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quarta-feira, 2 de maio de 2018

Azulejos da Escola Básica São João de Deus | Júlio Santos


A antiga Escola Primária do Bairro Arco do Cego, Lisboa, foi inaugurada em 1955, com a designação Escola nº 154, articulada em dois pólos, um feminino, situado na Rua Caetano Alberto e outro masculino, na Rua José Sarmento, ladeando, em composição simétrica, o antigo Liceu D. Filipa de Lencastre. Hoje estabelecimento de ensino misto, a Escola Básica do 1º ciclo São João de Deus recebeu a actual designação com a integração no Agrupamento de Escolas D. Filipa de Lencastre.
Este agrupamento escolar sofreu uma intervenção do Programa de Modernização das Escolas do Ensino Secundário, em 2007-2008, promovida pela Parque Escolar, cujo projecto arquitectónico foi da responsabilidade do atelier 9H ARQUITECTOS, com coordenação do arquitecto João Paulo Conceição (1950-2011).
Embora não caiba neste espaço tecer considerações sobre as intervenções arquitectónicas levadas a cabo pela Parque Escolar em vários estabelecimentos de ensino em todo a país, não deixa de ser fundamental dar a conhecer um caso exemplar de destruição de património azulejar público, perpetrado no contexto destas intervenções.



Júlio Santos - azulejo de padrão, refeitório dos meninos, Escola Primária do Arco do Cego, 1955. Imagem Azulejos Portugueses: Padrões do Século XX, 1998.



Símbolo da Câmara Municipal de Lisboa e datação da construção, Escola Primária do Arco do Cego, Lisboa. © CMP


Os refeitórios da  Escola Básica São João de Deus estavam revestidos com lambris azulejados, cujo padrão havia sido para ali propositadamente concebido pelo pintor Júlio Santos (1916-1965), tendo sido produzido na Fábrica de Cerâmica Viúva Lamego, em 1955. Este revestimento de padrão, exibia variações feminina e masculina adequadas a cada espaço, e foi destruído durante as obras de remodelação levadas a cabo pela Parque Escolar. Os azulejos poderiam ter sidos levantados e recolocados segundo um projecto de requalificação, o que teria sido a opção mais adequada, ou simplesmente retirados e preservados museologicamente, no entanto, foram negligentemente destruídos, tendo sido salvas apenas algumas dezenas de unidades, nem todas em boas condições, das quais podemos ver os três exemplares publicados abaixo.
Sabe-se também que nas mesmas obras foram destruídos painéis azulejares de pequena escala, da autoria de Jorge Colaço (1868-1942), provenientes da sua oficina nas vizinhas instalações da Fábrica de Cerâmica Lusitânia, situada no Bairro do Arco do Cego, construído inicialmente como bairro operário desta unidade fabril; e ainda frisos azulejares da autoria de Rafael Bordalo Pinheiro (1846-1905), produzidos pela Fábrica de Faianças das Caldas da Rainha; para além de mobiliário e outros equipamentos representativos do design e artes aplicadas das épocas de construção dos vários pólos escolares.



Vista arérea Liceu D. Filipa de Lencastre, c.1940. AML


Fachada do Liceu D. Filipa de Lencastre, c. 1952-53. Foto do Estúdio Mário Novais - Biblioteca Gulbenkian Flickr



O Liceu D. Filipa de Lencastre, situado no centro do Bairro do Arco do Cego, com projecto de 1932 do arquitecto Jorge Segurado (1898-1990), inicialmente destinado ao ensino primário, foi inaugurado em 1938, tendo vindo a sofrer obras de adaptação até 1940. Foi um liceu feminino, sendo ladeado pelos corpos das escolas primárias, um de frequência masculina (assinalado a azul na imagem abaixo) e outro de frequência feminina (assinalado a vermelho na imagem abaixo), segundo as normas em vigor até 1974.



Vista arérea do Agrupamento de Escolas D. Filipa de Lencastre.



