Recordo-o transcrevendo um dos seus poemas.
Casas Abandonadas
Casas abandonadas,
Casas sem moradores!
Já não marulham ondas de seda pelas escadas,
E as ervas no jardim abafaram as flores…
Os lagos do jardim são olhos cegos…
As salas vazias parecem maiores…
E nas paredes nuas os pregos
Lembram as espadas da Virgem das Dores…
Um espelho esquecido, congelado oceano
De tons sombrios, palustres,
Memora com saudade a voz extinta do piano,
E a inquieta irradiação das jóias e dos lustres…
Ao pé duma varanda, onde se abrem martírios,
Jaz no chão uma rosa, e junto dela
Cartas rasgadas: lírios
Chorando a morte duma donzela…
A poeira sucedeu aos tapetes, e tudo
Exala um ar de desconforto envergonhado…
- Ai das que um dia se vestiram de veludo
E agora não têm calçado!
As paredes, o chão, as portas e as janelas
Tudo relembra o dia de ontem, alegre e claro…
- Ai das que foram ricas e belas,
E que hoje são viúvas pobres, ao desamparo!
Em vez dos risos infantis, as ladainhas
Do vento! O repuxo é um cisne a cantar…
- Ai das Rainhas sem corte, das destronadas Rainhas,
De porta em porta a mendigar…
Da casa o coração chora com frio…
Pobre mãe! Seus filhos a deixaram só!
E ora quer ficar nesse amargor sombrio,
Pensando nos que , um dia , abalaram sem dó,
Ora apetece novos moradores
Em cujos sorridentes
E discretos amores
Possa esquecer os que se foram indiferentes…
Casas abandonadas,
Onde as noites são frias, e as manhãs
Pálidas! Casas abandonadas,
Minhas irmãs!
Eugénio de Castro
Foto minha