As histórias do Verão são quase sempre feitas do que acontece fora do nosso tempo e espaço habituais. E isso é bom e faz parte das narrativas. Mesmo que o nosso tempo seja (demasiado) ostensivo a esse e a outros propósitos. Mas, guardando e preservando a distância e o silêncio certos, está tudo bem. É (quase) sempre uma questão de sabermos onde é que nos situamos. E assim, o mundo continuará no seu ritmo próprio. Frenético e impaciente. E longe. Lá longe.
Antes de tudo o que no meu Verão acontece longe dos sítios onde me movo, no maravilhoso todos os dias de todas as estações, gosto muito de viver demoradamente a casa. De a ouvir nos seus silêncios e nos seus respirares. De lhe conceder o tempo que não é possível no resto do tempo. Das renovações que sempre acontecem nesta altura do ano. Às vezes há barulho e caos e pó e cheiro a tintas e todas as coisas próprias da vontade de mudar coisas, de as imaginar de outra forma. Terminado esse tempo de caos, algo em nós se renovou também. E então, as coisas fora de nós mudam e nós com elas. Sem darmos conta. Sem premeditarmos. Melhor assim, creio.
E há sempre a comida. E o encantamento que não (me) morre nunca. Aquilo de ficar bem feliz com o cheiro do manjericão e do alecrim e dos orégãos e da hortelã, com as cores imprevisíveis dos pêssegos, com as amoras acabadas de colher, com as cebolas e com as batatas novas, com os figos, com as mesas diárias no jardim e que são sempre cheias e naturalmente desorganizadas, por mais que eu as organize previamente. Mas o que eu gosto das mesas depois. Gosto muito do antes. Mas adoro olhar uma mesa depois de mais um jantar lá fora. Os guardanapos fora de lugar. Os copos misturados, a dar conta da sequência da refeição. Os objectos soltos a contar a história de cada uma destas noites de Verão. Tão bom. Aqui. Agora. Todos os dias. O futuro que espere. Sempre e só mais um bocadinho.
Como andei bastante irregular no registo das coisas que amo tanto, este post tem mais do que um livro. Se não o fizesse, andaria em Setembro a deixar livros que li em Janeiro ou assim:) E eu gosto que este meu sítio guarde a cadência do que é próximo, vivido perto do momento. Mas foram semanas de mudanças profundas e extremas na minha vida, tal como ela foi nos últimos anos. Deu para continuar a fazer comida e a pôr mesas, a ler pelas noites dentro e para outras coisas. Muitas outras coisas. Mas não deu para ir registando aqui. Precisava que as palavras encerrassem capítulos. E que fossem silêncio, também. Nesse silêncio, as palavras dos outros. Dos que escrevem/escreveram os livros que fui escolhendo ler. Este. E este. E este. E este. E este. E, antes de respirar fundo e (tentar) avançar para estes volumes míticos que ando a adiar há anos, este livro-prelúdio de Marcel Proust. Pelo meio disto tudo, chá de hortelã, limão e gengibre. Muito fresco. Água quente, primeiro. Hortelã. E deixar estar até arrefecer. Depois, é só retirar os ramos de hortelã, juntar açúcar (se se quiser assim), rodelas de gengibre e de limão. E gelo. E está. A receita breve do chá que amenizou os dias em que o calor foi impiedoso.
A música é esta. Tame Impala. List of people (to try and forget about).