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11/09/2011

O jazz morreu: Kyle Eastwood

Não se trata do acaso: o contrabaixista ao lado é de fato muito parecido com seu pai, o ator Clint Eastwood, tipo estranho de indivíduo que comparece a todos os Monterey Jazz Festivals, desde sua inauguração, em 1958. Portanto, do pai herdou a paixão pelo jazz, quer seja através de intensas audições caseiras de músicos como Duke Ellington e Count Basie, quer seja através da presença com o pai em memoráveis versões do Monterey Jazz Festival, onde era apresentado a figuras como Sarah Vaughan e Miles Davis. Criado em Carmel, California, o contrabaixista Kyle Eastwood tem demonstrado ser mais que o filho de Clint. Em inúmeras sessões de estúdio, tem produzido uma série regular de álbuns que, se por um lado mantêm certo afastamento do blues e do Neo-Bebop tradicionalista de um Wynton Marsalis, por outro têm resgatado com competência os legados do funky, do groove, do brazilian jazz e de outros elementos da world music que hoje encontram-se irremediavelmente associados ao jazz.

Kyle foi apresentado à linha do baixo ainda criança pelo próprio pai, que lhe ensinou a tocar as teclas da mão esquerda do piano, ficando o solo com a mão direita de Clint. Após algum tempo estudando cinema, Kyle percebe que sua verdadeira paixão é a música. Depois de alguns anos atuando como contrabaixista em Los Angeles e New York, grava seu primeiro álbum em 1998, para a Sony. Já então demonstrava certa aptidão para a composição, atuando em algumas trilhas sonoras bem sucedidas para o cinema e para a televisão. Em 2004, Kyle assina com a Candid Records, um dos selos independentes de jazz mais importantes da Inglaterra, com quem grava seu segundo álbum, Paris Blues, oportunidade em que restam claras suas múltiplas influências.




Acompanhado por alguns dos melhores músicos de jazz londrinos, como o pianista Andrew McCormack, e utilizando-se de uma linguagem atraente, Kyle alcança o sucesso junto ao público jovem, sobretudo na França, país que adota como segundo lar, bem como o respeito da crítica especializada. Atualmente, quando não está em turnê pela Europa, Japão ou EUA, Kyle divide sua residência entre Los Angeles e Paris. Para os amigos deixo as faixas Marciac, Moon Over Couronneau e Down At Ronnie's, retiradas do álbum Songs From The Chateau, gravado em 2011. Com Kyle estão Andrew McCormack (p), Graeme Flowers (t, flgh), Graeme Blevins (ss, ts) e Martyn Kaine (d). 





Agora, para aqueles que não gostarem do filho de Clint, sempre haverá esperança de que apreciem sua irmã Alison Eastwood. Notem como ela também adora um Moët & Chandon...







03/07/2011

Jazz criollo - Cafés e lojas de CD



Em nossa última viagem a Buenos Aires, em fevereiro de 2011, pudemos constatar que nem só de livrarias e bifes de chorizo vive a capital argentina. Em cada boa esquina você encontra agradáveis cafés, alguns deles centenários, como é o caso do lendário e pouco comentado Café de Los Angelitos, situado na Av. Rivadávia, 2.100. Inaugurado em 1890 pelo italiano Bautisto Fazio com o nome de Bar Rivadavia, o local com piso de terra e instalações precárias virou ponto de encontro da malandragem da época, reunindo uma série de payadores, espécie de repentistas, poetas improvisadores que, acompanhados ao violão, desafiavam-se uns aos outros, entre eles Gabino Ezeiza, Higuito Cazon e Jose Betinotti.



Devido à proximidade com o edifício do Congresso da Nação, o Café contava também com a frequência de muitos políticos, sempre dispostos a produzir aclamadas e infrutíferas discussões, como era o caso de figuras como Hipólito Irigoyen, José Ingenieros e Alfredo Palacios. Em 1920, ao ser adquirido pelo espanhol Ángel Salgueiro, o bar recebe seu nome atual que, segundo a lenda, faz referência à índole "angelical" de seus frequentadores, sempre vigiados de perto pela polícia. Torna-se também cada vez mais um ponto de encontro de artistas e intelectuais, como Carlos Gardel. Embora tenha fechado suas portas durante quinze anos (1992-2007), o Café de Los Angelitos voltou a funcionar, apresentando alguns dos melhores espetáculos de tango da cidade, agora com atenciosas funcionárias e instalações confortáveis para bem receber os turistas.



Já o Café Tortoni (primeira foto acima) é um clássico bastante conhecido e frequentado pelos turistas, onde é oferecido um show de tango mais estereotipado. Contudo, os bons músicos, suas instalações históricas e sua própria história valem a visita. Apesar de seu sucesso e importância, o site do café pouco informa sobre sua origem. Melhores informações podem ser obtidas no site Paralelo 35. Embora tenha sido inaugurado em 1858 pelo francês Jean Touan, é sob o comando de outro francês, Celestino Curutchet, que o Tortoni adquire seu nobre endereço atual e sua importância cultural. Diz a lenda que foram os olhos vivos de Curutchet, um homem pequeno de corpo e grande de espírito, que mantinha impecável a barbicha pontiaguda sob o casquete árabe de seda preta, que fez o sucesso do local. Talvez...

Situado na Avenida de Mayo, a meio caminho entre o Congresso e a Casa Rosada, o café era frequentado por pintores, escritores e músicos que, segundo o próprio Curutchet, se não podiam gastar muito, forneciam grande fama ao local, atraindo o público mais abastado. A forte imagem do café, portanto, foi construída ao longo de mais de cinquenta anos de dedicação de Curutchet, que esteve no comando do local até sua morte em 1925, aos noventa e sete anos de idade.



Já quanto às lojas de discos, é surpreendente o número das que ainda sobrevivem em Buenos Aires, principalmente nos bairros Recoleta e Palermo. Não faço a menor ideia de como elas competem com a internet, talvez mediante compras abusivas como as que realizei em diversas delas, do que resultaram duas boas centenas de álbuns, a maioria deles sobre músicos de jazz argentinos. Ou então sobrevivam apenas por cobrarem preços justos: o CD custa em média R$10,00. Bem, seja lá como for, para não ser cansativo, recomendarei ao amigo leitor apenas três delas: a Minton's, a Miles (Palermo) e a Notorious, esta última um misto de loja de CD, bar e casa de shows, onde se pode desembrulhar tranquilamente os álbuns adquiridos tomando um acolhedor café em seu diminuto e agradável jardim.

John Lester no jardim da Notorious, ouvindo jazz e visivelmente preocupado com a crise na Grécia.
Ele não sabia ainda, mas em poucas horas seria confrontado com um lauto chorizo e boas taças de um Catena Alta malbec 2002.


