DIA 12 DE NOVEMBRO
FICHA TÉCNICA
Título Original: Hannah Arendt
Realização: Margarethe Von Trotta
Argumento: Pam Katz, Margarethe Von Trotta
Montagem: Bettina Böhler
Fotografia: Caroline Champetier
Música: André Mergenthaler
Interpretação: Barbara Sukowa, Axel Milberg, Janet McTeer,
Julia Jentsch, Ulrich Noethen
Origem: Alemanha/Luxemburgo/França
Ano: 2012
Duração : 113’
M/12
TRAILER aqui!
SINOPSE
Após
assistir ao julgamento do nazi Adolf Eichmann, a filósofa política Hannah
Arendt atreve-se a escrever sobre o Holocausto em termos inauditos. O seu
trabalho provoca imediatamente escândalo mas Arendt mantém-se firme ao ser
atacada tanto por inimigos, quanto por amigos.HANNAH ARENDT é um retrato do génio que abalou o
mundo com a sua tese sobre a “banalidade do mal”. Incluído na Selecção Oficial do Festival Internacional de Cinema de Toronto e do New York Jewish Film Festival
CRITICA
"Todo o filme sobre Hannah Arendt medita
sobre a razão e a forma como o mal absoluto foi cometido no mundo dos seres
humanos.(...) O filme de Margarethe von Trotta é notável. Todo o talento cru da
realizadora de A HONRA PERDIDA DE KATHARINA BLUM (1975) está presente nesta
obra, mas com um apuramento formal e uma forma cinematográfica superior."
Nuno
Ramos de Almeida, Jornal i
"HANNAH ARENDT é um filme precioso,
capaz de mostrar como a percepção da história envolve sempre um jogo dialéctico
entre passado e presente, ideias herdadas e ideias contemporâneas. Vê-lo e
discuti-lo deveria ser uma prioridade democrática."
João
Lopes, Diário de Notícias
"Ver o filme de Margarethe von Trotta
sobre Hannah Arendt e as tribulações do relato do julgamento de Einchmann em
Jerusalém torna-se obrigatório. Para nos fazer pensar."
Clara
Ferreira Alves, Expresso
"Uma interpretação extraordinária de Barbara
Sukowa no filme mais importante agora em exibição entre nós: retrato de mulher
e filme de ideias sobre um tempo que passou.
(…)
Encarnada de modo
extraordinário por Barbara Sukowa, Hannah Arendt é uma mulher fiel apenas ao
seu intelecto e aos seus amigos, que se recusa a diluir ou adoçar o seu
raciocínio apenas para ser politicamente correcta. Arendt bem pode querer
separar as águas do pessoal e do profissional mas o affaire Eichmann e a sua
noção de rigor intelectual imparcial apenas vieram sublinhar a lição que o seu
professor, Martin Heidegger, aprendera tarde demais: a vida real e a vida da
mente não são a mesma coisa e há que escolher e assumir as consequências. O
pensamento da filósofa pode ter afectado o mundo, mas exigiu um preço pessoal -
e é também aí que Von Trotta e Sukowa ganham o filme, ao recusar “separar as
águas” e pintá-la como alguém intocável, ao tornar Hannah Arendt numa
apaixonante meditação sobre o pensamento como algo de profundamente
cinematográfico, até sedutor e sexy - e melhor “filme de recrutamento” para pôr
a cabeça a mexer é difícil de imaginar.
O que, aliás, leva a
outra e importante questão: será que, hoje, em 2013, o que Arendt escreveu há
50 anos teria gerado tal sururu? Só fazer essa pergunta bastaria para tornar
este num filme central para os tempos que vivemos. Felizmente, faz muitas mais."
Jorge Mourinha, Ípsilon
ENTREVISTA COM A REALIZADORA
"Os seus filmes propõem quase sempre um
confronto intenso com figuras históricas importantes
– Rosa Luxemburgo, Hildegard von
Bingen, as irmãs Ensslin… O que é que a estimulou em Hannah Arendt?
A questão de como fazer um filme sobre uma mulher que pensa.
Como observar uma mulher cuja principal acção é pensar. Claro que também tinha
medo de não lhe fazer justiça. Isso fez com que o retrato cinematográfico fosse
bem mais difícil do que, por exemplo, o de Rosa Luxemburgo. Ambas as mulheres
eram indivíduos altamente inteligentes e únicos, ambas eram dotadas na sua
capacidade para o amor e a amizade e ambas eram pensadoras e oradoras
provocadoras. A vida de Hannah Arendt não foi tão dramática quanto a de Rosa
Luxemburgo – mas foi importante e comovente.
