Título original: Beatrice and Virgil
Ano da edição original: 2010
Autor: Yann Martel
Tradução: Fátima Andrade
Editora: Editorial Presença
Ano da edição original: 2010
Autor: Yann Martel
Tradução: Fátima Andrade
Editora: Editorial Presença
"Henry, um escritor reconhecido, decide escrever um livro, meio ficção e
meio ensaio, como forma de abordar todos os aspectos de um mesmo tema.
Completamente desencorajado pelos seus editores, desiste do projecto e
vai viver para outra cidade. Aí, contudo, continua a receber cartas de
leitores e, um dia, um taxidermista escreve-lhe a pedir ajuda. Henry
apercebe-se então de que estão ambos a tentar escrever sobre o mesmo
tema. Um livro polémico e provocador, que confirma o autor de A Vida de Pi, o Man Booker Prize de 2002, como um dos mais surpreendentes escritores canadianos da actualidade."
Embora tivesse alguma curiosidade para voltar a ler Yann Martel, autor do surpreendente A Vida de Pi, não tinha grandes expectativas porque a maioria das críticas que li aos outros livros que escreveu eram mais ou menos desencorajadoras. Na realidade, este Beatriz e Virgílio não me encantou, achei-o até um pouco pretensioso.
Henry é um escritor conhecido que tem dedicado os últimos anos ao livro que está a escrever sobre o Holocausto. Na realidade Henry está a trabalhar em dois livros, uma obra de ficção e um ensaio sobre o Holocausto e Henry gostaria que os dois fossem publicados como um único livro, com a ficção a complementar a dura realidade. Quando os seus editores, de forma, mais ou menos simpática lhe dizem que a ideia é péssima e que os livros não são assim tão geniais, Henry fica em choque. Sem capacidade para recomeçar a escrever, parte com a mulher para uma cidade na Europa onde acabam por se ir integrando e ficando, e uma viagem que começou por ser isso mesmo, uma viagem, acaba por ser tornar na nova casa do casal que não pensa regressar à sua vida passada.
Henry ocupa os seus dias a descobrir novas vocações em si, tem aulas de música, está integrado numa companhia local de teatro amador e aguarda com ansiedade a chegada do primeiro filho de ambos. O único contacto que vai tendo com a sua carreira literária são as cartas dos leitores que lhe chegam e às quais faz questão de responder uma a uma. E é nesse correio de leitores que surge um envelope, de um leitor misterioso, que por coincidência vive perto de Henry. Ao contrário dos outros leitores este envia a Henry um excerto de uma peça de teatro, cujos protagonistas são Beatriz e Virgílio, duas personagens que parecem ter sido inspiradas nas homónimas de Dante, na sua Divina Comédia. O tom no pequeno bilhete que o misterioso leitor enviou com a peça de teatro e a qualidade literária da mesma, deixam Henry curioso e com vontade de conhecer o seu autor. E é o que faz, num dos seus passeios diários com o seu cão, vai até à porta da morada que constava no envelope que recebeu e, após um momento de hesitação, por estar defronte de um taxidermista, entra. O misterioso leitor e autor da peça de teatro é um sexagenário, homem duro, de poucas palavras, ríspido e pouco simpático.
Aparentemente o homem precisa da ajuda de Henry para acabar de escrever a sua peça.
E o livro vai decorrendo desta forma, com Henry a tentar perceber quem é o taxidermista e como é que alguém, aparentemente tão frio, tem a capacidade de escrever algo tão profundo em termos de emoções e de sensibilidade. À medida que vai conhecendo o estranho homem, Henry vai descobrindo alguém que carrega uma culpa, que não sabe como se redimir e que tenta pedir desculpa através de uma peça de teatro, cujos protagonistas são um burro e um macaco. Mais uma vez Yann Martel a recorrer aos animais para fazer passar a mensagem.
Nós, leitores, nunca temos a certeza de que o taxidermista tenha noção de quão monstruoso foi aquilo da qual fez parte, mas também nunca sabemos em que condições e que papel desempenhou no Holocausto, porque é disso que estamos a falar.
Não tenho muito mais a dizer sobre o livro. Não que não haja por onde esmiuçar, sobre o Holocausto existiria sempre muito para dizer. Mas no que ao livro diz respeito, não encontro muito mais que dizer. Como disse no início, achei-o um pouco pretensioso. Tenho sempre alguma aversão a livros sobre escritores onde nas entrelinhas se vão percebendo alguns auto-elogios.
Destaco a peça que o taxidermista está a escrever, Beatriz e Virgílio são as verdadeiras estrelas deste livro e a descrição que Virgílio faz de uma pêra, porque Beatriz nunca viu ou comeu tal fruto, é deliciosa.
Embora não tenha sido um livro que me tenha prendido particularmente, não deixa de ser uma obra que vale a pena ler. Sei de muito boa gente que a considera uma obra-prima. Mais por isso que pela minha opinião muito pessoal, recomendo! :)
Boas leituras!
Excerto (pág. 43):
"Beatriz: Mas a que sabe? Não aguento mais.
Virgílio: Uma pêra madura transborda de suculência doce.
Beatriz: Oh, isso parece bom.
Virgílio: Corta uma pêra e verás que a sua polpa é de um branco incandescente. Brilha com uma luz interior. Aqueles que trazem consigo uma faca e uma pêra nunca têm medo do escuro.
Beatriz: Tenho de provar uma.
Virgílio: A textura de uma pêra, a sua consistência, é outra coisa difícil de pôr em palavras. Algumas pêras são um tudo ou nada crocantes.
Beatriz: Como uma maçã?
Virgílio: Não, nada parecido com uma maçã! Uma maçã resiste a ser comida. Uma maçã não +e comida, é conquistada. A qualidade crocante de uma pêra é muito mais atraente. É generosa e frágil. Comer uma pêra é semelhante a... beijar.
Beatriz: Oh, céus! Parece tão bom.
Virgílio: A polpa de uma pêra pode ser ligeiramente granulosa. Contudo, derrete-se na boca.
Beatriz: Tal coisa é possível?
Virgílio: Com todas as pêras. E isso é só o aspecto, o toque, o cheiro, a textura. Ainda nem te falei do sabor.
Beatriz: Meu Deus!"