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sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Cerâmica portuguesa no Musée des Beaux-Arts em Ostende e no The Kiln Club of Washington - 1959

Em 1959, a cerâmica moderna portuguesa é difundida através de duas importantes exposições, a Exposition International de Ceramique Contemporaine, no Musée des Beaux-Arts, em Ostende na Bégica e a The Seventh International Exhibition, realizada no The Kiln Club of Washington, em Washington DC, nos EUA.
Estas mostras reúnem um conjunto notável de ceramistas, desde o pioneiro Jorge Barradas (1894-1971) às jovens Cecília de Sousa (n.1937), Maria de Lourdes Castro (n.1934) e Maria Manuela Madureira (n.1930).
As representações internacionais, regra geral organizadas pelo Secretariado Nacional de Informação, Cultura Popular e Turismo, mais conhecido por SNI, órgão encarregado de levar a cabo as políticas culturais do regime, eram divulgadas na imprensa, em especial na Panorama: Revista Portuguesa de Arte e Turismo, publicação oficial deste órgão educacional e propagandístico.  
Assim, o nº16/III série, de 1959, da revista Panorama, à época dirigida por Ramiro Valadão, noticia o evento, explicando que a cerâmica, "Arte entre nós bem mais jovem e circunscrita do que a pintura e a escultura, sofre o primeiro impulso, para a nobilitar, com as procuras de Jorge Barradas, concretizadas brilhantemente nas exposições de 1945 e 1948. 
De então para cá - e o que são pouco mais de dez anos para construir de novo uma arte abastardada? - os artistas trabalham, procuram: e de vulto é esse trabalho e procura; tanto que permite sem vergonha aparecer, e provoca, com honra e orgulho, o convite para se fazerem representar, os artistas e Portugal nas mais importantes exposições. 
À obra de Fernando Abranches, Cecília Alves de Sousa, Jorge Barradas, Manuel Cargaleiro, Maria de Lourdes Castro, João Fragoso, M. Manuela Madureira, José Sanches e Hansi Stäel se deve, com muitos outros, este recuperar tempo perdido, e a posição adquirida pela cerâmica de arte portuguesa nos certames internacionais.
Artistas portugueses - ceramistas, escultores e pintores - que são, ao fim ao cabo, embaixadores de Portugal e da sua cultura: embaixadores e testemunhos."

Neste artigo, não assinado, fica clara a necessidade de recuperar o tempo perdido no que à cerâmica diz respeito, reflectindo a falta de investimento criativo nesta tecnologia artística, em Portugal, durante o período entre as Guerras.
Publicamos abaixo, as imagens que ilustram a referida notícia, com as legendas tal como aparecem na revista Panorama.


Manuel Cargaleiro - jarra. © CMP

João Fragoso - jarra. © CMP

Fernando Abranches - A Nossa Mãe© CMP

Jorge Barradas - Senhora e Menino, 1957. © CMP

Maria Manuela Madureira - Sofisma, 1959. © CMP

De modo a complementar o conteúdo do artigo da revista Panorama, publicamos também outras peças do mesmo período temporal, da autoria dos ceramistas participantes nas referidas mostras.

Desenvolvendo a mesma linguagem do painel de azulejo "Sofisma" (85 x 57 cm),  o painel "Duende" (123 x 76 cm), também de 1959, dá-nos uma noção do cromatismo trabalhado por Maria Manuela Madureira nesta época. Ambos participaram na Échange Culturel Mondial da UNESCO em 1961, organizada pela Académie International de la Céramique de Genève, fazendo actualmente parte das colecções do Museu de Ariana em Genebra, Suiça.


Maria Manuela Madureira  - Duende, 1959. mmm


De Cecília de Sousa, duas jarras realizadas pela autora no ano seguinte à sua participação nas duas  exposições internacionais. A primeira mede 47,5 x 17 cm e a segunda 53 x 14 cm.


Cecília de Sousa - jarras, 1960. Imagens publicadas no catálogo A minha segunda casa... Cecília de Sousa, obra cerâmica 1954-2004, edição do Museu Nacional do Azulejo, 2004.

Produzida na Viúva Lamego, tal como as peças de Cecília de Sousa, uma jarra, com 27 cm de altura, da autoria de Manuel Cargaleiro (n.1927), 1956.

Manuel Cargaleiro - jarra, 1956. S.Domingos

Hansi Staël (1913-1961), recebeu, em 1954, o Prémio Francisco de Holanda, atribuído pelo SNI e, no ano seguinte, seria galardoada com a Medalha de Honra, na Exposição Internacional Les Chefs-d'Ouvres de la Céramique Moderne, em Cannes.
O prato de suspenção, com 39 cm de diâmetro, abaixo reproduzido, foi produzido nas Caldas da Rainha no último ano em que colaborou com a SECLA, 1957.

