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31 agosto 2024

O culto público deve ser preferido aos devocionais privados

O Rev. David Clarkson pregou um sermão sobre a importância do culto público. Em seus dias, semelhantes aos de hoje, muitos cristãos creem ser suficiente viver o seu cristianismo em seu lar, de modo privado, sem exercer a comunhão com outros irmãos e sem participar do culto público. Ele enumera alguns possíveis motivos:
1. Talvez por individualismo: O que realmente importa é o que eu faço por mim mesmo, ou o que Deus me diz pessoalmente. 
2. Talvez por orgulho: "Eu posso cuidar de mim mesmo espiritualmente; não preciso de pastores, presbíteros, diáconos e outros líderes cristãos".
3. Para alguns, a tentação pode estar na autopreservação: Talvez, você tenha sido gravemente ferido por outros cristãos e queira se proteger se afastando do convívio da igreja. 
4. Para outros, pode ser arrogância: Você não gosta de ser confrontado acerca dos seus pecados; seus ouvidos coçando, querem ouvir apenas coisas boas, agradáveis ​​e encorajadoras. 
5. Talvez você seja um pouco introvertido e ache exaustivo e assustador estar entre as pessoas. Até as melhores igrejas são lugares confusos e frustrantes. Se você colocar muitos pecadores — mesmo pecadores que estão sendo santificados — em um só lugar, haverá problemas. As pessoas dirão coisas insensíveis, haverá perspectivas diferentes, haverá cristãos fracos e imaturos para lidar. Seria muito mais fácil ficar em casa e evitar completamente essa situação!

E, em seguida, oferece alguns argumentos para que, além do exercício particular de devocionais, os cristãos participem dos cultos públicos:

1. O Senhor é melhor glorificado pela adoração pública do que pela privada. Deus é glorificado por nós quando reconhecemos que ele é glorioso, e ele é mais glorificado quando esse reconhecimento é público.

2. Há mais da presença do Senhor na adoração pública do que na privada. Ele está presente com seu povo no exercício da adoração pública de uma maneira especial, mais eficaz, constante e intimamente.

3. Deus se manifesta mais claramente na adoração pública do que na privada. Por exemplo, em Apocalipse, Cristo é manifesto "no meio das igrejas".

4. Há mais vantagem espiritual na realização da adoração pública. Qualquer benefício espiritual que seja encontrado em deveres privados, isso e muito mais é esperado da adoração pública quando usada corretamente.

5. A adoração pública é mais edificante do que a privada. Em privado, você provê para o seu próprio bem, mas em público você faz o bem tanto para si mesmo quanto para os outros.

6. A adoração pública é uma segurança melhor contra a apostasia do que a privada. Aquele que carece ou rejeita a adoração pública, quaisquer que sejam os meios privados que ele desfrute, está em perigo de apostasia.

7. O Senhor opera suas maiores obras na adoração pública. Entre elas a conversão, regeneração, etc., e, geralmente, são realizadas por meio dos cultos públicos.

8. A adoração pública é a semelhança mais próxima do céu. Nas representações bíblicas do céu, não há nada feito em particular, nada em segredo, pois toda a adoração dessa gloriosa comunhão é pública.

9. Os mais renomados servos de Deus preferiram a adoração pública à privada. O Senhor não se retirou das ordenanças públicas, apesar de estarem corrompidas. A adoração pública era mais preciosa para os apóstolos do que sua segurança, liberdade e vidas.

10. A adoração pública é o melhor meio para obter as maiores misericórdias, bem como prevenir e remover os maiores julgamentos.

11. O precioso sangue de Cristo está mais interessado na adoração pública. A adoração privada era exigida e realizada por Adão e sua posteridade, mesmo em um estado sem pecado, mas a pregação pública do evangelho e a administração dos sacramentos têm uma dependência necessária da morte de Cristo.

12. As promessas de Deus são dadas mais à adoração pública do que à privada. Há mais promessas à adoração pública do que à privada, e mesmo as promessas que parecem ser feitas a deveres privados são aplicáveis ​​e mais poderosas para a adoração pública.


Adaptado do site The Banner of Truth Trust acessado em 31/08/2024. 


Obs.* Obviamente o autor não está reprovando o necessário exercício dos nossos devocionais diários e particulares, mas acentuando porque eles não são suficientes, e como o culto público é superior e mais completo para nos alimentar na nossa comunhão com Deus.


Sobre David Clarkson (1622-1686). Ele nasceu em Bradford, Yorksire, onde foi batizado em 3 de março de 1622. Tornou-se membro do Conselho do Clare Hall, Cambridge, onde foi tutor de muitos alunos; também trabalhou como pastor em Martlake, Surrey, até 1662 quando foi exonerado por inconformismo. Foi, por um período, assistente de John Owen em Londres, vindo a sucedê-lo após a morte de Owen, em 1683. Ele publicou diversos livros, as suas obras escritas somam 3 volumes.

28 março 2022

A redescoberta dos puritanos no século XX

 

Os puritanos foram redescobertos indiretamente pela pregação e textos de Charles H. Spurgeon. O príncipe dos pregadores herdou de seu pai uma grande biblioteca, contendo muitas obras dos puritanos. No entanto, ele se preocupou mais em fazer conhecida a mensagem do que a história, o pensamento e obras dos puritanos. A tarefa de trazer o movimento ao público do século XX foi realizada por D.M. Lloyd-Jones e Iain H. Murray.

David Martyn Lloyd-Jones (1899–1981) foi um pastor galês, que por quase 30 anos ministrou na Capela de Westminster em Londres. Ele foi influente no despertamento calvinista do movimento evangélico britânico no século XX, na popularização no método expositivo de pregação e na redescoberta da teologia puritana.

Iain H. Murray serviu como pastor auxiliar de D. Martyn Lloyd-Jones na Capela de Westminster (1956–59) e, posteriormente, na Capela Grove em Londres (1961–69) e na Igreja Presbiteriana St. Giles, Sydney, Austrália (1981–84). Em 1957, ele e Jack Cullum fundaram a editora The Banner of Truth Trust, da qual ele continua sendo um administrador.

A editora The Banner of Truth Trust promoveu a reedição de muitas obras completas, biografias e monografias dos puritanos. O saudoso e querido Bill Barclay que serviu como missionário no Brasil fundou a PES, sendo a primeira editora a publicar textos dos puritanos em nosso país. Atualmente diversas editoras têm publicado desde sermões, biografias, textos resumidos a alguns volumes completos dos puritanos. Recentemente a editora Defesa do Evangelho lançou o curso em vídeo [com 2 livros-textos] do Joel R. Beeke de “Introdução aos Puritanos”. Um excelente material!

A biblioteca do Puritan Reformed Theological Seminary possui o maior acervo de fontes primárias dos puritanos. Dentre elas algumas raridades como um exemplo original da primeira edição e impressão da Confissão de Fé de Westminster. 

Os Simpósio Os Puritanos estará realizando a sua 29o. conferência em 2022. Todos os anos disponibilizam durante o evento uma livraria com literatura puritana e demais reformados. Além de palestras sobre o puritanismo.

Creio que será de grande proveito que você leia, conheça e, por si mesmo, descubra a riqueza da piedade puritana. Há muita distorção e maledicência, seja criterioso e examine. Tenho certeza que você terá uma experiência enriquecedora.


 Obs.* A Nadere Reformatie Publicações tem publicado excelentes textos dos puritanos em Kindle.

 

 


03 janeiro 2019

Remédios preciosos contra as artimanhas do Diabo - Capítulo 12

Satanás tem outro método para causar dano aos crentes. Se não pode conseguir que pequem, ou sejam distraídos, tratará de fazer-lhes infelizes e miseráveis como crentes. Isto procura fazê-lo induzindo-lhes a duvidar de sua salvação. Aprecia encher as mentes dos crentes com dúvidas e interrogações. “Sou realmente cristão? Está firme e segura minha esperança da vida eterna? É a satisfação cristã que sinto, uma boa emoção e nada mais? Um dos métodos de Satanás é atacar aos cristãos enchendo-lhes com interrogações, dúvidas, incertezas e miséria. Para conseguir isto, Satanás utiliza três métodos.

Primeiro, Satanás procurará que os crentes sempre estejam preocupados acerca de seus pecados. Fará que seus pecados lhes pareçam tão grandes que não possam pensar noutra coisa, especialmente que não pensem em seu Salvador. Nenhum crente deve pensar no pecado desta maneira. É certo que o pecado rodeia aos crentes e que estes ainda pecam. Não obstante, o pecado não tem poder para condená-los. O Senhor Jesus não retira todos e cada um dos pecados dos crentes, ou seja, eles ainda são imperfeitos. Todavia, retira a condenação do pecado. “Nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus” (Rm 8.1). Cristo também lhes livra do reino e do poder dominante do pecado (Rm 6.14). Os crentes não pecam de modo livre, nem com felicidade. Não são escravos do pecado, advertem seu perigo e pelejam contra ele. Ainda que o pecado ainda habite neles e se rebela, não pode controlar, nem dominá-los totalmente. O poder do pecado foi destruído por Cristo. Portanto, o crente não deve cair no erro de pensar somente em seus pecados.

Segundo, os crentes devem guardar na mente, que Deus promete o perdão do pecado na Bíblia. É certo que devem lutar contra o pecado e, todavia, neste mundo o pecado não será erradicado de suas vidas. Não devem se fixar tanto nos pecados, de modo que percam de vista a grandeza do perdão do pecado. Deus disse: “Eu, eu mesmo, sou o que apago as tuas transgressões por amor de mim e dos teus pecados não me lembro”. (Is 43.25) Cristo pagou pelos pecados de seu povo, nenhum outro o pode fazer. Paulo disse: “Aquele que não conheceu pecado, ele o fez pecado por nós, para que nele fôssemos feitos justiça de Deus.” (2Co 5.21). Os crentes não se sentiriam miseráveis se outra pessoa pagasse uma dívida sua. Cristo pagou a dívida dos pecados que cada crente devia a Deus. Portanto, os crentes não devem se sentir miseráveis e deprimidos como se sua dívida não estivesse quitada.

Terceiro, isto não quer dizer que os crentes devem tornar-se descuidados com o pecado. Satanás quer que estejam alarmados e aterrorizados por seus pecados. Os motivos de Deus em permitir que os crentes estejam preocupados com o pecado são outros. Deus quer que os crentes se mantenham em humildade. Quer que busquem sua ajuda para mortificar o pecado. Quer que dependam de Cristo para seu perdão e fortaleza. Quer que tenham compaixão por aqueles que estão sujeitos às mesmas debilidades e para os que caem em pecado. Também quer que anelem profundamente a libertação completa do pecado no céu. Deus alcança estes propósitos deixando que lutem e que sejam exercitados com os resquícios do pecado.

Os crentes que estão deprimidos, miseráveis e aterrorizados por causa de seus pecados, devem arrepender-se desse estado mental. Sua depressão é ocasionada por sua própria ignorância e incredulidade. Devem entender que o amor de Deus é completo, livre, eterno e abundante; a morte e os sofrimentos de Cristo são suficientes para perdoar todos os seus pecados para sempre. Devem compreender melhor o valor, a glória e a suficiência da justiça de Cristo, a qual lhes foi imputada. Devem crer mais na gloriosa e indestrutível realidade de sua união espiritual com Cristo. Se tão somente os crentes cressem mais na verdade destas coisas, não seriam deprimidos e enganados por Satanás, nem por seus pecados.

Há outra forma em que Satanás faz com que os crentes se sintam miseráveis, culpados e inúteis. Ele lhes leva a pensar que as normas para ser um crente são tão altas que nunca poderá alcança-las, fazendo-lhes duvidar, assim, de sua salvação. Agrada a Satanás fazer com que os crentes pensem que sua fé não é verdadeira. Quer persuadi-los que a fé é um dom tão especial e tão raro que poucos a têm. Satanás insinua aos crentes que a fé significa nunca duvidar de sua salvação e sempre crer que seus pecados são perdoados. Se em algum momento os crentes duvidam, questionam, ou caem em ansiedade, então, Satanás lhes diz que não têm a fé verdadeira.

Primeiro, Satanás ao fazer tudo isto, está insinuando que a fé signifique mais do que a Bíblia diz. Deus disse na Bíblia que os crentes podem ter a fé verdadeira, sem ter a certeza de que a têm. Se assim não fosse, o apóstolo João não escreveria: “Estas coisas vos escrevi a fim de que creiais no nome do Filho de Deus, para que saibais que tendes a vida eterna” (1Jo 5.13). Eles creram, mas não tinham certeza se tinham a vida eterna. João escreveu para mostrar-lhes que tinham a vida eterna. Antes que soubessem que tinham a vida eterna, eles haviam crido, pois tinham fé. Então pode-se ter fé sem ter certeza de sua salvação.

