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quinta-feira, 31 de agosto de 2023

A imagem do dia



Juan Manuel Fangio é um dos melhores pilotos de sempre e tem algo que hoje em dia seria impossível: ganhar cinco títulos em quatro carros diferentes: em 1951, pela Alfa Romeo, em 1954, dividido entre Maserati e Mercedes, no ano seguinte, pela construtora alemã, em 1956, pela Ferrari, e no final, pela Maserati.

O piloto argentino cruzou a meta pela última vez em 1958, e, Reims, pela Maserati, dez anos depois de ter chegado à Europa, conseguindo um quarto lugar e com um Mike Hawthorn a fazer-lhe escolta porque ia dá-lo uma volta. Não o fez, afirmando que um grande campeão não merecia tal coisa. E com razão: cinco anos antes, naquele mesmo circuito, disputaram taco-a-taco a vitória, com esta a cair para o lado do britânico. Aliás, a primeira vitória de um súbdito de Sua Majestade num Grande Prémio de Formula 1, e o primeiro duelo memorável da história da competição. 

Contudo, Fangio falou abertamente dos seus carros vencedores - inclusive, foi o representante da Mercedes na Argentina - mas a relação do Ferrari foi sempre tensa. O que não sabia foi que tinha sido acrimoniosa por uns bons anos. Digo isto porque comprei - e li - recentemente "As Minhas Alegrias Terríveis", a autobiografia de Enzo Ferrari

Publicado em 1962 e com acrescentos ao longo dos anos, até 1987, há um capítulo que intitula de "Pilotos, que gente!" e sendo ele um antigo piloto, deixa considerações sobre gente que guiou máquinas perigosas ao longo de três gerações. Desde gente que admirou, em criança, a adversários como Tazio Nuvolari, e por fim, pilotos que poderiam ser seus filhos, como Luigi Musso, Alberto Ascari, e os "netos", como Michele Alboreto, Carlos Reutemann e Gilles Villeneuve

Aparentemente, quando Fangio pendurou o capacete, escreveu - ou mandou escrever - a sua autobiografia na Argentina e lá, não deixou boas impressões sobre Ferrari. Este leu-o - deve ter chegado algum exemplar ao seu escritório de Maranello - e aproveitou aquela ocasião para responder às acusações do piloto argentino. 

Aparentemente, Fangio acusa Ferrari de ter sabotado o seu carro para que não ganhasse certas corridas, nomeadamente o GP da Bélgica e as Mille Miglia daquele ano. Chama às acusações de "comédia" e fala, sobre os buracos feitos no habitáculo no seu carro que o impediam de chegar em primeiro na prova italiana, apenas cortando a meta em quarto, que "aqueles diabólicos furos não impediram Castelloti de triunfar".

Sobre a corrida belga, ele afirma que tinha a ver com o carro, porque tinha ficado sem óleo na corrida. Ferrari explicou que Fangio trocou o carro com o do jovem britânico Peter Collins, na manhã da corrida. E foi com o bólido que era destinado ao argentino que o britânico... ganhou o seu primeiro Grande Prémio na Formula 1. 

"Mas qual seria a razão por que Enzo Ferrari, este Metternich - e porque não, este Richilieu dos automóveis? - se afinca, com tanta perfídia e astúcia, a arruinar o melhor piloto da sua equipa, o campeão do mundo? Fangio não tem dúvidas, e explica assim: Ferrari queria, antes de mais, demonstrar que os seus carros venciam, mesmo que ao volante não estivesse o campeão do mundo; em segundo lugar, ele desejava que o campeão mundial fosse Peter Collins, porque Collins significava o mercado inglês, enquanto o argentino estava então fechado às importações.

Ora, enquanto nem perco tempo a considerar as insinuações de sabotagem maquiavélica, pela simples razão de não querer, eu próprio, cobrir-me de ridículo, responderei a [Juan] Manuel Fangio no que respeita ao segundo ponto."

As Minhas Alegrias Terríveis, pags 91-92.  

Agora, o contexto ocasional: em 1956, Fangio passava por um mau bocado. Tinha sido apoiado pelo regime de Juan Domingo Perón na sua aventura europeia, e as suas vitórias eram usadas como propaganda, demonstrando o sucesso do desporto nacional. Contudo, em setembro de 1955, com a temporada a terminar em Itália, um golpe de estado derrubou-o e partiu para o exílio. Fangio regressou mas até à última, a sua viagem esteve em risco, porque o novo regime queria saber até que ponto esteve envolvido. Chegou a ter o seu passaporte confiscado, no qual devolveram 10 dias antes do inicio da temporada europeia. 

Para piorar as coisas, a reputação de Ferrari não era boa, e Fangio não era fã da dupla Hawthorn e Collins, para além de Luigi Musso, que ganhara a sua primeira corrida na Argentina. Sentiu que era mais um e não ficou tranquilo. Aliás, bem vistas as coisas, foi um campeonato no qual ganhou por sorte, por causa dos eventos de Monza. 

E isso, Fangio não fala, mas Ferrari... sim.

"Nessa mesma época de 1956, Fangio venceu o GP da Argentina porque Musso cedeu o seu Ferrari. No GP do Mónaco, queixando-se das suas suspensões, utilizou o carro de Collins e chegou em segundo lugar. No GP de Itália, tomou mais uma vez o Ferrari de Collins, que naquele momento comanda a corrida, e vence o título. 

Musso e Collins sacrificaram-se por ele, [Juan] Manuel Fangio. E, obviamente, com o meu consentimento. Se Collins não tivesse dado, duas vezes, o seu próprio carro, teria sido ele, matemática e merecidamente, o campeão do mundo naquele ano. E Collins e Musso morreram sem ter podido realizar esse sonho. 

É preciso, portanto, muita coragem para se definir como 'reizinho da Ferrari', como Manuel Fangio diz de si próprio, esquecendo mesmo o sacrifício dos seus companheiros de equipa. Que coisa devo concluir? Fangio foi um grandessíssimo piloto, afetado pela mania da perseguição.

As Minhas Alegrias Terríveis, página 92

Claro, não explicava tudo: Fangio nunca ficou à vontade em relação às equipas italianas, e o próprio Ferrari apontou isso na sua autobiografia. E de uma certa forma até se explica a relação com a Mercedes, totalmente diferente, ao ponto do qual conhecemos e podemos ver no museu em Balcarce: para além de um Maserati 250F, apenas estão expostos os carros da marca alemã. 

Mas há um final feliz nesta historia turbulenta italo-argentina: em 1968, Fangio regressa à Europa para participar nas 96 Horas de Nurburgring, a "Marathon de la Route", com o IKA-Torino, o derivado do Rambler americano que se tornou num "carro nacional argentino" que até passou para as mãos da Renault para se chamar "Renault Torino". "El Chueco de Balcarce" recebeu um convite de Maranello, e depois de um longo dia, aparentemente esclareceram as coisas e a relação melhorou bastante. E Ferrari mencionou isso nas edições seguintes da sua autobiografia.  

