A linguagem dos novos tempos

(Saramago, sobre o twitter, para o Jornal O Globo.)

Saudade do discurso verborrágico, prolixo... Saudade da lapidação da palavra... da palavra imagem, discurso, sagrada... A cada dia ficamos mais monossilábicos, nosso diálogo torna-se mais frio, menos aconchegante. Talvez o ritmo acelerado da nossa vida tenha nos levado a isso, o certo, porém, é que as palavras vêm perdendo o seu facínio! Escreve-se errado por vontade, ler tornou-se um passatempo de gente excêntrica. Os jovens não sabem mais o quão magnífico é viajar pelas páginas de um livro... o explêndido que há em decifrar cada palavra, por mais simples que ela seja...

"(...)

Penetra surdamente no reino das palavras.

Lá estão os poemas que esperam ser escritos.

Estão paralisados, mas não há desespero,

há calma e frescura na superfície intata.

Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.

Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.

Tem paciência se obscuros. Calma, se te provocam.

Espera que cada um se realize e consume

com seu poder de palavra

e seu poder de silêncio.

Não forces o poema a desprender-se do limbo.

Não colhas no chão o poema que se perdeu.

Não adules o poema. Aceita-o

como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada

no espaço.

Chega mais perto e contempla as palavras.

Cada uma

tem mil faces secretas sob a face neutra

e te pergunta, sem interesse pela resposta,

pobre ou terrível, que lhe deres:

Trouxeste a chave?

Repara:

ermas de melodia e conceito

elas se refugiaram na noite, as palavras.

Ainda úmidas e impregnadas de sono,

rolam num rio difícil e se transformam em desprezo."

Em sua sabedoria, Carlos Drummond de Andrade já refletia sobre o soberano poder da palavra, sobre suas mil faces, sejam elas evidentes ou obscuras.

Seja qual for o uso que façamos das palavras elas sempre irão além daquilo que queremos dizer. A atual tendência minimalista, contudo, vem afrontando a palavra em sua luz, em sua glória, em seu som e em seu silêncio...

Embora seja uma facilitadora da comunicação em tempos modernos, a inclusão digital vem sendo, em parte, grande responsável, para o bem e para o mal, dessa transformação linguística que estamos vivenciando. Seja como for, talvez nos próximos cem ou duzentos anos, olhem para o passado e vejam os blogs, os sites de relacionamentos, twitters, etc. como um meio conservador de uma linguagem rebuscada e tradicional... A realidade é que nossa língua é um organismo vivo que se desenvolve e evolui conforme nosso próprio desenvolvimento e evolução. Seremos, pois, nós responsáveis por esse processo? Pódi crê!