A propósito da nona temporada do programa televisivo ‘Morangos com Açúcar’, o crítico televisivo Nuno Azinheira defendia, há dias, uma posição que suscita perplexidade. No seu modo de ver, atiram completamente fora do alvo aqueles que criticam o programa por ser “um mau exemplo para a juventude”; por colocar “os nossos jovens” perante “tudo o que de mau a sociedade tem” e lhes franquear o “caminho da droga, do sexo fácil e da banalização do amor”; por os tornar “mais violentos na escola, enfim, um sem-número de pecados”, como ele escreve. Morangos com Açúcar, em vez de “um vício”, seria, para Azinheira, “uma oportunidade” para os pais explicarem aos jovens “o que é isso de crescer, de os preparar para as inquietudes e angústias que o seu desenvolvimento corporal e psicológico sempre desperta, e de os mentalizar para os perigos da vida fora do casulo dos primeiros anos de existência”. “Porque, entendamo-nos, não é a escola, muito menos a televisão, que tem de dar educação às nossas crianças”, esclarece ainda o jornalista. Para além do bom senso, é hoje farta a investigação a frisar esta ideia: tão ou mais importante do que aquilo que a TV faz aos mais novos e à sociedade é o que os mais novos e a sociedade fazem com a TV. Aparentemente haveria, assim, uma sintonia com Nuno Azinheira. E no entanto o desacordo não sendo total, é, eu diria, profundo. Certamente que a responsabilidade e papel dos pais é crucial. Dificilmente se pode negar isso e nunca se enfatizará suficientemente tal contributo decisivo. Mas remeter apenas para essa sede a tarefa educativa é escamotear completamente as condições reais em que ocorre, hoje, o quotidiano e a socialização das jovens gerações. Deixo de lado, por extravagante, a ideia de que à escola não cabe educar. No que respeita à televisão (e à Internet, aos videojogos…), se ela propõe situações, relações, experiências, valores e visões do mundo envolventes, isso não será relevante? Não a tornará um factor interveniente, com o seu grau de especificidade, no processo formativo? Dizer que tudo está do lado dos pais é irresponsabilizar a televisão e canonizar implicitamente tudo o que ela possa fazer. Será esse o papel de um crítico de televisão?
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sábado, setembro 17, 2011
Morangos sem açúcar
A propósito da nona temporada do programa televisivo ‘Morangos com Açúcar’, o crítico televisivo Nuno Azinheira defendia, há dias, uma posição que suscita perplexidade. No seu modo de ver, atiram completamente fora do alvo aqueles que criticam o programa por ser “um mau exemplo para a juventude”; por colocar “os nossos jovens” perante “tudo o que de mau a sociedade tem” e lhes franquear o “caminho da droga, do sexo fácil e da banalização do amor”; por os tornar “mais violentos na escola, enfim, um sem-número de pecados”, como ele escreve. Morangos com Açúcar, em vez de “um vício”, seria, para Azinheira, “uma oportunidade” para os pais explicarem aos jovens “o que é isso de crescer, de os preparar para as inquietudes e angústias que o seu desenvolvimento corporal e psicológico sempre desperta, e de os mentalizar para os perigos da vida fora do casulo dos primeiros anos de existência”. “Porque, entendamo-nos, não é a escola, muito menos a televisão, que tem de dar educação às nossas crianças”, esclarece ainda o jornalista. Para além do bom senso, é hoje farta a investigação a frisar esta ideia: tão ou mais importante do que aquilo que a TV faz aos mais novos e à sociedade é o que os mais novos e a sociedade fazem com a TV. Aparentemente haveria, assim, uma sintonia com Nuno Azinheira. E no entanto o desacordo não sendo total, é, eu diria, profundo. Certamente que a responsabilidade e papel dos pais é crucial. Dificilmente se pode negar isso e nunca se enfatizará suficientemente tal contributo decisivo. Mas remeter apenas para essa sede a tarefa educativa é escamotear completamente as condições reais em que ocorre, hoje, o quotidiano e a socialização das jovens gerações. Deixo de lado, por extravagante, a ideia de que à escola não cabe educar. No que respeita à televisão (e à Internet, aos videojogos…), se ela propõe situações, relações, experiências, valores e visões do mundo envolventes, isso não será relevante? Não a tornará um factor interveniente, com o seu grau de especificidade, no processo formativo? Dizer que tudo está do lado dos pais é irresponsabilizar a televisão e canonizar implicitamente tudo o que ela possa fazer. Será esse o papel de um crítico de televisão?
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terça-feira, agosto 31, 2010
Entre realidade e representação
No sempre excelente blogue de filosofia do The New York Times o mais recente artigo, da autoria de Alexander Nehamas, professor da Universidade de Princeton, estabelece um paralelo entre a situação da Grécia de outros tempos e a relação da sociedade actual com os media.