Planta da Escola Norte, proposta de remodelação, 2007-08. Parque Escolar




Júlio Santos, licenciado em Ciências matemáticas e professor de Matemática e de Desenho, tendo iniciado actividade como pintor em 1949, foi autor do desenho de vários padrões azulejares, executados em estampilha manual pela Fábrica Viúva Lamego. 
Para a Escola Primária do Arco do Cego, o pintor concebe um padrão composto por dois módulos alternados, um deles repete-se nos refeitórios masculino e feminino apenas com variação de cor, azul e verde respectivamente, o outro usa pictogramas adequados a cada espaço. Nestes pictogramas, em tudo semelhantes, tanto a figura do menino como a da menina seguram com a mão esquerda um livro aberto e estão rodeadas pelas letras iniciais do alfabeto: a, b, c;  existindo apenas uma preocupação de design: a distinção gráfica entre os dois géneros sexuais, o menino de calções, a menina de saia e laçarote na cabeça, num processo de sintetização sinalética.
Neste projecto decorativo, não são usados estereótipos cromáticos, os recorrentes azul e rosa, ou actividades diferenciadas para cada género sexual. Também não existe, no padrão concebido por Júlio Santos, qualquer referência à localização a que se destinava, o refeitório, o que facilitaria a sua adaptação a novos contextos. Teria sido possível a articulação dos vários módulos de novas formas, tivesse existido um olhar reflexivo sobre a pré-existência e a preocupação da reutilização dos elementos nela integrados.




Escola Básica São João de Deus  - entrada da antiga ala masculina. © CMP  



Abaixo podem ver-se dois exemplares dos azulejos/módulo, provenientes do refeitório da ala masculina da antiga Escola Primária do Arco do Cego, e um exemplar por aplicar, pertencente a uma colecção particular.



Júlio Santos - Módulo do padrão azulejar do refeitório da antiga Escola Primária do Arco do Cego, 1955.  © MUSEU VIRTUAL AEDFL



Júlio Santos - Módulo do padrão azulejar do refeitório da antiga Escola Primária do Arco do Cego, 1955. © MUSEU VIRTUAL AEDFL





Júlio Santos - Módulo do padrão azulejar do refeitório da antiga Escola Primária do Arco do Cego, 1955. © PMC



Módulo do padrão azulejar do refeitório da antiga Escola Primária do Arco do Cego, 1955, Fábrica Viúva Lamego - Tardoz. © PMC


Escola Básica São João de Deus  - entrada da antiga ala feminina. © CMP 



Do refeitório da ala feminina só foi possível salvar um exemplar dos azulejos/módulo. Este exemplar pode ver-se abaixo, tal como uma fotografia da época onde se vê o padrão completo aplicado no lambril.



Aspecto do antigo refeitório da ala feminina da Escola Primária do Arco do Cego, revestimento azulejar de Júlio Santos, 1955.



Detalhe da imagem anterior.




Júlio Santos - Módulo do padrão azulejar do refeitório da antiga Escola Primária do Arco do Cego, 1955. © MUSEU VIRTUAL AEDFL


Como pintor, Júlio Santos dedicou-se sobretudo à paisagem e natureza-morta, optando por um registo de pendor cezanneano, pré-cubista, pouco corajoso, apesar de consentâneo com as suas preferências pela geometrização da forma. Na imagem abaixo é reproduzida uma pintura de sua autoria publicada no catálogo da Exposição dos Artistas premiados pelo S.N.I., 1949. Fazendo uso da distorção da perspectiva, herdada das naturezas-mortas de Paul Cézanne (1839-1906) ou referenciando a obra Eduardo Viana (1881-1967), que na década de 1910 inclui nas suas obras muitos objectos de olaria popular, Júlio Santos opta pela representação de objectos de cerâmica industrial moderna, explorando as suas formas e decorações geométricas. Nesta pintura encontram-se representadas peças de produção nacional e internacional, numa composição clarificadora da proximidade do pintor à indústria cerâmica e ao conhecimento dos modelos internacionais.


Júlio Santos - Natureza Morta, catálogo da Exposição dos Artistas premiados pelo S.N.I., 1949.



A azulejaria de padrão, dominante na criação azulejar de Júlio Santos, desempenha um importante papel na qualificação dos espaços arquitectónicos modernos. No entanto, este papel parece não ter sido reconhecido pelos responsáveis pela intervenção da Parque Escolar no Agrupamento de Escolas D. Filipa de Lencastre, onde actualmente, privados da riqueza histórica do edifício que frequentam diariamente, os alunos realizam exercícios práticos de desenho de padrões, reproduzidos em papel e, ironia das ironias, colados nas paredes como se fossem verdadeiros azulejos.    
Teria sido fundamental que o projecto de remodelação do edifício considerasse a manutenção e conservação deste e outro património testemunho da história do edifício, em especial por se tratar de  uma escola, cuja função didáctica  implica consequências no futuro.
A esse propósito, fica a citação de uma entrevista realizada a José Berardo, um dos mais significativos coleccionadores de azulejaria em Portugal, realizada pela  Az - Rede de Investigação em Azulejo, no âmbito do seu blogue AzLab:

"3 perguntas | ao Comendador Berardo, a propósito da Colecção Berardo

Qual a história da origem da colecção?

