28 janeiro 2007

A missão da Igreja Cristã

A Igreja necessita resgatar o discipulado como uma prática normal em contraste com a filosofia pluralista. Tanto um conceito, como uma prática correta de discipulado evidenciará a saúde espiritual da Igreja. O pastor Dietrich Bonhoeffer notou que "em tudo que segue, queremos falar em nome de todos aqueles que estão perturbados e para os quais a palavra da graça se tornou assustadoramente vazia. Por amor a verdade, essa palavra tem que ser pronunciada em nome daqueles de entre nós que reconhecem que, devido à graça barata, perderam o discipulado de Cristo, e, com o discipulado de Cristo, a compreensão da graça preciosa. Simplesmente por não querermos negar que já não estamos no verdadeiro discipulado de Cristo, que somos, é certo, membros de uma igreja ortodoxamente crente na doutrina da graça pura, mas não membros de uma graça do discipulado, há que se fazer a tentativa de compreender de novo a graça e o discipulado em sua verdadeira relação mútua. Já não ousamos mais fugir ao problema. Cada vez se torna mais evidente que o problema da Igreja se cifra nisso: como viver hoje uma vida cristã."[1]

Este é o modelo Bíblico onde é possível desenvolver o caráter de Cristo na vida dos envolvidos. Conhecer a Deus por meio de Jesus, e glorifica-lo num relacionamento construtivo como Igreja. Nesse relacionamento construtivo o alvo é preparar discípulos para um envolvimento nos ministérios e departamentos da igreja, proporcionando um fortalecimento qualitativo, que resultará naturalmente na multiplicação de outros discípulos. John Sittema nos lembra que discipular é “reproduzir a si mesmo e sua fé na vida de outros.”[2] Evidentemente não podemos confundir, porque o Senhor Jesus exige que façamos discípulos dele e não nossos. Novamente podemos citar Sittema observando que “esse processo requer o desenvolvimento de um relacionamento de confiança, de exemplo, de revelação do nosso coração e da nossa fé ao discípulo que, por sua vez deve imitar o padrão de fé do seu mestre.”[3]

A Igreja não é testemunha de si mesma. Os salvos são chamados para proclamar a soberana graça do redentor. A Palavra de Deus como meio de graça para alcançar e transformar o pecador é o intrumento do Espírito Santo. A Igreja não prega um misticismo irracional, nem mesmo supostas novas revelações, mas ela instrui a Escritura Sagrada que “é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça” (2 Tm 3:16). O conteúdo registrado na Escritura Sagrada não é o resultado da experiência evolutiva dos povos antigos, mas a auto-revelação do Deus de Israel. W. Gary Crampton observa que "a concepção ortodoxa da inspiração também declara que a revelação bíblica é proposicional em natureza; ela ensina uma verdade proposicional. Proposições são lógicas, com importantes combinações de palavras que declaram alguma coisa. Elas possuem o significado das sentenças declaradas. A verdade da Escritura não está 'em meio', 'acima', ou 'além' das palavras, ou somente na mente do intérprete. Nem estão as palavras secretamente simbolizadas, insinuando alguma verdade mais "elevada" ou "profunda". Pelo contrário, a verdade de Deus repousa no significado lógico e organização que as palavras possuem. Nem numerologistas, nem poetas, nem aqueles que vêem códigos acrósticos na Escritura que compreende a Escritura. A verdade de Deus vem via o nosso entendimento das proposições da Escrituras conforme as regras ordinárias da gramática e da lógica (que estão presentes na Escritura). Por isso, a Bíblia não contém paradoxos lógicos."[4]

A doutrina de que a Escritura é inerrante não surgiu com o movimento Fundamentalista no início do século XX. Este tão antigo ensino pode ser encontrado, com clareza, durante o escolasticismo protestante no século XVII, por exemplo, o teólogo luterano alemão Johann A. Quenstedt (1617-1688) declarou que "a Sagrada Escritura canônica no texto original é infalível verdade e livre de todo erro; em outras palavras, na sacra Escritura canônica não existe mentira, nem falsidade, nem erro mínimo qualquer, seja no assunto ou de expressão, mas em todas as coisas e em todos os detalhes que são manuseados nela, ela é a mais segura verdade, tanto no que pertence a doutrinas, ou moral, à história ou cronologia, a topografia ou nomenclatura. Nem a ignorância, nem negligência, nem esquecimento, nem lapso de memória puderam e ousaram atribuir aos amanuenses do Espírito Santo em seu registro dos Escritos Sagrados."[5] Sustentando a mesma opinião acerca da inerrância das Escrituras, o teólogo reformado suíço Francis Turrentin (1623-1678) afirmou que “os escritores sacros foram movidos e inspirados pelo Espírito Santo, envolvendo tanto os pensamentos, como a linguagem, e que eles foram preservados livres de todo erro, fazendo com que os seus escritos sejam inteiramente autênticos e divinos.”[6]