Segundo, Deus nos disse que a fé significa receber a Cristo: “Mas a todos quanto o receberam, aos que creram em seu nome, lhes deu o poder de serem feitos filhos de Deus” (Jo 1.12). Satanás quer que os crentes pensem que a fé signifique sempre ter certeza e nunca duvidar de que Deus lhes ama e de que seu destino é o céu. A verdade é que pode existir a fé verdadeira, mesmo quando hajam muitas dúvidas. Por exemplo, Mt 14.31 disse: “Homem de pouca fé, por que duvidaste?” Uma pessoa pode crer verdadeiramente, e não obstante, às vezes, duvidar. Este foi o caso de Pedro; cria, tinha fé e, todavia, ainda duvidava.

Terceiro, a segurança é um efeito, ou um fruto da fé, portanto não deve ser confundido com a fé. Ter a certeza de que somos cristãos, não é a mesma coisa que crer em Cristo. A fé é o que vem primeiro e a segurança vem depois. A fé não pode se perder, a segurança sim. A terceira tática do Diabo para promover a dúvida nos crentes, que se deprimam e se sintam miseráveis e inúteis, é que julguem equivocadamente a providência divina. Satanás quer que os crentes pensem que Deus está contra eles e que está lhes tratando duramente. Satanás deseja que creiam que por causa da vida que levam, dificilmente Deus lhes ama. Oram e pedem algo a Deus, mas não lhes contesta, ou lhes responde negativamente. Esperam receber algo bom, mas são decepcionados e se sentem prejudicados. Se esforçam para obedecer a Deus, mas logo seus sonhos são frustrados. Então começam a pensar que Deus não se preocupa com eles.

Em tais circunstâncias os crentes devem recordar o seguinte:

Primeiro, que muitas coisas podem estar contra seus desejos e seus sonhos sem serem contrários ao seu bem. Abraão, Moisés, Paulo, Jonas sempre receberam o que queriam? Não. Encontraram-se em muitas circunstâncias providenciais contrárias aos seus desejos, mas não contra o seu bem espiritual. A providência pode operar contra os nossos desejos, mas nunca contra o nosso bem.
Segundo, a mão de Deus pode estar contra uma pessoa, ao mesmo tempo que seu amor e seu coração estão a seu favor. A mão de Deus parecia estar contra Jó, quando na realidade Deus lhe muito amava. O amor de Deus pelos crentes não muda ainda e quando sua providência pareça estar se realizando contrária a eles.

Terceiro, as coisas difíceis que sobrevêm aos crentes na providência de Deus têm um bom propósito (Rm 8.28). Todas as circunstâncias estranhas, obscuras, dolorosas em que os crentes se encontram, sempre lhes prosperam em seu caminho para o céu, em sua peregrinação para a felicidade. Quando Deus está operando na vida de um crente, as coisas difíceis e duras sempre lhe conduzem às bençãos e para a prosperidade espiritual. José teve uma vida dura quando foi vendido como escravo e quando foi encarcerado, mas posteriormente foi usado por Deus para salvar a sua família. A vida pode ser confusa e, às vezes, muito dura para os crentes; mas a Bíblia ensina que em todas estas coisas Deus nunca está operando contra, mas para o seu bem e o benefício de outros. Deus se preocupa com seu povo. Portanto, os crentes não devem permitir que Satanás lhes amargure, ou induza a duvidar do amor de Deus.

01 janeiro 2019

Remédios preciosos contra as artimanhas do Diabo - Capítulo 11

Concentremos a nossa atenção em outros dois métodos usados pelo diabo para desanimar aos crentes em seu serviço para o Senhor.

Primero, Satanás tratará de encher sua mente com maus pensamentos, ou ainda com pensamentos sujos. Isto ele faz frequentemente quando os crentes estão orando, lendo suas Bíblias, ou pensando em Deus.

Em segundo lugar, se esforçará para que se sintam satisfeitos com sua vida cristã a fim de que não se preocupem com o seu crescimento espiritual. Com o primeiro método, Satanás consegue desanimar a muitos em seu serviço ao Senhor. Com esta persuasão muitos são atrapalhados em suas orações, em seu estudo da Palavra, porque sempre se sentem distraídos. Chegam até mesmo a sentir-se frustrados, perdem a sua alegria e se sentem inúteis no serviço de Deus, tudo por causa dos fúteis pensamentos que o diabo coloca em suas mentes. O que podem fazer os crentes quando lhes é difícil orar, ler suas Bíblias, em consequência destes ataques?

Primeiro, os crentes devem esforçar-se em serem mais afetados pela grandeza de Deus, sua santidade, sua majestade e sua glória. Quando os crentes têm pensamentos superficiais e pequenos acerca de Deus, Satanás pode distraí-los facilmente. Quando começam a compreender melhor sua onipotência, sua pureza, sua grandeza, então os pensamentos vãos perdem muito de seu poder. Uma visão da perfeição de Deus, sua onipotência, sua onisciência, sua onipresença, sua santidade, ajudará muito para acabar com os pensamentos vãos. Quanto mais a nossa mente estiver cheia com pensamentos acerca de Deus, seremos menos afetados com os pensamentos do diabo. Filipenses 4.8 diz: “Portanto irmãos, tudo o que é verdadeiro, honesto, justo, puro, amável, tudo o que é de bom nome; se alguma virtude há, e se algo digno de louvor, nisto pensai.”

Segundo, os crentes podem superar esta tentação perseverando na oração, na leitura da Bíblia e em seus pensamentos acerca de Deus. Muitos crentes descobriram que Satanás lhes deixa em paz quando perseveram nestas coisas. Quando o diabo percebe que esta tática faz com que os crentes busquem a Deus com mais empenho, então se dá por vencido. Quando Jesus resistiu a Satanás no deserto, então este o deixou. Se os crentes perseveram em buscar a Deus apesar de todos os intentos do diabo por distrair-lhes, então também o diabo fugirá deles. “Resisti ao diabo, e ele fugirá de vós” (Tg 4.7).

Terceiro, devemos recordar que os pensamentos vazios, néscios e blasfemos são pecaminosos, e sempre não são bem-vindos, mas devem ser rejeitados e mortificados. Em outras palavras, não devemos fazer caso de tais pensamentos. Há muitos pensamentos que molestam e inquietam aos crentes, mas tais pensamentos não são pecaminosos se os crentes não permitem que se alojem em suas mentes. Tais pensamentos chegam a ser pecado quando são recebidos e abrigados na mente dos crentes.

Quarto, o fato de resistir a tais pensamentos, de lamentá-los e esforçar em acabar com eles, é uma forte evidência de que a graça de Deus está operando (Sl 139.23-24). É uma boa evidência quando alguém quer levar cativo os seus pensamentos em obediência a Cristo (2Co 10.4-5). Os pensamentos pecaminosos afetam a vida, pois frequentemente conduzem a atos pecaminosos. Portanto, os crentes devem pelejar contra os pensamentos vãos e pecaminosos. Enquanto vigiarmos e estivermos constantes em resistí-los e afugentá-los não nos causará dano.

Quinto, os crentes podem afastar dos pensamentos vãos sendo cheios com as coisas espirituais e celestiais (Cl 3.1-2). Paulo fala em Efésios da necessidade de ser cheios do Espírito e ainda deseja que todos os crentes sejam cheios de toda a plenitude de Deus (Ef 3.19). Quanto mais nos enchemos de pensamentos espirituais e celestiais, menos lugar teremos para os maus pensamentos.

Sexto, é necessário que os crentes cresçam em seu amor pelas coisas santas. Inevitavelmente pensamos mais acerca do que mais amamos. “Quanto amo tua lei! Todo o dia é ela minha meditação” (Sl 119.97). O salmista amava a Palavra de Deus, portanto, ela era a sua meditação todo o tempo. Se apenas amássemos mais a santidade, pensaríamos mais nela.

Finalmente, se os crentes não querem ser distraídos pelos pensamentos fúteis, não devem deter-se demasiadamente nas atividades deste mundo. O excesso de assuntos mundanos somente encherá as suas mentes com ansiedade e afã. As suas mentes lhes encherão constantemente de preocupações, ainda quando estiverem buscando as coisas de Deus. Os crentes devem lutar para livrar as suas mentes nas ansiedades acerca desta vida e fixar seus pensamentos na grandeza e a glória de Deus. Então Satanás não os distrairá tão facilmente com pensamentos indignos.

Pensemos acerca da segunda tática usada pelo Diabo para impedir aos crentes em seu serviço a Deus. Ele lhes faz sentir satisfeitos com suas orações, com a leitura da Bíblia, com seu serviço cristão, então começam a sentir que podem relaxar um pouco, e não se esforçam tanto. Diante desta tática os crentes devem recordar quatro fatos importantes:

Primeiro, tudo o que os crentes fazem e tudo o que farão é imperfeito. Há pecado em tudo o que fazem. Mesmo em suas orações, as leituras da Bíblia e todas as demais atividades cristãs que fazem estão manchadas por sua debilidade e seu pecado. Os crentes não têm motivo algum para orgulhar-se. Podemos dizer como o profeta, que todas as nossas obras de justiça são como trapos de imundícia (Is 64.6).

Segundo, os crentes não são salvos por suas obras, suas orações ou seu serviço cristão, senão somente pelo que Cristo fez por eles. Eles têm que confiar somente em Cristo para que sejam salvos do pecado.

Terceiro, a confiança em nossas atividades religiosas é um enorme pecado que terminará por destruir-nos (Fp 3.3-9).

Quarto, não devemos esquecer o que nosso Senhor disse: “Quando tiveres feito tudo o que vos tenho mandado, dizei: Servos inúteis somos, porque fizemos apenas o que deveríamos fazer” (Lc 17.10).

26 setembro 2018

Remédios preciosos contra as artimanhas do Diabo - Capítulo 9

Continuemos pensando em outras duas maneiras em que o diabo procura afastar os crentes de seu serviço a Deus. Primeiro, lhes fará pensar que tão difícil é seguir a Cristo. Ele lhes dirá que é difícil orar, é difícil pensar constantemente nas coisas espirituais, que é difícil ter comunhão com os outros crentes, difícil de obedecer, etc.

O primeiro remédio contra tal maquinação é o pensar mais na necessidade de servir a Cristo, que nas dificuldades que terão ao servi-lo. Os crentes devem servir a Cristo para mostrar-lhe o seu agradecimento. Os crentes necessitam crescer em santidade para que possam vencer o pecado. Necessitam ser obedientes a Deus para que possam cumprir a sua obra neste mundo. Os crentes necessitam seguir a Cristo para que o propósito de Deus seja cumprido em suas vidas. Não há dúvida que os crentes enfrentarão problemas e dificuldades ao seguir a Cristo, mas os crentes verdadeiros assumem esta responsabilidade, mesmo cientes dos problemas que possam sobrevir-lhes.

Segundo, os crentes devem recordar, que se realmente querem servir a Cristo, Ele lhes ajudará tanto que não lhes será difícil. Talvez, no início não lhes pareça fácil, mas enquanto forem cumprindo a vontade de Deus, descobrirão que experimentam grande gozo ao realiza-la. Enquanto serve a Deus, encontra de modo pessoal que Deus lhe está apoiando, fortalecendo, animando e guiando através do caminho mais difícil. Podemos ver na Bíblia como as pessoas zombavam de Neemias e dos demais judeus que pretendiam levantar novamente os muros de Jerusalém. Todavia, Neemias contava com a fortaleza de Deus como sua ajuda. Neemias 2.20 disse: “O Deus dos céus, Ele nos prosperará, e como seus servos nos levantaremos e edificaremos...”. Igualmente Isaías disse a respeito de Deus: “Saíste ao encontro de quem com alegria para a justiça, dos que acordavam de ti em teus caminhos...” (Is 64.5).

Também os crentes necessitam pensar muito acerca das dificuldades que o próprio Cristo sofreu, de como Ele nunca fugiu do sofrimento. Suportou os piores sofrimentos em corpo e alma para o nosso bem-estar espiritual e para o nosso bem eterno. Em Isaías 50.6 Cristo disse: “Dei meu corpo aos algozes, e minhas bochechas aos que me arrancavam a barba, não escondi o meu rosto das injúrias e dos escarros.” Cristo suportou a ira do Pai, a carga dos nossos pecados, a malícia de Satanás e o ódio do mundo. Porque Cristo sofreu tanto pelos nossos, devemos obedecer-lhe e viver para Ele, ainda que isto signifique que tenhamos que sofrer de alguma forma.

