Eu gosto muito de ler os comentários
porque me informam como as mensagens estão a ser interpretadas pelo leitores. Em particular, houve uma dúvida muito interessante (colocada pelo Vegaspar) e que persiste desde que foram criadas as ciências da natureza. Mas é uma "pergunta de algibeira" porque não pode ser respondida pela própria Ciência. Prova de que esta pergunta é apenas destrutiva é o facto de o meu colega e arqui-inimigo Pimenta a ter colocado nas minhas Provas de Agregação.
E também gosto de ver as fotografias dos meus seguidores. Mas o que me causa mais alegria é ir a um sitio qualquer e pessoas com quem nunca tive contacto físico virem falar comigo porque me conhecem do blog.
Fig. 1 - Agradeço a todos os meus seguidores e leitores
A pergunta epistemológica.
Será que o comportamento humano, mesmo sendo o resultado de múltiplas contingências, tem Leis da Natureza que possam ser compreendidas pela humanidade?
Se a resposta for negativa então, não haverá lugar para a Economia enquanto ciência que estuda as decisões dos seres humanos quanto à afectação dos recursos escassos e termos que confiar no vazio.
O Vegaspar acha que a resposta é negativa.
Como "as pessoas ... são muitos menos previsíveis do que as máquinas" então, a Economia não pode conter conhecimento sobre o comportamento humano quanto à afectação dos recursos escassos.
De facto, o Vegaspar tem dúvidas que a resposta seja negativa porque utiliza "muito menos previsível" e não "totalmente imprevisível".
A questão epistemológica da existência da Ciência.
A Ciência existe porque são assumidos axiomas que apenas podem ser discutidos pela filosofia e pela religião.
A1 - a Natureza existe.
A2 - a Natureza tem Leis.
A3 - a Humanidade pertence à Natureza.
A4 - a inteligência humana é capaz de compreender as leis da Natureza.
A Ciência não pode questionar estas questões porque a sua não verificação faria com que a Ciência deixasse de existir e, não existindo, a sua conclusão de que as condições não se verificam ficaria sem efeito.
Seria como cada um de nós tentar julgar se existe.
S. Tomás de Aquino pensou ter provado a sua existência com "Peco, logo existo" e Descartes com "Penso, logo existo" mas estavam errados pois isto é uma tautologia que parte do pressuposto de que só o que existe é que peca (STA) e que pensa (D).
Mas vamos supor que eu não existo. Então, como penso, fica provado que o que não existe também pensa.
Então, pensar (ou pecar) não é prova suficiente da minha existência.
Claro que o estimado leitor vai dizer que a minha conclusão (não existo e, no entanto, penso) não faz qualquer sentido lógico, mas a lógica parte de premissas e nunca pode a conclusão lógica dizer que as premissas estão erradas.
Fica então claro que nós não podemos, com ciência, provar que existimos.
A previsibilidade da Natureza, a compreensão humana e o conhecimento.
Se a Natureza não tivesse leis, seria totalmente imprevisível.
Se a nossa inteligência fosse incapaz, a Natureza seria previsível mas nós não a conseguiríamos compreender.
Então, a nossa falta de conhecimento resulta de somar a imprevisibilidade da Natureza com a nossa incapacidade. Como não é possível separar estas duas parcelas, a Ciência assume que a Natureza é perfeitamente previsível e que toda a falta de conhecimento resulta da nossa pouca inteligência.
Fig. 3 - Primeira Lei da Natureza: quem pousar aqui a mãozinha, leva estalo.
A Estatística.
Mesmo assumindo que a Natureza tem leis perfeitas, a limitação da inteligência humana implica que o grau de detalhe do conhecimento será sempre limitado.
Havendo Leis da Natureza, até que detalhe poderá ir o conhecimento destas leis?
A humanidade desenvolveu a Estatística para compreender, em termos de valores médios, as Leis da Natureza mais complexas.
Temos que distinguir o comportamento do individuo do comportamento das grandezas agregadas.
Uma coisa é eu prever se o meu vizinho se vai suicidar nos próximos 12 meses e outra coisa é eu prever quantas pessoas, entre as 10.6 milhões, se vão suicidar em Portugal nos próximos 12 meses.
Apesar de a decisão individual ser altamente difícil de prever, se compararmos as pessoas que se suicidaram em 2003 com as que se suicidaram em 2006, apesar de não terem sido as mesmas pessoas (é evidente) e as tomadas de decisão terem sido completamente diferentes, existem regularidade à escala agregada.
Por mais incrível que pareça, em ambos os anos a taxa de suicídio é crescente com a idade, cerca de 4%/ano (ver, Fig. 2).
Apesar de eu não fazer a mais pequena ideia de qual será a propensão do meu vizinho para se suicidar, eu sei que, em média, a probabilidade de ele se suicidar aumentará com o envelhecimento, cerca de 4% por cada ano.
Fig. 4 - Suicídios em Portugal por cada 100000 homens (Dados:
NES)
Vamos ver o que acham desta pergunta.
Existem duas padarias a menos de 50 m de minha casa.
Vamos supor que cada padaria vende 5000 pães por dia a 0.10€/pão e que o custo de produção é de 0.08€/pão. Conclui-se facilmente que o lucro de cada padaria é de 100€/dia.
Vamos agora supor que, como estamos a lidar com pessoas, se for como diz o Vegaspar, o seu comportamento é totalmente imprevisível.