A salvação pressupõe que a humanidade perdeu a sua identidade original, tornando-se deturpada e alienada moral e espiritualmente. O ser humano não é moralmente neutro, mas inclinado a tomar decisões que refletem a sua natureza. As pessoas, no estado natural em que se encontram são movidas intuitivamente, acima de tudo, pela cobiça e pelo egoísmo. Toda a humanidade está num estado espiritual decaído, diferente daquele em que foi originalmente criada. A ética cristã reconhece que as pessoas são incapazes por si mesmas de aceitar a perfeita vontade de Deus, expressa na Escritura Sagrada, e muito menos de obedecê-la.

A explicação que a Escritura oferece da Queda é a única que esclarece o real relacionamento que o ser humano tem com Deus. O apologista Francis A. Schaeffer argumenta que existiu "um período anterior à queda, e então, o homem desviou-se do seu ponto de integração apropriado, por sua escolha; e, assim procedendo, houve uma descontinuidade moral – o homem tornou-se anormal. Remova estes fatos e a resposta cristã às questões da moral se vai. Freqüentemente encontro evangélicos levando a primeira parte do Gênesis na brincadeira. Mas o fato é que, se desprezarmos a Queda verdadeira, espaço-temporal e histórica, as respostas deixarão de existir. Não se trata apenas de uma extinção do Cristianismo histórico e bíblico, como se coloca na corrente da história, mas toda e qualquer resposta que possamos ter para o homem e o seu dilema moral, também estará extinta."[7]

A salvação dos eleitos de Deus ocorre num processo temporal: presente, passado e futuro. R.C. Sproul observa que "a Bíblia refere-se ao fato de termos sido salvos antes da criação do mundo (Ef 1:4). Nesse trecho o tempo passado foi empregado em relação à salvação no sentido mais extremo. [...] Há um sentido no qual somos ou estamos salvos. No momento em que depositamos nossa confiança em Cristo, e somente em Cristo, Deus nos declara justificados. [...] Seremos salvos, visto que aguardamos nossa salvação com Cristo e a consumação definitiva da nossa salvação."[8]

A sociedade pós-moderna experimenta a deterioração dos valores que a preserva. A falta de sentido e propósito também produz a desesperança. Esta sociedade busca a redenção na tecnologia, cultura, e no sexo, todavia, estes meios são ineficazes de transformá-la. Todavia, somente com os valores do reino de Deus, num discipulado integral, em que os cristãos se envolvem produtivamente em todas as áreas da vida, é possível participar dum processo de transformação cultural, político, econômico e científico reconhecendo Cristo como o Senhor em todas as esferas da existência humana. A sociedade pós-moderna inclina-se a não reconhecer a verdade como absoluta, ridicularizando a concepção e a ação de Deus no mundo; entretanto, os cristãos são responsáveis de construir uma sociedade influenciada pelo Evangelho de Cristo que ofereça o bem-estar a todos.

Notas:
[1] Dietrich Bonhoeffer, Discipulado (São Leopoldo, Ed. Sinodal, 1995), p. 18.
[2] John Sittema, Coração de Pastor (São Paulo, Ed. Cultura Cristã, 2004), p. 173.
[3] John Sittema, Coração de Pastor, p. 173.
[4] W. Gary Crampton, By Scrypture Alone (Unicoi, The Trinity Foundation, 2002), p. 78
[5] Citado em Gordon H. Clark, The Pastoral Epistles (Unicoi, The Trinity Foundation, 1998), p. 131.
[6] citado por W.G.T. Shedd, Dogmatic Theology (Nashville, Thomas Nelson Publishers, 1980), vol. 1, p. 72
[7] Francis A. Schaeffer, O Deus que se revela (São Paulo, Editora Cultura Cristã, 2002), p. 74.
[8] R.C. Sproul, Salvo de quê? (São Paulo, Editora Vida, 2006), p. 23.