Os crentes devem perceber que servir a Cristo é difícil somente para o seu velho homem, os remanescentes de sua natureza caída. Todos os crentes estão obrigados a despojar-se do velho homem e a passada maneira de viver e a vestir-se do novo homem (Ef 4.22-23). O novo homem tem prazer em seguir a Cristo, é a sua natureza pecaminosa quem não gosta de servir a Deus. Em Romanos 7.22 o apóstolo Paulo disse: “Segundo o homem interior (o novo homem) me deleito na lei de Deus”. Para a nova criatura o jugo de Cristo é fácil e sua carga é leve (Mt 11.30). Para o novo homem os mandamentos de Deus não são pesados, mas sim causa de gozo. Todos os crentes sabem que esta é a verdade, e há algo em seu interior que lhes faz desfrutá-la agradando a Deus.

Finalmente, há grandes recompensas para aqueles que apesar de suas dificuldades seguem a Cristo fielmente. Há galardões no futuro. O céu recompensará tudo. No livro de Hebreus lemos acerca da fé de Moisés que teve por maiores riquezas o vitupério de Cristo que os tesouros dos egípcios, porque contemplava o galardão (Hb 11.26). Além disso, há recompensas nesta vida para aqueles que seguem a Cristo apesar das dificuldades. O Salmo 19.11 disse que ao guardar os mandamentos há grande recompensa. Quão néscios são os crentes que permitem que Satanás lhes roube este grande galardão.

Satanás pode usar outro método para conseguir que os crentes não sirvam à Deus. Pode tratar que pensem equivocadamente acerca do que Cristo fez em favor deles. Ele lhes sugerirá que por ter Cristo realizado tudo pelo seu povo, tendo lhes perdoado, justificado e garantido a sua chegada ao céu, então não há nada que fazer, a não ser contentar e satisfazer-se. Satanás deseja que pensem que pelo fato de Cristo ter sido castigado como seu substituto e que Cristo está no céu preparando um lugar para eles, então, não há necessidade de orar, arrepender-se, de estudar a Palavra, de reunir-se com outros crentes. Enfim, porque Cristo nos salvou, não há necessidade de que lhe sirvamos.

Ao fazer estas sugestões, Satanás está tomando uma parte da verdade e converte-a numa mentira. É certo que se não fosse pela obra salvadora de Cristo, não haveria nenhum crente. Todavia, ser um cristão incluí mais do que o mero receber o que Cristo fez. A Bíblia disse: “Não sois de vós mesmos, porque fostes comprados por preço; glorificai, pois, a Deus em vosso corpo e vosso espírito aos quais são de Deus” (1Co 6.19-20). Os crentes pertencem a Cristo. Eles lhe pertencem a fim de que façam sua vontade motivados por gratidão e amor a Ele. Então Satanás mente quando sugere que uma vez que somos salvos por Cristo, não é necessário servir-lhe.

A verdade é que o que Cristo fez e continua realizando pelos crentes constitui o motivo mais forte para servir-lhe. Cristo lhes livrou do poder dominante do pecado, da ira de Deus, da amargura da morte, dos sofrimentos do inferno. Portanto, eles devem servir com alegria e com muita gratidão. Paulo disse a Tito que “Cristo Jesus entregou-se por nós, para redimir-nos de toda iniquidade e purificar para si um povo zeloso de boas obras” (Tt 2.14). O fato de que Cristo se entregou pelos crentes deve estimulá-los a serem zelosos para fazerem o bem. Esta é a razão do porque os verdadeiros crentes sempre são muito ativos no serviço de Cristo. Por outra parte, se não quiserem servir a Deus devem questionar-se se verdadeiramente são crentes. O apóstolo João escreveu: “O que disse que lhe conhece, mas não guarda seus mandamentos, este é mentiroso, e a verdade não está nele” (1Jo 2.4). Uma vez mais temos que observar o equívoco de Satanás: A pessoa salva não é negligente no serviço do seu Salvador. O verdadeiro crente deseja servir a Cristo de todo coração, custe o que custar, porque Cristo sofreu muito para salvar a cada crente.

28 julho 2018

Remédios preciosos contra as artimanhas do Diabo - Capítulo 6

Satanás conduz os crentes ao pecado fazendo-lhes pensar que os que se santificam sofrem muita oposição e dificuldades. Ele lhes diz que enquanto os pecadores gozam da “boa vida”, os que desprezam ao pecado somente experimentam tristezas e problemas. Satanás insiste em lhes inculcar que por serem justos e santos terão problemas. O sussurro do inimigo de que é muito melhor viver numa forma que não lhes ocasione tantos conflitos e que os pecadores não sofrem como os piedosos.

Como devem reagir, e o que pensar os crentes quando Satanás lhes inquieta com estas ideias?

Primeiro, devem recordar que todos os problemas que os filhos de Deus serão usados para o seu bem. Deus nunca envia aflições ao seu povo sem um bom propósito, ainda que no momento não seja possível entende-lo. Em seguida mencionarei alguns dos efeitos que sobrevêm aos piedosos como consequência da aflição: Aprendem acerca da maldade do pecado; o sofrimento lhes faz desprezar ao pecado; o sofrimento lhes faz ter cuidado com o pecado no futuro. O menino que se queima teme ao fogo. As aflições nos ajudam a mortificar ao pecado. As aflições são o crisol onde Deus purifica as impurezas do seu povo. Deus disciplina, corrige e instrui aos crentes para o seu bem, a fim de que participem de sua santidade (Hb 12.10-11). Ainda que a disciplina divina seja no momento dolorosa, produz a piedade e traz muitas bençãos aos crentes.

Deus está treinando ao seu povo: fazendo que estejam numa boa e saudável condição espiritual, o sofrimento é uma parte deste treinamento. O sofrimento lhes torna humildes e sensíveis ao ensino do Espírito Santo. O sofrimento aproxima de Deus e os motiva a orar duma forma mais intensa e sincera. O salmista disse: “Antes que eu fosse humilhado, andava desviado, mas agora guardo a tua Palavra” (Sl 119.67). Também o sofrimento fortalece aos crentes. Crescem mais fortes em seu amor a Deus e pelo seu povo; crescem mais fortes na fé, esperança e gozo.

Segundo, os crentes devem recordar o que é mais importante do que seus problemas. Eles não podem mudar o fato de que Deus lhes ama. As aflições podem resultar em sofrimentos do corpo e da mente, e até mesmo leva-los a perder a vida, mas não podem separá-los do amor de Deus.

Terceiro, os crentes devem recordar que seus problemas na realidade são passageiros e de curta duração. “Por um momento será sua ira, mas o seu favor durará toda a vida. Pela noite durará o choro, mas a alegria virá pela manhã” (Sl 30.5). Na realidade há um breve tempo entre o conhecer da graça de Deus na terra e o gozar da glória de Deus no céu. “Porque ainda um pouco e o que há de vir virá e não tardará” (Hb 10.36-37). Este breve tempo de sofrimento terminará e os crentes estarão com Cristo para sempre. Este tempo de tormenta é o prelúdio da tranquilidade eterna.

Quarto, os crentes devem lembrar que os problemas que lhes ocorrem provêm do grande amor que Deus tem por eles. O Senhor Jesus disse: “Eu repreendo e castigo a todos os que amo” (Ap 3.19). Deus está preparando aos crentes para o céu e, às vezes, esta preparação resulta dolorosa. Todavia, o fato de que Deus procura que estejam preparados para o céu, é prova de que lhes ama grandemente.

Quinto, os crentes devem medir as aflições por seu resultado espiritual e não pela dor que ocasionam. É necessário que vejamos o propósito de Deus em nossos sofrimentos. José sofreu no Egito e foi encarcerado injustamente. Não obstante, o propósito de Deus foi, que por meio de José, salvasse a sua família. Do mesmo modo, Davi foi rodeado de inimigos e esteve em perigo constante no início de sua carreira. Todavia, tornou-se rei e foi honrado por seu povo. Em ambos os casos foi o sofrimento o que conduziu o cumprimento do propósito de Deus. Isto nos ensina que os crentes devem julgar seus sofrimentos não pela dor que produzem, senão por seus resultados espirituais.

Sexto, o propósito de Deus nas aflições nunca é para condenar, ou causar desespero nos crentes. Deus não quer enfraquece-los, ou arruiná-los com a tristeza. Deus quer provar e fortalece-los, seu pensamento nunca é destruí-los. Moisés recordava aos israelitas deste ponto: “Te recordarás de todo o caminho por onde Jehová, teu Deus, te conduziu estes quarenta anos no deserto, para afligir-te, para provar, e para saber o que estava em teu coração, se guardarias, ou não os seus mandamentos” (Dt 8.2). “Para provar”, esse foi o propósito de Deus, não para prejudicar ou destruir.

Finalmente, os crentes sempre devem recordar que as tristezas e as misérias que acompanham o pecado sempre serão maiores e pesadas que a tristeza que, às vezes, acompanha a santidade e a piedade. A tristeza que o pecado acarreta não tem nada de bom. Não possui nenhuma esperança, nem bom propósito. A tristeza que procede do pecado somente conduzido pelo que é temível e terrível, ou seja, o desprezo justo e santo de Deus e sua ira.


22 junho 2018

Remédios preciosos contra as artimanhas do Diabo - Capítulo 4

Por Thomas Brooks
Originalmente publicado em 1652 na Inglaterra

Neste capítulo poderemos observar outro método usado pelo Diabo para induzir aos crentes que caiam no pecado. Satanás lhes diz que é fácil arrepender-se, tão simples como confessálo ao sacerdote. Tudo o que se tem que dizer é: “Senhor tenha misericórdia de mim”, e ele o perdoará. Sussurrará em seu ouvido que o arrependimento é fácil.

Esta mentira do Diabo é muito perigosa. É uma mentira que é usada para enganar a muitos e coloca-los sob o controle e domínio do pecado. O arrependimento não é algo fácil de se obter; está além das forças humanas. Para arrepender-se é necessário o mesmo poder que levantou a Cristo dos mortos, ou seja, é necessário o poder de Deus.

O apóstolo Paulo escreveu a Timóteo que os servos de Deus devem ensinar a verdade com a esperança que Deus conceda arrepentimiento aos ouvintes (2Tm 2:25). O arrependimento não é fácil; o arrependimento é um dom de Deus. O profeta Jeremias perguntou: “O etíope mudará a cor de sua pele, e o leopardo as suas manchas? Assim também, podereis fazer bem, estando habituados a fazer o mal?” (Jr 13:23). As pessoas não podem transformar a si mesmas; falta-lhes o poder de Deus para que possam experimentar essa mudança. O simples fato de dizer: “Senhor tem misericórdia de mim,” não é o arrependimento verdadeiro. Os que usam esta linguagem, sem uma mudança genuína em suas vidas, estão se enganando. Muitos agora estão no inferno porque se equivocaram quanto à natureza do arrependimento.

Há três elementos essenciais no arrependimento. O primeiro elemento é uma mudança substancial; é dar as costas para o pecado e voltar-se para Deus. O arrependimento é deixar as trevas e volver-se para a luz. Isaías disse: “Deixe o ímpio o seu caminho, e o iníquo os seus pensamentos, e voltem-se para Deus” (Is 55:7). O arrependimento significa dar as costas a todo pecado, inclusive ao pecado mais amado. Significa também uma mudança de atitude para com Deus e em relação a tudo o que ele manda. Quando uma pessoa se arrepende verdadeiramente, sabe que não existe nada nela que agrade a Deus, e tudo o que ela possui é o seu pecado. Isto lhe faz voltar-se a Deus suplicando ajuda e perdão. O arrependimento não é fácil. Sempre é difícil e ocasiona dor e vergonha.

O segundo elemento no arrependimento verdadeiro é uma mudança completa de vida. O arrependimento significa uma mudança na vida interior, no que pensa e no que deseja. O arrependimento significa uma mudança tão poderosa na vida, que outros podem vê-la, uma transformação em sua maneira de viver, em seus hábitos, em sua perspectiva. Em Is 1:16 diz que “Lavai e limpai-vos; tirai a iniquidade de vossas obras diante de meus olhos; deixai de fazer o mal; aprendei a fazer bem”. Isto significa uma mudança externa e interna, uma alteração completa de vida.

O terceiro elemento do arrependimento é sua continuidade ao longo de toda a vida do crente. Arrepender-se significa sempre esforçar para guardar a lei de Deus de forma mais completa. Significa aproximar-se cada vez mais de Deus, ainda que ao mesmo tempo, saibamos que não podemos deixar de considerar-nos pecadores. A vida cristã consiste de um processo contínuo de mortificação do pecado. O apóstolo Paulo, que foi usado grandemente por Deus, disse: “Miserável homem que sou! Quem me livrará deste corpo de morte?” (Rm 7:24).

