lição de vida quanto às dificuldades e desafios que inesperadamente podem fazer-nos mudar de mundo e reaprender a viver, fazendo-nos crescer enquanto seres humanos e testar os nossos limites.

  Dramático, doce e belo, um livro a não perder! Nota Máxima sem hesitação!




quarta-feira, 7 de agosto de 2013

[Secção Criminal] O Estrangulador de Cater Street, de Anne Perry [ASA]


Para mais informações acerca deste livro clique AQUI

Título: O Estrangulador de Cater Street

Autor: Anne Perry

Editora: Asa

Edição: 2013

Páginas: 336



Crítica por Cláudia Lé para o Blog Os Livros Nossos


   Quando a Isabel Alexandra Almeida me perguntou se queria fazer a opinião deste livro, li o título e automaticamente disse que sim no entanto, quando li a sinopse e me apercebi que era um livro de época fiquei com um «pé atrás» mas como já tinha dito que sim e não gosto de ir contra o que digo inicialmente cá o esperei… pior ainda quando na contra capa me dou conta que foi escrito em 1979… uiiiiii pensei, não vou de certo gostar nada do tipo de escrita, será densa, pesada, enfadonha e dada a imensas descrições pomposas… opinião final: A SURPRESA DO ANO!!!

   Adorei o livro, adorei o enredo, adorei a escrita. Se houver continuidade vou querer ler todos, este livro foi uma lufada de ar fresco em comparação com os policiais tradicionais cheios de descrições sanguinolentas, bem como, face aos livros de época tradicionais a meu ver, demasiado eróticos e que já me maçam.

    Anne Perry descreve a sociedade vitoriana de forma nua e crua, com todas as limitações existentes na época no que diz respeito ao politicamente correcto e ao que nem sequer deveria ser pensado, quanto mais falado em alta voz. Uma sociedade para qual as mulheres não passariam de elementos decorativos cujas únicas finalidades seria o pestanejar subtilmente para o futuro marido, casar, ter filhos, tomar conta da casa e aceder a todas as opiniões do excelentíssimo marido e quiçá, um dia mais tarde de seus filhos homens.

   Este é um livro que despertará em nós, mulheres, emoções fortes. O que hoje em dia é um dado adquirido, na altura era impensável. Dar uma opinião era de mau tom, tentar fazê-la prevalecer e sendo a mesma contrária ao que o chefe de família eventualmente poderia defender, era uma ofensa grave e seria delicadamente pedido à mulher em questão que se retirasse para o seu quarto para descansar, passar água fria pelo rosto e cheirar uns sais et voilá, estaria novamente perfeita para conviver na mais fina sociedade. Uma mulher inteligente deveria demonstrar a sua inteligência de forma subtil para que o seu noivo/esposo pensasse que ele é que teria sempre razão.

   Relativamente à diferença das classes sociais, fiquei incrédula com a indignação da família aquando da primeira visita do Inspector Pitt. A polícia encontrava-se classificada como pertencente a uma das classes sociais inferiores, existindo abaixo dela apenas os criminosos. Polícia era gente de trabalho logo, nunca deveria sequer pensar em falar com uma família abastada sem que esta o desejasse, no entanto o inspector Pitt (como o seu sobrenome evoca Pitt Bull) não é homem de se intimidar com as questões sociais da época, conseguindo imiscuir-se no seio da família bem como, no coração de Charlotte! O romance entre os dois é totalmente anti-convencional, não encontramos no decorrer da obra suspiros nem palpitações mas o que deixa ao critério de nossa imaginação acaba por ser muito mais envolvente e interessante!

   As três irmãs da família Ellison; Sarah, Charlotte e Emily são a antítese umas das outras. Sarah a esposa recatada, obediente e completamente integrada na fina sociedade e Charlotte a filha rebelde que não concorda com a diferença de tratamento entre os dois sexos e que tudo faz para prevalecer a sua opinião, falando bem antes de pensar. Para mim a surpresa foi Emily. Com a leitura inicial do livro poderíamos facilmente classificá-la na mesma categoria de Sarah, no entanto Emily é uma caixinha de surpresas, o que à primeira vista poderá parecer uma cabecinha oca pensando única e exclusivamente em casar, Emily é uma personagem bastante complexa e de personalidade forte. Sabe exatamente o que quer e qual a melhor forma de o conseguir sem ir contra as regras sociais adequadas a uma senhorita pertencente à Sociedade de época, no fim de contas, um camaleão muito subtil!

   Relativamente ao ponto fulcral do livro, ao Estrangulador… para mim, devoradora compulsiva de policiais, foi uma autêntica surpresa, muito bem escondida e maravilhosamente saboreada num clímax doentio e retorcido, vítima de uma sociedade tão opressiva! Não tenham dúvidas, este é um livro fora do comum e que nos acompanhará admiravelmente por algumas horas!



sábado, 20 de julho de 2013

[Histórico] "As Mulheres de Summerset Abbey", de T.J. Brown [Clube do Autor]


Título: As Mulheres de Summerset Abbey

Autora: T. J. Brown

Editora: Clube do Autor [Noites Brancas]

Edição: Julho de 2013

Páginas: 300

Género: Romance Histórico/Romance

Saiba mais detalhes sobre a obra AQUI


Crítica para o Blog Os Livros Nossos por Isabel Alexandra Almeida:

    As Mulheres de Summerset Abbey é o título do primeiro romance de uma trilogia Histórica cuja acção decorre na Inglaterra Eduardiana, imediatamente antes do início da I Guerra Mundial, sendo autora T.J. Brown, assumidamente apaixonada por História.