Foi lá, na Notorious, que conheci o saxofonista Piotr Baron, nascido em Wroclaw, Polônia, em 1961. Aos 16 anos já estava tocando jazz profissionalmente. Em 1984, recebe o prêmio de melhor solista no Jazz Aldia, festival de jazz em San Sebastian, Espanha. Além de trabalhar com grandes músicos da Europa, como Urszula Dudziak, Michał Urbaniak, Tomasz Stanko e Jasper Van't Hof, Piotr tem atuado também ao lado de grandes nomes do jazz norte-americano, tais como Art Farmer, Billy Harper, David Murray, Kevin Mahogany, Victor Lewis, Roy McCurdy, John Hicks, Marvin "Smitty" Smith, Kei Akagi, Joe LaBarbera, Billy Hart, David Friesen e Wadada Leo Smith, entre outros. Não bastasse, Piotr atua também como professor na Polônia e nos EUA.



Além de exímio saxofonista tenor e soprano, Piotr utiliza também com muita competência os saxofones alto e barítono, além do clarone. Nitidamente influenciado pelo Hard Bop, sua linguagem é impregnada pela música clássica e popular, o que o torna um intérprete versátil. A modernidade de seu fraseado sabe dosar com equilíbrio a técnica com a beleza, fazendo com que seus seis álbuns como líder possam ser apreciados não apenas pelos cultores do Neo-Bop, mas também por qualquer ouvinte que goste de boa música. Para os amigos deixo as faixas Tingel Tango e St. Louis Blues, retiradas do álbum Tango, gravado em 1996 para a Polonia Records. Com Piotr estão Jacek Niedziela (b) e Adam Czerwinski (d).


18/11/2010

Forró também é jazz: Frank Marocco

Ele é produzido apenas nos anos em que o enólogo decide que a colheita foi boa, dizia Tobias  Serralho enquanto eu tentava ouvir o solo de Frank Marocco, um dos mais respeitados acordeonistas dos EUA. Frank nasceu em Illinois no dia 2 de janeiro de 1931 e passou a infância num subúrbio de Chicago. Foi por lá que, aos sete anos de idade, iniciou os estudos do instrumento. Durante nove anos, além de tocar na banda escolar, foi instruído por George Stefani, sua primeira importante fonte de inspiração. Mais tarde, estudaria com o consagrado acordeonista Andy Rizzo, um dos mais influentes acordeonistas norte-americanos. Com dezessete anos, Frank vence um concurso nacional de acordeão, fato que o encorajaria a dedicar-se integralmente à música. Veja só, disse Tobias assim que o solo de Frank terminou: ele é cem por cento touriga nacional! Eu nem sabia que havia uma uva brasileira Lester! Antes que pudesse a explicar a Tobias que a touriga nacional não é uma cepa nativa do Brasil, Frank voltou a solar. Pois bem, após formar seu trio, Frank passa a se apresentar no nos estados do centro-oeste, onde conhece a esposa Anne, em Indiana. Já casado, decide fixar residência em Los Angeles e, já com um novo grupo, Frank passa a se apresentar em bares, clubes e hotéis de Las Vegas e Palm Springs. Ao mesmo tempo, aproveita as boas oportunidades oferecidas pelos estúdios de cinema e televisão, produzindo uma série de trilhas sonoras importantes, além de comparecer como sideman numa infinidade de shows e gravações. Ouça aqui sua interpretação de Four Brothers, retirada do álbum Jazz Accordion, lançado em 1979 pela Discovery.


Terminado o excelente 2º Festival Internacional de Juazeiro, que durante seis dias de shows reuniu o jazz de Frank Marocco, o tango do argentino Hector Del Curto, as melodias mediterrâneas do italiano Antonio Spaccarotella com os mais populares nomes do forró brasileiro, como Dominguinhos, Oswaldinho do Acordeom, Cicinho de Assis e Targino Gondim, pude finalmente verificar o estado deplorável em que se encontrava o velho amigo Tobias Serralho. Acostumado às doses homeopáticas da cachaça artesanal que produz em seu engenho em Petrolina, o poderoso organismo de Tobias não suportou adequadamente em jejum as três garrafas de Rio Sol Winemaker’s Selection Touriga Nacional. Produzido com a cepa nativa mais tradicional de Portugal, seu afinamento em madeira ocorre durante seis meses em barricas de carvalho francês. Vermelho-grená intenso e brilhante, possui aromas complexos que lembram frutas negras bem maduras, como amoras e framboesas, notas de pinheiro, chá earl grey e especiarias. Sedutor e encorpado, com taninos nobres. Fiquei absolutamente surpreso que, em pleno clima semi-árido, pudesse ser produzido um vinho tinto com tamanha qualidade, considerando seu custo: R$39,00.

Criada em 2002 pela vinícola Portuguesa Dão Sul, a Vinibrasil é um dos mais recentes e inovadores projetos da viticultura e enologia no mundo por ser a única a produzir vinhos de qualidade internacional na latitude 8° sul. Localizada no interior do Estado de Pernambuco, às margens do rio São Francisco, a Vinibrasil já conta com uma área de 200 ha de vinhas, de um total de 1.600 ha, das variedades Cabernet Sauvignon, Syrah, Alicante Bouchet, predominantemente, além das variedades portuguesas Touriga Nacional e Tinta Roriz. Toda essa área está equipada com um dos mais modernos sistemas de fertilização e irrigação, que torna possível a produção em condições semi-áridas. Desde sua criação, seus vinhos têm sido distinguidos com diversos prêmios nacionais e internacionais. Atualmente exporta para mais de 15 países.

Enquanto preparava um javali com pimenta rosa para acompanhar o convincente tinto, Tobias colocou a faixa Cavaquinho , de Ernesto Nazaré, retirada do álbum Appassionato, lançado em 2008 pela Barvin. Depois ficamos ouvindo Dominguinhos, Oswaldinho do Acordeom, Targino Gondim e Cicinho de Assis, interpretando respectivamente Eu Só Quero um Xodó, Lamento de Sertanejo, Vida de Viajante e Esperando na Janela. Enquanto isso, o luar do sertão abraçava a noite.