A minha paixão pelos azulejos começou nos bancos da escola primária. Havia, junto à janela da sala de aula, um azulejo com a imagem de um cavaleiro com uma espada e umas grandes botas e eu ficava maravilhado a olhar para ele, a imaginar mil histórias e aventuras. Cresci, “percorri as sete partilhas do mundo” e às vezes, vinha-me à memória a figura do cavaleiro, como um sonho… Ao regressar a Portugal, vindo da África do Sul, descobri e naturalmente interessei-me e apaixonei-me pela azulejaria portuguesa. Fiquei fascinado pela história e cultura que os azulejos transmitem, pela sua beleza, pela variedade de desenhos e pela gama de azuis que possuem.  Foi, então, que aconselhado por colaboradores, historiadores de arte e consultores, como o meu amigo Manuel Leitão, pessoa fundamental neste processo, comecei a minha Colecção."



9H Arquitectos - Refeitório do pré-escolar, Agrupamento de Escolas D. Filipa de Lencastre, 2007-08. © CMP


Concluímos com uma imagem do actual refeitório do pré-escolar do Agrupamento de Escolas D. Filipa de Lencastre, construído aquando da intervenção da Parque Escolar: uma cave com fenestração elevada, não permitindo suficiente entrada de luz natural nem o acesso das crianças a uma vista do exterior. Este espaço é revestido com materiais frios: laminados plásticos, aço inoxidável e azulejos com vidrado mate de cor acinzentada. Sobre os muros foram aplicados desenhos aparentemente criados pelas próprias crianças, com execução débil em materiais precários, como o lápis de cera. Aqui tomam refeições quotidianamente cerca de duas centenas de crianças, permanecendo neste lúgubre interior cerca de uma hora e  meia por dia.
Evidentemente, questiona-se a qualidade do espaço (lumínica, visual e acústica), questionando essencialmente os efeitos a longo prazo de práticas que destroem interiores construídos com materiais nobres, executados por manufactura qualificada, pensados e desenhados para promover uma utilização tão prazerosa quanto educacional, substituindo-os por soluções deficientes, executadas com materiais pobres e com maus acabamentos.
Poderão estas crianças vir a apreciar, preservar, exigir qualidade ou até conceber os espaços públicos do futuro? É possível. Mas terá a escola contribuído para tal?



CMP* agradece ao Museu Virtual do Agrupamento de Escolas D. Filipa de Lencastre e ao coleccionador PMC, a cedência de imagens de peças das suas colecções.




domingo, 17 de julho de 2016

Azulejaria moderna na exposição Fragmentos de Cor | Azulejos do Museu de Lisboa I




Nota prévia: centrando-se apenas na produção do século XX, esta é a primeira de duas publicações cujo texto é integralmente reproduzido das legendas da exposição Fragmentos de Cor | Azulejos do Museu de Lisboa, que permanecerá no Pavilhão Preto do Museu de Lisboa - Palácio Pimenta até 25 de Setembro de 2016. 

Esta mostra permite a rara oportunidade de ver exemplares de azulejaria outrora integrados em edifícios da cidade de Lisboa, salvos e preservados graças à acção de cidadãos, serviços e funcionários autárquicos, contribuindo para reforçar a evidência de que a cidade seria muito mais rica e interessante caso tivesse sido possível a conservação destas obras in situ
Vale a pena continuar a tentar, começando pela visita a uma exposição motivadora.    



§ § §



O Museu de Lisboa dispõe de uma vasta coleção de azulejaria que, pelo número, variedade e qualidade dos exemplares, se afirma como uma das mais importantes do país, constituída, sobretudo, por azulejos provenientes  de edifícios demolidos ou remodelados, de  prédios em ruínas ou de intervenções arqueológicas
Tendo por objetivo dar a conhecer tão importante acervo, a presente exposição, comissariada por José Meco, um dos mais reputados especialistas nesta área, procura mostrar alguns dos melhores exemplares da coleção do Museu de Lisboa numa perspectiva diacrónica, desde o século XVI até à atualidade, exibindo exemplares, tanto de interior como de exterior, representativos de diferentes estilos e funcionalidades.


Exposição Fragmentos de Cor | Azulejos do Museu de Lisboa. © CMP


No início do século XX, as manifestações eclécticas e românticas do período anterior foram renovadas através de duas tendências dominantes, a Arte Nova, adoptada pela burguesia ligada ao comércio e indústria, presente na decoração das lojas (como a Casa Gomes Ferreira, na Baixa), e uma produção de tendência nacionalista e historicista, favorecida pelas camadas mais tradicionalistas e conservadoras, desenvolvida por Pereira Cão, Enrique Casanova, Leopoldo Battistini e Jorge Colaço, o principal mentor desta corrente.



