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Costa Nova ♡



























A par do mar de Lagos e de todos os significados que aquele sul tem na minha vida e que registo aqui a cada Verão, o mar atlântico da Costa Nova. E, tal como acontece com Lagos, não é só uma questão de água, de praia. Tem que ver com a alma dos sítios perto destes dois mares que significam muitas coisas que são só boas. Gratas de lembrar e de viver repetidamente. Tantas e tantas vezes que, estando eu noutra geografia, noutros contextos, vou com a memória até estes dois lugares. E, só por me lembrar, só por evocar, só por saber que, aconteça o que acontecer, há estes dois lugares na minha vida, tudo está bem. Nesta página, a Costa Nova, tal como ela é em mim. E, tal como acontece com o mar de Lagos, sinto sempre que nunca consigo dizer as coisas. Dizer mesmo. 
A Costa Nova é um lugar que encanta. O primeiro impacto é sempre esse. Quem nunca esteve, chega e encanta-se. É o efeito primeiro do lugar. As casas às riscas que parecem de história de crianças. A água da ria sempre perto. Aquele carácter náutico da Costa Nova. A vida a acontecer ali. E isso não se circunscrever ao Verão. Nada disso. A Costa Nova é de gostar sempre. É um lugar de ano inteiro. Mesmo nos dias cinzentos. Mesmo quando o mar está zangado. A vida acontece na mesma. O mercado e as pessoas do mercado e todas as coisas que ali são tanto, não são uma coisa de meteorologia. Os peixes e os frutos e os legumes e tudo o que sempre há nos mercados. E o único calendário que interessa é o das estações, de como elas fluem. Mais as redes dos pescadores e o que elas trazem a cada dia que amanhece. É isso.
Do mercado, os peixes. Primeiro, é por aí. É isso que vai determinar tudo o mais que vai acontecer à mesa. Depois do som de fundo da parte do peixe, a espécie de quietude na parte dos legumes e das frutas. É mais sereno, ali. E isso é bom, porque é preciso pensar com calma nos aromas que vão fazer brilhar os peixes. No dia das imagens, a surpresa boa das primeiras favas. Assim pequenas e frágeis. Mais as ervilhas de quebrar. E bolbos de funcho. E, a partir daí, pensar que, independentemente dos peixes, teria de haver um espaço na refeição dedicado só às favas. Esta comida que fica hoje. Nesta página que tem dentro o sol, o sal, o vento, a água atlântica da Costa Nova. E aquelas tais coisas que nunca consigo dizer bem. Mas que são o sítio, tal como ele acontece em mim a cada vez. O pão do Vale de Ílhavo mais o folar doce, que vou buscar ao Supermercado Alcibíades, uns passos depois do mercado. É ali que estas duas coisas são como devem ser, por chegarem ali vindas dos sítios onde as fazem como elas devem ser feitas. E o sal da Ria de Aveiro. Cristais lindos que parecem matéria preciosa. E até que são isso. Uma coisa que não se compra, mas que faz com que este supermercado seja um lugar especial, apesar de parecer um supermercado igual a tantos outros, é mesmo a simpatia e a alegria das pessoas. E que assim seja sempre, penso sempre. Mais os cestos lindos da cestaria que há à entrada da Costa Nova, quem vem de Aveiro. E esta loiça, feita ali perto e que encontro em Aveiro, numa loja no Mercado Manuel Firmino. Mais a música e os concertos do Cais Criativo. E os céus à noite na parte de cima da edificação náutica que é mesmo um cais, um porto de abrigo e de onde se ouve o rumor do mar, nos intervalos ou no final dos concertos especiais que acontecem neste sítio. 
Fica esta enumeração luminosa da (minha) Costa Nova. As imagens que são de coisas acontecidas, já passadas. As petingas, só com umas pedras de sal e passadas por farinha, antes de óleo quente e isso ser uma coisa só muito boa. Bem de mar. As azeitonas vindas do mercado e que tempero mal chego a casa. Alho e talos de coentros picados e azeite. E deixar estar. O pão, cortado de imediato, para não tardar na mesa. O sal. E as lulas, tal como as faço a sul e de que já deixei receita aqui. A salada de tomate com rama de funcho muito fresca. O vinho leve que aconteceu muito bem com estas e com outras coisas que não registei. E, depois de tudo, depois da mesa e dos silêncios e das conversas todas, este livro. É do género de não desvendar quase nada, porque se estraga tudo, mas basta dizer que nos coloca perante a última e grande questão: e se fosse possível não morrer nunca? Ou, no limite, escolher quando e como morrer. Sim. Não. Mas, mais do que tudo, o como. E todas as outras questões (interiores e nem tanto) que esse como levanta. E sim, sem estar com grandes coisas relativamente à poesia nobelizada de Bob Dylan, não se percebe como é que um escritor como Don Delillo não recebeu em casa uma carta igual à que Bob Dylan fingiu não ter recebido. E, antes de Don Delillo, o Philip Roth. Agendas. E, mais do que tudo, termos incomparáveis. Escritores como Don Delillo e Philip Roth são outra coisa. Outra coisa.  

Favas com batatas novas, funcho e bacon

300 g de favas (descascadas) + 1 bolbo de funcho (pequeno) + 2 dentes de alho + 1 tomate + 10 batatas novas (pequenas) + um punhado de ervilhas + 6 fatias de bacon + sal, azeite, rama de funcho e vinagre de arroz q.b. 

