Uma das coisas que me faz confusão hoje em dia, é a rapidez com que a História é apagada. Como os leitores sabem, sou um grande adepto de tudo o que a História passada nos tem para contar, e é por isso que, por exemplo, a variabilidade climática actual não é, para mim, nada de especial, quando comparada com eventos climáticos dos últimos séculos/milénios.
No início deste mês, tropecei
neste documento da REN, e observei alguma da História das primeiras barragens portuguesas. De todas elas, a que mais me marcou foi a da Barragem do Lindoso, entretanto substituída pela
barragem do Alto Lindoso, uma das barragens de referência em Portugal. Fiz umas pequenas pesquisas na Internet, e o melhor que consegui foi obter alguma informação sobre a central hidroeléctrica, vários quilómetros a jusante. Procurei mais, e nada???
Decidido a encontrar algo que desapareceu há pouco mais de 20 anos, encontrei finalmente esta referência,
Lima Internacional: Paisagens e Espaços de Fronteira, tese de Doutoramento de Elza Carvalho, na Universidade do Minho. Deste documento retirei a imagem que coloquei no
post anterior, e que abaixo está enquadrada com uma imagem da actual barragem. As duas foram calibradas pelo topo dos montes distantes, sendo ligeiramente distintas na parte frontal, pelo facto das fotografias não terem sido tiradas exactamente do mesmo local:
Três leitores foram capazes de a identificar. O primeiro preferiu ficar anónimo, tendo sido ainda identificadas por Pedro Pais e Jorge Pacheco de Oliveira. Em comum, nenhum dos três a afirmou ter conhecido, sendo que um dos três leitores referiu tê-la identificado pelo estilo de terreno.
A história do encouramento do Lindoso remonta ainda aos tempos da Monarquia, quando Justino Antunes Guimarães e Jesús Palacios Ramilo, apresentaram em 11 de Maio de 1905 o anteprojecto para a exploração hidráulica do salto de Lindoso. Em 1907, D. Carlos I autorgou a concessão do aproveitamento hidroeléctrico, através do alvará de concessão do Aproveitamento hidroeléctrico no rio Lima, de 14-2-1907, publicado no
Diário do Governo nº 40 de 20-2-1907. O alvará autorizava a derivação de um caudal de 7000 litros/segundo, por um período de 99 anos, com uma exigência de que as obras começassem num período de um ano, e que fosse terminada em quatro anos. A concessão foi transmitida à Sociedade Anónima
Electro del Lima no ano seguinte, constituída em Madrid a 19 de Maio de 1908.
O projecto inicial previa a instalação de 14000 cavalos em 7 grupos, cuja potência alcançaria os 12000 cavalos durante 10 meses, e somente 4510 cavalos no Verão. A represa teria uma altura de apenas 5.8 metros, e o canal de derivação prolongar-se-ía por 420 metros. As obras começaram a 16 de Setembro de 1908, mas dificuldades várias, incluindo a morte de um dos accionistas iniciais, retardaram a construção. A construção do canal de derivação (início visível do lado esquerdo do rio,
nesta e
noutra foto), entretanto prolongado, resultou em diversos problemas com a população, sobretudo devido a questões de nascentes de água, um tema "quente" na altura. A Primeira Guerra Mundial trouxe dificuldades óbvias, embora trabalhassem na altura entre 500 e 1000 trabalhadores nas obras. Em 2 de Abril de 1921 deram-se por concluídas as obras, com a instalação dos geradores Escher Wyss da General Electric, com uma potência de 8750 kVA, na central hidroeléctrica, cuja imagem é visível abaixo,
retirada daqui. Em 10 de Abril de 1922 a energia chega finalmente à central do Freixo, no Porto.
Entre 1923 e 1924 a barragem foi sobrelevada, da altura de 5 metros para uma altura de 22.5 metros. Tal permitiu a constituição de uma albufeira de 750 000 m3, 0.2% do volume máximo da actual barragem do Alto Lindoso. O progressivo aumento do consumo da electricidade obrigou a aumentos sucessivos do canal, das linhas, e da própria central hidroeléctrica e da câmara de carga (visível abaixo,
foto retirada daqui), contribuindo para um significativo desenvolvimento local, na
localidade de Paradamonte, que distinguia a aldeia de todas as outras em redor. Tais ampliações terminaram em 1951, quando foi montado o último grupo gerador, de 40 000 kVA, que permitiu alcançar uma potência de 92 500 kVA. Algumas imagens dos geradores antigos estão disponíveis
aqui, sendo ainda
este percurso de geocaching uma referência interessante.
No final da década de 1980 iniciou-se a construção da barragem do Alto Lindoso, que obrigou à destruição da antiga barragem. Algumas imagens dessa ocasião estão disponíveis nos seguintes links:
[1] [2] [3]. Na imagem seguinte podemos vê-la ainda, já com as obras necessárias à construção da barragem do Alto Lindoso.
Esta página manter-se-á aberta a edição, por forma a documentar outra informação que entretanto venha a recolher. Se o leitor tiver acesso a mais informação, faça o favor de a enviar. Em particular, uma imagem próxima da barragem seria muito interessante. Mais formidável seria uma imagem da barragem numa situação de cheia, mas creio que isso já é pedir de mais! Ainda assim, o objectivo é tentar manter viva uma recordação histórica que se perdeu há pouco mais de 20 anos...