Vista parcial da exposição Fragmentos de Cor | Azulejos do Museu de Lisboa. © CMP



O painel de azulejos, Por minha prima, com moldura original, é uma obra de Jorge Colaço (1868-1942) e foi realizado na Fábrica de Loiça de Sacavém, c. 1916.
Composição de cariz historicista em pintura policroma, com emolduramentos em madeira com ornatos neogóticos, que constituiu presente do pintor Jorge Colaço a uma prima, Jeanne Schmidt Lafourcade Rey Colaço (1858-1957), quando do seu casamento com o médico Leonardo de Sousa de Castro Freire. A noiva era filha do pianista e compositor Alexandre Rey Colaço, irmã da actriz Amélia Rey Colaço e mãe do arquitecto Leonardo Rey Colaço de Castro Freire. O painel representa um cavaleiro cristão, medieval, empenhando uma flor na mão direita e o escudo com a divisa "Por Minha Prima" na mão esquerda. A cena tem por fundo uma paisagem com castelo e uma ponte. Dois pequenos painéis heráldicos referentes aos noivos, com os nomes "Leonardo" e "Jeanne", ladeiam a composição.
Nos azulejos realizados até 1923 na Fábrica de Sacavém, com placas de "pó de pedra", Colaço, pintou sobre o vidrado incolor já cozido, obtendo assim efeitos aguarelados esbatidos, muito característicos da primeira fase da sua produção artística, que divergem da pintura tradicional do azulejo.



Jorge ColaçoPainel, Por minha prima, Fábrica de Loiça de Sacavém, c. 1916. © CMP



Jorge Colaço - Painel, Por minha prima, Fábrica de Loiça de Sacavém, c. 1916, detalhe. © CMP



Júlio A. César da Silva - painel publicitário, Fábrica de Loiça de Sacavém, inícios do século XX. © CMP 


O painel de azulejos Arte Nova, de cariz publicitário, realizado na Fábrica de Loiça de Sacavém, por Júlio A. César da Silva, no primeiro quartel do século XX, realiza uma alegoria à electricidade, representada por uma figura feminina, de pé, assente sobre globo terrestre, empunhado uma lâmpada com a mão direita levantada.
Encontrava-se aplicado na fachada de um estabelecimento comercial de artigos eléctricos, já destruído, na Rua Áurea, em Lisboa, apresentando em cima a legenda do nome da loja: Júlio Gomes Ferreira & Cª.
Este tipo de composições em azulejo foi frequente nos finais da centúria de oitocentos e primeiras décadas do século seguinte, período durante o qual pequenos industriais e comerciantes, através de uma hábil aliança entre a linguagem decorativa e publicitária procuravam atrair clientes aos seus estabelecimentos e transmitir, em simultâneo, uma nota de urbanidade e modernidade. Entre as lojas que então recorreram a este género de painéis (algumas já desaparecidas ou que mudaram de ramo), destacam-se a leitaria A Camponeza, o Animatógrafo do Rossio, a Padaria Inglesa e o Café Royal.



Júlio A. César da Silva - painel publicitário, Fábrica de Loiça de Sacavém, inícios do século XX, detalhe. © CMP



Júlio A. César da Silva - painel publicitário, Fábrica de Loiça de Sacavém, inícios do século XX, detalhe. © CMP



Júlio A. César da Silva - painel publicitário, Fábrica de Loiça de Sacavém, inícios do século XX, detalhe. © CMP



Vista parcial da exposição Fragmentos de Cor | Azulejos do Museu de Lisboa. © CMP



Conjunto de painéis, realizados na Fábrica de Cerâmica Constância, em 1905, que constituíam parte da decoração exterior da frente do antigo Café Royal, fundado em 1904. As composições figurativas, em azul de cobalto, estão assinadas P. Bonnatove (?) e representam: ambiente interior de café, com personagem sentada a uma mesa; figura feminina, subordinando legenda com anúncio (Água Castelo). As cenas estão envolvidas por cercaduras, relevadas policromas, Arte Nova, da autoria de Viriato Silva, que faziam o contorno dos vãos das portas, integrando vides, parras, cachos de uva, formando nos remates superiores de cada porta, ao centro, uma cabeça feminina.
Este estabelecimento, que se situava na esquina da Praça Duque da Terceira para a Rua do Alecrim, possuía uma das mais belas fachadas de Lisboa, em azulejos daquela corrente estética.