Primeiro, coze-se as batatas com a casca, em água e sal. Corta-se o bolbo de funcho em fatias finas e pica-se os alhos. Quando as batatas estiverem cozidas, retiram-se para um escorredor, passando água fria, para suspender a cozedura. Entretanto, leva-se o bacon ao forno, num tabuleiro e deixa-se estar durante cerca de 5 minutos, a 170º C. Depois, leva-se o funcho e os alhos ao lume numa sertã larga, num fio generoso de azeite. Quando o funcho começar a ficar translúcido, acrescenta-se as batatas, salpica-se com sal, rega-se com um bocadinho de azeite e um pouco de vinagre de arroz. Mistura-se, usando duas colheres de pau. A seguir, as favas, as ervilhas e o tomate (sem a casca e partido em pedaços). Envolve-se bem e deixa-se estar durante cerca de três minutos. Retira-se e coloca-se em porções nos pratos, tendo o cuidado de garantir que todos têm todos os elementos. Por cima, duas fatias de bacon e rama de funcho "rasgada" com as mãos, por cima dos pratos, para o sabor estar por inteiro. Depois, a parte de cada prato ser servido. E aquele silêncio bom, a partir daí:) 

A música é esta. Palace. Live well. Faz sentido. Para este lugar. Para esta página. Para tudo. Viver bem. 

De agora.












Há coisas que implicam mesmo paciência. E não há volta a dar a isso. No caso das favas, é essa a palavra que me ocorre logo, imediata. Esse exercício de paciência começa no momento de as escolher. As vagens mais curtas, que são as que têm dentro as favas mais tenras, as mais pequenas. São essas as escolhidas. A primeira coordenada para que o resultado final seja leve, aromático, a corresponder ao espírito da Primavera. Depois disso, é sentarmo-nos, sem estarmos a pensar que temos de ir não sei para onde e irmos abrindo as vagens. A seguir, a parte do processo que implica mais paciência: retirar as cascas. Um dado que requer entrega e calma, mas que vale a pena. Porque é assim que sabemos que não vamos ter favas encarquilhadas e amarelas. Serão verdes. Por isso, para mim, a ideia fundamental do processo de cozinhar favas, é tomar conta desse verde.
Eu nunca gostei assim muito de favas. Especialmente nas versões mais habituais. E sim, invariavelmente com aquele tom amarelo, a esconder tanta beleza interiormente verde. Um prato pesado, do qual comia o mínimo possível, exactamente porque, no meu entendimento, o efeito da comida não deve ser esse. Na comida, como em muitos outros aspectos, preservo só a parte do prazer e as outras deito fora, como com as cascas das favas. 
Previamente cozidas, para que libertem aquele odor pouco agradável. Três minutos em água a ferver e resolve-se esse problema. Salteadas, a seguir. Dois, três minutos. O que interessa é que fiquem como na imagem, um bocadinho suadas e com o verde intacto. 
Tal como acontece com as ervilhas de quebrar, ficam maravilhosas, associadas a batatas novas e ao final solar de um ovo escalfado. E o tomilho. Tomilho fresco fica mesmo bem. Logo no início, quando se está a saltear as batatas e as favas. E depois, no final de tudo. Pouco antes de servir. Com este vinho tão especial. Quando gostamos muito de uma coisa, procuramos repeti-la. E é assim, com as palavras do Herberto Helder. Neste caso, o livro póstumo. De agora, também. Assim como as favas. Só que um livro tem qualquer coisa de para sempre. Livros destes são sempre para sempre. 

Favinhas salteadas com bacon, batatas novas e tomilho
Quantidade para 2 pessoas 

150 g de favinhas (peso depois de descascadas) + 8 batatas novas (médias, cortadas em quartos) + 1 cebola (média) + 2 dentes de alho (picados e com um pouco da casca) + 4 fatias de bacon nesta versão e 4 tiras de bacon nesta versão (deliciosa) + um pouco de vinho branco + ovos para escalfar + sal, azeite, vinagre de sidra, pimenta preta e tomilho q.b. 

Primeiro, coze-se as favas durante três minutos, em água que já esteja a ferver. Retira-se, passa-se para um coador e por muita água fria, para suspender a cozedura. Reserva-se. A seguir, coze-se as batatas e faz-se o mesmo de passar por água fria, depois de cozidas. Coloca-se as batatas novamente na panela onde estiveram a cozer, salpica-se com um pouco de sal, um fio de azeite, um pouco de vinagre de sidra e umas folhas de tomilho. Reserva-se. Numa sertã, leva-se ao lume a cebola picada, os alhos, o bacon e duas ou três hastes de tomilho. Quando a cebola ficar translúcida, junta-se um pouco de vinho branco e deixa-se evaporar. A seguir, acrescenta-se as favinhas e vai-se salteando durante cerca de dois minutos. Enquanto isso, leva-se a panela das batatas ao lume, para aquecer ligeiramente no tempero. Ao mesmo tempo, escalfa-se os ovos (três minutos em água quente, mantida ao lume) e coloca-se as fatias de bacon no forno a 210ºC. Para servir, basta colocar as batatas num prato fundo, a seguir o salteado e, bem no final, aquele final lindo do ovo escalfado e de duas fatias de bacon a estalar. Uma haste final de tomilho, uns salpicos de pimenta preta e está. Fatias de pão, vinho branco bem perto e acontece uma espécie de magia:) 

E ballet clássico em Nova Iorque. Cerca de quatro minutos bem lindos. 


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