O arrependimento não é próprio da natureza humana. É necessário tanto do poder de Deus para arrepender-se, como para não pecar. “Vinde e voltemos a Jehová porque ele nos abateu e curará; nos feriu e tratará. Ele nos dará a vida depois de dois dias; no terceiro dia nos ressuscitará e viveremos diante dele” (Os 6:1-2). Convença-se que Deus é quem faz todas estas coisas a favor de seu povo. Ele os sara. Ele ata as suas feridas. Ele os vivifica e restaura. O poder e o amor de Deus estão atuando no arrependimento. Sem a misericórdia e o amor de Deus atuando, não é possível ocorrer o verdadeiro arrependimento.

É comum que Satanás diga que o arrependimento é fácil. Mas após ocorrer a queda no pecado, a sua mensagem mudará, pois dirá que o arrependimento é impossível. Uma vez que a pessoa se acostuma ao pecado, o Diabo dirá que o arrependimento é a coisa mais difícil que alguém poderá obter. Ele lhe dirá que é difícil abandonar aos pecados que fazem parte de sua vida. Dirá que não haverá a possibilidade de arrependimento, porque abusou da misericórdia de Deus e desprezou as advertências divinas. Satanás lhe falará de quantas vezes caiu e quão perversos são seus pecados. Ele lhe dirá: “É impossível arrepender-se.”

Os verdadeiros crentes buscarão o arrependimento enquanto há tempo, isto é, hoje! O arrependimento nunca é fácil, mas com a ajuda e com a misericórdia de Deus, é possível desprezar ao pecado e volver-se para Deus.

21 junho 2018

Remédios preciosos contra as artimanhas do Diabo - Capítulo 3

Por Thomas Brooks
Originalmente publicado em 1652 na Inglaterra

Neste capítulo trataremos com outras duas estratégias usadas pelo diabo para fazer com que os crentes caiam em pecado. Primeiro, Satanás lhes fala que os melhores crentes da Bíblia pecaram e, portanto, os crentes também podem pecar. Em segundo lugar, Satanás lhes dirá que não se preocupem com os seus pecados, que Deus é misericordioso para perdoá-los. Então, vejamos a forma de enfrentar estas artimanhas.

Primeiro, às vezes, Satanás diz aos crentes que, como todos aqueles acerca de quem lemos na Bíblia pecaram, então, o pecado não é tão grave. Davi foi um homem que amou a Deus e, todavia, cometeu o adultério. Satanás se apoia neste assunto para dizer-nos que o adultério não é algo tão mal. Noé foi um homem que achou graça diante os olhos de Deus (Gn 6:8), entretanto, em Gn 9:21 lemos que este homem embreagou-se. Satanás dirá aos crentes que tão pouco a embriaguez é um pecado tão grave diante de Deus. O texto de Mt 16:17 nos fala que Pedro foi abençoado pelo Senhor; mas em Mt 26:74 o mesmo apóstolo amaldiçoou e negou ao nosso Senhor Jesus Cristo. Com base nisto, Satanás diz aos crentes que tais pecados não são graves de modo algum.

Satanás tem razão? David, Noé, Pedro e outros filhos de Deus pecaram gravemente contra Deus. Isto significa que os crentes não devem se preocupar com os seus pecados?

Em primeiro lugar, Satanás somente está mencionando uma parte da história. Davi pecou, mas também Davi se arrependeu. O Salmo 51 nos fala de como Davi se sentiu e o que fez após cair no pecado. “Lava-me mais e mais de minha maldad, limpa-me de meu pecado.” (Sl 51:2) Estas não são as palavras de alguém que não se preocupava com o pecado, mas de alguém que estava arrependido, que odiou o seu pecado e pediu perdão à Deus. Da mesma maneira, depois que Pedro amaldiçoou e negou ao Senhor, saiu e chorou amargamente. (Mt 26:75) Por que Pedro chorava? Chorava porque estava consciente de seu pecado e arrependido do que fez. Quando alguém pensa que pode pecar porque os crentes da Bíblia o fizeram, este deve se perguntar se é capaz de arrepender-se como eles o fizeram. A verdade é que muitos pecam da mesma forma que estes homens, mas bem poucos se arrependem como eles. Em outras palavras, ainda que os crentes bíblicos caíram ocasionalmente no pecado, na realidade eles o odiavam. Do mesmo modo, os crentes devem odiar o pecado e desejar afastar-se dele.

Em segundo, note que estes crentes não permaneceram no pecado. Pecaram em ocasiões, mas não viviam no pecado. E ainda quando pecaram, não o fizeram de todo coração. Satanás deseja que os crentes pequem incessantemente, a fim de que se acostumem ao pecado, quer que se sintam a vontade pecando. Isto é muito diferente da forma em que caíram Davi e Pedro.

É necessário recordar que Davi e os demais crentes mencionados sofriam muito a consequência de seus pecados. No Salmo 51, Davi disse que lhe foi tão doloroso como a fratura de um osso. (Sl 51:8). E Deus lhe sentenciou, como consequência de sua falta, dizendo que sempre haveria violência em sua família, e assim aconteceu.

Os pecados de Davi e Pedro estão registrados na Bíblia como uma advertência aos crentes e também para o seu auxílio. Por um lado, Deus não quer que os crentes se desesperem quando pecam, e por esta razão nos mostra que os crentes mais fortes também pecaram. E, por outro lado, Deus adverte aos crentes a não descuidarem em sua luta contra o pecado. Devemos aprender com as quedas dos outros, ou seja, suas quedas podem nos ajudar a não cairmos. Não há nenhuma garantia em nossos anos como crentes, muito menos em nossa fidelidade no passado. Há graça e perdão para os que caíram, mas também há disciplina.

Satanás, além desta tática, trata de obter que os crentes não se preocupem com o pecado, dizendo-lhes que Deus é misericordioso e que sempre os perdoará. O Diabo lhes fala que Deus é um Deus de pura graça e que está disposto a conceder misericórdia, e que sempre estará mais propenso a perdoar que a castigar ao seu povo. Vejamos a continuação de cinco remédios preciosos contra esta tática.

Primeiro, sempre é um sinal de que Deus está contra nós, quando não nos preocupamos com o pecado. Quando vemos que alguém não está preocupado com os seus pecados, podemos ter certeza de que Deus está julgando esta pessoa. É uma coisa terrível quando Deus entrega alguém aos seus próprios pecados. Deus disse, numa ocasião, em relação aos israelitas: “Os deixei, portanto, para a dureza de seu coração; caminharam em seus próprios conselhos” (Sl 81:12). Noutro momento disse: “Efraim é entregue aos ídolos; deixe-o” (Os 4:17). Este foi o juízo de Deus contra eles. Quando Deus abandona a um povo, então, ele não se preocupa com seus pecados.

Segundo, Deus é tanto misericordioso como justo, a sua misericórdia não anula a sua justiça. Satanás oculta esta verdade quando diz que Deus será sempre e somente misericordioso. Quando Adão pecou, Deus em sua justiça expulsou-o para fora do paraíso. Quando o mundo antediluviano se corrompeu, Deus em sua justiça mandou o dilúvio. A menos que os pecadores se arrependam, Deus não lhes perdoará.

Terceiro, os pecados contra a misericórdia de Deus acarretam maior juízo. Quando os homens abusam da misericórdia de Deus, então, vem seu juízo. Esta é a ordem em que Deus atua: primeiro oferece a sua misericórdia, mas se os homens a desprezam, então são julgados. Deus mostrou grande misericórdia e ternura aos israelitas, todavia, eles se afastaram e esqueceram de Deus. Jesus lhes advertiu que não ficaria pedra sobre pedra de seu templo e assim sucedeu (Mc 13:2). Jerusalém e o templo foram destruídos. Muitos judeus foram mortos e outros levados cativos. Os que abusaram da misericórdia de Deus e lhe deram as costas às suas advertências, foram objetos de sua justiça. Por mais que alguém seja abençoado, mais severo será o seu juízo se esquecer-se de Deus. Cafarnaum que foi elevada ao céu, posteriormente foi posta na parte mais baixa do inferno (Mt 11:23).

Quarto, os crentes não devem pensar que tudo está bem devido ao desfrute de algumas bençãos de Deus. Todos de alguma maneira, ou de outra, constantemente recebem benefícios da bondade de Deus. Mas a misericórdia especial de Deus é somente para aqueles que o amam e lhe obedecem. “Todos os caminhos de Jehová são misericórdia e verdade para os que guardam o seu pacto e seus testemunhos” (Sl 25:10). “Os olhos de Jehová estão sobre os que o teme, sobre os que esperam a sua misericórdia.” (Sl 33:18). “Porque como é a altura dos céus sobre a terra, engrandeceu a sua misericórdia sobre os que lhe temem.” (Sl 103:11). Você teme a Deus? Se sim, então, não desejará pecar contra a sua misericórdia.

Quinto, a misericórdia de Deus é um fortíssimo motivo para não pecar. A bondade de Deus nunca deve se converter em pretexto para pecar. A Bíblia diz que devido à misericórdia de Deus, os crentes devem se entregar completamente a ele, seu corpo, sua mente e tudo o que são, a fim de que sejam usados em seu serviço (Rm 12:1). A misericórdia de Deus deve conduzir aos crentes a amá-lo e não a pecar contra ele. Os que têm a misericórdia de Deus como um pretexto para pecar, estão seguindo uma lógica satânica. Quando esta lógica predomina no pensamento de uma pessoa, há motivos para supor que tal pessoa está em perdição. Quando uma pessoa diz que a misericórdia de Deus significa que o pecado não importa, tal pessoa demostra que não está valorizando corretamente este atributo divino. Uma compreensão correta da misericórdia divina, traz como resultado uma atração em relação à Deus e um desprezo pelo pecado.

21 janeiro 2018

Sete marcas de um ministério do púlpito puritano

Por Chad van Dixhoorn


Os membros da Assembleia em sua reforma do ministério da pregação na Inglaterra, concordaram com um rígido delineamento do que seria o perfil dos pregadores e a natureza da pregação. Este estudo final resume sete pontos de uma visão puritana dominante acerca do púlpito como articulado pela Assembleia de Westminster e seus membros.

1. Os embaixadores de Deus: pregadores ordenados
A primeira marca do púlpito puritano é que ele seja ocupado por um homem, ordenado para o Ministério do Evangelho, pela Igreja de Cristo. George Gillespie (1613-1648) teve a ordenação em mente quando recordou uma importante questão feita pelo apóstolo Paulo: “como eles pregarão, a menos que sejam enviados”? Com isso, ele inferiu que os pregadores recebem um chamado especial e um ofício especial. Nem toda ovelha é um pastor. Nem todo cidadão é um embaixador.
Gillespie estava respondendo aos contemporâneos que achavam que não havia “um chamado sagrado, nem a separação solene dos homens para o ministério”, uma visão que ele achava impraticável e não bíblica. Ele retrata o caos se todos fossem pregadores, e ele retorna à palavra do apóstolo Paulo: alguns são separados; apenas eles são “enviados”. Esse é o núcleo da doutrina da ordenação.

2. Pregadores treinados
Os ministros precisavam ser ordenados e igualmente serem treinados. John Lightfoot (1602-1675) argumentou que o estudo era necessário para que alguém fosse um pregador, pois ele foi necessário até mesmo para os apóstolos. Eles se comprometeram a “ouvir, estudar, conferir e meditar”, e estavam com o próprio Cristo por um ano inteiro, antes de serem enviados para pregar.
Alguns “criticam aprender e estudar”. Mas Thomas Goodwin (1600-1680) observa que se exigiu de Timóteo que estudasse. Goodwin argumenta que a pregação extemporânea apenas, sem estudo, é realmente contrária à Escritura. Ele também comenta (perceptivamente) que aqueles que argumentam contra o estudo ainda dependem muito do que ouviram e discutiram. Ninguém entra no púlpito como uma lousa em branco.
Mas isso não significava que a sua erudição sempre fosse exibida no púlpito. Em um longo debate na Assembleia de Westminster, alguns homens argumentaram contra citar autores ou usar frases estrangeiras no púlpito. John Arrowsmith (1602-1659) era daqueles que discordava. Exibições de aprendizagem seriam permitidas e ele não resistiria em citar Agostinho (em latim) para mostrar que esta não é uma nova opinião na igreja.

