O automobilismo não é só pilotos, engenheiros, diretores de equipa ou até mecânicos, que são capazes de por a máquina a funcionar. Também existem aqueles que registam as corridas, os seus resultados e narram os seus feitos. Fotógrafos e jornalistas estão nesse canto, nessa tarefa. As fotografias, que depois vemos nas revistas e nos jornais na semana ou no dia seguinte, os jornalistas, que escrevem ou narram no dia da corrida ou depois, nos programas específicos - antes, nas televisões e rádios, hoje em dia, na Internet - com o tempo, e enquanto crescemos e envelhecemos, começam a fazer parte da vida.
Se falar de gente como o Galvão Bueno, Bob Warsha, Murray Walker, António Lobato ou José Rosinski, falamos de jornalistas que, ao cumprir uma tarefa, acabam por se apaixonar pela modalidade e se tornam parte da "mobilia", outros como Martin Brundle, Jackie Stewart, James Hunt ou Mauro Poltronieri, antigos pilotos que, indo para o outro lado da pista como comentadores, descobrem uma segunda pele e se adaptam tão bem que se tornaram famosos por eles mesmos: tão bons comentadores como foram pilotos, especialmente eles, com os seus conhecimentos técnicos, que enriqueceram o nosso conhecimento das máquinas que vemos na televisão, a mais de 300 km/hora.
E só falo dos televisivos. Há exemplos noutros lados que merecem o seu canto no panteão de honra do automobilismo, como Wilson "Barão" Fittipaldi, narrando pela Jovem Pan de São Paulo o GP de Itália de 1972, onde o seu filho mais novo, Emerson Fittipaldi, ganhou o seu primeiro título mundial, ou os escritos como Joe Saward, Nigel Roebuck, David Tremayne, ou Dennis Jenkinson, e falo apenas dos ingleses, que escreveram muito sobre o automobilismo nas páginas de revistas como o Autosport, Motoring News, Grand Prix International ou Motorsport, entre outros.
Alguns desses comentadores conseguem até uma relação profunda com alguns pilotos, quase dando atenção exclusiva. Alguns bons exemplos são Galvão com Ayrton Senna, Walker com Hunt, antes e depois, Lobato com Fernando Alonso, Jenkinson com Jim Clark.
E no lado alemão, falo de alguns bons exemplos: a Auto Motor und Sport, fundado em 1951 em Munique pelo ex-piloto das Flechas de Prata, Paul Pietch, e mais de 20 anos depois, os austríacos Heinz Prudl e Helmut Zwickl, ambos austríacos e que seguiram as carreiras de Niki Lauda e Jochen Rindt, corrida após corrida, na ORF, o canal estatal austríaco.
Ambos contemporâneos - Zwickl nasceu em 1939, Prudl dois anos depois - o primeiro apareceu cedo na vida no automobilismo para seguir um piloto em particular: Jochen Rindt. Nascido em Viena, e farmacêutico de formação, aos 21 anos, em 1960, começou a trabalhar no automobilismo, primeiro no meio escrito (Kurier, de Viena), depois na televisão, onde conheceu Rindt, que começava a sua carreira na Formula 1. Com o tempo, estabeleceram uma boa amizade e lhe deu acesso total à sua vida, ajudando até a colocá-lo na televisão. Juntos formaram "Motorama", um dos primeiros programas de automóveis, sem ser sobre testes, falando sobre corridas, carros rápidos, regras de segurança... um pouco de tudo.
Com o tempo, começou a escrever livros, o primeiro dos quais uma biografia de Jim Clark, logo em 1968. E quando dois anos depois, Rindt morre em Monza, interrompendo a sua carreira rumo ao título mundial, faz a biografia definitiva dele, publicada em 1971. Não fica muito tempo parado, especialmente quando surge outro compatriota seu, Niki Lauda. Também segue atentamente os seus feitos, especialmente os seus campeonatos, e quando ele tem o seu acidente quase mortal, também não escapa e escreve sobre ele, logo no final de 1976.
Com o tempo, não fica parado na sua profissão. Tira a licença não só de piloto profissional de automóveis, como também tira uma licença de piloto profissional de aviação, um pouco a seguir os passos de Lauda. Torna-se num dos mais famosos do seu meio não só no seu país, como no mundo de língua alemã, ainda se diverte nos clássicos, fazendo algumas edições da Carrera Panamericana ao volante de um Volvo.
Zwickl sempre afirmou que ficou infetado com o vírus das corridas desde a infância, e a sua paixão nunca o largou. Uma voz e escrita reconhecida por milhões de pessoas. Morreu este domingo, aos 85 anos. Também há lendas na escrita e na narração. Ars longa, vita brevis.