     Tendo por base pesquisa histórica e literária, e inclusive o apoio de uma Investigadora Histórica [ Evangeline Holland], a autora conseguiu construir uma apelativa e envolvente intriga familiar, de leitura fácil e viciante.

      As protagonistas são três jovens - as irmãs Rowena e Victoria Buxton, filhas de Sir Philip Buxton, um aristocrata à frente do seu tempo, uma personagem que já não conhecemos em vida, mas que surge bem presente ao longo de todo o livro, por ter sido um homem liberal, inovador, à frente do seu tempo, e que transmitiu os valores da igualdade e saudável e democrática convivência entre as várias camadas da sociedade, às filhas Rowena e Victoria e a Prudence, filha da Governanta da Casa, que foi criada e educada esmeradamente e como se de mais um membro da família se tratasse.

  Rowena é uma jovem tímida, indecisa, que sente o peso de se ver confrontada com as rígidas imposições e formalismos sociais tão queridos da Alta Sociedade a que pertence por sangue e tradição, mas no seu íntimo a jovem sabe que o mais correcto é adoptar a atitude liberal de seu pai. Perante a perda prematura do progenitor, Rowena, Victoria e Prudence são forçadas a residir em casa do Tio Paterno e Tutor das duas irmãs - Sir Conrad Summerville, casado com a maquiavélica e manipuladora Lady Charlotte Summerville. Rowena sente na pele o conflito social subjacente à sua nova vida, ao ver os tios hostilizar e menosprezar Prudence, que passa a ser tratada como uma criada na nova residência.

   Victoria Buxton é uma jovem bastante intuitiva e inteligente, sonha conseguir manter uma vida independente e moderna, revela uma personalidade mais decidida do que a da irmã mais velha Rowena, e revela ser verdadeiramente leal aos princípios e valores transmitidos pelo pai, não temendo enfrentar os tios em defesa de Prudence, que considera parte da família e sua irmã. A sua frágil saúde leva a que toda a família e também Prudence acabem por render-se aos seus encantos e assumam uma atitude protectora.

   Prudence é uma jovem educada, irá experimentar um conflito social bastante agudo, e acorda para a realidade se ser uma pessoa perdida num limbo entre dois mundos tão opostos, acabando por não saber a qual deles pertence. É, afinal, a filha de uma Governanta, que desconhece com rigor as suas origens familiares, mas foi acolhida e tratada na família se Sir Philip Buxton como se fosse mais uma filha, nunca sendo distinguida em relação às irmãs Rowena e Victoria. Mas a morte do seu protector tudo mudará na sua vida e na das amigas e nada mais voltará a ser como até àquele momento trágico que interrompeu brutalmente a harmonia familiar.

    Em Summerville Abbey as jovens vão enfrentar os novos desafios que se lhes colocam.  Novas pessoas entrarão nas sua vidas, para o bem e para o mal.

   Verdadeiramente fascinante o detalhe com que a autora nos apresenta os costumes e rituais próprios deste período histórico, quando a aristocracia britânica ostenta ainda a sua vida repleta de privilégios e cisões sociais, mas quando começam também a surgir os primeiros sinais de mudanças sociais e políticas profundas - com o movimento sufragista de luta pelo Direito ao voto pelas mulheres, a título de exemplo.

   Uma alta sociedade em que os jovens não revelam, na sua maioria, outros interesses na vida a não ser a mudança de indumentária, consoante os eventos sociais e os períodos do dia ou da noite. As festas luxuosas, as brincadeiras e partidas que são o sub-refúgio destes jovens para vidas que são, no fundo, fúteis e totalmente vazias.

  Às mulheres era exigido que constituíssem forçosamente um novo núcleo familiar, era imperativo casar e ter filhos, mas as crianças eram, bastantes vezes, confiadas ao cuidado de criados e professores, não tendo com os pais laços afectivos fortes.

   Victoria é, de entre as protagonistas femininas, a personagem que mais personifica a antevisão de novos ventos de mudança, muito por influência da educação menos formal transmitida pelo pai. A jovem é botânica, pretende estudar botânica numa Universidade e seguir as pisadas de seu pai nesta área científica, intuitos que para uma mulher desta época eram ainda pouco consentâneos com o que era considerado socialmente correcto.

  Collin e Elaine, primos de Rowena e Victoria acabam por simbolizar o conformismo da maioria dos jovens aos preceitos da educação e saber estar social da época. Lorde e Lady summerville são a exaltação da tradição secular de privilégios da aristocracia britânica, vendo os empregados como seres inferiores e chegando mesmo a desconhecer os seus nomes, numa total despersonalização.

   Em suma, uma obra magistralmente escrita, rica em detalhes, e que evoca na perfeição os ambientes e intrigas próprios de séries televisivas como "Upstairs, Downstairs" [Em Portugal exibida sob o título - A família Bellamy] ou, mais recentemente, Downton Abbey.

   Uma saga familiar a acompanhar atentamente e a ler e reler, merecendo lugar cativo na biblioteca de qualquer amante destas temáticas.

    Está de parabéns a colecção Noites Brancas da editora Clube do Autor, por esta escolha editorial.  Nota máxima! Uma leitura recomendada para este verão.