"Também isso é a coragem de Fangio. É um traço de nobreza que estou disposto a reconhecer-lhe, além da reencontrada amizade."

As Minhas Alegrias Terríveis, pag. 266.

Em suma, é um livro que merece estar na estante de qualquer amante de automobilismo.   

quarta-feira, 19 de abril de 2023

Youtube Formula 1 Vídeo: O vencedor mais velho de sempre

Bem sei que a Formula 1 só regressa no final do mês mas... estamos a ser mimados por estes dias pelo nosso amigo dos antípodas, Josh Revell. Depois de no dia anterior ter falado sobre o "Singaporegate", a corrida onde Nelson Piquet Jr bateu de propósito para garantir um Safety Car e a bitória de Fernando Alonso, hoje ele foi longe. Muito longe. 

Na realidade, ele foi ao GP de França de 1951, em Reims, e falar sobre Alberto Ascari, Juan Manuel Fangio, Froilan Gonzalez e o homem que acabou por ganhar a corrida... aos 53 anos. Um recorde que ainda não foi batido... se Fernando Alonso não tiver ideias. 

quinta-feira, 3 de novembro de 2022

No Nobres do Grid deste mês...


"Depois da II Guerra Mundial, a América do Sul se tornou num dos lugares onde o automobilismo ajudou a reerguer-se, depois da destruição europeia. A Argentina, com as suas corridas, primeiro as que ligabam cidades a cidades, e depois as de circuito, especialmente em Buenos Aires, ajudaram a mostrar-se contra a concorrência europeia e mostraram ao mundo gente como Juan Manuel Fangio, ´El Chueco', José Froilan Gonzalez, ´O Touro das Pampas´, ou Onofre Marimon, outro talento argentino, precocemente desaparecido no Nurburgring Nordschleife, em 1954.

E o facto de correrem no verão austral, especialmente janeiro e fevereiro, ajudou muito para preencher o calendário na altura do ano onde havia frio e neve no hemisfério norte.

Mas não foi só a Argentina que recebeu máquinas e pilotos, ajudados por um regime, o de Jun Domingo Peron, que adorava automobilismo. Temos também Cuba, que em 1957 e 1958 recebeu os melhores pilotos do mundo num circuito desenhado nas ruas de Havana, e que teve um final atribulado, com o rapto de Fangio pelos rebeldes da Sierra Maestra. E que mostrou ao mundo que politica e automobilismo andavam de mãos dadas, como manifestação de relações públicas. Existe um terceiro país que é pouco falado, que usou os mesmos métodos da Argentina e de Cuba, para ser a montra de um regime autoritário, chefiado por um general, e que trouxe os melhores pilotos do mundo para um circuito desenhado nas ruas da sua capital, e que, quando o ditador caiu, as coridas deixaram de acontecer.

Eu falo da Venezuela. Entre 1955 e 1957, gente como Stirling Moss, Phil Hill, Jean Behra, Peter Collins, correndo em carros como Mercedes, Porsche, Maserati, Gordini, entre outros, e correndo contra alguns pilotos locais, correram num lugar chamado Los Proceres, onde quando os bólidos velozes não corriam, havia... desfiles militares. Foram anos fascinantes, de um país que queria se mostrar ao mundo, de um ditador que adorava velocidade que usurpou um Mercedes 300 SL e deixou que Fangio o guiasse e se tornou no local do canto do cisne de uma mitica marca do automobilismo. (...)


Hoje em dia, quando se lembra de automobilismo na América Latina, só se lembram de três países: Argentina, Brasil e México. Existiram grandes corridas e excelentes pilotos, mas houve mais países que quiseram fazer do automobilismo o espelho - ou o "relações públicas" dos seus países, atraindo os melhores pilotos de então, como fazem agora os países árabes. Muitos se recordam de Cuba, especialmente por causa do rapto de Juan Manuel Fangio, em 1958, mas a Venezuela também colaborou, e tudo por causa do gosto do seu líder autoritário pelo automobilismo. Como acontecera antes, noutros continentes e com outros ditadores. 

Durante três anos, existiu um GP da Venezuela numa das auto-estradas construídas em Caracas, a capital, e os melhores pilotos andaram por lá. Fangio triunfou da primeira vez, e a terceira contou para o campeonato do mundo de Sportscar, com Ferrari, Maserati e Porsche lutando pelo título. E essa foi uma corrida que entrou para os anais do automobilismo, com o canto do cisne de uma dessas marcas. Três meses depois, o canto do cisne foi para o regime autoritário, e o ditador amante do automobilismo teve de fugir.

E é sobre essas histórias que conto este mês no Nobres do Grid.  

quinta-feira, 4 de agosto de 2022

A imagem do dia


O Nurburgring Nordschleife é um circuito enorme, monumental. 23 quilómetros e mais de cem curvas, num traçado estreito em termos de largura. Um excesso, e é um desastre. 

Se é assim agora, então imaginem em 1957. Há 65 anos.

Mas foi nesse cenário que precisamente neste dia, Juan Manuel Fangio conseguiu a sua melhor vitória da sua carreira e provavelmente, uma das vitórias mais épicas da Formula 1 - será que Hollywood fará algum dia a reprodução dessa corrida? - ainda por cima, pelas circunstâncias do que aconteceu. Foi uma corrida de recuperação, e foi um Maserati a bater não um, mas dois Ferraris, os de Mike Hawthorn e Peter Collins.

A história é conhecida: Fangio partiu leve, porque iria reabastecer a meio, enquanto os Ferrari iriam correr com o depósito cheio, para chegar ao fim sem parar. O argentino chegou às boes com 30 segundos de vantagem e esperava que os mecânicos da Maserati fizessem o trabalho de modo veloz, mas a operação foi um desastre e voltou à pista com uma desvantagem de 48 segundos sobre Collins, que era segundo classificado.

A partir dali o argentino guiou como um louco, tentando recuperar o tempo perdido. Para isso, bateu o recorde da pista por dez vezes, nove dos quais seguidas, e acabou com um tempo de 9.17,4, quase oito segundos que o tempo da pole-position. E para passar Hawthorn na liderança, a meio da última volta, na zona de Breidscheid, meteu metade do carro... na relva!

"Eu nunca dirigi tão velozmente antes na minha vida e acho que nunca mais serei capaz de fazê-lo de novo". Mais tarde, Fangio também disse: "Nürburgring era minha pista favorita. Eu me apaixonei totalmente por ela e acredito que naquele dia em 1957 eu finalmente consegui dominá-la. Era como se eu tivesse aprendido todos os seus segredos de uma vez por todas... Durante dois dias não consegui dormir, ainda dando aqueles saltos no escuro naquelas curvas onde nunca antes tive coragem de puxar as coisas tão fora dos limites."