26 janeiro 2007

As funções dos presbíteros

As funções atribuídas aos presbíteros aqui descritas não são exaustivas. Elas mencionam o que o presbítero deve ser e fazer, mas ele não pode se limitar a elas. Todos os presbíteros devem exercer o seu ofício em conformidade com a diversidade dos dons de cada um, e discernindo segundo a necessidade da Igreja. A vitalidade da igreja muito depende da operosidade dos presbíteros.

Uma palavra grega usada para se referir ao ofício de presbítero é episcopos. Sabemos que “o uso no N.T., em referência aos líderes, parece ser menos técnica do que uma tradução como ‘bispo’ sugeriria; daí, superintendente, ou supervisor At 20:28; Fp 1:1; 1 Tm 3:2; Tt 1:7.”[1] O presbítero tem a responsabilidade de supervisionar a igreja que o escolheu para ser o seu líder. Louis Berkhof afirma que “claramente se vê que estes oficiais detinham a superintendência do rebanho que fora entregue aos seus cuidados. Eles tinham que abastecê-lo, governá-lo e protegê-lo, como sendo a própria família de Deus.”[2]

A responsabilidade dos presbíteros de supervisão não se limita aos membros da igreja. Os presbíteros devem supervisionar o seu pastor. R.B. Kuiper observa que "um dos seus mais solenes deveres é vigiar a vida e o trabalho do pastor. Se o pastor não leva uma vida exemplar os presbíteros regentes da igreja devem chamar-lhe a atenção, e corrigi-lo. Se não é tão diligente em sua obra pastoral como deveria sê-lo, devem estimulá-lo para que tenha maior zelo. Se a falta de paixão que deve caracterizar a pregação da Palavra de Deus, os presbíteros regentes devem dar os passos necessários para ajudá-lo a superar tal defeito. E, se a pregação do pastor, em qualquer assunto de maior ou menor importância, não está de acordo com a Escritura, os presbíteros não devem descansar até que o mal tenha sido resolvido." [3] Entretanto, os presbíteros devem oferecer liberdade e recursos para que o seu pastor desenvolva-se e possa oferecer mais ao rebanho.

A autoridade do presbítero
A autoridade dos governadores é puramente ministerial e declarativa. Cada função do Conselho, como o ensino, a admoestação, governo e o exercício da disciplina, devem fundamentar-se na Palavra de Deus. Os presbíteros não possuem autoridade inerente. Não possuem o direito de impor as suas opiniões pessoais, preferências, filosofias sobre o culto, a doutrina, ou o governo da igreja, antes, devem examinar e extrair das Escrituras os padrões e princípios estabelecidos por Deus.

A autoridade do presbítero procede de:
1. A autoridade de Cristo como cabeça da Igreja.
2. Submissão à Cristo como o Senhor da Igreja.
3. A obediência e fidelidade à Escritura Sagrada como única regra de fé e prática.
4. Uma vida de santidade pessoal e familiar.
5. O exercício responsável da sua vocação e dos seus dons segundo o seu chamado.

As funções pastorais
1. Visitar os membros menos assíduos às reuniões da igreja;
2. Resolver os desentendimentos entre os membros;
3. Instar os disciplinados ao sincero arrependimento;
4. Orar por/com todas as famílias da igreja;
5. Consolar os aflitos e necessitados;
6. Supervisionar o bom andamento das atividades da igreja;
7. Exortar aos pais que tragam os seus filhos ao batismo;
8. Ser um pacificador em assuntos controversos;
9. Lembrar aos membros da sua fidelidade com os dízimos e ofertas;
10. Dar assistência e/ou liderar as congregações (quando houver);
11. Auxiliar na distribuição da Ceia do Senhor.