Para saber mais sobre ela, não só li os livros e as cartas
dela, mas também tentei encontrar pessoas
que a tivessem conhecido. Através destas muitas conversas,
descobri gradualmente o que queria dizer sobre ela e que tempo da vida dela
melhor serviria os meus propósitos. Por vezes, tinha mesmo muito medo dela. De
repente, parecia tão áspera e arrogante. Só depois da famosa conversa entre ela
e Günter Gaus é que me convenci finalmente de que Hannah Arendt era uma pessoa
verdadeiramente encantadora, espirituosa e agradável. Depois de os ver juntos,
compreendi o que Gaus quis dizer quando disse mais tarde numa entrevista que
ela era o tipo de mulher por quem uma pessoa imediatamente se apaixona.
A sua investigação teve lugar enquanto
trabalhava no argumento que começou a escrever em 2003 com a argumentista
americana Pam Katz. Em 2006, decidiu centrar o filme, que nessa altura tinha
como título de trabalho A controvérsia, nos quatro anos em torno do julgamento
de Eichmann de 1961.
Queríamos contar a história de Hannah Arendt sem diminuir a
importância da sua vida e do seu trabalho, mas também sem recorrer à estrutura
muito alargada de um filme biográfico típico. Após Rosenstraße e Die andere
Frau, HANNAH ARENDT é a minha terceira colaboração com Pam Katz. Fomos, por
isso, capazes de escrever o argumento numa espécie de “pingue-pongue”,
discutindo continuamente o trabalho por e-mail, telefone e em pessoa, em Nova
Iorque, em Paris e na Alemanha. A nossa primeira questão foi: o que é que
escolhemos mostrar da vida de Hannah Arendt? O caso amoroso com Martin
Heidegger (que muitos provavelmente esperavam)? A fuga da Alemanha? Os anos em
Paris ou os anos em Nova Iorque? Depois de nos debatermos com todas estas
possibilidades, tornou-se finalmente claro que concentrarmo-nos nos quatro anos
em que ela escreveu sobre Eichmann era a melhor maneira de retratar a mulher e
o seu trabalho. O confronto entre Hannah Arendt e Adolf Eichmann permitiu-nos
não apenas aclarar o contraste radical entre estes dois protagonistas, mas
também ganhar uma compreensão mais profunda dos tempos negros da Europa do
século XX. Ficou famosa a declaração de Hannah Arendt “Ninguém tem o direito de
obedecer”. Com a sua recusa firme em obedecer a outra coisa que não o seu
próprio conhecimento e crenças, não podia ser mais diferente
de Eichmann. O dever dele, como ele próprio insistia, era ser fiel ao juramento
de obedecer às ordens dos seus superiores. Na sua fidelidade cega, Eichmann
renunciou uma das principais características que distinguem os seres humanos de
todas as outras espécies: a capacida de de pensar por si mesmo. O filme mostra
Hannah Arendt como uma teórica política e pensadora independente em luta contra
exactamente o seu oposto: o burocrata submisso que não pensa de todo e que, em
vez disso, opta por ser um subordinado entusiástico.
O material de arquivo a preto e branco
do julgamento permitiu-lhe captar, de forma incisiva, o carácter “não-pensante”
de Eichmann.
Só se consegue mostrar a verdadeira “banalidade do mal”
observando o verdadeiro Eichmann. Um actor só distorce a imagem, nunca a
tornaria mais nítida. Enquanto espectador, pode-se admirar o brilhantismo do
actor, mas inevitavelmente não se compreenderia a mediocridade de Eichmann. Ele
era um homem incapaz de formular uma única frase gramaticalmente correcta. Pela
maneira como falava, era possível ver que ele era incapaz de pensar de forma
significativa acerca do que estava a fazer. Há só uma cena com a Barbara Sukowa
que tem lugar no verdadeiro tribunal e aí, porque tinha de ser um actor, só se
vêem as costas de Eichmann. Filmámos todas as outras cenas de tribunal na sala
de imprensa, onde o julgamento foi, de facto, mostrado em vários monitores.
Isso foi uma maneira de usar o verdadeiro
Eichmann, através do material de arquivo, em todos os
momentos importantes. Mas também tínhamos acabado por acreditar que, uma vez
que Arendt era um fumadora inveterada, ela teria passado mais tempo na sala de
imprensa do que no tribunal. Dessa forma, podia seguir o julgamento e fumar ao
mesmo tempo. Muitos dos outros jornalistas também assistiram ao julgamento nos
ecrãs de televisão e enviaram relatórios ao mesmo tempo. A propósito, muito
tempo depois de termos escrito esta sequência, conseguimos finalmente falar com
a sobrinha de Arendt, Edna Brocke, que estava com ela em Jerusalém na altura.