Fangio tinha razões para dizer tal coisa. O seu grande segredo na pilotagem era de guiar medianamente, mas a um nível mais alto que os seus adversários. Certo dia afirmou que "tinha conhecido pilotos mais corajosos que eu. Estão mortos". Ele nunca se excedia, porque tinha plena consciência de que isso significava morrer. E especialmente, deve ter refletido imenso quando teve o seu acidente em 1952, que o colocou fora de cena por quase um ano, porque tinha puxado demasiado de si mesmo - guiara na véspera por mais de 12 horas e estava ainda fatigado quando alinhou na corrida - logo, aprendeu a lição: ir ao limite, mas nunca ira além dela. Deixem que os outros façam e que arquem com as consequências. Afinal de contas, era o tempo dos carros com motor à frente, sem cintos de segurança, dos capacetes abertos, e recentemente tinham instalado o seu mais recente avanço tecnológico: capacetes de aço! 

Naquele dia, no Nordschleife, violou as suas próprias regras de segurança para alcançar uma vitória, e o consequente título mundial. Tudo correu bem para ele, sabendo que poderia ter corrido horrivelmente mal. Aliás, dali a um ano, no mesmo circuito, Peter Collins sofreria o seu acidente fatal, prova que o circuito não perdoava quem errava ou puxava pelos seus limites. Com exceções. 

segunda-feira, 8 de novembro de 2021

A imagem do dia


Juan Manuel Fangio comemorando a vitória no GP de Espanha de 1951, numa das maiores demonstrações de estratégia quer do piloto, quer da equipa, naquela que viria a ser a última vitória da Alfa Romeo na Formula 1, e claro, o primeiro título mundial do piloto argentino, alcançado... aos 40 anos de idade.

E a estratégia tinha a ver com os pneus. Dizendo melhor, o seu tamanho. Ao escolher o aro 18, que resistia melhor às condições do circuito de Pedralbes, construído nas ruas de Barcelona, Fangio decidiu o destino dos Ferrari, que escolhendo os pneus aro 16, eram mais velozes, mas desgastavam-se rapidamente. Resultado? Alberto Ascari, que liderava o campeonato com dois pontos de avanço, viu o seu pneu estoirar na oitava volta, e seis voltas depois, o mesmo acontecia a Froilan Gonzalez, seu compatriota e o primeiro vencedor de uma corrida ao serviço da Ferrari, quase três meses antes, em Silverstone.

Passados 70 anos, e no ano em que faria 110, e 26 anos depois da sua morte, Fangio vai ser homenageado em Balcarce, a sua terra natal. A cidade, com cerca de 45 mil habitantes, situada entre Buenos Aires e Mar del Plata, e que já tem um museu dedicado a ele, decidiu transladar os seus restos mortais para um mausoléu construído na área do museu. A cerimónia vai acontecer na quarta-feira e será transmitida em direto na televisão local.

Para além disso, haverá um desfile pela cidade dos carros que Fangio usou, e mais alguns, de associações de automóveis antigos da Argentina, num tributo aos feitos que alcançou e ao prestigio alcançado, pois ainda hoje é considerado como um dos melhores pilotos do século XX. 

quarta-feira, 22 de setembro de 2021

Youtube Formula 1 Video: A genialidade de Fangio

Na atualidade, apenas os fãs que melhor conhecem a história podem falar com autoridade sobre Juan Manuel Fangio, o argentino que aos 40 anos foi para a Europa e maravilhou o automobilismo na sua primeira década, vencendo cinco títulos mundiais e 24 corridas, algumas em condições quase impossíveis.

E sendo falado por pessoas que não o viram correr, e alguns deles, nunca o viram vivo, é outro feito. Portanto, ver um video do Josh Revell onde fala de "El Chueco" é um feito. Portanto, vamos lá apreciar aquilo que ele fez sobre ele. 

quinta-feira, 24 de junho de 2021

A imagem do dia


Juan Manuel Fangio nasceu este dia, mas há 110 anos. Considerado por muitos como um dos melhores pilotos de sempre no automobilismo, o argentino conseguiu algumas das suas melhores proezas... na casa dos 40 anos, numa altura em que, se fosse hoje em dia, já estaria a gozar os milhões que teria ganho a correr na Mercedes, por exemplo.

Contudo, Fangio foi um dos pilotos que apenas se virou para a Europa com quase 37 anos, ajudado pelo governo peronista, como também fez a outros pilotos locais, como Froilan Gonzalez e Onofre Marimon, por exemplo. Os seus primeiros triunfos foram suficientes para chmar a atenção das grandes equipas, e em 1949, já corria pela Alfa Romeo, que o emparelhava com o seu melhor piloto italiano, Giuseppe "Nino" Farina. Do outros lado, surgia já a Ferrari, que tinha nas suas fileiras Alberto Ascari, piloto por mérito próprio e filho de Antonio Ascari, um dos melhores pilotos da Alfa Romeo nos anos 20 do século XX.

A temporada de 1951 foi um grande duelo entre os Alfa dominadores com o seu modelo 159, e os Ferrari. O chassis já acusava os anos - o projeto era de... 1938 - e a marca de Maranello, que tinha sido um "spinoff" da Alfa - quando Enzo Ferrari saiu da equipa, assinou um acordo em que era proibido de usar o nome por cinco anos, decidiu fundar a Auto Avio Construzione e coincidiu com a II Guerra Munidial - ambos faziam o seu melhor para superar. E Fangio fez a sua parte para prolongar as vitórias da marca de Milão, mas não evitou que em Silverstone, Froilan Gonzalez, seu amigo e compatriota, desse a Maranello o seu primeiro triunfo.

No final dessa temporada, o "showdown", ou o confronto final, tinha lugar em Barcelona, numa pista desenhada nas ruas da cidade condal. Era o primeiro Grande Prémio de Espanha desde 1935 e claro, o primeiro da Formula 1 na Peninsula Ibérica. E Fangio tinha dois pontos de avanço sobre Ascari na luta pelo título.

Ali, não poderia ser veloz, porque o carro "bebia" mais que o da Ferrari, logo, iria ter de reabastecer mais vezes. Portanto, decidiu ser mais inteligente. Ambos usavam os Pirelli, mas poderiam ter aros diferentes, e Fangio escolheu os de 18 polegadas, contra as de 16 da Ferrari. Podiam ser menos velozes, mas mais resistentes, e isso ele sabia. 