Hansi Staël - prato de suspensão, SECLA, 1957. Museu Malhoa

Quanto aos ceramistas Fernando Abranches (1920-...) e José Sanches (1916-...), o primeiro iniciou-se na cerâmica em 1950 e participou, a partir de 1951, em várias Exposições de Cerâmica Moderna organizadas pelo SNI, tendo também exposto individualmente.
O segundo trabalhou na Fábrica de Cerâmica Viúva Lamego, desempenhando as funções de oleiro-rodista.  Ainda no ano de 1959, ganhou o Prémio Nacional de Cerâmica Sebastião de Almeida, atribuído pelo SNI.


José Sanches - base de candeeiro, 40 cm de altura, Viúva Lamego. © PMC


Do escultor João Fragoso (1913-2000), fundador do Estúdio-Escola de Cerâmica, uma figura feminina, (29 x 22,5 x 11,5 cm) pertencente à colecção do Centro de Arte Moderna da Fundação Gulbenkian.
Esta obra esteve exposta na mostra O tempo em (re)construção: A colecção de cerâmica do CAM - Fundação Calouste Gulbenkian, inaugurada a 7 de Julho de 2011, no Museu Nacional do Azulejo.


João Fragoso - sem título. Col. CAM-JAP. © CMP

De Jorge Barradas, responsável pelo despoletar do movimento de renovação da cerâmica portuguesa após a  Segunda Guerra Mundial, o painel Máscaras (90 x 90 cm), executado na Fábrica de Cerâmica Vúva Lamego em 1959 e actualmente parte das colecções do Museu Municipal Dr. Santos Rocha, na Figueira da Foz.


Jorge Barradas - Máscaras, 1959. © CMP


Finalmente, de Maria de Lourdes Castro uma taça com patine de prata (9,5 cm de altura por 23,5 cm de diâmetro), executada na Fábrica de Loiça de Sacavém, em 1958-1959.


Lourdes Castro - taça, 1958-1959. Imagem publicada no catálogo Maria de Lourdes Castro: Uma Exposição Biográfica, edição do Museu Nacional do Azulejo, 2005.


CMP* agradece aos vários coleccionadores a cedência de imagens de peças das suas colecções, bem como todas as informações e esclarecimentos prestados.


sexta-feira, 22 de julho de 2011

Cerâmica no Pavilhão de Portugal - EXPO58 Bruxelas

A Exposição Universal de Bruxelas decorreu no parque de Lacken entre 17 de Abril e 19 de Outubro de 1958. Na actualidade, as marcas deixadas na paisagem são ainda bastante visíveis, especialmente pela presença do Atomium, que foi adquirindo o estatuto de ícone da cidade. 


Cartaz. Foto do Estúdio Horácio Novais (1930-1980) - Biblioteca Gulbenkian Flickr


Com comissariado geral do Conde de Penha Garcia,  tendo como comissários adjuntos  Jorge Segurado e Mário Neves, a representação portuguesa nesta exposição era composta por um conjunto arquitectónico, da autoria de Pedro Cid (1925-1983), situado sobre um amplo relvado, enquadrado por uma colina densamente arborizada.
Os edifícios ocupavam uma área de 7100 metros quadrados, dos quais 2870  correspondiam às áreas do pavilhão propriamente dito e do anexo, onde funcionavam o restaurante, o Bar do Vinho do Porto, a loja de artesanato e produtos regionais e a esplanada.

Capa do folheto informativo. Foto de António Leal - ephemera

Interior do folheto, onde pode ver-se a localização do pavilhão e sua articulação com o anexo. Foto de António Leal - ephemera

Pavilhão de Portugal, pode ver-se a utilização de uma grelha cerâmica sobre a fachada lateral.

Pedro Cid, considerado uma das referências fundamentais da arquitectura modernista em Portugal, foi o vencedor do concurso para o Pavilhão Português. O arquitecto, que havia já colaborado em vários projectos, como o conjunto habitacional da Av. dos Estados Unidos da América em Lisboa (Prémio Municipal, 1956), foi posteriormente co-autor do projecto da sede da Fundação Gulbenkian (Prémio Valmor, 1975).


Vista nocturna do Pavilhão de Portugal, a grelha cerâmica filtra a luz que emana do interior através das enormes fachadas envidraçadas.  Foto do Estúdio Horácio Novais (1930-1980) - Biblioteca Gulbenkian Flickr

Os dois corpos constituintes do pavilhão português integram a visão modernista dominante em toda a Exposição, sem deixarem de utilizar elementos típicos da arquitectura portuguesa, como os azulejos e as grelhas cerâmicas ou de ferro forjado.
Do denominado sector VI, o anexo, cujo desenho de interiores era da responsabilidade de Eduardo Anahory (1917-1998) e José Rocha (1907-1982), fazia parte o Bar  de Vinho do  Porto, onde estavam integrados uma grelha de ferro forjado do artesão Esteves e um painel de azulejos da autoria da pintora Menez (1926-1995). Este painel, datado de 1957, é contemporâneo do conjunto azulejar da pastelaria Vá-Vá, em Lisboa, também com assinatura da autora e datado de 1958, apresentando, no entanto, características formais bastante diversas.


