Foi revogado o decreto-lei do Governo que aumentou os limites para a autorização de despesa por parte do Estado, autarquias, institutos, fundações, associações e empresas públicas.
Este é o resultado da aprovação pelos deputados, com os votos contra do PS, de quatro projectos de resolução do PCP, BE, PSD e CDS-PP que pugnavam pela cessação da vigência daquele diploma do Governo.
Com esta votação, como salientou o presidente da Assembleia da República, Jaime Gama, mantêm-se em vigor os anteriores limites para a autorização de despesa pública, fixados no decreto-lei n.º197/99, de 8 de Junho.
No decurso do debate choveram as críticas dos partidos da oposição a uma actualização que o Governo apresentou como sendo correspondente à inflação acumulada desde 1999 mas que na verdade alarga os limites de autorização de despesa para valores muito superiores.
A título de exemplo refira-se que no caso do primeiro-ministro esse limite aumentou 40 por cento, de 7,5 milhões para 11,250 milhões de euros, enquanto que no caso dos directores-gerais e ministros esse aumento chega aos 50 por cento.
Aumentos que não obstante o desafio para que fossem justificados não obtiveram esclarecimento por parte do Governo, que se limitou, tal como a bancada do PS, a acusar os partidos da oposição de virem contestar agora uma decisão que, no respeitante às autarquias, antes fora por aqueles autorizada com a votação do artigo 38.º do Orçamento do Estado para 2010.
Ora esse artigo, aprovado com os votos favoráveis do PS e do PSD e com a abstenção dos restantes partidos, apenas autorizava o Governo a legislar até 31 de Dezembro de 2010, com vista a possibilitar um aumento dos limites de autorização de despesa por parte dos órgãos das autarquias locais.
Acontece porém que o decreto-lei agora revogado, de 23 de Março, é posterior a 2010 e, por isso, na perspectiva do PCP, ilegal. Isso mesmo sustentou o seu líder parlamentar, Bernardino Soares, afirmando que não é aceitável a utilização de uma autorização legislativa que caducou em 31 de Dezembro.
Mas se esta questão configura do ponto de vista jurídico uma ilegalidade, na perspectiva do PCP, não menos importante é vê-la politicamente e, nesse plano, como foi dito, o que o Governo faz é aumentar de «forma inaceitável» os limites para a autorização de despesas.
Bernardino Soares, a este propósito, lembrou que «uma regra clássica para a transparência dos dinheiros públicos é que os limites para a autorização – sobretudo por órgãos individuais – sejam razoáveis», o que não acontecia na proposta do Governo.
Sustentada pela bancada comunista foi também a ideia de que devem ser os órgãos colegiais as entidades privilegiadas a quem deve ser atribuída a responsabilidade pela adjudicação de despesas por montantes elevados.
«Isso é que favorece a transparência e o justo exercício dos poderes públicos», sublinhou Bernardino Soares que não resistiu a comentar dois momentos quase hilariantes ocorridos no debate. Um, quando o ministro Jorge Lacão acusou o PCP de enganar os portugueses. «Imagine-se, o Governo a acusar o PCP de enganar voluntariamente os portugueses», ironizou o líder parlamentar comunista, concluindo que «é preciso ter descaramento».
O segundo momento foi quando o mesmo ministro afirmou que o Governo respeita «com total lealdade» os procedimentos institucionais.
«Se este assunto não fosse tão sério era caso para darmos aqui todos uma sonora gargalhada», comentou o líder parlamentar comunista.