As funções doutrinárias
Os presbíteros em nosso sistema de governo têm a responsabilidade de guardarem a doutrina da corrupção. (1 Tm 3:16; Tt 2:7-8). Entretanto, para isto é necessário:
1. Conhecer o sistema e doutrinas presbiterianas;
2. Zelar pela fidelidade e pureza doutrinária da igreja;
3. Avaliar a qualificação doutrinária do pastor;
4. Examinar os candidatos ao rol de membros da igreja;
5. Discernir os novos “movimentos” que os membros estejam se envolvendo;

As funções administrativas (indivíduo)
1. Representar as necessidades dos membros nas reuniões do Conselho;
2. Zelar para que as decisões do Conselho sejam cumpridas pela igreja;
3. Lembrar os membros dos seus deveres e privilégios;
4. Acompanhar o funcionamento das sociedades e ministérios da igreja;
5. Elaborar propostas e projetos para a edificação da igreja.

As funções administrativas (concílio)
1. Reunir periodicamente para decidir sobre o bem estar da igreja;
2. Divulgar na igreja local as decisões dos concílios superiores (presbitérios, sínodo, SC);
3. Avaliar candidatos ao batismo e profissão de fé;
4. Participar na aplicação da disciplina bíblica para que atinja a sua finalidade;
5. Analisar se a Junta Diaconal está realizando as suas atribuições;
6. Acompanhar o bom andamento das sociedades internas e ministérios da igreja;
7. Avaliar para o envio ao presbitério os candidatos ao sagrado ministério pastoral;
8. Participar da ordenação e instalação de novos pastores e presbíteros;
9. Representar a igreja local nos concílios superiores.

Notas:
[1] F. Wilbur Gingrich & F.W. Danker, Léxico do N.T. Grego/Português (São Paulo, Ed. Vida Nova, 1993), p. 83.
[2] Louis Berkhof, Teologia Sistemática (Campinas, LPC, 1990), p. 590.
[3] R.B. Kuiper, El Cuerpo Glorioso de Cristo (Michigan, T.E.L.L., 1985), p. 132.

Rev. Ewerton B. Tokashiki

24 janeiro 2007

A justiça de Deus

Uma definição simples da justiça divina é que ele é o atributo que reflete a integridade moral de Deus. A justiça de Deus não inocenta os culpados, por mais escondidos que eles estejam, nem culpabiliza os inocentes, por mais caluniados que eles sejam. Deus é onisciente e conhece a dimensão exata da nossa culpa, e também sabe quando alguém está transferindo sobre outrem uma falsa culpa. Assim, quando Adão lançou a sua acusação contra Deus e sua esposa, pelo seu pecado, o Senhor puniu todos segundo a iniqüidade de cada um. Não há injustiçados nem omissões no tribunal divino.

A justiça de Deus tem motivo certo e medida certa. Embora a santidade ofendida seja de grau infinito, exigindo uma punição eterna, ela não será aplicada nos escolhidos de Deus, pois, esta punição foi imputada no amado Filho, sobre a cruz. Mas, por causa do Seu redentor propósito eterno, Ele decidiu condicionar o Seu perdão ao nosso arrependimento (At 3:19). Ele nos pune para manifestar a Sua glória, sem excessos, corrigindo e educando-nos para vivermos a Sua santidade, à imagem de Cristo.

A justiça de Deus não é negociada, não é comprada, nem é subornada. A Sua justiça muitas vezes, ao nosso parecer, é lenta: porque ela não está a serviço de poder econômico algum, de poder político algum, de religioso algum. Deus é independente de qualquer necessidade e absoluto em Suas decisões. Nada pode intimidá-lo na aplicação da Sua justiça. Ninguém pode manipular os resultados dos Seus juízos, nem torcer aos padrões da Sua retidão.

Deus retribui a cada um segunda a sua medida. A justiça de Deus separa o falso do verdadeiro, o joio do trigo, o fingido do autêntico, o condenado do perdoado, o incrédulo do crente, o perdido do salvo. A justiça de Deus coloca de um lado as boas obras meritórias e do outro, as boas obras produzidas pelo coração purificado e agradecido. Deus é inerrante em Suas sentenças, bem como é exato em suas recompensas.

A justiça de Deus traz à tona os pecados não confessados nem abandonados, e joga no lixo os pecados arrependidos. A justiça de Deus é terrível para aqueles que amam mais a impiedade do que a Sua santidade. Ela se manifesta agora de forma esporádica e há de se revelar no futuro próximo de forma conclusiva. É o que chamamos de juízo final! A Escritura declara em tom absoluto e solene: Deus é justo juíz, Deus que sente indignação todos os dias (Sl 7:11).