3. Pregadores piedosos
Os pregadores precisavam ser ordenados e treinados, mas também precisavam ser “piedosos”, uma palavra que resume muito do que se diz sobre os presbíteros em 1 Timóteo e Tito. Na verdade, à Assembleia de Westminster foi dada a responsabilidade de identificar os ministros envolvidos em escândalos para que fossem removidos dos púlpitos, e substituídos por ministros instruídos e piedosos.
Inicialmente, o Parlamento exigiu que a Assembleia examinasse os candidatos acerca da sua instrução e piedade. Na primavera de 1646, o parlamento mudou de opinião sobre o critério da piedade e exigiu que a Assembleia examinasse os pregadores somente se eram instruídos.
A Assembleia suspendeu a mudança da redação imediatamente e resolveu não aprovar novos ministros até que o problema fosse resolvido. Depois de alguns dias de deliberação, eles enviaram apenas o Dr. Peter Smith (1586-1653) para uma comissão do Parlamento para pressionar o caso da Assembleia. A Assembleia escolheu seu homem com sabedoria, pois ganhou a sua causa e retomaram a questionar os pregadores sobre a doutrina e a vida deles. A Palavra de Deus não deixa espaço para se comprometer a piedade.

4. A Palavra de Deus
A quarta característica de um ministério do púlpito puritano é frequentemente encontrada nas exortações aos ouvintes dos sermões, e não apenas aos pregadores. Os ministros precisavam ser ordenados, instruídos e piedosos, porque (citando Gillespie novamente) os ouvintes deveriam “receber a palavra da boca dos ministros, como Palavra de Deus”. De acordo com William Gouge (1575-1653), esta é a mensagem de Hebreus 13, que diz: “Lembrai-vos dos que dominam sobre vós, que vos falaram a Palavra de Deus”. Poderia “adequadamente o som da voz de um homem, naquilo que os verdadeiros ministros de Deus pregam, no exercício de seu ofício ministerial, é a Palavra de Deus”.
Jeremiah Burroughs pontuou vinculando à Isaías 66 – “e que tema a minha Palavra” – para promover um pouco de reverência entre seus ouvintes. Um homem, ou mulher, temente à Deus, diz ele, não vem “ouvir a Palavra do modo comum, simplesmente para passar o tempo, ou ouvir o que um homem pode lhe dizer”. Pelo contrário, a Palavra, “lida ou pregada”, é recebida “com reverência”. Ele examina a pregação, mas “não se sofisma contra ela”.
Burroughs apresenta o rei Eglom de Moabe como um exemplo a ser seguido pelos santos, é claro, que não em seus caminhos “pagãos”, nem em sua morte intempestiva e nojenta, mas como alguém que se levantou para receber Ehud como embaixador com “uma mensagem de Deus “. Burroughs então empurra a faca um pouco mais fundo, perguntando a seus ouvintes se seus “corações”. . . inundam contra a “pregação”, perguntando o que eles realmente pensam sobre a pregação e denunciando a ironia daqueles que pensam que escaparam do mundo, mas ainda mostram o pior orgulho de se rebelar contra a Palavra de Deus.
Essa discussão de irreverência e orgulho é a premissa básica, óbvia para Burroughs, de que a pregação fiel da Palavra de Deus é a Palavra de Deus. Porque a pregação é a Palavra de Deus, a irreverência e o orgulho são escandalosos.

5. Os meios de graça externos e ordinários: a pregação
Se a pregação da Palavra de Deus é a Palavra de Deus, então, qual é o seu lugar na vida e no culto cristão? Não surpreendente que os teólogos respondam que a pregação é o meio comum da graça para os cristãos, que é o meu quinto ponto. Anthony Burgess (falecido em 1664) afirma que o ministério fiel da Palavra é “o caminho certo e comum para a conversão dos homens de seus caminhos perversos”.
Ele afirma isso mais vigorosamente em sua exposição de 1 Co 3: “O ministério é o único caminho comum que Deus designou, quer para o começo ou o auge da graça”. Afinal, “fé é recebida pelo que se ouve”, e em seu próprio texto informa aos corintos que Paulo e Apolo eram os “ministros por meio de quem eles creram”.
Em 1649, William Greenhill (1597/8-1671) dedicou um prefácio a uma parte de seu comentário de Ezequiel para a defesa da primazia da pregação, pois “onde a Palavra de Deus não é exposta, pregada e aplicada” o povo “perece”.
Mas esse é sempre o caso? E se as pessoas não se beneficiarem dos sermões? Alexander Henderson (c. 1583-1646) admitiu em um sermão: “Conheço muitos de vocês que disseram, quando saíram da pregação. . . que suas almas não foram nada melhoradas por ela”. As pessoas eram, talvez, um pouco mais francas naqueles dias! Uma questão que muitos puritanos perguntariam aos pregadores quando surgisse o problema: eles estavam pregando à Cristo?

6. Pregação centrada no Cristo
Quando ele leu sobre a prática de Ezequiel de proclamar tudo o que o Senhor lhe mostrou, Greenhill teve pouca dificuldade em ver um imperativo aos ministros: eles devem somente pregar e pregar tudo o que eles aprendem na escola de Cristo.
Ecoando sentimentos semelhantes, Obadiah Sedgwick (1599/1600-1658) afirma que o sermão é “um trabalho inútil se expor qualquer coisa, se não for a Cristo”. Os ministros devem “fixar a convicção de pregarem a Cristo”. Novamente, “seus esforços na pregação, resultarão em pouco, talvez em nada, se não for Cristo, ou algo em referência a Cristo, no qual você insiste laboriosamente na pregação”.
Goodwin afirma que os pregadores “acrescentariam mais beleza aos seus próprios pés” se pregassem mais o evangelho e menos “verdades de momentos insignificantes”. Esses sentimentos são tão comuns nos escritos dos teólogos que eu considero a pregação centrada em Cristo como a sexta das sete marcas de um ministério do púlpito puritano.
Como Arrowsmith escreve, os verdadeiros ministros “confirmaram Cristo em seu ministério; eles se contentam em ficar na multidão e levantar Cristo sobre os ombros; conteúdo, não para ser visto, para que Cristo seja exaltado”.

7. “A obra do Espírito”
A última, mas não menos distinta marca de um ministério do púlpito puritano, é a dependência do Espírito Santo. Argumenta-se que a pregação dos puritanos estava sempre pronta para admitir que a pregação não parecia ser um meio sensato de avançar o evangelho. Mesmo no século XVII, a pregação era “muito desprezível e indesejável para a razão humana”.
Mas o chamado “problema” com a pregação é em si a resposta. Deus escolheu deliberadamente um meio humilde que ampliaria a sua própria grandeza e a obra do Espírito Santo. Burgess retoma a figura de 1 Coríntios 3, onde Paulo lembra aos leitores que o pregador pode semear e regar, mas Deus é quem dá o aumento. Como na administração dos sacramentos, a pregação não é automaticamente efetiva. A Palavra, seja visível ou audível, precisa ser recebida pela fé que é dada pelo Espírito. E assim, embora os pregadores sejam descritos como cooperadores da obra de Deus, Burgess nos lembra que mesmo um ministro sendo fiel, pode não ter sucesso porque “o sucesso é a obra de Deus, e não o dever dos ministros”.
Samuel Rutherford (1600-1661) diz o mesmo, e aplica essa verdade muito mais a pregação. Ele nos lembra que o benefício de tudo o que fazemos depende da “obra do Espírito”. E, assim como, às vezes, refletimos sobre nossos pecados e falhas como pregadores, lembremo-nos do poder do Espírito Santo e da graça de Deus através de Jesus Cristo – não apenas pelo bem de nossos ouvintes, mas também por nós mesmos.


Este artigo é um extrato e adaptação do livro de Chad Van Dixhoorn, God’s Ambassadors: The Westminster Assembly and the reform of the English pulpit, 1643-1653. Nele são encontradas notas de rodapé, referências e discussões mais completas sobre este assunto.

Extraído DAQUI

Traduzido por Rev. Ewerton B. Tokashiki

21 novembro 2017

Remédios preciosos contra as artimanhas do Diabo - Prefácio

Escrito por Thomas Brooks

Originalmente publicado em 1652 na Inglaterra

Introdução

Este livro trata com as estratégias usadas por Satanás para induzir aos crentes a pecar. Satanás é o inimigo de Cristo e de todos os seus discípulos. Satanás quer desviá-los da vontade de Deus e que se afastem dele. Satanás é muito sútil em seu propósito. Deseja que os crentes sejam seduzidos sem que eles percebam. Quer que pequem, mas não quer que creiam, ou percebam que estão pecando.

Há quatro assuntos acerca dos quais os crentes devem aprender. Devem aprender de nosso Senhor Jesus Cristo, acerca da Bíblia, a respeito de si mesmos e acerca da astúcia de Satanás em seus intentos de afastá-los de Deus.

Satanás é um inimigo cruel. Ele demonstra o seu desprezo contra Deus e o seu povo em todas as formas que lhe seja possível. Satanás quer que o povo de Deus seja miserável e cheio de amargura. Sabe que não há nada que lhes faça mais miseráveis do que fazer-lhes cair em pecado. Satanás utiliza muitas maneiras enganosas para conseguir que os crentes pequem. Satanás é um inimigo forte, mais forte do que a nossa capacidade. Satanás pode ferir e causar muitos danos aos crentes. Em sua astúcia não quer que os crentes se informem de quão forte ele é, e, portanto, é necessário advertir a cada crente: Satanás é um inimigo forte e cruel. Desejo adverti-los de que maneiras Satanás procurará daná-los. Desejamos que todos os que lerem este livro sejam fortalecidos a fim de que possam resistir a Satanás em todas as suas conspirações.

Por isso não é suficiente apenas ler este livro, há que aprender e praticá-lo. Todo ensino cristão não é simplesmente para ajudar aos crentes que aprendam a verdade. Os crentes devem não somente entender a vontade de Deus, como também cumpri-la. Jesus disse, “Se sabeis estas coisas, bem-aventurados sereis se as fizerem.” (Jo 13.17)

Há muitos textos na Bíblia que nos advertem acerca da sutileza de Satanás. Os crentes necessitam ser fortalecidos para resistirem a Satanás. Em seguida citaremos alguns textos da Bíblia que nos advertem acerca de Satanás. O primeiro texto é 2 Co 2.11: “Para que Satanás não obtenha vantagem alguma sobre nós; pois não ignoramos os seus desígnios”. O apóstolo disse que sabe bem acerca das maquinações satânicas para danar aos crentes. Paulo estava consciente das distintas formas que Satanás usa para prejudicar aos crentes.

O segundo texto é Ef 6.11: “Revesti-vos de toda a armadura de Deus para poderdes estar firmes contra as ciladas do diabo”. Paulo disse aos crentes que fossem como soldados, colocando a sua armadura para protegerem-se de seu inimigo. Paulo sabia que Satanás atacaria aos crentes de muitas maneiras diferentes. Às vezes fará armadilhas para atacá-los de repente, sem advertência. Em outras ocasiões buscará desviar-lhes do caminho e os atacará quando estiverem confusos. Também lhes tentará com uma armadilha de falsa segurança, para que depois lhes ataque quando estiverem desprevenidos. Satanás em todas estas maquinações deseja ferir o povo de Deus e conseguir que deixem de trabalhar e pelejar na causa de Deus. Os crentes necessitam da armadura e da força de Deus para lutar contra Satanás.

O terceiro texto é 2 Tm 2.26: “livrando-se eles dos laços do diabo, tendo sido feitos cativos por ele, para cumprirem a sua vontade”. Aqui o apóstolo Paulo se refere a pessoas que estão sendo levadas cativas como prisioneiras de guerra. Os prisioneiros sentem-se desesperados, sem nenhum poder para livrarem-se e estão sujeitos à vontade de outro. Do mesmo modo Satanás quer conseguir que os crentes sejam seus prisioneiros. Esta palavra é usada também para referir-se às aves quando são presas numa gaiola. Satanás quer que os crentes se sintam assim.

Tenham muito cuidado com as artimanhas de Satanás. Não se esqueçam de que Satanás é um inimigo forte e cruel, que se opõe a todos os verdadeiros crentes. Ele quer prejudica-los e fazer com que se tornem inúteis para o reino de Deus.