19/10/2010

Habla el jazz, calla la política

Na semana passada, Wynton Marsalis esteve em Cuba, apresentando-se com a espetacular orquestra do Lincoln Center, formada por quinze excelentes e, em sua maioria, jovens músicos. Era o jazz novamente rasgando as cercas ideológicas que sempre cismaram em separar os dois países. Sua presença na Ilha de Castro e a recente turnê de Chucho Valdés nos EUA lembram um pouco a atuação de Dizzy Gillespie e Chano Pozo que, em décadas passadas, incentivaram um memorável fluxo musical entre os dois países, culminando na invenção do afrocuban jazz e no asilo político de centenas de importantes músicos cubanos que, não fosse o Tio Sam, restariam desdentados e esquecidos em algum banco de praça da bela ilha. Num total de cinco concertos, Wynton Marsalis e a big band mais famosa do mundo contaram a história do jazz, interpretando clássicos de Ellington, Gillespie e Monk, com arranjos que de certa forma podem indicar os novos rumos desse velho estilo. É claro que os clássicos cubanos também estiveram na pauta, com o auxílio dos gabaritados músicos da banda de Valdés, a The Afro-Cuban Messengers, que também interpretaram composições de seu novo álbum, Chucho's Steps, lançado em 2010. Além da homenagem óbvia a John Coltrane, Valdés traz em seu novo cd a faixa New Orleans, tributo a um de seus mais célebres admiradores, Ellis Marsalis.

Ciceroneado por Chucho Valdés, talvez o melhor pianista de jazz cubano em atividade, Marsalis e sua banda participaram também de workshops e puderam ouvir o desempenho de bandas escolares do ensino médio e fundamental, passando aos alunos suas impressões e sugestões. Não bastasse, alguns deles foram convidados a tocar com a banda em sua última apresentação, na verdade uma emocionante jam session. Entre uma apresentação e outra, Marsalis arranjou tempo para participar da gravação de um novo álbum de filin, com Valdés e Omara Portuondo. Emocionada com o solo de Marsalis, a musa da voz cubana não conteve as lágrimas. 

Durante toda a turnê não se ouviu uma única palavra sobre política.

Marsalis, avesso a assumir qualquer posicionamento político explícito, disse que "estamos aqui para unir as pessoas através do swing". E quanto ao fato de que alguns músicos da banda não foram à Cuba por motivos políticos, alegou que se tratava de convicções particulares de cada um.

Eu, que nunca fui homem de muitos amigos, gostaria que Marsalis tivesse a coragem de Gillespie. Gostaria que ele se posicionasse em relação às centenas de músicos cubanos que abandonaram e ainda abandonam sua terra natal para viver na Europa e nos EUA. Gostaria que ele comentasse o sofrimento de homens como Arturo Sandoval, que teve sua música e a de seu conjunto Irakere utilizada pelo governo cubano sem sua autorização. Que teve sua criatividade tolhida por um sistema ditatorial. Que tentou diversas vezes o asilo político na Europa e nos EUA, mas sempre fraquejava diante da possibilidade de abandonar sua família em Cuba. Que teve a ousadia de se inflitrar no partido cominista cubano somente para obter autorização do governo para levar sua esposa Marianela e seu filho Arturo Jr. para uma turnê na Europa e, ao chegar em Roma, e com o auxílio de Dizzy Gillespie, pediu e recebeu asilo nos EUA.

Bem, pelo menos Marsalis não foi canalha em comparar os presos políticos que morrem de fome em Cuba com os bandidos comuns do Brasil. Para os amigos fica a faixa Las dos caras , retirada do novo álbum de Valdés. Tem até citação brasileira no magistral solo de Chucho. 

Para Valdés, a visita de Marsalis constitui um marco nas relações entre os dois países. Eu esperava mais. 

09/06/2009

Elas também tocam jazz - Saskia Laroo

Admiradora confessa de Miles Davis, a trompetista holandesa Saskia Laroo é conhecida nos EUA como “Lady Miles of Europe”. Descontando seu desempenho convincente também ao contrabaixo, é no sutil e econômico toque de seu trompete que Saskia parece reduzir a pó todo o preconceito de nosso amigo andaluz Frederico Bravante, para quem as mulheres não sabem tocar jazz, em especial quando manejando trompetes e contrabaixos acústicos. Nascida em Amsterdam em 1959, é certamente uma das poucas trompetistas de jazz proprietárias de voz própria, talvez oriunda da longa jornada - iniciada aos oito anos de idade – e da humildade característica dos grandes artistas: Saskia nunca sonhou em ser profissional. Mas tudo mudou aos dezoito anos, quando a moça troca a Matemática, que estudou na Universidade de Amsterdam, pela Música. Ao mesmo tempo em que estuda em importantes centros musicais, como na Muziekpedagogische Academie de Alkmaar, no Sweelinck Conservatorium, com Boy Raaymakers, em Amsterdam e na Muziekpedagogische Academie, em Hilversum, Saskia apresenta-se em diversos clubes da Europa, percebendo rapidamente a imensa responsabilidade artística que recai sobre o trompetista, elemento inevitavelmente considerado líder durante 99% das apresentações ao vivo. Além disso, ela mesma acreditava que não era suficientemente forte para manejar o trompete durante todo um concerto. Talvez por esses motivos tenha iniciado sua jornada tocando o contrabaixo, passando lentamente para o trompete.

Mas em 1979, com o auxílio das Organizações Tabajara, todos os seus problemas e temores desaparecem, tornando-se uma instrumentista respeitada em diversos contextos, desde o dixieland até o nu jazz, passando obviamente pelo mainstream jazz. Como toda inteligente e bela holandesa, Saskia abre-se facilmente às mais extravagantes experiências musicais, desde a dance music, o reggae, a salsa ou o hip-hop, integrando elementos diversos naquilo que se tem denominado nos becos de “swingin’ body music”. A partir de 1995 Saskia já adquire voz identificável, passando a liderar seus próprios conjuntos. Naquilo que nos afeta mais gravemente, o jazz, seus álbuns mais significativos são Sunset Eyes, gravado em 1998 com a participação do mestre Teddy Edwards (ts), e Jazzkia, gravado em 1999. Se não podem ser considerados clássicos do jazz atual, certamente constituem certidão de competência no contexto complexo do idioma bop. Para os amigos fica a faixa Spin , de sua autoria, com Albert Sarko (p), Jos Machtel (b) e Martin van Duynhoven (d).