Segundo Nehamas, Platão ignora na sua República nomes como o de Homero, autor da Odisseia e da Ilíada, concluindo que o filósofo "censurou" o trabalho do poeta por o considerar nocivo para a educação da sociedade. "Nós também censuramos os materiais educativos das nossas crianças de forma tão segura e com base nos mesmos fundamentos que Platão. Como ele, muitos de nós acreditamos que a emulação se torna em 'hábito e segunda natureza', que maus heróis (hoje dizemos 'modelos') produzem más pessoas", escreve Nehamas.
Tal como a poesia de Homero criava "maus" exemplos para quem a lesse, também os media hoje reproduzem imagens que podem ser encaradas como perniciosas.
Contudo, o problema aqui é outro. O problema é um de elementos do processo comunicativo. E um de abrupta divisão entre realidade e representação. "Ser realista é apresentar o mundo sem artifício ou convenção, sem mediação - a realidade pura e simples. E a cultura popular, enquanto permanecer popular, parece sempre realista: os polícias na televisão usam sempre cintos de segurança", explica o autor.
Entre a realidade e representação há uma grande diferença e saber que o que nos é transmitido é apenas representação é essencial. "Nós passamos, como Platão, da representação para a realidade? Se sim, então devemos mesmo preocupar-nos com os efeitos da televisão ou dos videojogos". Ou seja, se aceitamos as representações como realidade, então, de facto, temos um problema em mãos.
Como argumenta Nehamas, se nos apercebemos de que a reacção a representações não tem de determinar o nosso comportamento então a influência dos media será menor do que se teme. "Se o contrário for verdade, em vez de limitar o acesso ou de remodelar o conteúdo dos media, deveríamos garantir que nós, e em particular as nossas crianças, aprendem a interagir com eles de forma inteligente e consciente".
Se hoje lemos e estudamos as obras do passado grego, então o que será lido e visto da nossa era dentro de dois mil anos? E em que ficamos: realidade ou representação?
sexta-feira, abril 23, 2010
Uma apresentação e várias incertezas sobre o papel do computador na sala de aula
Surgiu neste blogue, há alguns dias, um pequeno cartaz (que deve estar aqui à direita) a dar a conhecer um estudo que se encontra a decorrer na Universidade do Minho sobre a Educação para os Media em Portugal. Nele, é pedido a quem tenha ligações (ou conheça quem tenha) a projectos nesse campo para contactar Tiago Ferreira, pessoa responsável pela recolha de tais dados.
Assim sendo, eu, Tiago Ferreira, dou-me finalmente a conhecer ao público deste blogue, já com alguns dias de atraso. Espero poder contar com o máximo de colaborações possíveis aí desse lado, para que possamos ter um trabalho final o mais completo possível.
Apresentações feitas, passemos à minha primeira entrada propriamente dita.
Por entre o frenesim das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) brotam pelo meio universitário nos EUA vários casos de professores contra o uso de computadores nas aulas. Este artigo (The Blackboard Versus the Keyboard) da revista Slate dá vários exemplos de professores universitários que decidiram proibir a utilização de portáteis nas salas de aula.
Mais. Uma professora da Universidade do Colorado-Boulder chegou a levar a cabo um estudo não-científico com os seus próprios alunos e notou que os que usavam os portáteis durante as aulas tinham notas, em média, 11% mais baixas do que os restantes. Os hábitos mudaram rapidamente naquela turma.
Por entre justificações em princípio legítimas, como o uso do computador para tirar notas mais rapidamente ou para aceder à Internet de modo a verificar uma ou outra informação, o problema é que o mais habitual é que o portátil seja usado para distrair e não como ferramenta de aprendizagem, como descobriu uma professora da Universidade Winona State no Minnesota. Ao mesmo tempo, um estudo na Roménia mostrou que crianças de famílias de baixos níveis de rendimentos que receberam apoio do governo para comprar computadores melhoraram as suas capacidades técnicas, mas as notas na escola mantiveram-se baixas. O uso dado aos computadores focava-se nos jogos de vídeo e não nos trabalhos de casa.
A questão aqui situa-se nos efeitos das tecnologias sobre os processos de educação e é aplicável a programas de distribuição de computadores em geral. Como escreve um doutorando de Economia da Universidade de Oxford no seu blogue sobre ajuda ao desenvolvimento:
"Quando consideramos a introdução de tais tecnologias nas salas de aula, especialmente em países em vias de desenvolvimento, precisamos de compreender que os efeitos sobre a aprendizagem básica podem ser negativos".