25 agosto 2016

A legitimidade da ordenação dos reformadores - Johannes Wollebius

I. A principal causa eficiente deste chamado é Deus, quem chama o ministro internamente, e provendo-o com seus dons. O corpo que pode compor os ministros é toda a igreja, ou no mínimo a igreja representativa, pastores e presbíteros, ou o conjunto de pessoas da igreja [plebs], e não apenas bispo ou pastor. Os apóstolos não restringiram o privilégio de escolha somente a eles (At 1:23, 6; 14:23).
II. Três atos são necessários para um legítimo chamado [para o ministério]: exame, eleição e confirmação.
III. O exame envolve tanto a vida como a doutrina. A vida precisa examinada antes da doutrina; se o comportamento é imoral, ele não pode ser admitido para um exame na doutrina.
IV. O procedimento para eleição é este: pessoas são nomeadas após sincera oração à Deus, do número daqueles que são escolhidos, e dentre eles é selecionado pelo voto da maioria, se votando por viva voz ou pelo levantar das mãos.
V. A confirmação é a indução da pessoa eleita, em que ele é designado para a igreja com oração pública, e seus chamado será confirmado pela imposição das mãos. Bispos não têm um poder superior e autoridade pelo direito divino.
VI. Os papistas ensinam falsamente que este chamado não é legítimo, se o último é feito pelos presbíteros e não pelo bispo.
VII. A igreja reformada aceitou o chamado dos que reformaram a igreja no tempo de nossos pais, não porque ele veio do papado, que foi um câncer na igreja, mas porque eles eram divinamente chamados por Deus e habitados com dons necessários. É objetado que eles eram chamados sob a autoridade papal, então, que deveriam ser rejeitados, pois o seu chamado expirou. Replicamos que é falso acusa-los de rejeição; eles não rejeitaram o evangelho, pelo qual foram chamados para pregar mesmo estando sob o papa, mas eles rejeitaram a corrupção do evangelho. Nem há alguma razão para afirmar que eles foram chamados para pregar a doutrina da igreja romana; se Roma coloca a sua doutrina sob o nome de evangelho, um ministro que encontrando contrária à real verdade do evangelho, poderia falar contra ela pelo privilégio de seu chamado.
VIII. Nem podem apresentar algum fundamento sobre qual eles são capazes de desafiar o chamado dos nossos ministros de acordo com as regras acima. Antes de tudo respondemos àqueles que nos questionam por qual autoridade ensinamos no modo que Cristo respondeu a quem lhe perguntou: “o batismo de João, de onde vem, do céu ou da terra?” (Mt 21:25). Similarmente dizemos “a doutrina de nossos antepassados, que ouvimos entre nós até os dias de hoje, de onde procede? Se ela está em desacordo, deixamos que mostrem em que artigos; se ela está concordando, então eles não podem atacar o chamado de nossos ministros. Onde quer que a verdadeira doutrina seja encontrada, há ali verdadeiro chamado. E o chamado que corresponde ao exemplo dos apóstolos e a igreja primitiva é legítimo. É óbvio que o nosso chamado é desta natureza.
3. O direito de tomar decisões em matéria de doutrina é que, através dele, o entendimento da igreja em questões de doutrina e resolve controvérsias que perturbam a igreja.

Extraído de Texto de Johannes Wollebius, "Compendium Theologiciae Christianae" in: John W. Beardslee III, Reformed Dogmatics: seventeenth-century Reformed Theology through the Writings of Wollebius, Voetius, and Turretin (Grand Rapids, Baker Books, 1977), pp. 144-145.
Tradução em 25 de Agosto de 2016.

26 março 2016

Sobre a divisão da Teologia - William Ames

O PRIMEIRO LIVRO DE TEOLOGIA

Capítulo 2 - Sobre a divisão ou partes da Teologia


1. Há dois elementos na teologia: fé e prática. 2 Tm 1:13 retém a forma das sãs palavras na fé e amor que é em Cristo Jesus. 1 Tm 1:19 mantendo a fé e boa consciência. At 24:14-16 crendo em todas as coisas escritas, tendo esperança em Deus, procuro ter sempre uma consciência sem ofensa. Estes eram os mesmos elementos na teologia de Abraão. Gn 15:6 Abraham creu em Jehová; Gn 17:1 anda diante de mim e sê perfeito. Cristo requer o mesmo de seus discípulos, quando através da fé exige que eles guardem todas as coisas que lhes ordenou, Mt 28:20. Paulo maneja este mesmo assunto na Epístola aos Romanos, na qual está manifesta o que contêm a suma de teologia. Finalmente, deve-se ensinar em todas as igrejas todas estas coisas. Tt 3:8, estas coisas quero que insista com firmeza, para que os que creem em Deus procurem se ocupar na prática das boas obras.

2. Uma propriedade desta distribuição (a qual é requerida numa distribuição genuína em cada arte) é que flui da natureza do objeto. Vendo que no princípio e o primeiro ato da vida espiritual (que é o objeto apropriado da Teologia) é a fé e o segundo ato, ou operação que flui deste princípio (a fé) é a prática e necessariamente se declara que estes dois são as partes genuínas da Teologia, portanto, não há nenhuma outra que devamos buscar além delas.

3. No Antigo Testamento (apropriado para esse estado legal e servil), às vezes, a Teologia parece ser dividida no temor de Deus e guardar os seus Mandamentos, como declara Eclesiastes 12:13: O fim de tudo o que se têm ouvido é: Teme a Deus e guarda os seus mandamentos; porque este é o fim todo homem. Mas, por uma metonímia, a fé é incluída na primeira parte como aparece em Pv 3:5-7: Confia em Jehová de todo o teu coração: Teme a Jehová e aparte-se do mal.

4. Estas duas partes (fé e obras) no uso, fato e prática, estão sempre juntas. Todavia, são distintas em sua natureza e aspecto.

5. Também são distintas em sua ordem de natureza que a fé detém o primeiro lugar e que a obediência espiritual vem despois; porque não pode realizar ações piedosas a menos que exista um princípio de vida de previamente iniciado internamente.


Extraído de William Ames, The Marrow of Theology (Grand Rapids, Baker Books, 1997), pp. 79-80.
Tradução: Rev Ewerton B. Tokashiki
26/03/2016.

26 dezembro 2015

Johannes Wollebius começa a falar português!

DA IMPORTÂNCIA

O teólogo reformado Johannes Wollebius ainda é desconhecido pela maioria dos leitores brasileiros. Numa busca rápida na internet pode-se perceber que são poucos os textos encontrados em português, quer artigos publicados ou traduzidos acerca deste reformador.[1] O fato é que o período dos séculos XVI e XVII ainda é uma área de pesquisa, em geral, pouco explorada entre os teólogos de nosso país. O Dr Heber C. Campos Jr, dentre os reformados brasileiros, é um pioneiro no desbravamento da produção acadêmica do protestantismo escolástico, inclusive atraindo outros pesquisadores para este amplo campo de estudo. Apesar de ter em minha biblioteca o Compendium Theolociae Christianae[2] de Wollebius desde 2009, foi no módulo “Puritanismo e Protestantismo Escolástico” realizado em 2013 no CPAJ, que interessei em conhecê-lo a fim de produzir um artigo como exigência daquela disciplina. Confesso que fiquei motivado a traduzi-lo após descobrir a sua relevância para entendermos o cenário teológico antecedente a Assembleia de Westminster.

Por que ler Wollebius? John W. Beardslee III oferece em sua introdução uma breve descrição da importância da obra
Johannes Wollebius (1586-1629) nasceu e foi educado em Basiléia, onde se tornou pastor em 1611, e professor de Antigo Testamento e pregador da catedral em 1618. O Compendium Theologicae Christianae foi publicado em 1626, sendo várias vezes, reimpresso em Latim (Basiléia, 1634; Amsterdã, 1638; 1642; Oxford, 1657; Londres, 1760), e foi traduzido para o holandês e inglês. Ernst Bizer quem reeditou o original em nossa geração, poderia agora prevenir-nos contra superestimar a sua importância, concordando com diversos historiadores do século XIX, mas não seria possível negar que seu extenso uso durante o século XVII, a sua brevidade, clareza e fidelidade, não fosse uma positiva expressão característica dos teólogos reformados nos tempos do Sínodo de Dort e que poderia manter esta afirmação concedendo-lhe o título por considera-lo como uma avenida para uma completa descrição do entendimento “ortodoxo” aceito pela Fé Reformada – o “que comumente é ensinado com aceitação em nossas igrejas” e que pode ser encontrado em Voetius, Turretin e igualmente em outros.[3]

Nesta breve nota introdutória algumas informações foram omitidas por Beardslee III que precisam ser acrescidas à importância deste manual de dogmática.[4] Após a sua primeira publicação, em 1626, em Basiléia, ela se tornou em várias universidades reformadas da Europa o livro-texto tanto para dogmática como para o ensino de ética. Assim, o seu Compendium foi um dos mais influentes manuais de dogmática na formação de teólogos no século XVII.

Os teólogos reformados necessitam conhece-lo, em especial, por causa da sua influência sobre os divines da Assembleia de Westminster. Wollebius oferece de modo preciso, conciso e perspicaz várias definições que permanecem na linguagem dos Padrões de Westminster. É fato, que a precisão nas definições e maturidade teológica dos teólogos da Assembleia de Westminster muitíssimo supera a Wollebius, mas, é evidente a sua dívida a ele.

O período do protestantismo escolástico padece de um preconceito negativo que precisa ser revisado. Infelizmente repousa sobre os teólogos do século XVII o estigma de serem áridos e apegados a sutilezas conceituais. Entretanto, uma leitura nos seus escritos, mesmo que superficial, revela algo surpreendente. Em especial porque neste período os puritanos eram homens de marcante piedade, zelosos pela pregação expositiva e a observância da santidade aplicada a todas as esferas da vida e sociedade. Este manual de teologia de Wollebius desmitifica essa deformada caricatura. A sua linguagem é cheia de citações das Escrituras, e por vezes, oferecendo a sua própria tradução dos originais, demonstrando boa exegese, e uma linguagem piedosa na construção de seus argumentos. Há ainda uma preocupação na área da teologia prática, tanto no conteúdo dogmático, como na parte em que ele interpreta e aplica o decálogo. É um excelente sumário da teologia reformada do período do protestantismo escolástico, e isto justificou a sua adoção em várias universidades na Europa no século XVII.

O retorno aos textos clássicos é uma necessidade nestes tempos de reiterado interesse pelo Calvinismo. Diante do perigo de descuidadas redefinições, que por vezes são confusas e imprecisas, torna-se urgente um retorno aos autores clássicos. Termos como Neocalvinismo, Novo Calvinismo, Calvinismo Moderado, dentre outros, representam versões revisionistas, subdivisões ou desvios do tronco principal. Em muitos casos há o real risco de afastamentos, como o Amiraldianismo e Arminianismo, que em seu surgimento alegavam serem intérpretes fiéis da teologia calvinista. É neste aspecto que ler os clássicos é ter acesso aos passos de maturidade que a Igreja Reformada deu em sua imponente jornada na história da teologia, e assim, evitando se perder nestas ramificações distorcidas.


DA TRADUÇÃO

A primeira tradução para a língua inglesa apareceu em 1650. Alexander Ross publicou o Compendium sob o título de Abridgement of Christian Divinitie, em Londres.[5]

A tradução de Beardslee III surgiu em 1965. Ela obteve várias publicações, inclusive por diferentes editoras, todavia, está esgotada. Beardslee III baseou a sua tradução no texto latino, holandês e na versão de Alexander Ross. Esta tradução preserva algumas palavras ou expressões latinas, e obviamente alguns termos tem uso técnico e precisam ser entendidos segundo o uso original.[6] O mesmo ocorre quando Wollebius cita alguma palavra hebraica ou grega. A tradução de Beardslee III é melhor que a de Ross, por ser num inglês moderno, e por oferecer notas explicativas, bem como a sua diagramação torna mais clara a apresentação do conteúdo.

A minha tradução foi realizada a partir do texto de Beardslee III. Todavia, simultaneamente comparei com o texto de Ross, a fim revisar e, quando necessário, acrescentar notas explicativas onde estes tradutores divergiam. Nas poucas vezes em que me deparei com uma aparente discrepância entre ambos, recorri ao texto latino para conferir a exatidão das traduções.[7] Acusei nalgumas notas quais foram as diferentes nuanças na tradução de um ou do outro, bem como outras notas foram adicionadas para explicar personagens ou movimentos da história da teologia. Quando o autor cita a Escritura Sagrada, normalmente uso a versão Almeida Revista e Atualizada [ARA da SBB], a não ser quando o versículo em questão é tradução de Wollebius, ou possuí uma explicação de Beardslee III em algum aspecto gramatical original. Assim, nestes casos para distinguir não uso a sigla ARA a fim de preservar a tradução original em inglês.

Tenho esperança de que o texto se torne acessível ao maior número possível de leitores. Até agora Wollebius é desconhecido pela maioria de nós, e a sua importância igualmente ignorada. Creio que a sua influência outrora sobre os teólogos puritanos do século XVII pode contribuir para um refinamento no pensamento cristão do século XXI. Por isso decidi torná-lo acessível aos que apreciam a teologia reformada em sua fonte, mas que por causa da limitação do idioma, ou acesso ao texto original, são impossibilitados de lê-lo. Sirvamo-nos deste rico legado da teologia reformada.