Rev. Ewerton B. Tokashiki

13 janeiro 2007

Todos devem ser teólogos

Meu querido leigo, leigos precisam ser teólogos. Não, eles não necessitam ser teólogos profissionais. Eles não precisam estudar grego e hebraico. Nem carecem necessariamente serem capazes de instruir outras pessoas. Mas, eles devem ser teólogos. Isto é, devem conhecer a Deus. Precisam fundamentar o seu conhecimento a respeito de Deus. Não podem se excusar de terem claros e corretos conceitos acerca da Deidade, desculpando-se de não serem ordenados para trabalharem na igreja em tempo integral, entretanto, eles foram chamados para algum outro serviço.

por Dr. John H. Gerstner

Extraído de http://www.the-highway.com/theology1_Gerstner.html [13/01/2006]

Traduzido por Rev. Ewerton B. Tokashiki

12 janeiro 2007

A santificação

Escrito por A. A. Hodge e revisado por B.B. Warfield

A santificação (do latim sanctificatio [derivado de sanctificare, santificar; sanctus, santo] tradução do grego agiazein, consagrar, fazer santo, derivado de àgios, santo) é a obra da graça de Deus pela qual aqueles que crêem em Cristo são libertos do pecado e fortalecidos, edificados em santidade. Na teologia protestante ela é distinta da justificação e da regeneração, as quais se encontram em sua raíz, e que não está separada, de fato, de nenhuma das duas; entretanto, o termo justificação está limitada ao ato ou sentença judicial por parte de Deus, pela qual o pecador recebe o favor de Deus, em consideração do que Cristo fez em seu favor, e dela a santificação é a execução eficiente; e o termo regeneração se limita ao ato eficiente inicial pelo qual se implanta a nova vida, da qual a santificação é o desenvolvimento progressivo. Tanto a regeneração como a justificação são atos momentâneos, e atos de Deus em que o pecador permanece passivo; a santificação, por outro lado, é uma obra progressiva de Deus, na qual o pecador coopera.

A natureza da santificação, como o seu método e a relação dos fatores divinos e humanos em sua seqüência, são concebidas de diferentes modos pelos vários tipos de teologias:

1. A visão Pelagiana e a Racionalista excluem totalmente a ação do Espírito Santo; e, faz com que a santificação seja nada mais do que a contínua ação correta, baseada nos poderes inatos do agente moral livre, pela qual gradualmente conquista as tendências da maldade e edifica um carácter santo.

2. A visão Medieval e Romana recusa fazer uma distinção entre justificação e santificação; e faz da justificação e a santificação, o processo da purificação do pecado, e a infusão dos hábitos da graça por parte do Espírito Santo, a causa de Cristo, por meio do instrumento do batismo, pelo qual se condicionam as mudanças subjetivas da remoção da culpa e a recepção do favor divino. 1) Portanto, sustenta-se que é progressiva, e que se fomenta por meio das boas obras, as quais possuem mérito real, que tanto merecem como asseguram o acréscimo da graça. 2) O mesmo ocorre por penitências, orações, jejuns, etc., que satisfazem a justiça de Deus e purificam a alma. 3) Se o crente morrer antes que se consuma o processo da libertação do pecado, ele deve completar no purgatório, cujas dores são expiatórias e purificadoras; e ali pode ser ajudado pelas orações, as missas e o poder dispensador da Igreja na terra. 4) Mas, é possível inclusive, que antes da morte, que um crente se conforme perfeitamente a todas as exigências da lei de Deus no que se ajusta a esta vida. 5) É inclusive possível, por causa do amor realizar um serviço superrogatório.6 Por obediência aos conselhos de Cristo, que têm caráter de conselho, mas que não são obrigatórios até que sejam assumidos voluntariamente. Estes são a pobreza voluntária, o celibato voluntário e a obediência às normas monásticas; e alcançarão mais do que a mera salvação pessoal, pois contribuem com o “tesouro de méritos” à disposição da Igreja, que é imputada naqueles que ostentam a jurisdição dos crentes na terra, ou no purgatório, dos que ainda não foram plenamente justificados.7