Quando largaram, Ascari e Froilan Gonzalez foram para a frente, deixando Fangio para trás. Mas cedo se descobriu que os Ferrari desgastavam fortemente os seus pneus. Primeiro foi Piero Taruffi, na volta 6, Luigi Villoresi na volta seguinte, Ascari na oitava volta e com isso, Fangio, indo mais calmamente, tinha tudo controlado. E quando foi a vez de Froilan Gonzalez ir às boxes, na volta 14, seguia confortavelmente na frente. E a vantagem nos pneus foi assim até ao final, vencendo com tranquilidade. Mas melhor: tinha derrubado os Ferrari de forma convincente. Se o seu compatriota ainda salvou o dia, acabando na segunda posição, já Ascari fora quarto, a duas voltas do vencedor. 

A Ferrari fora humilhada e superado em toda a linha, pode-se dizer, pela astúcia de um argentino.

Mas o palco do seu primeiro título mundial também era simbólico por causa de uma coisa: foi a última vitória da Alfa Romeo na Formula 1. Com as finanças escassas por causa do investimento no projeto, e ainda a viver o pós-guerra, eles renunciaram a competir e concentraram-se em construir automóveis de estrada. Voltariam em 1979, mas apenas foi uma amostra do que tinham feito nestes primeiros tempos. E Fangio, sempre em busca dos melhores carros do momento, prosseguiria a correr por várias equipas, consolidando a sua lenda no automobilismo. 

segunda-feira, 26 de outubro de 2020

Youtube Formula One Video: A história dos recordes de vitórias na F1

Setenta anos de Formula 1 fizeram com que existissem dezenas de recordes ao longo da sua existência. Mas um dos que faz despertar mais atenção é o de vitórias, pois a partir de ontem, Lewis Hamilton é o novo detentor. Mas até chegarmos lá, tivemos outros que o alcançaram, desde o primeiro, Giuseppe "Nino" Farina", até Michael Schumacher. E este video conta essa história. 

segunda-feira, 4 de maio de 2020

No Nobres do Grid deste mês...


(...) Em 1955, Moss, então com 25 anos, é contratado pela Mercedes para ser seu piloto ao lado de Juan Manuel Fangio e dos alemães Karl Kling e Hermann Lang, este último ativo desde os tempos dos Grand Prix dos anos 30, quando corria ao lado dos Auto Union, no domínio alemão das pistas. O pai de Stirling, Alfred Moss, tinha insistido no talento do seu filho, mas Neubauer tinha desconfianças. Para fazer quebrar essa desconfiança, Moss pai adquire um Maserati 250F e consegue um terceiro posto no GP da Bélgica de 1954, suficiente para ser contratado pela equipa para o resto da temporada.

No ano seguinte, Moss é contratado pela Mercedes, graças aos seus dotes de condução. É muito jovem, comparado com os pilotos mais maduros, como Fangio e Kling, ambos então com 43 anos, ou Lang, com 45. E naquele ano, existiam muitas provas para a equipa alemã competir, e esperavam eles, ganhar. A primeira das quais eram as Mille Miglia, uma prova de longa distância entre Brescia e Roma, e regresso, totalizando cerca de 1600 quilómetros, ou as Mil Milhas. Nesse ano, iria acontecer no fim de semana de 30 de abril e 1 de maio.

A Mercedes tinha inscrito oficialmente quatro Mercedes na corrida: um para Moss, outro para Fangio, outro para Kling e outro para Hans Hermann. Moss escolheu outro britânico, Dennis Jenkinson, então jornalista da Motorsport e piloto com experiência nos sidecars - tinha sido campeão do mundo em 1949 - para ser seu navegador. Jenkinson decidiu levar consigo um rolo de papel onde ia ditar as notas dos obstáculos e dos cruzamentos existentes no caminho, de forma a que Moss pudesse ir à vontade na sua condução e ser o mais veloz possível. Para além disso, tinham estado a treinar durante meses nas estradas italianas, e eram um dos favoritos à vitória. Fangio, por exemplo, decidiu guiar sozinho todo o caminho. (...)

Depois das Mille Miglia, a Mercedes apontou armas para a próxima grande prova do calendário, as 24 Horas de Le Mans. Fangio e Moss, que tinham 18 anos de diferença entre eles, começavam a ter uma relação de respeito um com o outro, com o mais velho a vê-lo como um possível sucessor, e do qual poderia ensinar algo ao mais novo. E por uma vez guiaram juntos: nessas 24 Horas de Le Mans,  que aconteceria no fim de semana de 11 e 12 de junho, partilhariam um carro, numa equipa que teria mais dois carros: um com André Simon e Karl Kling, e outro com o americano John Fitch e o francês Pierre "Levegh". Essa foi a infame edição onde "Levegh" perdeu o controle do seu carro quando o Jaguar de Mik Hawtohrn travou à sua frente com os seus travões de disco, e causou o acidente que matou mais de 80 espectadores.

Com esse acidente, as coisas mudaram: Moss e Fangio estavam a caminho da vitória quando a marca alemã decidiu retirar os carros da prova, e no rescaldo, grande parte dos organizadores decidiu cancelar as corridas de Formula 1 do calendário. A Suíça, por exemplo, proibiu as provas de circuito até aos dias de hoje, abrindo recentemente a excepção à Formula E. Naquele verão, o automobilismo esteve muito perto de terminar, devido à falta de segurança, que começava a ser intolerável.

Mas houve poucas corridas que se mantiveram. Grã-Bretanha era uma delas, e nesse ano iriam correr em Aintree, numa pista desenhada na mítica pista de cavalos nos arredores de Liverpool. Os Mercedes dominram nos treinos, ficando com quatro dos primeiros cinco lugares da grelha, o único a incomodá-os foi Jean Behra, terceiro no seu Maserati. Mas na corrida, eles andaram à vontade, com Fangio na frente, seguido por Moss. O britânico passou-o na terceira volta, até ir às boxes, onde o argentino ficou de novo na frente. Depois das paragens, Moss ficou na primeira posição, enquanto Fangio o seguia de perto.

O jovem britânico pensava que iria ver um sinal das boxes, de Neubauer, para que deixasse passar o argentino e ficar com o primeiro lugar, mas dali, nada apareceu. As coisas foram assim até à meta, quando Moss atravessou no primeiro posto, perante o júbilo dos locais. Afinal de contas, era o primeiro britânico a vencer em casa. No final, perguntou a Fangio se o deixou ganhar. Este negou: "não, hoje simplesmente foste o melhor". O argentino manteve a narrativa até morrer, e Moss foi para a tumba convencido do contrário. (...)

Stirling Moss morreu a 12 de abril, com 90 anos de idade, depois de uma longa vida onde andou uma parte a correr e vencer provas, algumas delas de modo épico, e depois do seu acidente em 1962, em Goodwood, a recuperar e a contar as histórias da sua carreira, como um herói vivo de uma era onde um erro e era praticamente "a morte do artista".

