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segunda-feira, 21 de novembro de 2011

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O INCONFORMISMO

Lito acordou cedo e foi até a cozinha, se serviu de café e passou requeijão no pão. Comeu, bebeu, tomou refrigerante e foi ao banheiro. Fez suas necessidades fisiológicas, escovou os dentes, se olhou ao espelho e lavou as mãos. Cuidou dos lábios que estavam rachados por tanta bebida vencida que havia tomado, passando uma pomada específica. Caminhou até fora de casa e ficou observando a serra, sentado à escadaria de entrada. Sua vida se reduz a poucas coisas, numa cidade sem muita razão de ser. A casa se localiza no nada, em meio a lugar algum. Só se vê um monte de grama envolta onde pastam as vacas, e a tal serra ao lado direito onde há uma gruta com cachoeira e de onde saltam de pára-glaiden. Há um mês que vive assim. Conseguiu emprego numa fábrica de tijolos ecológicos à beira de uma estrada, mas nem por isso veria problema se o seu coração parasse de bater.
Sua mulher o abandonou. Desde então não transa com mais ninguém. Além de sua mulher, sua mãe o expulsou de casa. Ele não sente muito por ter saído da casa da mãe, afinal de contas, de uma maneira ou de outra eles não tinham mesmo muito em comum, mas sente muito pela ex-mulher. Lito é um gênio, mas poucos sabem disso, sendo assim mesmo como funciona. Um verdadeiro poeta sul-americano dos tempos modernos que encontrou numa mulher tudo o que precisava e, não tivesse sido uns desvarios, ainda estariam juntos. Lito se levanta e entra pra dentro de casa, pega o telefone e põe-se a teclar os números. Alguém atende:
“Alô”
“Escuta aqui, cara, o negócio é o seguinte: vocês tão recebendo essa porra toda? Eu não vou ficar aqui escrevendo esse monte de coisas sem saber o que irá se suceder! Alemão, sinto muito!... Chamem do que quiser: “vaquinha magra do conformismo” coisa e tal, a verdade é que a gente gostava mesmo e eu ainda tenho leite pra tirar dela! Entendeu?!”
“Quem é que tá falando?”

“Você sabe quem é que tá falando, cara, não me venha se rogar de santo!”
“Porra, não fode a vida. A gente achou que você tava numa nice. E quanto àquela atendente?”

“Ah, agora essa?! Aquilo foi em caráter lúdico, qualquer um saberia! E avisa aí, avisa aí que eu quero a minha vaca magra de volta, senão eu não vou escrever mais porra nenhuma pra essa merda, tá me ouvindo?!... Passar bem!”
E bateu o telefone. Lito é o tipo de gênio que às vezes se deixa levar pela ira. Não que ele seja de má índole, mas é o fato de, acima de tudo, ser o tipo de gênio incompreendido, como a maioria dos gênios são. De um modo ele desabafara, agora. Foi até os fundos da casa onde há uma edícula. Entrou na edícula, ligou o som, serviu-se de um Curaçau Blue e se pôs a preparar um baseado. Isso o irá fazer ficar mais calmo, um pouco. Estacionou o copo na mesa e o cigarro num cinzeiro. Entrou no quartinho do fundo onde há o retrato da imagem de uma semideusa a quem confia e, num gesto ritualístico, prestou reverência pedindo que a trouxesse de volta.
O caso foi o seguinte: confiscaram-lhe a vaca. Supostamente estaria doente e contagiava um rebanho vizinho. A vaca era muito querida por ele e, embora magra, dava-lhe o suficiente. Mandou dezenas de cartas para a corregedoria, mas até agora nada. É a ex-mulher, é a vaca, tudo o torna depressivo. Voltou e bebeu o drinque. Acendeu o baseado e serviu-se com mais Curaçau, contemplando as garrafas. Ah, minha vaquinha sagrada, pensou consigo. Ele sabe que as chances são pequenas sem a sua amiga que tanto adora. Acomodou-se em uma cadeira à beira do jardim e sentiu o sol. Um rosto triste, então, pitou o cigarro... e bebeu o drinque. Não demorou muito até sorrir. Lito as vezes se lembra de coisas, e põe-se a rir sozinho mesmo.
(Escrito por Bobby, brother do Lito – em seu fantástico mundo)

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Reembolsar despesas era mais negócio

Bom, daí esse sábado resolvi fazer o teste.