3. A visão Mística da santificação, ainda que nunca tenha sido expressa em nenhum credo eclesiástico, existiu como uma doutrina e como uma tendência em todos os períodos, e entre todas as denominações cristãs. O misticismo cristão deprecia a dependência da alma na revelação objetiva da palavra de Deus, e a necessidade dos meios de graça e o esforço humano, e enfatiza a intuição espiritual, o valor regulativo do sentimento religioso, a comunhão física da alma com a substância de Deus, condicionada pelo silêncio e a passividade da mente. Tais enfoques se difundiram grandemente na Igreja através dos escritos do Pseudo-Dionísio, que foram publicados em grego no século VI, e traduzidos para o latim por John Scotus Erigena, no século IX. Estes influenciaram no ensino de muitos eminentes eruditos evangélicos, tais como Bernardo de Clairvaux, Hugo y Ricardo de Saint Victor, e conseqüentemente Thomás de Kempis. Foram ensinados com grande influência entre os primeiros protestantes como Schwenckfeld (1490-1561), Paracelso (1493-1541), Weigel (1533-1588), e Jacobo Bohme (1575-1620); e entre os católicos romanos como São Francisco de Sales (1567-1622), Molinos (1640-1697), Madame Guyón (1648-1717), e o Arcebispo Fenelon (1651-1715). Os Quáquers originais sustentaram ênfases semelhantes, como se pode verificar nos escritos de George Fox (1691), William Penn (1718), e Robert Barclay (1648-1690). Uma visão mística está presente cada vez que a santificação se concebe, não como a meta do esforço, mas como um dom imediato que alma que espera receber.

4. A doutrina evangélica da santificação, comum nas Igrejas Luteranas e Reformadas, inclui os seguintes pontos: 1) A alma, após a regeneração, continua dependendo das constantes operações de graça do Espírito Santo, mas é, por meio da graça, capaz de cooperar com elas. 2) As operações santificadoras do Espírito são sobrenaturais, e não obstante, efetuados em conexão com, e através da instrumentalidade dos meios: sendo os meios da santificação, sejam internos, tais como a fé e a cooperação da vontade regenerada pela graça, ou externos, tais como a palabra de Deus, os sacramentos, a oração, a comunhão cristã e a disciplina providencial do nosso Pai celestial. 3) Neste processo o Espírito completa gradualmente a obra de purificação moral começada na regeneração. A obra tem duas operações: a) a limpeza da alma do pecado e a emancipação do seu poder, e b) o desenvolvimento do príncipio implantado da vida espiritual e os hábitos implantados pela graça, até que o indivíduo chegue a estatura do varão perfeito, em Cristo. O seu efeito é a transformação espiritual e moral do homem total, o intelecto, os afetos, a vontade, a alma e o corpo. 4) A obra continua com vários graus de rigorosidade durante a vida, mas nunca se alcançará a absoluta perfeição moral até que o sujeito seja glorificado.

Em oposição a esta doutrina é ensinado uma teoria da santificação perfeccionista nesta vida, a partir de vários pontos de vista distintos. Segue alguns casos:

1. Segundo os príncipios do Pelagianismo, é perfeito um homem que obedece as leis de Deus até a medida da sua habilidade natural presente, sendo que a lei moral é uma escalada, ajustando as suas exigências às várias habilidades do sujeito; e isto é possível para cada homem.

2. Conforme a idéia Mística a perfeção consiste na assimilação da essência divina, ou, numa forma menos extrema, na assimilação dos desejos e a vontade humana na vontade divina, num amor desinteressado; e, isto pode ser alcançado através de um persistente desprendimento do ego e a meditação em Deus.

3. Segundo a teoria Católica Romana, ou Ritualista, a perfeição consiste na perfeita conformidade da lei de Deus, ajustada – pela graça misericordiosa de Cristo – às capacidades do homem regenerado nesta vida; e esta perfeição se alcança por meio das obras meritórias e as penitências, as orações, os jejuns, os atos voluntários de auto-negação, e a obediência eclesiástica. Isto não somente se encontra ao alcance dos homens, mas está incluso no rendimento de um serviço superrogatório na forma de uma auto-negação extra legal a partir de um príncipio do amor evangélico.