Moss era o último grande representante de uma era onde correu ao lado de Juan Manuel Fangio, Alberto Ascari, Mike Hawthorn e Jim Clark, correu em carros da Mercedes, Maserati e Lotus, e nunca correu em Ferraris, pelo menos na Formula 1. E paradoxalmente, ficou mais famoso pelos títulos que esteve quase a ganhar a não conseguiu, mas acima de tudo, foi capaz de permanecer nas mentes de toda uma geração de amantes de automobilismo.

E com a sua morte, é uma era a chegar ao fim. Sobre ele, conto três grandes momentos da sua carreira, recordados este mês no Nobres do Grid.   

sexta-feira, 17 de abril de 2020

A(s) image(ns) do dia



Em 1955, Stirling Moss teve a sua grande chance de guiar um carro de uma equipa de primeira linha. Essa chance aconteceu depois de, no ano anterior, o seu pai lhe ter comparado um Maserati 250F e ter conseguido um pódio na Bélgica, suficiente para que a equipa oficial o assistisse para o resto da temporada. E claro, pelo caminho, tentou convencer Alfred Neubauer de que o piloto. então com 25 anos, tinha talento suficiente para correr nos carros alemães, que faziam o seu regresso pela porta da frente, vencendo quase todas as corridas até então - a sua derrota em Silverstone, às mãos do Ferrari de Froilan Gonzalez também tinha sido épica.

Nessa temporada, Moss tinha como companheiro de equipa Juan Manuel Fangio, para além dos alemães Hans Hermann e Karl Kling. Com quase 18 anos de diferença entre os dois, ambos formaram uma rivalidade nas pistas e uma amizade fora delas. Unia-os um sentimento de que estavam a arriscar o pescoço sempre que corriam, sabendo que poderiam não mais voltar a casa. Moss sabia que Fangio era veloz, e o que tinha de fazer era de ver como ele conseguia conduzir para que ele seguisse e quando a oportunidade aparecesse, o passasse. Foi uma temporada harmoniosa: o carro era bom, eles dominavam, normalmente com Fangio em primeiro e Moss em segundo. E por uma vez guiaram juntos: nas 24 Horas de Le Mans, a infame edição onde Pierre "Levegh" perdeu o controle do seu carro quando o Jaguar de Mik Hawtohrn travou à sua frente com os seus travões de disco, e causou o acidente que matou mais de 80 espectadores.

Com esse acidente, as coisas mudaram: Moss e Fangio estavam a caminho da vitória quando a marca alemã decidiu retirar os carros da prova, e grande parte dos organizadores decidiu cancelar as corridas de Formula 1 do calendário. A Suíça, por exemplo, proibiu as provas de circuito até aos dias de hoje, abrindo recentemente a excepção à formula E. Naquele verão, o automobilismo esteve muito perto de terminar, devido à falta de segurança, que começava a ser intolerável.

Mas houve poucas corridas que se mantiveram. Grã-Bretanha era uma delas, e nesse ano iriam correr em Aintree, numa pista desenhada na mítica pista de cavalos nos arredores de Liverpool. Os Mercedes dominram nos treinos, ficando com quatro dos primeiros cinco lugares da grelha, o único a incomodá-os foi Jean Behra, terceiro no seu Maserati. Mas na corrida, eles andaram à vontade, com Fangio na frente, seguido por Moss. O britânico passou-o na terceira volta, até ir às boxes, onde o argentino ficou de novo na frente. Depois das paragens, Moss ficou na primeira posição, enquanto Fangio o seguia de perto. 

O jovem britânico pensava que iria ver um sinal das boxes, de Neubauer, para que deixasse passar o argentino e ficar com o primeiro lugar, mas dali, nada apareceu. As coisas foram assim até à meta, quando Moss atravessou no primeiro posto, perante o júbilo dos locais. Afinal de contas, era o primeiro britânico a vencer em casa. No final, perguntou a Fangio se o deixou ganhar. Este negou: "não, hoje simplesmente foste o melhor". O argentino manteve a narrativa até morrer, e Moss foi para a tumba convencido do contrário.

A realidade era esta: os Mercedes ficaram com os quatro primeiros lugares, com Kling a completar o pódio, na frente do veterano italiano Piero Taruffi. Foi o último tetra da marca alemã. No final do ano, retiraram-se da Formula 1 e só voltariam 55 anos depois.

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020

Youtube Formula 1 Classic: Os melhores, década a década

Discutir sobre o melhor piloto de todos os tempos é discutir o "sexo dos anjos", ou seja, não leva a lado algum. Cada um tem as suas escolhas, e o melhor, pelo menos para mim, é respeitá-las. Logo, quando alguém faz videos sobre esse assunto, é mexer em ninhos de vespas, a não ser que façam esta discussão de modo inteligente.

E como se faz isso? É vendo as coisas década a década... e ter bom humor. Pelo menos é isso que está a fazer o Josh Revell, que começou hoje uma série de videos sobre os melhores pilotos, década a década. E claro, os anos 50 tinham de vir em primeiro lugar. 

sábado, 3 de novembro de 2018

Formula 1 em Cartoons: Fangio e Hamilton (Bonecos do Bruno)

O Bruno Rafael fez este cartoon engraçado que vi ontem, quase uma semana depois do seu pentacampeonato. Como igualou Juan Manuel Fangio, as comparações são inevitáveis, e claro, agora todos querem que ele alcance Michael Schumacher...

sexta-feira, 6 de julho de 2018

A imagem do dia

O último ato de um grande campeão. Há precisamente 60 anos, a 6 de julho de 1958, Juan Manuel Fangio despedia-se dos circuitos, dez anos depois da sua estreia nas pistas europeias. O final de uma longa e gloriosa carreira, com cinco títulos mundiais.

O piloto argentino foi um dos melhores da sua geração. Contudo, desde 1956 que a sua vida e carreira estava a ser cada vez mais dolorosa para ele. A idade e a politica tinha começado a interferir ainda mais na vida do piloto. Apoiado pelo peronismo no inicio da sua carreira, em 1956, quando ele foi derrubado por um grupo de militares, Fangio teve a sua vida dificultada pelo novo regime, tendo sido confiscado o seu passaporte e apenas alinhado na Maserati semanas antes de começar o campeonato, na Argentina natal.

No ano seguinte, depois da sua épica vitória no Nordschleife, a Maserati retirou-se de cena - tinha falido - e Fangio teve corridas esporádicas. Em fevereiro, em Cuba, aconteceu o famoso rapto pelos castristas, que abriu as portas da fama nos Estados Unidos e deu uma chance de correr nas 500 Milhas de Indianápolis. Sem sucesso, porém.

