O público ainda se acomodava na tenda do Tim Festival quando, às 23h10 (mais de uma hora de atraso), Rosa Passos entrou no palco cantando "Vatapá", de Dorival Caymmi, compositor que, junto de Tom Jobim, foi o mais lembrado da noite. "Esse é um show que eu já apresentei nos Estados Unidos e na Europa, um concerto em homenagem a Caymmi e à bossa nova. Compositor e movimento sempre serão dignos de lembrança, mas o show de Rosa chega em um momento em que, por força das circunstâncias, tais reverências encontram-se no limite da saturação.
Ainda na terceira música, começou a ocorrer um fenômeno que acompanharia toda a apresentação. Casal sentado na nossa mesa, comentou: "depois do Sonny Rollins, essa Rosa não dá, não". Levantaram-se e foram embora. Já na primeira noite, um erro primário de escalação, colocando um instrumentista virtuoso para tocar antes de uma cantora brasileira cujas pretensões artísticas estão muito além do espetáculo que proporciona. Rosa tem uma boa voz. Sua amplitude vocal permite-lhe ir da suavidade à potência em um mesmo verso. Porém, as tentativas de alterar a métrica e a melodia dos canções, emulando improvisos jazzísticos instrumentais com a voz, resulta em um pedantismo inócuo.
Sua banda é composta por instrumentistas virtuosos, afinal, se não o fossem, não tocariam com ela, afirmou a cantora ao apresentá-los. O que deveria ser uma qualidade resulta em interlúdios instrumentais obrigatórios em todas as canções, prejudicando-lhes a execução. Nestes momentos, Rosa posta-se ao lado do instrumentista, olhos fechados. O que para ela é puro prazer, a platéia recebe com enfado. Tanto que quando ela anuncia que deixará o palco para um set instrumental, as luzes sobre a platéia se acendem e o que se vê é uma debandada considerável por parte do público.
O ponto alto do show acontece quando ela pega o violão e a banda se retira, ficando acompanhada apenas pelo baixista Paulo Paulelli. Aos primeiros acordes de "O Que Que a Baiana Tem?", a mulher sentada na mesa ao lado comenta com a amiga: "aí que é a Rosa Passos, assim é que ela manda bem". É quando ela se aproxima do epíteto "João Gilberto de saias" que muitas vezes lhe é impingido. Onde João é minimalista, Rosa é vigorosa. O violão de João é sambista; o seu é jazzístico. As batidas ritmadas fazem digressões sobre a harmonia e a melodia das canções e, por quatro músicas, Rosa consegue fazer seus improvisos soarem naturais em língua portuguesa. Mas foi cantando um samba que o show alcançou o seu ápice. Em uma interpretação convencional de "Pra que discutir com madame?", de Haroldo Barbosa e Janet de Almeida, que faz parte do repertório de João, o público chegou a ensaiar um coro. Mas foi só.
Em seguida, ao travestir "Águas de Março" de jazz, alterando a métrica dos versos e a melodia vocal, afasta-se do público para não mais se aproximar. Exceto, é claro, daqueles fãs incondicionais citados no começo desta postagem. Quem esperava por uma apresentação do nosso "João Gilberto de saias", podia ter evitado a frustração ao observar que Rosa Passos entrou no palco trajando calças. E o violão, instrumento fundamental à materialização do desejo do público, foi antes um elemento decorativo para os malabarismos de piano, baixo, sopros e bateria. E, principalmente, vocais.
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sexta-feira, 24 de outubro de 2008
Tim Festival 2008: Rosa Passos e o cansaço do samba-jazz
Em um determinado momento do seu show, ontem, no primeiro dia da edição carioca do Tim Festival 2008, Rosa Passos anunciou com uma ponta de orgulho que "Romance", seu disco mais recente, está indicado para o "Latin Grammy". Porém, ressalvou, em uma categoria "nada a ver": pop contemporâneo. "É um disco de jazz", ponderou. Assistindo ao show, fica claro o porquê de tal categorização. Rosa é uma cantora brasileira que faz carreira no exterior com a cansada combinação de jazz e bossa nova. À banalização de um e de outro resulta em... um pop contemporâneo para platéias estrangeiras. Aqui no Brasil parece não funcionar, exceto para um público cativo, cujo grau de "refinamento" musical talvez só encontre correspondência nos fetichistas do MPB-Jazz lá de fora.
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