Entrada para o Bar de Vinho do Porto, sector VI, o com Atomium em pano de fundo. Foto do Estúdio Horácio Novais (1930-1980) - Biblioteca Gulbenkian Flickr

Interior do Bar de Vinho do Porto com painel cerâmico de Menez. Foto do Estúdio Horácio Novais (1930-1980) - Biblioteca Gulbenkian Flickr

Painel cerâmico de Menez no exterior do Bar de Vinho do Porto. Foto do Estúdio Horácio Novais (1930-1980) - Biblioteca Gulbenkian Flickr

No interior do pavilhão principal, mais especificamente no sector IV, dedicado às Aspirações do Povo Português, cuja concepção ficou a cargo de Sebastião Rodrigues (1929-1997) e Manuel Rodrigues (1924-1965), estão presentes obras do escultor Jorge Vieira (1922-1998) e do pintor Júlio Resende (n.1917), bem como relevos cerâmicos de Querubim Lapa (n.1925).
Nas peças apresentadas, provavelmente realizadas no seu atelier na Viúva Lamego (fundada em 1849), o mestre ceramista trabalha a iconografia solar, já desenvolvida por  si noutros trabalhos da mesma época e seguidamente também explorada nos murais da Pastelaria Mexicana (1961-62) em Lisboa.
De notar o convite à integração  na representação portuguesa de artistas não afectos ao regime, como Querubim Lapa, especialmente ligado ao movimento neo-realista.


Relevo cerâmico de Querubim Lapa no sector IV do Pavilhão de Portugal. Foto do Estúdio Horácio Novais (1930-1980) - Biblioteca Gulbenkian Flickr

Capa da revista literária Notícias do Bloqueio, nº5, Dezembro de 1958, da autoria de Querubim Lapa.


A cerâmica é também utilizada em obras escultóricas de maior volume e conteúdo épico, como é o caso da peça da autoria do escultor António Amaral Paiva (1926-1987), hoje desaparecida.
Situada no sector III, dedicado às Riquezas Materiais da Nação,  com desenho expositivo de  Tomaz de Mello (1906-1990) e Marcello de Morais, a estrutura totémica que pretendia representar simbolicamente a força do trabalho, obteve o Grande Prémio Individual de Escultura da Exposição.


Escultura cerâmica de António Paiva. Foto do Estúdio Horácio Novais (1930-1980) - Biblioteca Gulbenkian Flickr

 Foto do Estúdio Horácio Novais (1930-1980) - Biblioteca Gulbenkian Flickr

Detalhe da integração no espaço. Foto do Estúdio Horácio Novais (1930-1980) - Biblioteca Gulbenkian Flickr

Ainda no sector III, no espaço dedicado à indústria, é concebido um expositor que congrega a produção cerâmica, o vidro e a ourivesaria. Nesta estrutura, as vitrinas contendo os objectos, são pontuadas por imagens fotográficas de formas em revolução, desde a roda de oleiro a representações abstractas sugestivas de movimento e dinâmica, sublinhando a ideia da transformação da matéria informe em objecto.


Expositor dedicado às indústrias do vidro, cerâmica e ourivesaria. Foto do Estúdio Horácio Novais (1930-1980) - Biblioteca Gulbenkian Flickr

Outra vista do mesmo expositor. Foto do Estúdio Horácio Novais (1930-1980) - Biblioteca Gulbenkian Flickr

Na Expo58 a fábrica de porcelanas Vista Alegre (fundada em 1824) conquista o Grande Prémio da Exposição, apresentando peças com formas livres de cariz modernista, divergindo claramente da sua produção clássica, como pode ver-se na página de publicidade publicada na revista Panorama, onde usa o slogan: "Sempre à frente!"


Anúncio na revista Panorama, nº11, III Série, Setembro de 1958. © CMP


A SECLA, que normalmente apresentava, nas exposições internacionais, peças de autor produzidas pelos artistas do Estúdio, viu a sua política reconhecida com a Medalha de Prata da Expo58.
Em termos económicos estes prémios não produziram efeitos imediatos, mas contribuíram para consolidar o prestígio internacional das marcas, que a longo prazo alargaram a sua carteira de exportações.


Capa do catálogo da SECLA para a Exposição Universal de Bruxelas, 1958. Publicada no catálogo Estúdio SECLA - Uma Renovação na Cerâmica Portuguesa, edição do Museu Nacional do Azulejo, 1999.