P. Bonnatove e Viriato Silva - painéis da fachada do antigo Café Royal, Fábrica Constância, 1905. © CMP


Composição figurativa, em cores quentes e de expressão sensual, características da estética Arte Nova, representando seis figuras masculinas, com contornos definidos, nuas da cintura para cima, trabalhando numa fundição. A peça estava aplicada no frontão de uma oficina de fundição, destruída, situada na Rua dos Remédios à Lapa, em Lisboa, e fazia par com uma outra, similar do ponto de vista técnico e decorativo, alusiva a uma forja. Este painel foi realizado por José António Jorge Pinto (1875-1945), principal pintor de azulejos Arte Nova, na Fábrica de Campolide, em 1906.



José António Jorge Pinto - painel A Fundição, Fábrica de Campolide, 1906. © CMP


As Arts Déco triunfaram na Europa no final da 1ª Guerra Mundial, em 1918, mantendo-se durante duas décadas e substituindo a liberdade formal da Arte Nova por motivos mais depurados e geometrizados, de excelente design, cuja essência é mais gráfica do que volumétrica. Para além da vasta produção de azulejos aerografados da Fábrica de Loiça de Sacavém, destacaram-se as criações da oficina de azulejos da Fábrica Lusitânia, ao Arco do Cego em Lisboa, dirigida por António Costa, onde o discreto relevo utilizado na separação das cores planas era obtido através de tubagem, como nos exemplares expostos, provenientes da fachada da loja da própria fábrica.



Oficina de António Costa - placa toponímica e painéis da antiga loja da Fábrica Lusitânia, c.1930-39.  © CMP


Silhares de azulejos policromos de estilo Arts Déco, formando composições geometrizantes. Foram decoradas através de tubagem (tubelining), técnica exclusivamente utilizada em Portugal pela Fábrica de Cerâmica Lusitânia, que consistia na aplicação com bisnagas, de barro líquido que caia em fio sobre a chacota, formando desse modo os limites relevados das decorações que eram seguidamente esmaltadas, sugerindo de certa forma as antigas técnicas hispano-mouriscas da aresta.
Estes exemplares, criados na oficina de azulejos dirigida por António Costa naquela unidade fabril, c. 1930-39, constituíam parte da ornamentação da fachada da loja da Fábrica Lusitânia, na Rua do Arco do Cego, Lisboa, servindo de suporte informativo ao tipo de materiais ali comercializados. O primeiro integra a legenda GRÉS/ REFRATÁRIOS, enquanto o outro, fazia a separação entre os artigos publicitados. Foram recolhidos pelo Museu da Cidade, em 1988, aquando da demolição da fábrica.


Oficina de António Costa - painel da fachada da antiga loja da Fábrica Lusitânia, c.1930-39.  © CMP



Oficina de António Costa - painel da fachada da antiga loja da Fábrica Lusitânia, c.1930-39.  © CMP



Oficina de António Costa - painel da fachada da antiga loja da Fábrica Lusitânia, detalhe, c.1930-39.  © CMP



Oficina de António Costa - painel da fachada da antiga loja da Fábrica Lusitânia, detalhe, c.1930-39.  © CMP



Fred Kradolfer (1903-1968) foi precursor em Portugal do design gráfico, tendo a sua actividade estendida desde as artes gráficas ao vitral, à cerâmica e à publicidade. 
Kradolfer é o autor do revestimento azulejar da Confeitaria de Santos, executado na Fábrica de Sant'Anna, Lisboa, e meados do século XX. Composição de feição bastante gráfica, organizadas de modo seriado, alternando três azulejos diferentes: um com uma barca e os corvos (Armas de Lisboa) sobre um fundo de linhas paralelas, simulando ondas; outro, só a repetir essas linhas; e o restante, com simplificadas volutas, enquadrando traços arqueados, dispostos na vertical e que intercalam silhuetas de aves. Os dois exemplares, ambos em verde e vermelho, mas com as cores trocadas entre si, encontravam-se a revestir uma confeitaria na zona de Santos-o-Velho.




Fred Kradolfer - azulejos da antiga Confeitaria de Santos, Fábrica de Sant'Anna, meados do Séc. XX. © CMP 



Fred Kradolfer - azulejos da antiga Confeitaria de Santos, Fábrica de Sant'Anna, meados do Séc. XX. © CMP 



Fred Kradolfer - azulejos da antiga Confeitaria de Santos, Fábrica de Sant'Anna, meados do Séc. XX. © CMP 



Vista parcial da exposição Fragmentos de Cor | Azulejos do Museu de Lisboa. © CMP


Continua em: Azulejaria moderna na exposição Fragmentos de Cor | Azulejos do Museu de Lisboa II