Ela confirmou que “a tia Hannah” tinha, de facto, passado a maior parte do
tempo na sala de
imprensa, porque podia fumar lá!
HANNAH ARENDT não seria um filme seu se
não víssemos igualmente Hannah Arendt como mulher, amante e amiga. Se não
compreendêssemos melhor a complexidade desta grande pensadora.
O filme é também sobre a vida dela em Nova Iorque, a vida
com os amigos, o amor por Martin
Heidegger – mesmo estando convencidos de que Heinrich
Blücher foi uma figura bem mais importante
na vida dela. Ela chamava a Heinrich as suas “quatro
paredes,” querendo dizer a sua verdadeira
“casa”. Heidegger foi o primeiro amor de Hannah e ela
continuou ligada a ele, apesar da sua
filiação com os nazis. Mesmo no início da minha
investigação, Lotte Köhler, a única amiga ainda
viva de Hannah Arendt, deu-me o livro da correspondência publicada
entre Heidegger e Arendt.
Mas assegurou-se de me dizer que Arendt tinha mantido todas
as cartas dele na gaveta da
mesa-de-cabeceira. Num flashback, mostramos Arendt a
encontrar-se com Heidegger, durante uma visita à Alemanha. Este encontro aconteceu
mesmo, apesar de, apenas algumas semanas antes de se encontrarem, ela ter
escrito uma carta ao seu amigo e mentor, Karl Jaspers, em que chamava assassino
a Heidegger. A sobrinha de Arendt disse que a tia explicava a relação com
Heidegger insistindo que “Algumas coisas são mais fortes do que um ser humano.”
Para o papel de Hannah Arendt escolheu
novamente Barbara Sukowa. Porquê?
Vi Barbara Sukowa no papel de Hannah Arendt logo do início
e, felizmente, consegui ultrapassar alguma resistência inicial a atribuir-lhe o
papel. Não teria feito este filme sem a Barbara. Precisava de uma actriz que eu
pudesse ver a pensar. A Barbara era a única em quem se podia confiar para dar
resposta a este difícil desafio.
É evidente como a Barbara Sukowa se sai
bem, entre muitas cenas, no discurso de oito minutos no fim do filme. Poucos
realizadores arriscariam tentar manter a atenção do público durante tanto
tempo. Porque é que tomou essa decisão?
Muitos sentiam que um filme sobre Hannah Arendt devia, na
verdade, começar com um discurso.
Mas começamos com uma conversa entre amigas a falar dos seus
maridos. Queríamos que o discurso final fosse o momento em que o público
compreende finalmente as conclusões que o seu pensamento trouxe à luz. Só
depois de se ter assistido a ela a compilar as suas percepções sobre o carácter
de Eichmann e de se ter visto como ela foi atacada por elas de forma tão brutal
e frequentemente tão injusta, é que se está disposto a ouvi-la durante tanto
tempo. Nessa altura, já nos apaixonámos por ela, bem como pela sua maneira de
pensar. E a interpretação da Barbara é simultaneamente tão inteligente e tão
emocional que nos tira o fôlego. Dirigimo-nos gradualmente em direcção a este
momento, dando lentamente oportunidade ao público de compreender os elementos
constitutivos dos pensamentos complexos de Arendt e de entender o que ela
queria dizer com a banalidade do mal. O discurso é o clímax intelectual e
emocional de todo o filme.
A equipa está a abarrotar de mulheres
fortes: Pam Katz como co-argumentista, Bettina Brokemper como produtora,
Caroline Champetier como directora de fotografia, Bettina Böhler como
montadora… Coincidência ou uma decisão consciente?
Não planeei isso dessa maneira, simplesmente aconteceu. Mas
por outro lado, talvez não seja coincidência. Mas Hannah Arendt era o oposto de
uma feminista e HANNAH ARENDT também não é o típico “filme de mulher.” É um
filme feito por pessoas altamente dedicadas e profissionais, que se
comprometeram a contar uma história que faz jus à vida de Hannah Arendt.
De acordo com Karl Jaspers, professor e
amigo de Hannah Arendt, “só nos podemos aventurar na esfera pública, quando
confiamos nas pessoas”. Cada um dos seus filmes é uma aventura. Como é que isso
se aplica a HANNAH ARENDT?
No espírito de Hannah Arendt: confiando que o público passe
da ignorância e espanto para o desejo de compreender e, em última instância,
chegue a essa compreensão."