11/11/2008

2gether

A leitura atenta do Pare de fumar para sempre, de Martin Raw, um dos maiores especialistas em aproveitar boas oportunidades de vendas, me fez acender mais um cigarro. Afinal, sabe-se lá, poderiam ser meus últimos tragos, caso o livro um dia venha a funcionar realmente. A ironia foi que, num momento delicado como esse, na difícil trajetória de um dependente químico, Warren Vaché e Bill Charlap interpretavam Easy Living no toca-discos. Justo no capítulo em que Raw se propõe a ensinar ao ex-fumante a manter-se definitivamente distante dos prazeres da lasciva nicotina. Se você visitar o All Music, não encontrará muitas informações sobre o álbum 2gether, gravado nos dias 13 e 14 de dezembro de 2000 em Connecticut. Lançado em 2001 pelo excelente selo de jazz Nagel Heyer, 2gether é, como bem define Dan Morgenstern nas liner notes, um dos mais bonitos álbuns de jazz lançados naquele ano. Na verdade, Morgenstern, que é diretor do Institute of Jazz Studies, vai mais longe, afirmando tratar-se de um de seus álbuns preferidos de jazz. No televisor cigarros gigantes sinalizavam a proporção do apoio de alguns manifestantes que, vestidos de esqueletos, rolavam em frente à Assembléia Legislativa de São Paulo apoiando a promulgação da lei que, agradecm os planos de saúde e as seguradoras de vidas, proibirá o fumar em todo e qualquer local fechado daquele colossal estado-membro.
Precisamos reconhecer: é irreversível a marcha humana em direção à vida eterna, à qualidade otimizada de vida e àquela tez absolutamente perfeita, esticada e imóvel. Oxalá não estarei mais por aqui quando todos os rostos forem idênticos, todos os sorrisos forem perfeitos e todos os nossos terríveis vícios eliminados. Haverá espaço para o improviso? E concordo com Morgenstern, diretor do Institute of Jazz Studies, que 2gether é um disco bastante saboroso, especialmente para aqueles que apreciam travessuras como as de Ruby Braff, um dos melhores cornetistas do swing, em memoráveis duos, como os com o pianista Ellis Larkins. As multas paulistas prometidas serão elevadas, algumas chegando a severos 3 milhões de reais, mas aplicadas somente contra o estabelecimento enfumaçado: a lei não prevê punição para o fumante, ao contrário do que se fazia com os dependentes químicos na década de 1950, quando eram presos e tratados como criminosos, como Art Pepper e Billie Holiday, ou perdiam sua licença para tocar, como Thelonious Monk. Numa linguagem que poderia confortavelmente ser catalogada como neobop, Vaché e Charlap contam velhas estórias - If I Should Lose You, You And The Night And The Music, Darn That Dream, Prelude To A Kiss, St. Louis Blues - com sotaque contemporâneo, mostrando que os three T's - time, technique e taste - podem evoluir de forma inteligente e bela. Cof cof.

03/06/2008

Elas Também Tocam Jazz - Sophie Alour

E nós gostamos da saxofonista Sophie Alour, Mr. Lester? Sim Mr. Scardua, nós gostamos dela. É o tipo de assunto que me alegra e me faz lembrar de nosso poeta mais feliz: Vinicius, o de Moraes. A certa altura, em seu livro O Sentimento Do Sublime, ele diz:

Meus amigos, meus irmãos, cegai os olhos da mulher morena
Que os olhos da mulher morena estão me envolvendo
E estão me despertando de noite.
Meus amigos, meus irmãos, cortai os lábios da mulher morena
Eles são maduros e úmidos e inquietos
E sabem tirar a volúpia de todos os frios.


E por aí vai, até que, a certa altura, o poeta suplica que o salvem dos braços da mulher morena, porque:

Eles são lassos, ficam estendidos imóveis ao longo de mim
São como raízes recendendo resina fresca
São como dois silêncios que me paralisam.
Dois silêncios Mr. Lester? Sim, Mr. Scardua, existem coisas assim. Os lábios e os braços de Sophie têm um pouco da mulher morena de Vinicius. A saxofonista Sophie Alour tem a boca, os braços e, seguramente, as mãos da mulher morena. Claro, sua linguagem não é a linguagem dos naufrágios sussurrados nas madrugadas. Seu alfabeto são as notas musicais e sua gramática é o improviso. E para aqueles que procuram algo novo no jazz, e algo feito por uma mulher morena, Sophie pode ser um excelente objeto de investigação. Ela nasceu francesa faz cerca de 30 anos e, desde logo, partiu pela estrada esburacada do autodidatismo, com todos os solavancos e curvas que costumam importunar os aventureiros viajantes. Aos treze anos já tocava o clarinete, aos dezenove descobre o saxofone e, ao lado da Vintage Orchestra, estabelece sua posição como instrumentista. Nos anos seguintes teve seus sextetos, participou de outras big bands até que, em 2004, encontra outra mulher morena, a organista Rhoda Scott, com quem aprendeu os temperos e sabores da África. Em 2005 lança seu primeiro álbum, Insulaire, estabelecendo-se como uma dos principais saxofones franceses de sua geração. Maleável como toda mulher morena, Sophie percorre todas as possibilidades do jazz moderno, desde os trabalhos mais tradicionais e acústicos até experiências elétricas pouco ortodoxas, como o trabalho com Benjamin Roy e seu álbum DJ Killer. E todos estes temperos e kilowatts estão presentes em seu último álbum, Uncaged. Mas, lá no fundo, podemos perceber o silêncio da mulher morena. E nós gostamos, Mr. Scardua. Para os amigos ( ). Boa audição.

