Reflexões, notas, impressões, apontamentos, comentários, indicações, desabafos, interrogações, controvérsias, flatulências, curiosidades, citações, viagens, memórias, notícias, perdições, esboços, experimentações, pesquisas, excitações, silêncios.

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quarta-feira, 28 de fevereiro de 2007

À espera de Godot

aqui se beliscou ao de leve o alvoroço atlântico provocado pela demissão de Jardim. Como é sabido, o peronismo manso e edificante instalado na Madeira há 30 anos está a meio caminho entre o reinado de D. Pedro, o Cruel e um keynesianismo insuflado pela generosidade dos sucessivos Governos da República, para quem os deputados madeirenses eram o sagrado penhor limiano no Parlamento. Todavia, por muito que custe a alguns, a "democracia" madeirense não é muito diferente da de Sócrates. É talvez mais ruidosa, mais garrida, mais chocarreira. O contínuo e escandaloso desfile de yes man pelas prebendas do Estado, a ocupação de cargos públicos pelos boys e girls disponíveis só pode aconselhar este entendimento. Experimentem ser voz dissonante no que toca às regras de admissão para um cargo público, ou de concessão de determinada empreitada, ou de licenciamento de determinada actividade, ou à "boa prática" de determinado comissário destacado num "serviço público" ou de um político eleito pelas cores da maioria. Verão o que acontece. Terão em cima de vós uma boa dose de arrogância e dificuldades. A mediocridade, a incompetência e a proximidade dos favores do poder andam de mãos dadas. Será que Sócrates é mais autoritário do que Jardim? Talvez não. Simplesmente dissimula o seu muito melhor. É o representante de uma espécie de cavaquismo científico, onde nada é deixado ao improviso, ou à arbitrariedade. Com a suave complacência da comunicação social, é claro. E com a bênção de quem ainda não percebeu isto.

quinta-feira, 22 de fevereiro de 2007

O Pântano

O regedor Jardim veio à metrópole, mais concretamente a casa do Sr. Silva, suplicar por eleições antecipadas na Madeira, após se ter demitido das suas funções. É que o Carnaval da sua governação, baseada num despesismo irresponsável e escandaloso, teve os seus dias contados, com a recente aprovação da nova Lei das Finanças Regionais. Acto contínuo, a nomenclatura do arquipélago, habituada a engordar junto à teta do orçamento de estado, e o próprio chefe da macacada, perceberam que teriam que despedir, cortar, retirar mordomias. Vai daí, nada como um plebiscito peronista para repor a normalidade "democrática" na região. E colocar a oposição local em maus lençóis. Especialmente o PS. Que terá de desenvolver uma estratégia corajosa e certeira para ganhar pontos. Numa campanha onde as diferenças em relação ao Carnaval pouco se farão sentir. E para uma eleições cujas consequências serão exclusivamente políticas. Com o semi-existente Marques Mendes à espreita dos louros que poderá colher.

segunda-feira, 29 de maio de 2006

O Circo democrático

O primata da Atlântida tem um acordo tácito com este país e que, valha a verdade, tem cumprido escrupulosamente: para gáudio da plateia e para combater a proverbial tendência depressiva da nação, aparece periodicamente no galho mais alto, perdão, nos media e, aclamado pela assembleia, dá início ao seu one monkey show (perdoem o trocadilho fácil, mas não resisti). Depois de distribuir mais umas bananas pelo clã, debita então uns soundbytes que vai tirando da cartola - que usa como sinal distintivo da sua preponderância - enquanto bate furiosamente na barriga, apontando para leste, terra dos macacos grandes que, supostamente, querem disputar a ilha da sua tribo e roubar-lhe a comida. Cada gesto mais expressivo, ou cada onomatopeia mais desafiadora, são imediatamente reproduzidos pelos macacos dos galhos inferiores, numa sintonia unânime e típica, temendo que, se não o fizerem, ficarão excluídos na próxima distribuição de bananas. Entretanto, e enquanto duram estes rituais, os humanos da ilha, não dispondo ainda de meios para a criação de uma reserva natural para fixação dos símios, vivem aterrorizados e amordaçados de todas as formas e feitios.
A história é sobejamente conhecida, tendo-se tornado mesmo objecto de estudo por paleontólogos e pseudólogos (pseudologia, ciência do quimérico, do falacioso). Há até quem afirme que Platão, em A República, deveria ter previsto mais esta modalidade de perversão totalitária, criada e alimentada pela democracia, algures na Atlântida.
Mas veja-se com maior detalhe a última homilia do celebrante macaco-chefe: desta vez exige a criação de um sistema judicial "regional", uma espécie de foro privado convenientemente inspirado por costumes locais e formado por macacos às ordens do chefe. Deste modo, a distribuição de bananas permaneceria intocada, os macacos do continente já não poderiam vir pedir contas e os macacos de todo o mundo teriam ali uma zona franca para poder trocar todo o tipo de bananas, sem que ninguém colocasse questões incómodas. Bravo! É de mestre! Atenção pseudólogos! Mesmo os piratas e flibusteiros de antanho, quando criaram uma rede global de "redistribuição" da riqueza, ao arrepio de todas as leis conhecidas, nunca deixaram de criar as suas, para uso interno: simples, cruéis e de uma lógica desconcertante. Em todo o caso, essas regras eram escrupulosamente aplicadas. Sem excepções. Ora, no nosso exemplo, a ideia seria desmantelar a última forma independente de controlo das tropelias simiescas do chefe y sus muchachos, visto que o controlo e a responsabilização por via política já deixaram de existir há muito. As portas ficariam abertas para o último passo: um regime de excepção, apto a assegurar a inimputabilidade permanente e vitalícia do seu líder.
Mas azar dos azares, as plateias menos desatentas já deixaram de se impressionar com estas macacadas. E já aprenderam que o show off esconde o medo e a insidiosa chantagem. E que esta mais não é do que a preclara antecipação de mais umas dotações extra para financiar a bananada local. Enviadas por correio expresso pelos macacos do continente, num assomo magnânimo e liberal. Como uma mesada que um pai desiludido já deixou de fazer acompanhar de prosélitas recomendações de bom comportamento, mas que, sem dúvida, ainda aliviavam a consciência de assim estar a alimentar a irresponsabilidade e o desvario. Até ver.

Publicado no jornal "O Interior"