Ainda bem que não tenho sabido quem vai comentando os Jogos Olímpicos nos vários canais e nos vários directos. Assim não posso cair na tentação cruel de nomear quem quer que seja.
Há muito tempo que o meu comentador desportivo preferido é o grande ciclista Marco Chagas, tal é a consistência da sua “performance”, sempre culta, sempre informada, sempre interessante. Quase todos os restantes, infelizmente, são uma espécie de caça à calinada que desemboca nesse verdadeiro “clímax” que dá pelo nome de Rui Santos (que saudades do imparável Gabriel Alves!!!). Expedição fartamente povoada por curtos, mas intensos momentos de disparate. Uns, bastante divertidos, reconheça-se... outros apenas deprimentes.
Por manifesto azar, já levei nestes Jogos com vários dos tais momentos deprimentes.
Durante a Gala de Abertura, que mesmo não tendo visto na íntegra, me pareceu muito bem “esgalhada”, suportei o papaguear dos comentadores, deslumbrados com o som da própria voz, deslumbramento que os fazia, repetidamente, falhar pormenores interessantes do espectáculo. Apenas dois exemplos:
Durante a entrada em cena da bandeira olímpica, transportada por figuras conhecidas, os dois papagaios nunca se calaram, apenas mencionando, vagamente, a presença do mítico pugilistaCassius Clay, ou Muhamad Ali, se quiserem... e ainda mais vagamente, a presença da ambientalista Marina Silva, que um deles identificou como ex-candidata à presidência do Brasil, como se tivesse sido isso a motivar o convite. Imediatamente embalaram para o blá, blá, blá, deixando passar em claro (que eu tenha ouvido) todos os restantes, a saber:
- Sally Becker (reconhecida, entre outas actividades, pelo seu trabalho político-humanitário na guerra da Bósnia).
- Shami Chakrabarti (Chanceler da Oxford Brooks University e director de uma organização defensora das liberdades civis, “Liberty”).
- Leymah Gbowee (activista africana prémio Nobel da Paz 2011).
- Doreen Lawrence (escritora e activista contra o racismo).
- Haile Gebrselassie (um dos melhores atletas fundistas da História).
- Ban Ki-moon (secretário-geral das Nações Unidas).
- Daniel Barenboim (um dos maiores maestros da actualidade, que estaria ali, não tanto como músico, mas muito mais pelo significado humano e político da orquestra que fundou, composta por músicos judeus e árabes).
Não sei, porque não vi, que espécie de tratamento deram à escritora J.K. Rowling (lendo excertos do Peter Pan), ou ao actor Rowan Atkinson (como Mr. Bean), entre tantos outros “famosos” que foram aparecendo… mas antes desta “pobreza franciscana” que relatei, já me tinham feito rir muito (apesar da irritação), quando na altura da encenação da Revolução Industrial, entrou em cena Kenneth Branagh, um dos mais creditados realizadores de cinema, argumentista e actor que, respaldado pelo reconhecimento público que lhe dão os cerca de 50 filmes que já tem no currículo, ia declamando Shakespeare alto e bom som (e bem!)… não conseguindo impressionar os nossos diligentes comentadores que, depois de o ignorarem “olimpicamente” por alguns minutos, acabaram por lhe chamar «o figurante encarregado do recitativo».
Não me daria ao trabalho de escrever sobre esta historieta triste, não fosse o facto (espécie de “gota de água”) de um outro deles, não sei quem, se ter referido logo no dia seguinte, à importância não sei exactamente de quê, com o já clássico «não deixa de “não” ser importante»…
Já que estamos em tempo de Jogos Olímpicos… que “mínimos” é que será obrigatório atingir para ser comentador na televisão?
ADENDA: Por lapso, tinha incluido na "família" de comentadores "calinas" o jornalista Nuno Santos... quando queria dizer Rui Santos, o mago dos comentários da bola.
Como disse um dia um comentador desportivo, «é uma falta indesculpável, pela qual peço desculpa!»