27/04/2008

Elas Também Tocam Jazz : Renee Rosnes

Definitivamente, o ambiente globalizado é um território muito mais acolhedor que uma aldeia para a pianista, arranjadora e compositora canadense Renee Rosnes. Nascida em 24 de março de 1962 na comunidade indígena Saskatchewan às margens do Lago Cowichan, província da Colúmbia Britânica, e filha biológica da nativa Mohinder Randhawa. Aos 4 meses, foi adotada pela família de um operário do norte de Vancouver. Martelando com insistência nas teclas do piano, aos três anos, obtém mais alegria que o convívio de suas bonecas. Aos 5, quis aprender violino. Ouvinte na adolescência de Oscar Peterson, Cedar Walton e Herbie Hancock deslumbra-se com o jazz. Ingressando, no entanto, ao final do período colegial, no curso de piano clássico da Univ. de Toronto. Nas horas livres gasta seu tempo tocando e ganhando “algum adicional” nos clubes de jazz e nas apresentações da rádio educativa. Diante de seu virtuosismo, recebe uma bolsa da “Canada Council of the Arts” pra aperfeiçoar-se em NY, em 86. Logo consegue trabalho, entrando nos grupos do trombonista J.J. Johnson, dos saxofonistas Wayne Shorter, Joe Henderson e do trompetista Freddie Hubbard. Era o início de uma ascensão meteórica. Em 90, assina com o selo Blue Note gravando seu primeiro disco com seu nome ao título e as participações de Branford Marsalis, Shorter (sax), Ron Carter (b ac) além do próprio Hancock, num dueto. No trabalho seguinte,“Without Words”, aventura-se no acompanhamento com cordas. Nos títulos de seus discos posteriores parece tentar revelar, de certo modo, suas confissões íntimas e emotivas: “For the Moment” (90), “Ancestors”(95)”, “As We Are Now”(97), “Art & Soul”(99). Determinada a reconhecer sua origem, Renee localiza sua mãe biológica em 94 quase ao mesmo tempo em que recebe a noticia que a adotiva, Audrey, tem diagnosticado um câncer terminal. Essa combinação perversa de sensações: a da tragédia e alegria, servem de material de inspiração “comovida” em Ancestors (tradução livre: ancestrais). Em cumplicidade com músicos do calibre de Chris Potter(sax), Christian Mc Bride(b), Billy Drummond (bat e ex-marido), Walt Weiskopf(sax), Lewis Nash(bat) entre outros, exercita a constante busca pela inovação com certa dose de ousadia. Utilizando a linguagem do jazz, no caso, a do hard bop, como guia nas improvisações associadas a técnica clássica com o “tempero” do swing e a riqueza no desenvolvimento melódico. Em Life on Earth(2002), aborda a world music, sem usar tacape, cocar e nem os atabaques do Olodum. Apenas, uma interessada pesquisa das manifestações musicais africanas e do Brasil, distante de qualquer viés oportunista. Quando recolheu esse material levou em consideração sua qualidade musical, não apenas a origem étnica em si. Da musica brasileira gravou temas de Egberto Gismonti e Edu Lobo. Na atualidade consegue, sabe-se lá como, tempo pra participar de forma quase simultânea como “sidewoman” dos grupos de Bobby Hutcherson(vib), James Moody(sax) e da Dizzy Gillespie All-Star Big Band. Ainda enfrentando, em certos períodos do ano, os 4.200 km que separam Nova York, sua morada , até São Francisco, sede da SF Jazz Collective, uma ONG de jazz fundada em 2003 dedicada a criação coletiva e estudo das obras dos grandes compositores originais. Os resultados são ministrados em “workshops” e conferidos para apreciação pública nas apresentações do grupo - um oiteto (tema de uma resenha detalhada futura). No final de agosto de 2007, Rosnes casou-se - pela segunda vez - com o pianista Bill Charlap e certamente já determinou quem faz uso no lar, prioritariamente, de um dos dois pianos Steinway Grand, presenteados pelo fabricante. Ouça Renee ( ) aqui.

27/12/2007

Lot Of Fun

Conversava outro dia com Mr. Lester acerca das razões que o levam a considerar Michael Brecker um dos saxofonistas mais chatos dos últimos 40 anos. Cheguei a lembrar a Mr. Lester que a crítica especializada considera Michael um gênio, afirmando que nele encontramos o verdadeiro continuador da obra de John Coltrane. Enquanto Lester sorria ironicamente, arrematei: a crítica nacional vem copiando essas teses há vários anos, reforçando que o rei não está nu. Lester limitou-se a dizer que apenas as crianças, em sua imprudente sinceridade, são capazes de ver que o rei está nu. Além disso, disse ele, prefiro falar sobre jazz. Remexendo em sua prateleira, retirou um álbum e disse: ouça e, caso goste, escreva uma resenha para o Jazzseen. O álbum era 50th Anniversary Álbum, do saxofonista tenor suíço Roman Schwaller. Roman nasceu em 1957, em Frauenfeld. Começou estudando clarinete clássico, aos 14 anos. Três anos depois mudou para o sax alto, passando a tocar jazz. Na Swiss Jazz School, em Berne, passa a tocar o tenor. Indo para Munique, aos vinte anos, passa a integrar o quinteto de Klaus Weiss, com quem grava o álbum Density, em 1980. No final da década de ’70 parte para New York, onde grava Four Leaf Clover, seu primeiro álbum como líder. Durante suas aventuras, Roman teve oportunidade de tocar e gravar com músicos como Mel Lewis, Johnny Griffin, Sal Nistico, Jimmy Cobb, entre outros. Desde 1980 integra a Vienna Art Orchestra, além de continuar gravando e atuando em diversos festivais de jazz pela Europa. No álbum 50th Anniversary podemos perceber que o jazz requer emoção, vigor, alegria e tesão. Sem isso, de nada adianta aquela técnica fria de laboratório, como a encontrada em centenas de sonolentos e tristes álbuns da ECM. Talvez por isso Lester diga que os álbuns da ECM devem ser guardados em frigoríficos e não em estantes de jazz. Para os amigos fica a faixa All The Things You Are, em homenagem a Oscar Peterson. Até a próxima!

Roman Schwaller - ...

11/12/2007

Sonho de Padaria

Eu entendo, em parte, a revolta e a ira de Mr. Lester com relação aos Beatles. Muitos e excelentes instrumentistas de jazz não teriam passado fome se não tivessem surgido esses grupos musicalmente menores e com grande apelo sobre os jovens brancos e assustados da classe média norte-americana, jovens reprimidos sexual e politicamente, que saíam em disparada ao ver um negro se aproximando. Grandes mestres, como Dexter Gordon, fugiram para a Europa, onde algum público menos incapaz ainda apreciava a boa música popular (entenda-se jazz). Outros, como o pianista Albert Ammons, foram lavar carros em New York. Talvez o gordo pianista tenha mesmo lavado alguma limusine dos Beatles estacionada na Quinta Avenida, e recebido uma lauta gorjeta, provavelmente de Lennon, o mais sensível dos vendedores de seguro ingleses que já conheci. Infelizmente, não compreendo o que tem a ver Beatles com música. Se falássemos em cultura pop, em questionamento de valores tradicionais, como sexo antes do casamento, liberdade de expressão e política anti-nuclear, até que poderíamos enxergar alguma valia nesse e noutros conjuntinhos de rock. Mas música? Música fazia Jimmy Hendrix que, por falta de melhor rótulo, foi chamado de rockeiro. Bem, é preciso deixar claro que não tenho nada contra os temas singelos da música pop. O próprio jazz, sabemos bem, utilizou-se de inúmeros. Billie Holiday cantou Georgia on My Mind e, nem por isso, o tema deixou de ser, como diria Mr. Lester, idiota.

O que conta, e sempre contará em jazz, é a interpretação, é a forma como você diz o ‘eu te amo’. Bill Charlap, pianista nascido em 1966, parece estar entre aqueles músicos de jazz que, a princípio, teria tudo (técnica, talento e sensibilidade) para dar continuidade a um trabalho pegajoso e estéril dentro do contexto paupérrimo da música clássica norte-americana, se é que existe música clássica norte-americana. Poderia, também, produzir aqueles gostosos e açucarados sonhos de padaria vendidos na Brodway. Mas, por São Coltrane, Charlap optou por largar a faculdade de música e mergulhar nos clubes de jazz. Aos vinte anos, já era o pianista de Gerry Mulligan. Aos trinta, o de Phil Woods. A tal opção pelo autodidatismo, que tanta falta tem feito ao jazz contemporâneo, gera oportunidades interessantes para que Charlap introduza, lenta e delicadamente, algumas novas abordagens melódicas, rítmicas e harmônicas no jazz, utilizando como meio bons e velhos standards. Essa sutileza no renovar, essa delicadeza no evoluir, faz com que Bill seja, em minha modesta opinião, um dos pianistas mais interessantes da nova geração. Para os amigos fica a faixa My Shinning Hour, retirada do dulcíssimo álbum ‘S Wonderful, gravado em 1998, em trio com os irmãos (veja os comentários) Peter (b) e Kenny (d) Washington. Até a próxima!