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segunda-feira, novembro 09, 2009
"Rua Sésamo" faz 40 anos nos EUA e 20 em Portugal
Faz amanhã 40 anos que foi emitido o primeiro episódio daquele que viria a tornar-se num dos mais famosos programas para a infância do mundo - o Sesame Street. Eleva-se a 125 o número de países que adquiriram à Children's Television Workshop os direitos para produzir ou co-produzir séries inspiradas na versão norte-amerciana. E é assim que o programa se diz, conforme as latitutes do mundo, de modos diversos, tais como: Sesame Tree, Jalan Sesama, Vila Sésamo, Galli Galli Sim Sim, Plaza Sésamo, Ulitsa Sezam,Sesamstraat,Hikayat Simsim, 5 Rue Sesame, Sesamstrasse,Rechov Sumsum, Shara’a Simsim, Barrio Sesamo, Alam Simsim.
Curiosamente, acaba também de se completar vinte anos sobre o início da versão portuguesa, co-produzida pela RTP, sob a orientação pedagógica de Maria Emília Brederode Santos. Uma geração de portugueses hoje com cerca de 30 anos fez a sua descoberta do mundo muito apoiada e inspirada por Rua Sésamo. E muitos hoje lamentam que o programa tenha deixado a programação, por razões que podem ser relevantes, mas que não deixam de ser discutíveis, num serviço público, mesmo tendo em conta o esforço feito pela RTP em torno da produção de algo que se lhe aparenta nos objectivos, o Jardim da Celeste.
A ideia de Rua Sésamo foi a de procurar oferecer a crianças em idade pré-escolar um currículo orientado para a aprendizagem lúdica de aspectos relacionados com a literacia básica, o bem estar, o apoio emocional, a exploração do mundo envolvente. Foi, de certo modo, a aposta possível numa vertente da televisão que não estivesse amarrada à mera lógica mercantil e consumista.
Um programa destes mereceria que os media virassem, por um momento, as suas atenções não apenas para aquilo que foi e o impacto que teve entre nós o programa Rua Sésamo, mas para a oferta televisiva que hoje existe para os mais pequenos, em especial os da faixa dos 2-3 aos 5-6 anos. Fora a RTP2, o panorama não parece ser brilhante.
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domingo, junho 14, 2009
Seminário: "Papel educativo dos media"
O Conselho Nacional da Educação promove amanhã, em Lisboa, um seminário sobre o papel educativo dos media, numa iniciativa no âmbito das Jornadas "Cá Fora Também se Aprende!". O texto que segue apresenta a iniciativa e o programa pode ser consultado AQUI.
"É hoje plenamente aceite que, para além da educação formal, geralmente proporcionada em instituições de ensino, seguindo um currículo oficial, organizada sequencialmente e avaliada e certificada periodicamente, existem outras formas de educação, mais ou menos deliberadas, mais ou menos conscientes e que ocorrem nos mais diversos contextos *. Os media são obviamente um dos principais suportes desse tipo de aprendizagem “informal” mas raramente assumem a correspondente função educativa.
A passagem para uma Sociedade do Conhecimento – em que a maioria das pessoas trabalhará em funções requerendo elevados níveis de conhecimento e permanente actualização - exige uma “Sociedade de Aprendizagem” em que todos estejam permanentemente disponíveis para aprender, mas também para ensinar…Por maioria de razão, os media, de acesso fácil e possibilidades tecnológicas extraordinárias!
Por outro lado, o desenvolvimento de uma concepção de cidadania e de Direitos Humanos mais alargada, abarcando o direito ao acesso e usufruto do património cultural e à participação na sua produção questiona, também, o assumir dessa função pelos media, meio privilegiado para proporcionar esse acesso.
As possibilidades quase infindáveis abertas pelas Novas Tecnologias da Informação e da Comunicação (NTIC) não só directamente mas também em convergência com os outros media mais tradicionais, justificam que nos debrucemos sobre os modos de fazer essa convergência e sobre as suas possíveis implicações organizacionais.
Neste contexto, as Jornadas “Cá Fora Também se Aprende!”, de que este é o terceiro Seminário (sobre o papel dos media), pretendem identificar potencialidades e forças para tornar a sociedade portuguesa culturalmente mais rica, mais estimulante e mais criativa, orientadas por três questões principais:
1.Qual a importância da educação não formal e informal? Que competências se desenvolvem? Que aprendizagens proporcionam? Qual o papel dos media neste processo?
2.Como fomentar o papel educativo dos media – “tradicionais” e “modernos” – a sua convergência e complementaridade? Que alterações organizacionais isso implicaria?
3.Que pode fazer a administração pública – e em particular o CNE – para estimular e apoiar o papel educativo dos media?"
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