A minha oração é que o Senhor Deus com a sua rica graça novamente use este precioso livro para fortalecer a fé do seu povo.

NOTAS:
[1] Em inglês também há escassez de pesquisa e produção de artigos sobre a sua pessoa ou obra, sendo R.S. Clark uma das exceções.
[2] O título completo em latim é Compendium Theologiae Christianae Accurata Methodo Sic Adornatum. Doravante apenas Compendium e a indicação da página. A edição mencionada é a publicada pela Baker Book House de 1977.
[3] Veja o prefácio de John W. Beardslee III, Reformed Dogmatics, pp. 10-11.
[4] W. Hadorn, “Wolleb, Johannes” in: Samuel M. Jackson, ed., The New Schaff-Herzog Encyclopedia of Religious Knowledge (Grand Rapids, Baker Book House, 1950), p. 407.
[5] Esta versão se encontra disponível na internet.
[6] Recomendo Richard Muller, Dictionary for Latin and Greek Theological Terms (Baker Books).
[7] Uso o texto latino publicado em Amsterdã, de 1655, disponibilizado digitalmente pela Bayer Staatsbibliothek [Biblioteca Estatal de Bayer].

22 novembro 2015

Breve relato da vida e obra de Matthew Henry

Escrito por Allan M. Harman

Dificilmente há um homem tão conhecido entre os comentaristas bíblicos como Matthew Henry. Desde a publicação de seu primeiro volume (o Pentateuco) em 1706 até o presente, o comentário de Henry foi repetidamente reimpresso, traduzido a outros idiomas, combinado com o comentário de Thomas Scott para formar o comentário de Henry e Scott, ou impresso em formato resumido. Ele tem exercido uma grande influência na formação espiritual de uma multidão de leitores que dele utilizam para devocionais pessoais, ou para preparar-se para o ensino, ou pregação. Destacados líderes cristãos como George Whitefield e William Carey testemunharam da influência que receberam dele.

Para mencionar o caso de Whitefield, que pouco depois de sua conversão, adotou a prática de levantar às cinco da manhã. Ajoelhado ele lia a Bíblia, em seguida o seu Novo Testamento grego e finalmente consultava o comentário de Matthew Henry acerca daquela passagem. Posteriormente, a sua pregação esteve intensamente influenciada pela exposição de Henry. Arnold Dallimore chega ao ponto de dizer que “de tal modo bebeu dos mananciais da exposição bíblica de Matthew Henry que muita de sua expressão pública era pouco mais do que o pensamento do grande comentarista; pensamento que havia chegado a assimilar em sua própria mente e alma, e que se derramava espontaneamente tanto quanto preparava como quando pregava os seus sermões”. Era capaz de recordar citações de Henry, e sua lista de regras para o seu Instituto em Bethesda na Georgia incluía, entre os livros sobre teologia, o comentário de Matthew Henry. Quando escreveu a sua famosa carta a João Wesley sobre o tema da redenção universal, não deu a sua própria explicação de algumas passagens bíblicas, mas remeteu Wesley que lesse aos comentaristas como Ridgely, Edwards e Henry. O seu desejo era que estes tratados pudessem levar Wesley a reconhecer o seu erro.

Mas para a imensa maioria dos leitores a vida de Matthew Henry é algo desconhecido, e há uma falta de valorização crítica de sua obra e ministério. Ao apresentar alguns de seus sermões até agora inéditos, é necessário oferecer um breve relato de sua vida e ministério, junto com uma avaliação dele como pregador assim como comentarista.

Acesse o texto completo [CLIQUE AQUI]

15 março 2014

A fé cristã é compatível com o socialismo marxista?

CATECISMO MAIOR DE WESTMINSTER COMENTADO
Por Johannes G. Vos

Pergunta 140. Qual é o oitavo mandamento?
R: O oitavo mandamento é: não furtarás.

Pergunta 141: Quais são os deveres exigidos no oitavo mandamento?
R: Os deveres exigidos no oitavo mandamento são a verdade, a fidelidade e a justiça nos contratos e no comércio entre os homens; dar a cada um aquilo que lhe é devido; restitui aos donos legítimos os bens tirados deles ilicitamente; dar e emprestar gratuitamente, conforme nossos recursos e as necessidades dos outros; moderar os nossos juízos, desejos e sentimentos relativos aos bens mundanos; o cuidado e a busca providente para obter, guardar, usar e dispor das coisas necessárias e convenientes à sustentação da nossa natureza e apropriadas á nossa condição; ter um meio de vida lícito e empenhar-se nele; a frugalidade; evitar processos judiciais, fianças ou outras demandas semelhantes; e o esforço, por todos os meios justos e lícitos, de procurar, preservar e aumentar a riqueza e o estado exterior, tanto de outros quanto o nosso próprio.

COMENTÁRIO:
1. Qual é o alcance geral do oitavo mandamento?
O alcance geral do oitavo mandamento é o respeito à santidade da propriedade, da mesma sorte que o sexto impõe respeito á santidade da vida e o sétimo, à santidade do sexo. A propriedade ou a riqueza é criada por Deus e confiada ao homem para o seu uso na glorificação e no serviço a Deus. É, portanto, um compromisso administrativo atribuído ao homem e por isso tem de ser respeitado. O oitavo mandamento, portanto, requer não apenas que nos guardemos de roubar o bem do nosso próximo, mas que conquistemos e conservemos o nosso.

2. A Bíblia autoriza a propriedade privada?
Sim. A posse da propriedade privada, no estado pecaminoso em que a humanidade existe desde a queda, é necessária para que uma vida possa glorificar e gozar a Deus. A propriedade privada fundamenta-se não na mera invenção ou costume humanos, mas na lei moral de Deus. Está definitivamente autorizada pelo oitavo mandamento – “Não furtarás” – o qual só fará sentido se houver por trás dele uma ordenação divina para a propriedade privada. Mesmo fora da Bíblia, a revelação natural ensina a todos os homens que roubar é errado. Está profundamente equivocado quem hoje pensar que a propriedade privada é maligna. Os males que ele tem em mente procedem não da propriedade privada em si mesma, mas dos abusos da propriedade privada.

3. À luz da Bíblia, que devemos pensar do comunismo?
Segundo o que a Bíblia ensina, o comunismo é errado a princípio. Não é errado meramente em alguns de seus aspectos ou práticas, ou por causa dos abusos a ele associados, mas é errado e maligno na sua ideia fundamental. Se pudéssemos imaginar um “perfeito” estado de comunismo, em que não houvesse tirania, campos de concentração, policia secreta, propaganda politica, nem censura de informações, ele ainda seria inerentemente pecaminoso e maligno. O capitalismo viola a lei moral de Deus pelos males e abusos a ele vinculados; o comunismo viola a lei moral de Deus por sua própria natureza e ideia fundamental. O principio do comunismo é a posse coletiva da propriedade imposta pelo Estado. Isso pressupõe que a posse particular do indivíduo é um mal que só pode ser tolerado em pequena escala, como uma concessão à natureza humana. Isso é contrário à Bíblia, que ensina que a propriedade privada é um direito dado por Deus. O ser humano individual, como portador da imagem de Deus, deve ter o direito à propriedade conforme o propósito de Deus e para O glorificar plenamente na sua relação com o seu ambiente. A imagem de Deus no homem abrange a implicação de que o homem deve ter o domínio sobre a Terra (Gn 1.27-28); mas o homem é essencialmente um indivíduo, com alma e consciência individuais, com competência e habilidades individuais, com esperança e desejos individuais. O comunismo procura fundir o indivíduo à massa da humanidade e isso envolve o sacrifício do elemento essencial da personalidade do homem, como portador individual da imagem divina e mordomo de Deus com domínio sobre uma parcela da criação de Deus. O comunismo assume que o indivíduo existe por causa da massa, da sociedade, mas isso é contrário a Palavra de Deus, a qual nos ensina que a sociedade e todas as instituições sociais existem por causa do indivíduo, para que ele possa alcançar o propósito divino da sua vida e assim glorificar a Deus. É o indivíduo quem possui uma alma mortal, uma consciência e a capacidade para a comunhão com Deus. Essas coisas sobreviverão a esse mundo e existem para sempre. Elas é que dão dignidade e valor reais à vida humana. Qualquer sistema que considere o ser humano individual como sem importância e busca amalgamá-lo á massa supostamente pelo bem-estar da “sociedade” é fundamentalmente errado e anticristão. Isso se aplica tanto à propriedade coletiva compulsória quanto às outras subversões da individualidade da personalidade humana.

4. Segundo registra Atos (2.44; 4.32-27), a igreja primitiva não praticava o comunismo?
É verdade que existia um tipo de “comunismo” na igreja de Jerusalém, mas era totalmente diferente do comunismo que existe hoje. Deve-se observar que (a) era voluntária e não compulsória, como mostram as palavras de Palavras de Pedro a Ananias em Atos 5.4; 9 (b) era parcial e não total, como demonstra o fato de que a casa de Maria, mãe de João Marcos, não fora vendida; (c) logo surgiu uma murmuração acusatória de que as rações de comida não estavam sendo distribuídas de modo justo (At 6.1); (d) isso foi apenas temporário, sendo descontinuado mais tarde, provavelmente no tempo de grande perseguição que se seguiu ao martírio de Estevão, quando os crentes se espalharam a partir de Jerusalém (At 8.1-4); (e) não há menor indicação de que tenha sido implantado algum “comunismo” assim em nenhuma das Igrejas estabelecidas pelos apóstolos, além da igreja em Jerusalém. É claro, portanto, que o “comunismo” temporário da Igreja de Jerusalém não era uma questão de princípios, mas de contingência em face das condições peculiares àquele tempo e lugar. É extremamente insensato, antibíblico e anti-histórico apresentar o estado temporário das ocorrências na Igreja de Jerusalém como análogo ao comunismo moderno, ou como um padrão a ser imitado pelos crentes em Cristo de todos os lugares.

5. O socialismo é contrário ao cristianismo?
A palavra socialismo é usada com uma variedade tão grande de sentidos que é difícil falar categoricamente dela sem primeiro a definir, para sabermos precisamente o que quer dizer. O socialismo marxista, que é raiz do comunismo moderno, é indubitavelmente contrário à religião cristã. Embora haja uma forma limitada de socialismo que não é contrária ao ensinamento da Palavra de Deus. O governo operar serviço postal, em vez de deixa-lo à iniciativa de particulares ou de corporações, é uma forma de socialismo; mas não se pode achar que seja pecaminoso o envolvimento do Estado nesse empreendimento. Na maioria dos países do mundo as ferrovias, os serviços telefônicos e os de comunicação são operados ou majoritariamente ou exclusivamente pelo Estado. Podemos, ou não, achar que isso seja inteligente, mas dificilmente conseguiremos provar que seja contrário à Bíblia; assim mesmo faz-se necessário traçar um limite em algum ponto. Seria errado, com certeza, que o Estado controlasse e operasse todos os negócios e comércios. A operação de negócios pelo Estado deveria limitar-se a atividades como as do serviço postal, que são essenciais para todos os habitantes do país e por questão de economia requerem monopólio de alcance nacional. O Estado deve proporcionar as condições para que os negócios privados sigam adiante, e deve regulamentá-lo em prol da justiça, mas não deve suplantá-lo competindo contra ele. Deus instituiu o governo civil para promover o bem das pessoas pela manutenção da justiça na sociedade humana (Rm 13.4), e não para se firmar como um colossal empreendimento coletivo em concorrência com os seus próprios cidadãos.


Extraído de Johannes G. Vos, Catecismo Maior de Westminster Comentado (São Paulo, Editora Os Puritanos, 2007), pp. 433-437.

