FERREIRA GULLAR Suspensão das hostilidades no conflito é provisória e vem após perdas lamentáveis
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O HORROR que tenho à violência me leva a admitir que o pior dos acordos é melhor que uma guerra. Nem todos o admitem, mesmo porque as coisas não são tão simples quanto podem parecer, já que às vezes mostrar-se disposto a ir à guerra pode ser um fator importante para evitá-la.
Desentendimentos que envolvem povos e nações são sempre muito complexos e de difícil superação. E quando remontam a disputas antigas, que já resultaram em mortes e perdas de todo tipo, superá-los é ainda mais difícil. Ir à guerra é mais fácil, mas, na maioria dos casos, também não resolve. O conflito entre Israel e palestinos é exemplo disso: 60 anos de atentados, bombardeios e combates, intercalados de tréguas que levaram a novos massacres, mortes e destruição.
No momento em que escrevo, as tropas de Israel começam a se retirar da faixa de Gaza, dando início a uma trégua, de fato inevitável, uma vez que nenhum dos contendores tem capacidade de derrotar definitivamente o outro. Ao contrário do que gostaríamos que ocorresse, essa suspensão das hostilidades tende a ser provisória e vem, não antes, mas depois de perdas lamentáveis. Teremos assim mais uma precária pausa na interminável e sangrenta disputa entre os dois povos.
Quem tem acompanhado o desenrolar dessa questão sabe que os dois lados se julgam com a razão e é exatamente por isso que o conflito não termina: "A razão está conosco, eles se apossaram de nossa terra, logo, ou nos devolvem o que é nosso ou seremos obrigados a tomá-lo pela força". Isso, de um lado; enquanto o outro lado argumenta: "Não tomamos nada de ninguém, temos o direito de estar onde estamos e repeliremos toda e qualquer tentativa de nos expulsar daqui". Mas de que adianta ter razão e viver no inferno?
Como se sabe, esse conflito começou em 1948, depois que a ONU decidiu pela criação de dois Estados, um palestino e outro judeu, mas os palestinos não acataram essa decisão, alegando que aquele território lhes pertencia desde sempre. Mesmo assim, o Estado de Israel foi implantado, resultando na expulsão de milhares de palestinos. Criou-se a OLP (Organização para Libertação da Palestina) que prometeu "jogar os judeus no mar".
Em 1967, Gamal Abdel Nasser, presidente do Egito, liderou uma frente anti-Israel, a que aderiram a Síria e a Jordânia, cujas tropas se preparavam para invadir o território israelense quando foram surpreendidas por uma ofensiva fulminante que as derrotou, resultando na ocupação, pelo Exército israelense, das colinas de Golã, de parte da Cisjordânia e da península do Sinai. Finda a guerra, o governo israelense negou-se a desocupar aqueles territórios, alegando que esse era o modo que tinha de evitar os ataques a seu país. Esse é ainda hoje um dos principais entraves à pacificação.
De lá para cá, houve alguns progressos que aliviaram as tensões na região, como o acordo de paz firmado por Israel com o Egito e a Jordânia. Em 1993, foi assinado o Acordo de Oslo, que abriu caminho para o convívio pacífico entre israelenses e palestinos. Alguns territórios foram devolvidos por Israel, inclusive a faixa de Gaza, hoje ocupada pelas forças do Hamas.
Foi a impossibilidade de destruir o Estado de Israel que levou Yasser Arafat a concordar com a criação do Estado palestino e o convívio pacífico com ele. Esta é a posição, hoje, de Mahmoud Abbas, sucessor de Arafat. Os líderes do Hamas não concordam com isso: mantêm-se na posição palestina de 60 anos atrás, exigindo o fim de Israel. Logo, para eles, a paz é inaceitável, pois, como Israel não admite autodissolver-se, só a guerra pode acabar com ele. Mas como, se o Hamas não tem poder militar para isso?
Já que essa é a realidade, resta entender por que então, sabendo que sofreria implacável represália, insistiu em atirar foguetes sobre cidades israelenses. Pode-se especular que seu verdadeiro propósito era de fato provocar a reação furiosa de Israel e, com o martírio de sua gente, ganhar o apoio dos países árabes para, assim, como ocorreu em 1967, juntá-los numa frente militar capaz de expulsar os israelenses daquela parte da Terra Santa que lhes pertence.
Pode ser, pode não ser, mas custa crer que alguém provoque um conflito dessas proporções, sabendo que não o vencerá, apenas para irritar o inimigo. De qualquer modo, a verdade é que, na tentativa de anular as ações do Hamas, Israel fez crescer ainda mais o ódio dos palestinos e desgastou-se diante da opinião pública internacional, particularmente no mundo árabe.
A paz parece mais longe ainda.