Mas nesse julho, Fangio tinha acabado de fazer 47 anos, e para ele, sabia que tinha sido abençoado por todos aqueles anos de sorte, onde correu e teve fama, sem morrer na pista, como muitos outros do qual conviveu ao longo dos anos. Assim sendo, sabia que a altura de pendurar o capacete.

Alugou um Maserati 250F e manteve a competividade perante os carros da Ferrari, Vanwall, BRM e a nascente Cooper, com os motores traseiros. Foi oitavo na grelha e viu outro piloto, Luigi Musso, sofrer o seu acidente mortal. Andou a par de pilotos como Mike Hawthorn, Tony Brooks, Stirling Moss e Peter Collins, para acabar em quarto, o melhor dos Maseratis. Nas voltas finais, Hawthorn aproximou-se de Fangio e ficou atrás dele, não lhe querendo dar uma volta. Por simples respeito por ele e pelo seu palmarés.

Curiosamente, esta foi a única vitória de Hawthorn naquela temporada. A sua regularidade iria dar-lhe o título mundial, graças a alguma sorte e perícia. Mas aquela corrida, há 60 anos, representou o final de uma era. De uma certa forma, houve certas circunstâncias naquela temporada que assinalaram o final desse tempo.

Fangio sobreviveu. Voltou à Argentina, sendo o representante da Mercedes e viveu até aos 84 anos com fama, fortuna e o seu lugar no automobilismo. Muitos outros não tiveram essa sorte: em outubro de 1961, três anos e três meses depois desse dia, sete dos pilotos que tinham alinhado em Reims estavam mortos.

quarta-feira, 28 de março de 2018

A imagem do dia (II)

Naquele pódio de há 25 anos estavam dezasseis títulos mundiais. E uma constelação de estrelas que nunca se tinha visto antes, nem depois. Hoje em dia, podemos dizer que dos cinco de Juan Manuel Fangio, estavam também os três de Ayrton Senna, o vencedor, os sete de Michael Schumacher, e o único que Damon Hill conquistou, mas esse era especial. Afinal de contas, foi o primeiro filho de campeão do mundo a vencer um título.

Mas para além dos títulos, também poderemos encarar os vencedores do GP monegasco, o mais prestigiado de todos: dos seis de Senna, cinco de Schumacher e dois de Fangio, o total chegava aos treze, os vencedores no Principado. 

Mas isso é o que sabemos agora. Em 1993, apenas Senna e Fangio tinham ganho títulos. E os vencedores de Mónaco eram sete. Senna ainda iria acrescentar a sua sexta (e última) vitória, dali a dois meses.

Aquela foi uma corrida onde o tempo teve o seu papel. E Senna jogou bem com ele, sendo o primeiro a trocar antes de todos os outros. Nisso, era muito bom. Tão bom que conseguiu transformar uma penalização de dez segundos, por ter passado Eric Comas numa zona de bandeiras amarelas, numa vitória. Sem isso, era provável que nem tivesse ido ao pódio, pois, por exemplo, Michael Schumacher estava mais veloz, apesar da ameaça de Johnny Herbert ao seu terceiro posto, quase o último "hurra" da Lotus.

A vitória foi bem celebrada na pista e nas bancadas, e o gesto de Senna abraçar Fangio, o grande campeão do passado, em sinal de reverência, foi um gesto que também caiu bem. Mas o que não se sabia era que mais coisas estavam a vir...

sábado, 24 de fevereiro de 2018

Youtube Motorsport Movies: Operação Fangio


Passam agora mesmo sessenta anos que, em Havana, revolucionários do Movimento 26 de julho, ligados a Fidel Castro e aos revolucionários de Sierra Maestra, raptaram Juan Manuel Fangio para impedir que ele corresse no GP de Cuba, organizado pelo ditador Fulgêncio Batista para mostrar a imagem do país ao mundo.

O rapto do pentacampeão do mundo de Formula 1 agitou o mundo e durante um dia e meio, nada se soube sobre o piloto argentino, numa corrida que acabou à sexta volta, quando um piloto local, Armando Garcia Cinfuentes, mergulhou o seu carro contra a multidão, matando sete pessoas. No final, Fangio foi levado para a embaixada argentina sem ser beliscado pelos raptores, deteriorando ainda mais a imagem internacional de Batista. Menos de um ano depois, o ditador fugiu do país, para não mais voltar.

No ano 2000, um filme sobre esse rapto foi feito, "Operacion Fangio", uma co-produção cubano-argentina. Filmado em Havana, conta a história desse rapto e de como um herói automobilístico foi usado para fins politicos. Quer de um lado, quer do outro.

quarta-feira, 29 de novembro de 2017

A Alfa Romeo volta à Formula 1, o que quer dizer? (parte 1)

O anuncio da chegada da Alfa Romeo à Formula 1 era algo do qual era esperado há algum tempo. Os rumores tinham mais de um ano, e em muitos aspectos, era algo do qual muitos fãs "alfisti" e outros desejavam, ainda nostálgicos dos tempos gloriosos dos primeiros anos do automobilismo. Trinta anos após a última vez que um motor da marca esteve num Grande Prémio, e 32 anos depois do último suspiro da equipa oficial, o grupo FCA (Fiat-Chrysler Automobiles), direccionado por Sergio Marchionne, fez um acordo de parceria com a Sauber e vai colocar o logótipo da marca de Varese nos carros da marca fundada por Peter Sauber e que está na Formula 1 desde 1993. De uma certa forma, é a concretização de um velho sonho de Marchionne, pois desde há algum tempo que pretendia ter uma equipa para publicitar a Alfa Romeo, da mesma forma como a Red Bull tem a Toro Rosso: uma equipa B para os jovens do seu programa de pilotos.

Mas a Alfa Romeo não é novata, bem pelo contrário. De facto, a Alfa, fundada em 1910, tem uma longa e bem recheada história no automobilismo, tendo acolhido grande parte dos pilotos que fizeram o século XX, desde Tazio Nuvolari a Nino Farina, passando por Achille Varzi e Luigi Fagioli, entre outros. E acolheu, nos anos 20, um jovem piloto da zona de Mântua chamado Enzo Ferrari, que em 1929 decidiu fazer a sua própria equipa, acolhendo carros da Alfa Romeo.

Ferrari e Alfa estão mais interligados do que se julga. Um não existe sem o outro, e de uma certa maneira, tê-los ali, no topo do automobilismo, deve ser o sonho de muita gente, embora poucos se lembrem que hoje em dia, todas as marcas italianas fazem parte de um grande grupo, o Grupo Fiat. Nos tempos idos, Ferrari e Alfa Romeo estiveram juntos, depois separaram-se e desencadearam uma rivalidade que apaixonou os automobilistas. Mas hoje em dia, todas estas marcas miticas - Alfa, Ferrari, Maserati, Lancia e outros - fazem todos parte de um grande grupo, complementando-se e não se rivalizando.