Bill Charlap Trio ...

02/12/2007

Русские также касатьются джазу

Outro dia conversávamos, eu e Mr. Lester, sobre o jazz russo. Eu havia comprado um álbum bastante experimental do trompetista e compositor Vyacheslav Gayvoronsky. Enquanto ouvíamos Yankee Doodle Travels, lançado pela Solyd Records (SLRO 140), lembramos bastante de Mr. Salsa, confessadamente afeito a experimentações inusitadas, como é o caso desse álbum em duo de trompete e contrabaixo. É o tipo de álbum que tanto pode ser classificado como jazz moderno ou como música clássica de vanguarda, com diálogos interessantes e bem construídos mas, é preciso reconhecer, sem nenhum swing. Isso não impede que apreciemos a incrível performance do baixista Vladimir Volkov que, com dedos, arcos e tapas, trata seu instrumento com a delicadeza que se poderia esperar de um camponês russo colhendo uma aramatchka iv joper lhubit lest, flor típica da região de fronteria por onde fugiu Adolpho Bloch. Mr. Lester, então, levantou num rompante e recolheu da sua velha estante o álbum Kadans nº 2, do também trompetista e também russo German Lukianov. Dessa vez ouvimos realmente jazz, com um swing, se assim podemos dizer, russo. O swing russo é preciso demais, aritimético ao extremo, sem aquelas síncopes inesperadas e sem aquelas 'quebras' de meio tom que, acredito, somente os músicos negros, e alguns raros músicos brancos, norte-americanos sabem providenciar naqueles momentos em que menos esperamos. Em certas ocasiões ficamos com a impressão de que estamos ouvindo alguns músicos de formação clássica tentando tocar jazz, o que, de fato, é o caso de alguns integrantes da banda de Lukianov. Foi na sexta faixa, So What, que lembramos do saudoso amigo Olney, um dos primeiros bateristas a frequentar o Jazzseen. Após uma introdução quase marcial com solo de bateria - que mais parece uma bateria eletrônica de tão cronometrada, temos um jazz de primeira, com um sotaque todo próprio, mas que agrada. Aos amigos deixamos a tal faixa, com bons solos de Yury Yurenkov no sax. Fui!



German Lukianov - ...

23/08/2007

Un universo extenuante

The Bad Plus, formación creada en el año 2000, presenta con "These Are The Vistas" (no pw) su segundo trabajo discográfico tras un primero homónimo ("The Bad Plus", Fresh Sound, 2001). Segundo que curiosamente parece ser primero a tenor de las diversas promociones que hablan de álbum debut. Cosas de multinacional. Sea como fuere en este trabajo se recuperan un par de composiciones de la primera grabación. Una de ellas es la versión de "Smells like teen spirit" del grupo Nirvana. Quizá el reclamo de la formación de Kurt Cobain facilita el apartado promocional o quizá sea decisión revisionista del trío. Sea como fuere el disco iniciático suena ya a curiosidad de coleccionista. "The Bad Plus" es ortodoxia en formación (piano, contrabajo y batería) pero heterodoxia en sonido. No son inventores de un nuevo lenguaje pero si esponja de la música contemporánea (entendida esta como aquella música hecha en nuestros días). Conforman su modo de expresión a partir de los lenguajes melódicos del pop y del jazz y los ritmicos del rock, pop y dance. Todo ello unido crea el universo "The Bad Plus", un universo extenuante a la vez que intrigante. El repertorio del trío es también reflejo de esas influencias rítmicas y melódicas. Composiciones propias (ocho en el disco) junto a tres versiones de temas de Nirvana, Blondie y de Aphex Twin. Tres ejemplos para analizar qué hay de cierto en el ánimo "deconstructor" de la música de "The Bad Plus". Siendo sincero. Conozco a Nirvana (al menos el tema versionado), me suena Blondie y no conozco a Aphex Twin. Así que si al ejemplo de "Smells like teen spirit" me atengo la "deconstrucción" no es prácticamente tal ya que se respeta casi al completo la estructura original de la composición. Justo en el momento en que parece romperse la forma se reexpone el tema. Será cosa de las limitaciones cronométricas del disco. En directo es de esperar mayor ruptura. Una de las frases promocionales define a "The Bad Plus" como "el trío más ruidoso jamás visto", casi en contraposición a la también promocional frase de ECM "el sonido más hermoso después del silencio". Y es que con "The Bad Plus" el silencio se convierte en caos. La belleza de las armonías y melodías "amables" se va tornando en un torrente sonoro donde los ritmos se cruzan y las tres "voces" parecen caminar independientemente para terminar confluyendo al final del camino. Buen ejemplo es el tema "Silence is the question" ("el silencio es la pregunta") firma del bajista Reid Anderson donde la calma inicial se tensa hasta llegar a un caos de intensidad casi minimalista (por momentos uno parece escuchar en el piano la insistente reiteración arpegiada de, por ejemplo, un Philip Glass) para terminar confluyendo de nuevo los tres en ese silencio (sonoro) que forma parte de la pregunta. Una pregunta con respuesta en el anterior trabajor: "love is the answer" ("el amor es la respuesta"). Gracias Mr. Lester. ¡Véalo!

13/03/2007

È Vero

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Os italianos sempre estiveram, desde o início, profundamente envolvidos com o jazz. Prova disso é o trabalho do controvertido trompetista Nick LaRocca. Nascido em New Orleans mas de origem italiana, Nick já fazia jazz por volta de 1905, aos quinze anos de idade. Apesar de sua tonalidade satisfatória, Nick nunca foi considerado um grande improvisador, embora a noção de improviso, naquela época, seja bastante diferente daquela trazida por Armstrong em 1924/1925. Bem, o fato é que Nick sempre reclamou seu lugar entre os inventores do jazz, assim como o fez Jelly Roll Morton. Quanto a isso, nunca chegaremos à uma conclusão definitiva. O fato é que Nick fundou e liderou a Original Dixieland Jazz Band, primeira banda de jazz a realizar uma gravação (isso foi em 1917). Embora muitos critiquem essas primeiras gravações de jazz – principalmente pelo fato de que a Original Dixieland Jazz Band era toda formada por músicos brancos – ninguém pode negar que Nick causou grande estardalhaço em Chicago, em New York e na Europa, contribuindo de forma significativa para a divulgação do jazz naqueles primeiros tempos. Ok: é quase certo que o lendário trompetista negro Buddy Bolden teria sido, segundo consta em inúmeros depoimentos da época, o verdadeiro inventor do jazz, com sua sonoridade prontamente identificável, sua potência inigualável (seus solos podiam ser ouvidos de uma ponta a outra de New Orleans) e com seus improvisos até então nunca ouvidos nem imaginados. Mas, até onde sabemos, Buddy morreu louco e infelizmente nunca gravou nada.