O combinado era às três horas eu me apresentar. Tratou-se de uma pizzaria há uns quilômetros de casa. Já fazia algum tempo que recebia os sinais. Vocês sabem, o universo vai se comunicando conosco. Portanto, lá fui eu, partindo de casa sob a garoa de um céu cinza.

Fui caminhando. Protegendo-me da chuva, a lona de um guarda-chuva laranja. Eu só tinha esse guarda-chuva pra usar, e eu não ligava pra cor dele. Dizem que é feminino, mas, para mim, tanto faz.

Eu gosto de caminhar, é um bom exercício para as pernas, tirando a sensação de nostalgia que me invade sempre quando faço. Quer dizer, não teria como eu narrar qualquer outra coisa ou acontecimento nesse ínterim senão as minhas lembranças de quando caminhava com ela segurando os meus braços. Não deixou de ser triste.

Cheguei no horário combinado. Havia um sujeito com uma cara bastante desagradável de se olhar esperando sentado à frente do lugar. A pizzaria, de grandes portas de vidro, permanecia fechada e com as luzes apagadas. Eu não tinha relógio e perguntei ao rapaz sobre as horas. Ele me respondeu, com uma cara bastante feia, que já eram pra lá das três. Eu não me deixei abater. Encostei o guarda-chuva na parede e me sentei no chão que era coberto por uma telha na entrada do estabelecimento. Não demorou e surgiu mais outro integrante. Cumprimentou-nos de uma maneira alegre. Nada acontecia, só esperávamos. Depois de uns três minutos de silêncio, resolvi perguntar qual time ele torcia, como uma maneira de puxar um assunto e dar uma desbaratinada, de repente. Já fui logo perguntando: “Corintiano?!” E ele me respondeu “ôxe, São Paulino! E você?” E eu respondi: “Corintiano” Daí ele “tem cara” Aí eu “de maloqueiro?” Aí ele “não, não foi isso que quis dizer” Aí eu “é, você também não tem cara de ser veado! Melhor assim.” E não falamos mais nada.

Ficamos esperando por pelo menos uns quarenta minutos e eu não tinha sequer uma revista. O dono do lugar não aparecia. Que tempo perdido deveria ser aquilo, eu pensava. Mesmo assim eu permaneci firme e forte. Então, passado esse tempo, chega o dono, cujo eu havia conversado no dia anterior. Estacionou o carro numa área que havia bem a nossa frente, e saíram dele cinco pessoas. Quatro operários, com a mesma cara do sujeito que conheci primeiro. Como o dono de um rebanho, tomou a frente e já se pôs com as chaves na mão a abrir o portão dos fundos, por onde iríamos entrar e seguir os seus passos. Levou-nos até o lugar onde era feito tudo. Eram dois metros quadrados para se fazer as esfihas, outro lugar do que poderia ser de uns três por dois para as pizzas, uma cozinha onde se espremia tomates e picava cebolas, além da preparação do café, e por fim um cubículo onde havia uns armários e um banheiro. Tudo isso escondido do público, com exceção do espaço onde eram preparadas as pizzas, que tinha janelas de vidro para que os clientes pudessem ver o quão higiênico era o lugar.

O pessoal já estava adaptado, já sabiam o que fazer e como fazer. Cada um, à medida que iam entrando posicionavam-se em seus lugares. Um foi preparar a massa, o outro o molho, e assim por diante. Eu fiquei ali, esperando por qualquer coisa. Talvez uma luz divina, eu não sabia ao certo. Enfim... Aí alguém me jogou um pacote com uma camiseta branca e uma espécie de toca para não deixar os cabelos caírem. Eu entreguei o meu guarda-chuva laranja para essa mesma pessoa pedindo o favor de guardar, e ouvi “iih, olha a cor do guarda-chuva do cara” E eu simplesmente ignorei. Fui até o banheiro e me vesti. O dono, que se chamava Tico, orientou um rapaz, que por coincidência era aquele que havia conhecido melhor ainda enquanto estávamos lá fora, a me passar o que deveria feito. E então foi o que ele fez. Veio com uma caixa cheia de cebolas gigantes e um facão, depois trouxe um balde e disse: “é só descascar”. Aí ficamos eu e ele tirando as cascas de uma centena de cebolas. As cebolas eram gigantes, e exalavam aquela coisa forte que nos faz chorar. O sujeito que descascava as cebolas comigo até que era gente boa. Trocamos umas idéias. Ele estudava direito, e achei aquilo peculiar. Quer dizer, que espécie de futuro advogado descasca cebolas no final de semana? Isso deve ser raro. Bom, enfim... Vivendo e aprendendo.