Mas vamos às origens. Fundada em 1910 por Nicola Romeo, que tinha licença para construir carros da marca Darracq em Itália, a história começa quando acolheu Enzo Ferrari como seu piloto, no inicio dos anos vinte do século passado. Ao lado de outros como Ugo Sivocci ou António Ascari, o pai de Alberto Ascari. Ferrari sobreviveu aos acidentes que vitimaram Sivocci ou Ascari pai, e no final dessa década, aos 31 anos, decidiu ser diretor de equipa, algo do qual conseguiu gerir ao longo dos anos 30. Contudo, em 1938, Ferrari sai da Alfa e quer construir os seus próprios carros, mas a Alfa impõe uma clausula que o impede de usar o seu nome por cinco anos. É por isso que o primeiro carro dele se chama Auto Avio Construzione, que o inscreve nas Mille Miglia de 1940, com o jovem Alberto Ascari como piloto. Mas a II Guerra Mundial facilita a vida de Enzo Ferrari e fica com os direitos de construir os seus carros com o seu apelido, até aos dias de hoje.

No final da II Guerra Mundial, a Alfa pertencia à IRI, o Instituto per la Riconstruzione Industriale - aliás já estava desde 1932, uma aquisição orquestrada pelo então governo fascista de Benito Mussolini, pois a marca lutava para ter lucros na sua parte automóvel - e com fundos estatais, poderia tentar a sua sorte no automobilismo, graças a um carro que construiram em 1938, e que foi usado até... 1951. O Tipo 158 Alfetta tinha sido escondido em celeiros durante a II Guerra e recuperado após o final do conflito, para vencer em corridas um pouco por toda a Europa com pilotos como Nino Farina (sobrinho do fundador da casa de design Pininfarina) e Luigi Fagioli. Em 1949, vão à Argentina e conhecem um local que tinha jeito para os automóveis: Juan Manuel Fangio.

No ano seguinte, quando a CSI (Comission Sportive Internationale) efetiva o Mundial de Formula 1, os Alfa são os claros favoritos, perante a rival Ferrari, que também ganhava corridas, mas não tinha ainda uma maquina capaz de rivalizar o carro da marca de Varese. Assim sendo, Vencem todas as corridas daquela temporada, num duelo a dois entre Farina e Fangio. O italiano leva a melhor, vencendo o mundial com 30 pontos, contra os 27 do piloto argentino. E o terceiro classificado, Fagioli, consegue 24 pontos - resultantes de quatro pódios - também a bordo de um 158.

As coisas em 1951 tornam-se mais complicadas. A Ferrari tem, por fim, uma máquina à altura, e só a capacidade de condução de Fangio é que salva um pouco as coisas. Vance na Suíça e em França - numa condução partilhada com Fagioli, que aos 51 anos (!) se torna no vencedor mais velho de sempre - mas em Silverstone, outro argentino, amigo de Fangio, Juan Froilan Gonzalez, dá a primeira vitória à Ferrari. O "Commendatore", que sempre quis derrotar os Alfa Romeo nas pistas, comentou mais tarde que "parecia ter matado a sua própria mãe". Mas tinha alcançado o seu feito.

Fangio venceria na última corrida do ano, em Barcelona, graças a um melhor uso dos pneus no abrasivo circuito urbano de Pedralbes, que deu cabo dos pneus no Ferrari de Ascari, que queria vencer o campeonato a qualquer custo, acabando por ser quarto na corrida. No final, Fangio foi campeão com 31 pontos, contra os 25 de Farina. Contudo, uma nova alteração nos regulamentos fez com que a Alfa Romeo decidisse retirar-se da Formula 1, e de uma certa maneira, do automobilismo, não se importando muito com ela nos dez anos seguintes.

O capitulo seguinte da Alfa no automobilismo é escrito por um... dissidente da Ferrari.

quinta-feira, 24 de agosto de 2017

Youtube Formula 1 Classic: Fangio, o maior de todos


Há precisamente 60 anos, Juan Manuel Fangio era campeão do mundo pela quinta vez, depois de vencer de forma épica o GP da Alemanha, batendo os Ferrari de Peter Collins e Mike Hawthorn. Fangio foi um dos melhores pilotos da sua geração e os seus recordes demoraram a ser batidos, ao volante de máquinas como a Alfa Romeo, Maserati, Mercedes e Ferrari, acabando por pendurar o capacete em 1958, aos 47 anos de idade... não sem antes ser raptado pelos revolucionários cubanos, que o tentaram impedir de participar no GP de Cuba.

E hoje, para assinalar esse feito, o Antti Kalhola lançou este simples video sobre ele e os seus feitos. "Que viva El Chueco!"


sexta-feira, 4 de agosto de 2017

Youtube Formula 1 Classic: GP da Alemanha de 1957

Faz hoje 60 anos sobre o maior feito de Juan Manuel Fangio, que foi a sua 24ª vitória da sua carreira, no GP da Alemanha de 1957, no circuito de Nurburgring. A sua corrida foi absolutamente fantástica, onde tentou ganhar alguma vantagem, mas problemas na sua traca de pneus nas boxes fizeram com que caísse para a terceira posição, atrás dos Ferrari de Mike Hawthorn e Peter Collins.

Fangio reagiu, batendo o recorde da pista por dez vezes e acabando por apanhar os dois Ferrari na última volta, passando-os e ficando com a vitória naquela corrida, praticamente confirmando o seu quinto título mundial. 

Apesar de ter declarado: “Fiz coisas que nunca tinha feito. Nunca mais quero pilotar dessa maneira!”, anos depois, em reflexão sobre essa corrida tinha outro tipo de pensamento. 

"Nürburgring sempre foi a minha pista favorita. Eu me apaixonei totalmente por isso e acredito que naquele dia, em 1957, finalmente conseguira dominá-lo. Era como se eu estivesse descoberto todos os segredos de uma vez e por todos... durante dois dias eu não pude dormir, ainda fazia esses saltos no escuro sobre aquelas curvas onde nunca tinha tido a coragem de puxar até então pelo limite".

Podem ver o resumo da corrida, aqui através da British Pathé.

sábado, 26 de novembro de 2016

A imagem do dia

Juan Manuel Fangio a ser cumprimentado por Fulgêncio Batista durante o fim de semana do GP de Cuba, em 1958, numa fotografia tirada por Bernard Cahier, dias antes do seu rapto pelos revolucionários castristas. Curiosamente, ao fundo desta foto, está outro piloto, o alemão Wolfgang Von Trips.

Fidel Castro morreu este sábado de manhã, aos 90 anos de idade, em Havana, depois de 47 anos de poder e praticamente 60 anos depois de ter desembarcado em Cuba, a bordo do iate "Granma", com Ernesto "Che" Guevara e outros revolucionários, para iniciar a guerrilha que iria derrubar Fulgêncio Batista, outro ditador cubano.