Outro mestre negro do jazz, atuante na mesma época de Nick, foi o trompetista Freddie Keppard, considerado o herdeiro musical de Bolden. Contam os livros que Freddie teria sido convidado a gravar em 1916 mas, com medo de que outros músicos copiassem suas idéias, recusou a oferta. Diz a lenda que Freddie cobria as válvulas de seu trompete, evitando assim que outros músicos roubassem sua técnica. Resultado: Nick entrou para a história do jazz e Freddie caiu no quase esquecimento, não fossem suas gravações de 1923/24. Mas voltemos à Itália: seja lá como for, o fato é que os italianos sempre estiveram, desde as origens, presentes na configuração do jazz. Muitos críticos radicais os acusam de usurpadores e oportunistas brancos, responsáveis por simples contrafações dessa arte musical originalmente negra. Esse tipo de discussão, acredito, nunca terá um fim no jazz. O que posso dizer, e com certeza, é que na Itália de hoje está se produzindo o melhor post bop que conheço, melhor mesmo do que aquele produzido nos EUA. Trompetistas como Aldo Bassi, Alberto Mandarini, Paolo Freso, Enrico Rava e Pino Minafra, saxofonistas como Carlo Actis Dato, Stefano Di Battista, Eugenio Colombo, Maurizio Giammarco, Mauro Negri, Roberto Ottaviano, Gabriele Mirabassi, Alberto Pinton, Massimo Urbani, Gianluigi Trovesi e Mario Schiano, trombonistas como Giorgio Giovannini, Gianluca Petrella, Giancarlo Schiaffini e Sebi Tramontana, guitarristas como Francesco Barberini, Franco Ceccante, Cláudio Cusmano, Guido Di Leone, Fabio Mariani, Nicola Mingo e Enzo Rocco, pianistas como Stefano Battaglia, Stefano Bollani, Antonio Farao, Luca Flores, Giorgio Gaslini, Enrico Pieranunzi, Umberto Petrin, Guido Manusardi e Walter Gaeta, entre muitos outros, têm produzido um dos melhores jazz da atualidade.


Aqui você encontra sim uma pitada daquele neo-bop da escola de Wynton Marsalis, calcada na rica tradição dos mestres. Mas existe, pelo menos na minha orelha, uma grande diferença: os italianos, talvez por se considerarem menos responsáveis do que os negros pela manutenção dessa arte negra, são muito mais livres e criativos que os neo-tradicionalistas norte-americanos. Não sentem medo de experimentações mais agressivas e não se preocupam muito em estabelecer limites à criatividade. Resultado: sua música soa mais espontânea, mais rica e mais excitante do que aquela produzida pelos sonolentos young lions. Para os amigos navegantes deixo uma faixa do excelente saxofonista italiano Rosario Giuliani, sem dúvida um dos melhores altos do jazz contemporâneo. Se você um dia sonhou em ouvir uma mistura de Charlie Parker com John Coltrane ou de um Eric Dolphy com um Wayne Shorter, acredito que vai apreciar muito o som de Giuliani. É logo ali, no Gramophone Jazzseen.

26/01/2007

Quinta Emenda

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Lá pelas tantas você já não percebe que a pia do banheiro, além de ser lisa e estar molhada, é levemente inclinada. Então, você repousa ali sua taça de vinho e, enquanto se dirige ao urinol para ser abençoado com a despressurização da bexiga, sua taça vai deslizando lentamente, até se estilhaçar no chão. Com o susto, você nem percebe que sua calça e sapatos estão ensopados de vinho e sua braguilha ainda está aberta: atônito, você só pensa em sair correndo dali imediatamente, evitando assim um eventual flagrante pelas autoridades competentes. Mas, se acontecer o pior, poderá sempre alegar que não houve dolo. Foram exigências técnicas que o levaram a livrar-se da taça. Além disso, aquela inclinação absurda da pia não encontra amparo em nenhuma norma da ABNT. E nem seria possível, por Deus, reconstituírem suas digitais a partir daqueles milhares de estilhaços espalhados aleatoriamente pelo assoalho. Ou seria?

Com aquela cara assustada de ‘não foi eu não’ você volta para o show do contrabaixista Neal Miner e, olhando para todos os lados para ter certeza de que não está sendo seguido, pede outra taça daquele vinho de garrafão de 4 dólares que é servido no Smalls. Com o solo de trombone de John Mosca, você acaba relaxando e, lá pelas tantas, você já nem sente que sua calça permanece molhada e, sua braguilha, aberta. Já é quase uma hora da madrugada e o jazz continua rolando impassível, alheio às conversas, aos sorrisos e aos sons de talheres ou taças que caem ao chão. Para os amigos a faixa Blues For Red And Brown, do álbum The Evening Sound, na Radiola acima. Smalls: um dos melhores e mais informais clubes de jazz de New York. Só falta colocar a pia do banheiro na horizontal.

25/01/2007

Esses malditos insubstituíveis

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Desde criança eu ouço que “ninguém é insubstituível”. E, como toda criança, eu sempre quis entender a tal frase como melhor me aprouvesse. Para mim ela queria era dizer que ninguém é substituível. Naquela minha cabeça ingênua que somente a infância permite, não podia imaginar que as pessoas pudessem ser trocadas impunemente umas pelas outras, como um caixa de supermercado é trocado por outro sem LER ou como um analista sênior é trocado por um analista júnior mais barato. Na ensolarada infância nossa compreensão das coisas é bastante mais rica e ampla, a ponto de reconhecermos em cada indivíduo toda a riqueza que o torna único, insubstituível, inalienável. Mas, com o passar dos anos, com a luta obstinada por um emprego mal remunerado e com os sorrisos falsos das recepcionistas ISO 9000, vamos modificando nossa audição. Tornamo-nos adultos, essas crianças míopes e surdas, insensíveis e gananciosas.
Farinha pouca, meu pirão primeiro. Talvez alguns de nós respeitemos apenas e tão somente os artistas, essas figuras de fato e de direito insubstituíveis. E muito desse respeito pelos artistas vem quase sempre acompanhado de um sentimento estranho, misto de incômodo, inveja e saudosismo. Incômodo porque o artista, como um imenso iglu espelhado, nos expõe ao ridículo do que nos tornamos quando adultos. Inveja porque, lá no fundo, gostaríamos de estar ali, brincando e sorrindo como ele brinca e sorri. Saudosismo porque lembramos de nossa infância, aquele lugar perdido e distante onde éramos nós que dávamos significados às frases, aquele quintal onde nenhum de nós era substituível. Somente as crianças podem tocar sax e improvisar. Ao amigo e artista Salsa, proprietário daquele espírito livre de que nos fala Nietzsche, desejo boas férias e envio a faixa Frank’s Blues, com o insubstituível pianista Frank Hewitt. O álbum, um dos melhores que conheço em trio, é We Loved You, lançado em 2004 pela Smalls Records. Até!

