Nenhum dos apelos de Vovô Acácio junto à imprensa foram ouvidos. Suas reuniões com Juscelino foram em vão. As súplicas ao Papa deram em nada. Brasília nasceu cinza, pesada, sem verde e sem qualquer conexão com os arredores, do que resultou na favelização horizontal da vizinhança, também sem verde e sem jardins, como numa metástase. Visivelmente transtornado, Vovô caminha com dificuldade até a velha estante, de onde retira uma surrada pasta com os projetos originais de Welwyn Garden City, construída quarenta anos antes de Brasília. E cochichava: veja Paulinha, olhe aqui a primeira casa ocupada da cidade jardim, nas vésperas do natal de 1920. Depois, retirando outra foto, disse: está vendo este bebê aqui, é Chris Barber, um dos maiores músicos de jazz da Inglaterra. Sabe onde ele nasceu? Exatamente, em Welwyn Garden City!
Colocando no toca-discos um desconhecido álbum de Chris e apertando entre os dedos a rolha de um dos Château Latour 1934 abertos por Niemeyer durante aquele terrível encontro, Vovô passou a nos contar um pouco mais sobre o músico inglês. Nascido na cidade jardim em 17 de abril de 1930, Chris iniciou os estudos de violino aos sete anos, passando para o trombone aos dezoito e, em 1949, forma sua primeira banda de Dixieland. Entre 1951 e 1954, Chris frequenta a Guildhall School of Music, em Londres, onde estuda trombone e contrabaixo. Nesse período, forma um quinteto e, com a chegada do trompetista Pat Halcox, um sexteto, com o qual se apresenta no Club Creole, também na capital inglesa.
Em 1953, Pat Halcox é substituído por Ken Colyer, talvez o mais importante divulgador do jazz tradicional na Inglaterra. No ano seguinte, com a saída de Colyer, Halcox retorna ao sexteto que, em pouco tempo, alcança grande popularidade e é reconhecido pela crítica especializada como um dos melhores conjuntos de Dixieland da Inglaterra. Em 1954, a cantora Ottilie Patterson passa a integrar a banda e, em 1959, casa-se com Chris, união que duraria até 1983, quando se divorciam. Na década de 1960, com o revival do jazz tradicional na Europa, a banda de Chris tem suas forças revigoradas, além de aproximar-se de outros estilos, como o Swing, o blues e o ragtime. São memoráveis seus encontros com grandes mestres norte-americanos, como Muddy Waters, Sonny Terry, Brownie McGhee, Albert Nicholas, Sidney De Paris, Edmond Hall, Hank Duncan, Russell Procope, Wild Bill Davis e Louis Jordan.
Também o rock e a música clássica são investigados por Chris, músico que já atuou ao lado de lendas como Eric Clapton, Mark Knopfler e Dr. John, além de compor um concerto para trombone e orquestra e gravar como solista com a London Gabrieli Brass. Enfim, um músico comparável ao vinho Château Latour: quanto mais velho, melhor! Nas faixas acima você ouve C Jam Blues (com Albert Nicholas), The Sunny Side of The Street (com Jools Holland), Ragtime Piece (com Mark Knopfler) e Do Lord, Do Remember Me (com Ottilie Patterson, Sonny Terry e Howard McGhee). Quem gostar, plante uma árvore.