Contudo, o envolvimento de Fidel no automobilismo tem a ver com um dos episódios mais espectaculares da história da guerrilha: o sequestro de Juan Manuel Fangio, em 1958, quando ele participava no GP de Cuba, em Havana. Fulgêncio Batista tinha ideias de atrair dinheiro americano ao seu país, propagandeando-o como se fosse um destino turistico, com praias de areia branca e casinos, fazendo concorrência com Las Vegas. O GP de Cuba existia desde 1957, com a sua primeira edição a ser um sucesso, e onde Fangio tinha sido dado sete mil dólares - uma soma considerável para a época - para correr a bordo de um Maserati, contra Stirling Moss e Eugenio Castelloti, entre outros.

Em 1958, as atividades da guerrilha estavam cada vez mais fortes e ousadas. Duas pessoas, Faustino Perez e Oscar Lucero Moya, arquitectaram um plano para estragar os planos de Fulgêncio Batista para lucrar com o Grande Prémio. E qual era? Sequestrar Fangio. Com a anuência de Fidel.

Fangio estava em Havana desde o dia 21 de fevereiro, e dois dias depois, a 23, no átrio do Hotel Lincoln, Fangio juntara-se a outros amigos, como Alejandro de Tomaso (sim, esse mesmo De Tomaso!), o mecânico Guarino Bertochi e o "manager" Marcelo Giambertone, entre outros.

E de repente... “Estavamos a ter uma conversa quando de repente um homem com um casaco de cabedal nos aproximou", recordou Fangio. "Tinha uma pistola automática na sua mão e disse, de modo firme e decisivo que não nos deveriamos mexer ou nos mataria". O homem com a pistola na mão era Oscar Lucero, e os seus cumplices estavam espalhados na sala. A principio, Fangio pensava que era uma brincadeira, mas quando viu que não era, perguntou-lhe onde o levaria. Disse que o levaria para um sitio seguro e não tinham intenções de o fazer mal.

Descobri depois que haviam três carros envolvidos,” disse Fangio. “Eles guiavam devagar para não atrair as atenções. As pessoas que viajavam comigo pediram-me desculpas por aquilo que estavam a fazer, mas o que queriam era atrair a atenção do mundo para a sua causa".

Chegados a uma casa segura, informaram ao mundo que Fangio estava nas suas mãos. Como seria de esperar, a noticia correu mundo e eles informaram que só libertariam após a corrida. O governo de Batista, enfurecido e humilhado, entrou numa caça ao homem para apanhar os seus raptores, mas sem sucesso.

A corrida começou com hora e meia de atraso, e Maurice Trintignant iria correr no lugar de Fangio no seu Maserati. A corrida começou com um duelo entre o americano Masten Gregory e o britânico Stirling Moss, mas na oitava volta, o Ferrari de dois litros conduzido pelo cubano Armando Garcia Cifuentes, despista-se numa curva à frente da embaixada americana e embate num guindaste cheio de pessoas. Isto causou a morte de seis pessoas e ferimentos em mais quarenta. A corrida foi imediatamente interrompida e ironicamente, o seu rapto pode ter-lhe salvo a sua vida... pelo menos na pista, porque ele ainda estava em perigo. Como entregá-lo a são e salvo, sem que os esbirros de Batista o apanhassem?

A solução foi entregá-lo à embaixada argentina. Depois de garantias por parte do embaixador argentino de que não seriam perseguidos, eles o largaram por lá. Descobriu-se depois que o embaixador, Raul Lynch, era familiar... de Ernesto "Che" Guevara, mas Fangio lá chegou, são e salvo. Ali conversou com um jornalista mexicano que contou as coisas da seguinte forma:

"Bem, esta foi mais uma aventura. Trataram-me de modo excelente, tive as mesmas comodidades que teria se estivesse entre amigos. Se aquilo que os rebeldes afirmam é uma boa causa, eu, como argentino que sou, aceito-a".

Fangio voltou a Cuba em 1981, ao serviço da Mercedes, para ajudar o governo local. Fidel recebeu-o bem, e quando comemorou o seu 80º aniversário, dez anos mais tarde, o governo cubano mandou uma mensagem de felicitações, agradecendo a sua simpatia e colaboração pela causa, assinando-a como... "seus amigos, os sequestradores".

domingo, 6 de novembro de 2016

A foto do dia

"Mon Ami Mate", era o nome que dava Mike Hawthorn a ele. Peter Collins era um bom piloto, muito jovem e com potencial para ser campeão. Tanto que um dia, em 1956, passou a oportunidade de o ser porque achava que era "demasiado jovem". Se soubesse quanto tempo é que teria de vida, teria pensado duas vezes. Hoje, Peter Collins teria feito 85 anos de idade.

No GP de Itália desse ano, em Monza, Collins (nesta foto tirada por Bernard Cahier) era um dos candidatos ao título, a bordo de um Ferrari, contra Stirling Moss, num Maserati, e Juan Manuel Fangio, seu companheiro de equipa. Fangio não era muito fã de Ferrari, mas era a equipa que lhe dava a chance de ganhar, e sendo pragmático que era, aceitou. 

Parecia que iria ser um duelo Moss-Fangio, mas Collins venceu duas corridas, em Spa-Francocamps e Reims, dando-lhe uma boa chance de alcançar o título mundial. Depois do argentino ganhar no Nurburgring, Collins estava a oito pontos de Fangio, com chances de vitória, e mesmo Moss poderia ser matematicamente campeão, por causa dos pontos deitados fora.

No circuito italiano, o combinado seria o seguinte: se Fangio desistisse por algum problema, seria Luigi Musso a dar o carro a ele para poder guiar até à meta (nesses dias, a troca de pilotos era permitida, e os pontos eram divididos entre eles). E na volta 30, Fangio encostou às boxes com problemas na direção do seu carro. Fez-se sinal para que Musso encostasse à boxe, mas este recusou. Na volta 35, Collins parou para reabastecer, e quando soube da situação, ele deu generosamente o carro para que o argentino pudesse guiar até ao fim. E foi, até ao segundo posto, numa corrida ganha por... Moss.

Quando questionado pela razão pelo qual entregou o carro a Fangio, quando tinha uma chance matemática de vencer, contou depois que era demasiado novo para alcançar um campeonato. E a lógica era simples: Collins tinha 24 anos quando corria, contra os 45 do argentino, e com a quantidade de pilotos mais velhos do que ele, pensava que teria mais do que tempo para ser campeão.

Infelizmente, a partir desse dia, ele não iria ter mais do que ano e meio de vida: iria morrer a 3 de agosto de 1958, aos 26 anos, sendo mais uma das vitimas do Nordschleife.