As empresas públicas de transportes públicos não são geridas de forma racional.
E todo o problema começa em serem cobrados preços menores que os custos reais de produção dos transportes. Este "subsídio" obriga a haver uma densidade de rede superior ao que seria socialmente óptimo.
Por exemplo, os autarcas exigem a linha de caminho de ferro do Tua porque o preço das viagens é menos de 1% do do custo que se eleva a várias centenas de euros por passageiro transportado.
Sem se experimentar um preço igual ao custo, nunca se pode saber qual o valor social da existência da linha de transportes.
Fig. 1 - Se não se fizer nada, a enxurrada leva os transportes públicos.
A estrutura de custos das empresas públicas de transportes
Uma empresa de transportes tem, por um lado, os custos financeiros que resultam dos investimentos e prejuízos que aconteceram no passado, e os custos de operação que resultam do funcionamento da empresa no dia a dia (electricidade, combustíveis, seguros, manutenção e trabalhadores).
Neste momento, as empresas públicas de transportes têm uma dívida de 17MM€ (mil milhões de euros) que empola a dívida pública em 10% do PIB. Esta dívida implica custos financeiros na ordem dos 1700M€ por ano (amortização em 20 anos e taxa de juro de 7.5%/ano), 1% do PIB.
Parece que 1% do PIB não é grande coisa mas se compararmos com as importações líquidas de petróleo mais os bens alimentares (que, em termos líquidos, são 6MM€, 3.5% do PIB), vemos que estamos a falar de valores muito importantes.
Como pensa o governo resolver o problema desta dívida?
A ideia é separar os custos financeiros dos custos operacionais.
Parte 1 - Aumentar os preços dos transportes até estarem cobertos os custos operacionais.
Quando se aumentam os preços, diminui a procura. Numa conferência que fui, um autor estimou em -0.25 a elasticidade preço/quantidade dos transportes.
Primeiro aumento - 1 Agosto.
Como o preço aumentou 15%, a procura vai diminuir 4% e a receita vai aumentar 10%.
A diminuição da procura vai permitir identificar as linhas que estão em excesso. Fecham-se as linhas mais penalizadoras das contas reduzindo-se os custos operacionais, previsionalmente, mais que 5%.
Segundo aumento - 1 Janeiro.
Recalculam-se os custos e receitas operacionais e fazem-se novos aumentos, +15%?, o que reduz mais uma vez a procura e fecham-se mais umas linhas.
Este processo vai continua até os custos operacionais estarem cobertos pelos preços.
Parte 2 - Passar as dívidas para um fundo (veículo financeiro estruturado).
Actualmente o Estado transfere para as empresas públicas de transportes cerca de 1000M€ por ano.
Como grande parte das dívidas das empresas públicas de transportes estão garantidas pelo Estado, a ideia é fazer um produto estruturado, os tais que deram problemas, com os 17MM€ da dívida e emitir obrigações sobre este veículo.
O Estado garante o pagamento de 1000M€ por ano mas ainda ficam a faltar 700M€ por ano que vai ser difícil resolver. Terá que ser uma mistura de
H 1. Partilhar com as autarquias.
H 2. Portajar alguma coisa, por exemplo, a entrada nas cidades ou as ICs à volta das cidades.
H 3. Meter uma taxa consignada nos combustíveis.
Mas as pessoas vão passar a andar de automóvel.
Há a ideia que andar de automóvel é mau para o país. Que gasta gasolina que é importada.
Isto é falso.
Os transportes públicos também gastam combustível importados e, por mais estranho que pareça, gastam mais que os automóveis porque andam, a maior parte do tempo, vazios.
Mas os transportes públicos parecem andar lotados.
Isto é um erro de análise denominado "enviesamento do observador cliente"
Como a necessidade de transporte das as pessoas acontece ao mesmo tempo, o cliente fica com a sensação que há muitas pessoas. Como, naturalmente, viajam mais pessoas quando os transportes estão lotados, a percepção fica enviesada.
A análise tem que ser feita por um observador parado e que mede a taxa de ocupação regularmente durante todas as horas do dia.
Aí, veríamos que os os transportes públicos, em média, andam vazios.
Depois, há o custo do investimento que paga juros pagos ao exterior e que é muito menor no caso dos automóveis que no caso dos transportes públicos.
Somando as parcelas, os transportes públicos implicam uma maior saída de dinheiro para o estrangeiro que o automóvel.
O automóvel ainda paga ao Estado e autarquias impostos (IVA e ISP), taxas várias, estacionamento e portagens.
Somando tudo, é melhor para o país as pessoas deslocarem-se de automóvel.
As pessoas têm que andar mais a pé.
Há a ideia que o transporte público tem que parar à porta de cada casa. Isto está errado.
Uma pessoa entre os 12 e os 65 anos, pode caminhar 1km em 10 minutos. Passando os transportes públicos nas zonas mais densas, as linhas devem estar afastadas 3 km entre si. Numa cidade com um diâmetro de 15 km, só há justificação para 5 linhas de transportes públicos com paragens afastadas 2 km entre si.
Actualmente, Lisboa (
Carris-175) e Porto (
STCP - 110) têm 300 linhas com paragens com um espaçamento menor que 500m.
Fig. 2 - Antes de eu tirar a cueca, vai dar uma voltinha a pé até ao Multibanco.
Os transportes terão que ser uma mistura transporte individual / transporte público.
Nas zonas de grande densidade (centros de cidades) e grande tráfego (ligação entre cidades), justifica-se a existência de transportes públicos pesados que, sendo muito caros, precisam de muitos passageiros para serem socialmente rentáveis. Estes eixos pesados terão que ser ligados por transportes públicos ligeiros e meios individuais. Assim, as linhas que existem, muitas delas desenhadas antes de 1950, precisam de ser completamente refeitas apostando em
Transportes públicos
Comboio - Eixo Porto Lisboa e alguns transportes sub-urbanos de Lisboa e Porto
Metro - Linhas existentes em Lisboa e Porto e mais nada
Autocarro urbano: linhas complementares e de ligação ao Metro e Comboio
Autocarro sub-urbano: linhas complementares e de ligação a zonas de baixa densidade. Ligações com e entre centros urbanos.
Táxis - cobertura de zonas com baixa densidade de população
Transportes individual
Pé - Ligação a paragens de autocarro, metro e comboio até 3 km.
Bicicleta - Ligações até 5 km e viagens de jovens até 10 km. Uso em cidade e em zonas menos densas.
Automóvel particular - Transporte pendular casa/emprego em zonas pouco densas e ligações aos transportes públicos pesados.
É preciso dar prioridade aos ciclistas e peões e tratar como tentativa de homicidio o desrespeito dos automobilistas para com a vida dos ciclistas e dos peões.
A óptica do Código da Estrada não deve estar no veículo ter motor e dar mais de 40km/h mas no risco de vida do individuo no caso de haver um choque. É tal o desrespeito para com os ciclistas que, na Volta a França, os jornalistas atropelam os ciclistas. É bater no ceguinho.
Fig. 3 - A solução está na mistura.
Conclusão.
A subida dos transportes em 15%, 30% ou 50% custa muito mas vai melhorar a vida dos portugueses.
De facto, o custo tem que ser pago pelos portugueses, e a política de preços baixos apenas serviu para ter uma rede de transportes exagerada e socialmente mal desenhadas.
Vamos a ver se este governo faz alguma coisa de jeito.
Arrancou bem mas é preciso fazer muito mais.
É preciso uma task force só para os transportes públicos.
Pedro Cosme Costa Vieira