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14 março 2014

Do Magistrado Civil e a Igreja - Confissão de Fé de Westminster

CONFISSÃO DE FÉ DE WESTMINSTER
CAPÍTULO XXIII - DO MAGISTRADO CIVIL


Comentado por G.I. Williamson

Aqui deixamos uma vez mais a ordem da Confissão de Fé para considerar juntas certas seções da Confissão que são difíceis de considerar em relação umas com as outras. Estes capítulos e estas seções são: o capítulo XXIII, 3 da e o capítulo XXXI, 1, 2. A dificuldade consiste em definir qual é o poder do magistrado civil com respeito aos assuntos eclesiásticos. A partir deste ponto, primeiro, procederemos discutindo as seções do capítulo XXIII que não são problemáticas; e segundo, as seções dos capítulos XXIII e XXXI que apresentam o problema e terceiro, as porções que ficaram do capítulo XXXI, ou seja, as seções 3,4, e 5.
1. Deus o supremo Senhor e Rei de todo o mundo, institui os magistrados civis, para estar abaixo dele e sobre o seu povo, para sua própria gloria e para o bem publico; para cujo fim lhes deu autoridade da espada, para defender e estimulo dos bons, e para castigo dos maus.
2. É licito que os cristãos aceitem e desempenhem o oficio de magistrados quando para isso forem vocacionado por Ele. Na administração deste oficio os cristãos devem manter especialmente a piedade, a justiça e a paz de acordo com as leis saudáveis de cada estado. Para tal fim, podem legalmente a luz do NT, fazer guerra em ocasiões justas e necessárias.
3. [...]
4. O povo tem o dever de orar pelos magistrados, honrar suas pessoas, pagar tributos e outros direito, obedecer aos seus mandamentos legítimos, e estar sujeitos a sua autoridade por causa de sua consciência. A infidelidade, ou a diferencia de religião não invalida a justa e legítima autoridade do magistrado, nem exime do povo a devida obediência a ele, do qual as pessoas eclesiásticas não estão excluídas, e muito menos tem o papa poder de jurisdição alguma sobre os magistrados, sobre seus domínios, ou sobre algum de seu povo; e muito menos para priva-los de seu domínio, suas vidas, sejam porque os julguem que são hereges, ou por qualquer outro pretexto.

XXIII, 1,2,3

ESTAS SEÇÕES DA CONFISSÃO DE FÉ NOS ENSINAM:
1) Que Deus estabeleceu o governo civil sobre a terra.
2) Que seu propósito e sua glória e o nosso bem.
3) Que nos deu os oficiais civis e o poder da espada.
4) Que os cristãos podem de forma lícita ter cargos civis e exercer o poder da espada em ocasiões necessárias e justas.
5) Que Deus requer que os cristãos exerçam o mandato, orem, se submetam aos que licitamente utilizam o seu cargo no governo civil.
6) Que esta responsabilidade não deixa de existir por causa das diferenças religiosas, e
7) Que o papa de Roma não tem nenhum direito sobre o poder civil.

A passagem clássica das escrituras que trata do estabelecimento do governo civil é:
“Todo homem esteja sujeito às autoridades superiores; porque não há autoridade que não proceda de Deus; e as autoridades que existem foram por ele instituídas. De modo que aquele que se opõe à autoridade resiste à ordenação de Deus; e os que resistem trarão sobre si mesmos a devida condenação. Porque os magistrados não são para temor, quando se faz o bem, e sim quando se faz o mal. Queres tu não temer a autoridade? Faze o bem e terás louvor dela, visto que a autoridade é ministro de Deus para teu bem. Entretanto, se fizeres o mal, teme; porque não é sem motivo que ela traz a espada; pois é ministro de Deus, vingador, para castigar o que pratica o mal. É necessário que lhe estejais sujeitos, não somente por causa do temor da punição, mas também por dever de consciência. Por esse motivo, também pagais tributos, porque são ministros de Deus, atendendo, constantemente, a este serviço. Pagai a todos o que lhes é devido: a quem tributo, tributo; a quem imposto, imposto; a quem respeito, respeito; a quem honra, honra” (Rm 13:1-7).

Nesta passagem clássica das Escrituras se estabelece os ensinos desta seção da Confissão. “Todos devem se sujeitar as autoridades publicas” disse o apóstolo. Sem dúvida se requer do cristão que se submetam aos que estão como autoridades pela vontade de Deus. “Porque não há autoridade que não proceda de Deus, e as autoridades que existem foram por ele instituídas.” A. A. Hodge bem disse: “alguns imaginam que o direito e a autoridade legítima do governo humano tem seu fundamento final na aprovação dos governados,” bem como “na vontade da maioria”, ou, em algum pacto social imaginário feito pelos antepassados da raça na origem da vida social. Mas as Escrituras nos ensinam que o governo civil vem de Deus, e que tem sua autoridade pela vontade de Deus, e assim aprovação dos governos. Isto implica claramente que o cristão deve considerar o governo de fato, de qualquer país particular no qual pode residir como jure. Nenhuma forma de governo civil está designada nas Escrituras. O cristão não tem a liberdade de obedecer ou não dependendo do tipo de governo que exista. “Os poderes que existem foram estabelecidos por Deus”, disse Paulo. E se referia ao governo totalitário do Império Romano. Se Paulo e Jesus ensinaram que deveriam se sujeitar a Cesar, é difícil pensar em algum tipo de governo civil que não deveria ser obedecido pelos cristãos em assuntos civis. A luz deste contexto do período apostólico (quando o governo civil era totalitário), não cremos que os cristãos tivessem o direito de apoiar, ou, de participar na derrota violenta de uma autoridade civil, ou, seja uma monarquia ou democracia (ver Rm 13:2, I Pd 2:13-14, Tt 3:1 etc). Se todo o governo de fato é estabelecido por Deus, e a resistência é uma resistência diante do mandato de Deus então, não existe nenhuma outra conclusão.

No entanto, afirmar que a autoridade a autoridade civil é de origem divina não é dizer que a mesma não tenha limites. Toda a autoridade divinamente estabelecida, em assuntos humanos, está limitada pelo decreto divino. O magistrado civil é estabelecido por Deus como “ministro” o servo de Deus “para o bem”. A sua responsabilidade é levar a espada do poder físico como terror contra as obras do mal. A sua responsabilidade é como vingador que demonstra a ira de Deus sobre quem fez o mal. Enquanto o governo civil se contenta restringindo e castigando o crime e a violência, proteger o bem e castigar o mal, o cristão deve apoiar, orar e honrar por esse governo. Mas quando esse governo castiga aos retos e recompensa ao malfeitor, tornando-se agressivo militarista, é a responsabilidade do cristão resistir esse poder porque subverte o mandato de Deus. Em muitos casos é sem dúvida, difícil determinar precisamente quando, até que ponto um cristão deve resistir a um governo civil em particular. Não é nossa intenção fazer que esta decisão pareça fácil. Mas certos princípios são muitos claros, e se aplicados corretamente, tornará possível para que o indivíduo tome a decisão correta em seu caso particular.
1. Devemos sempre obedecer aos “mandatos legítimos” de nosso governo. Em todas e cada uma das instâncias devemos estar “prontos a fazer toda boa obra” (Tt 3:1).
2. Sempre devemos obedecer a Deus antes que ao homem quando existe um conflito entre os dois. “É necessário obedecer a Deus antes que os homens” (At 5:29).
3. Podemos resistir, tanto ativa como passivamente, se for necessário, para obedecer a Deus. Quando uma autoridade civil se mostra um terror quanto às boas obras e não quanto o mal, cremos que os cristãos tem o direito defender–se ativamente. Tanto a “sua vida como a sua propriedade” conforme determina a lei “Salmo 82:4, Provérbios 24:11-12, etc.”. Assim “o fim imediato para o qual Deus instituiu os magistrados é o bem público e o fim último a manifestação de sua própria glória.”

Mas consideremos atentamente certos erros modernos que ganharam um amplo apoio, e que confunde a mente de muitos cristãos.

1. O primeiro que consideraremos é a intenção modernista de descontinuar a prática da pena de morte. Em nossa nação hoje em dia existe uma corrente cada vez mais forte a favor de abolir a pena de morte. E muitos grupos protestantes liberais aprovam esta mudança dizendo que não beneficia a sociedade, não reforma o criminoso nem reflete os ensinos humanitários do Novo Testamento. É dizer, por várias razões, que é muito popular hoje em dia negar ao governo o poder da espada para castigar o mal. Tal posição enquanto autoridade civil está ao menos completamente contra ao ensinamento bíblico. Não pensemos que se possa provar que a pena de morte não seja um beneficio para a sociedade. Cremos que seja, embora a única razão seja que a Escritura declara que o cumprimento fiel da justiça é uma punição para o mal e um alento para o bem. Pode ser possível que a pena de morte não reforme o criminoso. Mas, também é possível que a falta de punição contra a maldade também reforme o criminoso. Mas estamos convencidos de que ela promove a maldade. Sobretudo, nos opomos à ideia de que o poder e a autoridade civil devam refletir as ideias modernas de ensino humanitário do “Novo Testamento”. A justiça não é mais “humanitária” no Novo Testamento que no Antigo Testamento. E a instituição do governo civil não foi estabelecida para ensinar o Novo Testamento: é para castigar o crime e proteger os que fazem o bem. Sem motivos duvidamos que o esquema dos liberais que promovem abolição da pena de morte seja “humanitária”. Cremos que muitos dos crimes da atualidade se devem ao fato de que existe demasiada preocupação não bíblica pelo malfeitor e bem pouca preocupação bíblica pelos justos.

2. Outro ataque moderno contra a instituição do governo civil pode-se observar por aqueles que promovem a corrente pacifista. Os concílios da igreja modernista têm defendido tais coisas:
2.1. O completo desarmamento de nossa nação.
2.2. O desarmamento unilateral [ou seja, somente do cidadão de bem].
2.3. A negociação em vez da defesa armada ao serem confrontados com agressão criminosa.
2.4. O reconhecimento dos que são agressores sem nenhum tipo de castigo justo.

A Confissão de Fé insiste que os magistrados civis (ainda que sejam pessoas cristãs) “podem legitimamente, conforme o Novo Testamento, fazer atualmente guerra em ocasiões justas e necessárias. Os que apoiam a política que basicamente exige que nosso governo nacional renuncie o poder da espada e renuncie os esforços para ser um punidor dos malfeitores, e que renuncie a execução de vingança sobre eles, pedem nada menos que destruição do mandato de Deus em Romanos 13:1-5. É precisamente porque “se opõem a autoridade” então “se rebelam contra o que Deus instituiu”. Este pecado deve ser denunciado como ele realmente é. É um pecado contra Deus, é um pecado contra o nosso governo.

A última parte da seção número 4 deste capítulo trata dos males históricos associados com a Igreja Católica Romana.

3. O primeiro destes males é que lhes outorga um status privilegiado aos oficiais da igreja em assuntos civis. Existem em alguns países que são dominados pela Igreja Romana nos quais os sacerdotes não podem ser julgados nas cortes civis por seus crimes. Existe talvez um pouco de humor nos relatos tradicionais da vergonha da polícia irlandesa quando se deu conta de que havia prendido um sacerdote por excesso de velocidade. No entanto, as Escrituras ensinam que os cristãos, sejam oficiais da igreja ou não, não devem se considerar acima do poder civil. Cremos que a Confissão de Fé concorda com a Escritura quando diz que “as pessoas eclesiásticas não estão excluídas desta autoridade”. E a infidelidade, ou diferença de religião entre os cidadãos cristãos e o governo civil “não invalida a justa e legítima autoridade do magistrado”.

5. O outro mal que outorga autoridade ao Papa de Roma. Este foi e continua sendo uma reivindicação do Pontífice Romano, ele insiste que exerce tanto a espada espiritual como a temporal do poder e a autoridade. “Segundo a posição ultramontana estritamente lógica, sendo toda nação, em todos seus membros, uma porção da igreja universal, a organização civil está compreendida dentro da igreja para certos fins subordinados para o grande fim para o qual existe a igreja e assim, portanto, finalmente responsável diante dela para execução da autoridade delegada. Quando enfim o Papa se coloca na condição de exigir a sua autoridade, pondo o reino debaixo de edito emitido aos súditos exigindo o seu voto de fidelidade (civil), e demonstrando aos soberanos, baseando-se na suposta heresia da insubordinação dos líderes cívis no país”. (A A.Hodge, Ibid., p. 276). A Escritura anunciou o que a história demonstrou, ou seja, que tal usurpação resulta na perseguição aos verdadeiros crentes (Ap 13; 18:24).


PERGUNTAS PARA ESTUDO

1. Qual o fundamento da autoridade do governo civil? Prove biblicamente.
2. Que tipo de governo vem da autoridade divina?
3. Deve um cristão promover a derrota violenta de um governo civil?
4. Deve um cristão resistir licitamente ao governo?
5. Quando é que os cristãos devem obedecer ao seu governo?
6. Quando é que os cristãos devem desobedecer ao seu governo?
7. Enumere os erros modernos promovidos por cristãos liberais que estão contra a instituição divina do governo civil?
8. Por que estes estão contra a instituição divina do governo civil?
9. Quais são os erros refutados na seção número 4 da Confissão de Fé?


Extraído de G.I. Williamson, La Confesión de Fe de Westminster (Carlisle, El Estandarte de la Verdad, 2003), pp. 355-360.

Traduzido por Rev. Gaspar da Silva
Pastor da Igreja Presbiteriana de Pimenta Bueno
Revisado por Rev. Ewerton B. Tokashiki
Pastor da Primeira Igreja Presbiteriana de Porto Velho
Professor de Teologia Sistemática no SPBC-RO.