18/09/2006

Elas Também Tocam Jazz - Virginia Mayhew

. Incentivada pelos avós, a menina começou a estudar clarinete aos dez anos, passando para o sax alto na adolescência. Hoje Virginia toca também o tenor. No colégio e na faculdade tocou de tudo: rock, pop e jazz. Na década de 80 toca com a trompetista Rebecca Franks e na de 90 apresenta-se no festival de jazz de Monterey. Atuou com variados mestres, entre eles Toshiko Akiyoshi, Kenny Barron, Slide Hampton, Sahib Shihab e Clark Terry. Hoje Mayhew possui voz própria e estilo plenamente desenvolvido. Está sempre no circuito, produzindo aquele tipo de jazz do qual gosto muito: uma espécie de post bop sem preconceitos, mas também sem muitas aventuras escatológicas. Acima, no Gramophone Jazzseen, deixo as faixas Voyage e Time Alone, ambas do excelente cd Nini Green, lançado em 1997 pela Chiaroscuro. Com a menina estão Ingrid Jensen (t) – preste atenção nessa trompetista! -, Kenny Barron (p), Harvie Swartz (b), Adam Cruz (d) e, para a alegria de nosso amigo Garibaldi, o percussionista Leon Parker. Boa audição!

23/08/2006

Solo de contrabaixo

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Salvo engano, foi Jimmy Blanton, o baixista de Duke Ellington, quem, ainda nas décadas de 1920 e 30, começou a manusear o contrabaixo de forma menos convencional. Saturados daquela odiosa rotina de marcar o tempo de forma inexorável como o faziam as velhas tubas, os contrabaixistas passaram a inventar diversas aventuras rítmicas com as cordas de seus instrumentos, como foi o caso do famoso walking bass de Blanton. Mais adiante, nas décadas de 1940 e 50, surgem músicos que decidem investigar as possibilidades melódicas desse curioso e pesado instrumento. Scott LaFaro e Charles Mingus são os nomes que mais me impressionaram nessas pesquisas. Mingus, além disso, impôs um respeito pelo contrabaixo até então inédito no mundo saxofônico do jazz, muito disso em virtude de sua generosa e inigualável capacidade de compor. Dave Holland é da geração seguinte, daquela que herda toda essa rica experiência pela qual passou o contrabaixo, sabendo aliar desde o mais sedutor swing ao mais caótico free jazz, desenvolvendo ao limite a capacidade melódica de seu picaresco instrumento. Proprietário do mais significativo leque de composições desde Charles Mingus, Dave é, para mim, o mais importante contrabaixista do que se costuma denominar de neo bop, ou seja, desse estilo contemporâneo que entende e domina o idioma bop, mas que procura desenvolvê-lo em novos e comportados formatos. Dono de uma técnica precisa, Dave já tocou com figuras como Coleman Hawkins, Ben Webster, Joe Henderson, Thelonious Monk, Miles Davis e Sam Rivers. Preciso dizer mais para termos idéia da versatilidade desse músico? No Jazzseen Salad - acima, à direita - o argonauta mais curioso pode ouvir Dave em excelente companhia: Robin Eubanks (tb), Chris Potter (as, ts), Steve Nelson (vib) e Billy Kilson (d). Mande o saxofone marcar o tempo que o contrabaixo quer mais é fazer um solo. Boa audição!

21/08/2006

Elas Também Tocam Jazz

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A utilização sistemática de heroína talvez tenha contribuído decisivamente para o enfarto fulminante que matou Emily Remler aos 32 anos. Sua morte prematura impediu que essa excelente guitarrista estabelecesse de forma definitiva um estilo próprio. Bastante influenciada pelo toque de Wes Montgomery, a menina Emily começou estudando violão em Berklee aos dez anos e, em 1980, já gravava seu primeiro álbum como líder. Seu trabalho foi quase todo em trios ou quartetos, num clima post bop que me agrada bastante e faz a gente pensar que grande guitarrista ela poderia ter sido se ainda estivesse por aqui entre nós. Logo acima, no Gramophone Jazzseen, deixo para os amigos as faixas Hot House e In A Sentimental Mood. Boa audição!

17/08/2006

Milcho Leviev - Up & Down

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Leviev nasceu em 1937 na Bulgária onde aprendeu piano clássico. Na década de 60 já estava tocando em programas de rádio e televisão. Após algum tempo na Alemanha, fixa-se nos EUA onde passa a trabalhar com Don Ellis. Além de suas experiências como compositor, Leviev tem mostrado grande versatilidade como instrumentista, trabalhando com orquestras (Gerald Wilson), fusion (Al Jarreau), west coast (Art Pepper) e post bop (Charlie Haden). Os dois discos de Leviev que eu mais gosto são Blues For The Fisherman, com Art Pepper, e Up & Down, com o excelente baixista Dave Holland. Aos amigos navegantes deixo a faixa Billy's Bounce, do disco Up & Down, gravado em 1987 e lançado pelo selo M-A Recordings. É logo ali no Jazzseen Salad - acima, à direita. Espero que gostem!

11/08/2006

Jazz é ao vivo

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Muitos críticos e estudiosos dizem que o jazz é uma experiência que só pode ser efetivada completamente ao vivo. Somente no momento em que está acontecendo o jazz se manifesta em toda sua plenitude. Por melhor que seja a gravação, nunca se consegue a mesma emoção. Eu concordo com essa opinião. A vibração do jazz feito ao vivo nunca é captada em todas as suas nuances pelos microfones, por mais avançada que seja a tecnologia aplicada. Assim, caso você não tenha ido ao Village Vanguard entre os dias 21 e 26 de março de 1995, só nos resta ouvir Joshua Redman aqui mesmo no Gramophone Jazzseen - no topo da página. Para se ter uma idéia do som que esse saxofonista inglês produz, tente imaginar Coleman Hawkins, Sonny Rolins e John Coltrane numa só pessoa. Essa seria a sonoridade que eu identifico em Joshua. Acompanhado por Peter Martin (p), Christopher Thomas (b) e Brian Blade (d), você ouve Just In Time. Não é ao vivo, mas é excelente.