4. A teoria wesleyana da perfeição concebe que a satisfação e o mérito de Cristo fazem que seja consistente com a justiça divina oferecer a salvação aos homens em termos mais fáceis que a antiga lei Adâmica da perfeição absoluta; e essa perfeição é alcançada quando se cumpre com estes termos: “o carácter cristão se valoriza pelas condições do evangelho; a perfeição cristã implica no desempenho perfeito destas condições, e nada mais.”8

Notas:
1 Concílio de Trento, sessão 6, canônes 7.
2 Concílio de Trento, sessão 6, canônes 32.
3 Concílio de Trento, sessão 14, cap. viii; sessão 6, canônes 29 e 30.
4 Bellarmin, O Purgatório., ii. 9.
5 Concilio de Trento, sessão 6, cap. xvi, canônes 25.
6 Superrogação: ação executada acerca, ou além das exigências da obligação.
7 Bellarmino, De Monachiis, cap. vi e vii.
8 João Wesley, A Perfeção Cristã (São Paulo, Imprensa Metodista, 1990).

Traduzido por Rev. Ewerton B. Tokashiki

06 janeiro 2007

Amado Timóteo: uma resenha

A Editora Fiel acertadamente lançou um livro com o título Amado Timóteo. Esta obra é uma série de cartas fictícias com conselhos práticos forjados pelos anos de experiência baseados em princípios bíblicos do exercício do ministério pastoral. São recomendações especificamente na área familiar, pregação, ensino, aconselhamento e liderança.

As sugestões são endereçadas ao Amado Timóteo. Embora seja útil a todos os pastores, ele é dedicado a um [fictício] jovem pastor batista chamado Timóteo, de 26 anos, recém formado, com apenas seis meses de experiência pastoral na Primeira Igreja Batista, casado com Mary, têm um filho e está grávida. Ele contactou vários ministros e lhes pediu conselhos para um ministério pastoral bem sucedido. A partir deste contato, os pastores retribuem com os seus conselhos demonstrando certa intimidade com o jovem Timóteo, de modo semelhante com o velho apóstolo Paulo.

Os autores que contribuiram são ministros de renome por sua formação acadêmica e larga experiência pastoral, a maioria é batista e alguns presbiterianos. Todos os articulistas na época que escreveram estavam pastoreando alguma igreja local, e são ministros dedicados à formação acadêmica dos pastores. São homens que equilibram a erudição e o pastoreio provando que não há necessidade de dicotomizar a piedade e uma boa formação acadêmica para serem bons pastores.

O organizador Thomas K. Ascol tem divulgado o Calvinismo entre os batistas. Mesmo dentro da Convenção Batista do Sul dos EUA que tem a tradição de ser calvinista, este sistema doutrinário tem enfraquecido e perdido a sua influência nos Seminários e púlpitos daquela denominação. Por isso, os founders têm escrito e divulgado o Calvinismo na tentativa de provocar um retorno às raízes[ www.founders.org ]. Este livro é outro projeto nesta direção. Entretanto a obra tem uma proposta maior do que simplesmente apontar uma identidade denominacional. A pretensão de indicar referências mais bíblicas do que os modelos pastorais que têm se estabelecidos no contexto do pós-modernismo norte americano. O surgimento de pastores que são showmen, executivos, estrategistas pragmáticos, etc.. Padrões estranhos que tendem a levar fogo estranho ao altar do Senhor.

No final de cada capítulo, o autor oferece uma lista de leituras que poderão complementar o assunto discutido. Algumas sugestões são repetitivas, creio que outros autores merecem ser citados além dos que são exclusivamente calvinistas. Entretanto, entendo a preocupação de indicar obras de um perfil muito restrito, para se evitar que os jovens ministros bebam em fontes duvidosas. Mas, por ser uma obra de publicação recente [Founders Press, 2003] os autores poderiam indicar obras mais atualizadas.

Embora os autores sejam norte americanos e vivam em outro contexto social e econômico, pode-se perceber que os problemas eclesiásticos e as preocupações pastorais são as mesmas. Não podemos esquecer que a verdade é absoluta e desdobra-se em princípios universais que podem reger os mais diferentes contextos do rebanho de Cristo.

Creio que todos os seminaristas que estão se formando, licenciados para a ordenação, recém ordenados, e mesmo pastores experientes deveriam ler este livro. Quer seja para repensar, ou uma sugestão de ministério, esta obra será muito útil para [re]examinarmos o nosso chamado e o nosso exercício pastoral. Este livro não se propõe a lançar um perfil pastoral, mas apontar um modelo fundamentado em princípios bíblicos que nos alerta dos perigos e doenças que cercam e ameaçam o pastor e o rebanho de Cristo. Boa leitura.

Rev. Ewerton B. Tokashiki