Então, se uma das padarias aumentar o preço para 1.00€/pão, será totalmente imprevisível o que as pessoas vão fazer. Se calhar, ainda vai vender mais pães vindo o seu lucro exponencialmente maior.
Alguém acredita nisto?
Apesar de os estimados leitores serem seres humanos imprevisíveis, prevejo com confiança que não acreditam que padaria que fixar o preço para 1.00€/pão vá vender mais. Acreditam, penso eu, que essa padaria vai ficar sem clientes e a outra vai ficar com os clientes todos.
Mas não estamos a tratar com pessoas que são, em termos individuais, imprevisíveis?
Estamos e por isso é que não posso garantir que não haja uma única pessoa que não compre um pão por 1.00€ mas a maioria não vai comprar.
Vejamos como funciona a Estatística.
Vou comparar o comportamento humano a um jogo de sorte e azar.
Uma pessoa atira um dado de que pode resultar o número 1, 2, 3, 4, 5 ou 6.
Depois, tira esse número de cartas de um baralho com reposição e soma os pontos (as figuras valem 10 pontos).
A pessoa escreve num papel os pontos que obteve.
Olhando para uma pessoa.
O conhecimento que eu tenho sobre o número que a pessoa tem escrito no papel é muito pequeno. Sei que será um número qualquer entre 1 e 60 e posso determinar a função distribuição.
Se fosse pedido que avançasse um intervalo com uma amplitude de 2 como previsão, a probabilidade de errar seria muito grande (a melhor previsão seria entre 22 e 24).
(A probabilidade de eu errar seria de 93%).
Vou agora pegar em 100 pessoas e calcular a média.
Agora, em vez de uma pessoa, tenho a média de 100 pessoas.
Eu ainda não sei em concreto quanto vai dar a média mas, se eu repetir várias a experiência, em 95% das vezes, a média dos pontos das cartas vai estar entre 19.29 e 26.53.
A probabilidade de eu acertar a minha previsão (cair no intervalo ]22; 24]) ainda é pequena, 40%.
Vou agora calcular a média de 10000 pessoas.
Em média, em 95% das vezes, soma dos pontos das cartas vai estar entre 22.52 e 23.25.
Agora, a probabilidade de acertar (cair no intervalo ]22; 24]) na minha previsão já é de 99.9999%.
E estamos a falar de sorte e azar.
Mesmo que o comportamento humano fosse totalmente aleatório (como o exemplo do lançamento do dado e o sorteio das cartas do baralho) e, por tanto, com pouca capacidade de eu prever uma valor para a variável que estou a estudar, havendo regularidade estatística (cada pessoa extrai as suas cartas do mesmo baralho) então, eu sou capaz de prever o comportamento médio das pessoas.
Sou capaz de prever como as pessoas vão reagir ao aumento do preço (a quantidade de pães vendidos vai diminuir).
Estimado Vegaspar, penso que agora vai acabar de ler o poste.
Quando estamos incapazes de destruir a argumentação lógica dos nossos adversários, uma escapatória que está entranhada nos nossos genes é utilizar a resposta religiosa do "não acredito".
Recordo que o conhecimento religioso se baseia apenas na crença.
Antigamente, se alguém dizia, Deus escreveu nas Pedras da Lei que não se pode cobiçar a mulher alheia, nós podíamos dizer, com propriedade, Não acredito. Mas naquele tempo não existia conhecimento científico.
Mas o conhecimento científico baseia-se na prova. Agora, quando alguém nos prova que estamos errados, temos que contra argumentar ou aprender.
No outro dia estive a aturar um aluno muito chato.
Dizia que ia ser como o pai (na parte em que é um empresário de sucesso) mas que, ao mesmo tempo, nunca seria como o pai (que se levanta às 5 da manhã para ir trabalhar e só volta às 23h horas do trabalho).
É o tal sonha das mulher magrinhas com mamas grandes.
O que interessa é que, mesmo tendo fraca média e já andar há 5 anos para fazer um curso de 3, queria ir para uma escola de topo mundial porque assim se tornaria num profissional muito mais capaz. O pai paga o que for.
O que lhe disse foi apenas que não existe nenhum estudo que garanta que quem frequenta uma escola de elite se vai tornar um profissional de elite. O que dizem os estudos (estatísticos) é que essas escolas apenas fazem selecção dos mais capazes.
Controlando a capacidade intelectual, por exemplo, com um teste de QI, não existem diferenças significativas entre as melhores escolas do mundo e as escolas médias.
A Ciência é assim: não basta afirmar ou contra-dizer mas é preciso provar com evidencia empírica e dedução matemática. Acabou o lugar da crença.
Fig. 5 - Tive que escolher e preferi ser magra.
É a estatística.
Não quer dizer que não haja uma pessoa que não fique melhor profissional por frequentar uma escola de elite, mas também haverá outra que ficaria melhores profissional se não a tivesse frequentado.
Garanto que, se os salários descerem, o desemprego diminui.
Não garanto que o Sr. Alberto ou a Dona Micas vá arranjar emprego mas, em termos médios, muito mais desempregados encontrarão emprego e muito menos trabalhadores perderão o seu actual emprego.
Garanto que, se o nivel médio de salário descer 15%, a taxa de desemprego vai descer para próximo dos 10%-
E garanto que isso não terá qualquer efeito na procura interna e que será uma política expansionista (por haver mais pessoas a trabalhar).
Pedro Cosme Costa Vieira.