As cebolas foram descascadas e a essas alturas eu já sabia até o nome do sujeito, que atendia como “Jonny”. Quando soube seu nome, pensei: caramba, que coisa, um Jonny descascando cebolas. Todos operavam e davam risadas. Eu não sabia se era da minha cara ou o quê, mas eu pouco ligava. Quando eu perguntava seus nomes, como resposta ouvia: “Péba”, ou “Galego”, ou “Barriga” e etc. Quer dizer, os nomes pareciam ser improváveis e eles não paravam de dar risadas enquanto falavam comigo. Deviam estar zoando com a minha cara, certeza. Mas de qualquer maneira, eu não ligava.

Aí eu fui pra cozinha, onde espremi uns tomates. Foi um sujeito que atendia pelo nome de “Bahia” quem me orientou a usar a máquina. A máquina que espremia os tomates era uma coisa de louco. Precisava-se de muita técnica para manuseá-la. Eu não peguei a técnica e, em um momento quando apelei para a força, o tomate explodiu lá dentro, espirrando suco pra tudo que foi lado. Bahia achou estranho, e disse: “oxe” Bom, eu me desculpei. Espremi uns tomates e piquei umas cebolas, também, usando a mesma máquina. Aquilo ia ser o tempero da esfiha. Sai dali. Fui até o espaço onde era feito tudo o que tivesse a ver com as pizzas. Eles preparavam a massa e eu fui aprender. Um sujeito que atendia pelo nome de “Jow” foi quem me ensinou. A gente tinha que pegar um punhado de massa e socá-la no balcão, assim para tirar o ar de dentro dela. Feito isso, fazíamos dela uma bola e guardávamos na gaveta. Não entendia a razão daquilo, mas fui fazendo. Várias bolas de massa.

Voltei ao lugar onde era feito tudo o que tivesse a ver com as esfihas. Um rapaz baixo e gordo espremia com a mão um monte de carne moída. Devo admitir que, após ter visto uns vídeos de uns ativistas vegans, essa coisa de se espremer carnes não me desce muito bem. Contrai certa rejeição contra esse tipo de coisa. De toda maneira, não falei nada. Era meio da tarde e ainda não havia muito movimento, ou seja, muitos pedidos. Ignorei o sujeito que mexia com o amontoado de carne. Eu não tinha nada para fazer lá e fui ao banheiro. Voltei e o Jonny colocava uns saches de catchup dentro de uns saquinhos com limão. Achei que ele merecia ajuda. Ficamos lá, fazendo isso. Quer dizer, apesar da chuva, dezenas de ônibus pegavam as estradas, a tribo mística saía em excursão, alguns recebendo vales e outros sendo bonificados, milhares de cabeças fervilhando em São Paulo planejando o que seria daquela noite com as garrafas de vinho tomando suas temperaturas e todo mundo ansiosos para celebrar a vida, enfim... O mundo acontecendo e eu lá, colocando saches de catchups dentro de um saquinho com limão. Era deprimente, mas me mantive forte. Ah, como eu era feliz e não sabia, pensava. Se pudesse ao menos falar com alguma das pessoas que sinto vontade. Desculpar-me. Enfim...

Feito isso fui até a cozinha, onde preparei um café. Tomei um copo de café. Aliás, de hora em hora eu tomaria um copo de café. Aí eu voltei. Alguém fazia bolinhas de massa, o que viriam a se tornar esfihas. Fui ajudar. Era um cara gordo e mal educado quem fazia isso. Ele tentou me dar uns toques, mas eu não entendi nada do que ele pronunciava. Era como outro dialeto. Enfim... Eu dei um jeito de levar aquelas nove horas de maneira que me fosse justo o que viria a receber. Eu ajudava um pouco aqui, e um pouco ali, até quando me fixei na tarefa de tirar as pizzas do forno. Alguém ia colocando as pizzas no forno e eu ficava de guarda do outro lado esperando que ela chegasse até mim por uma espécie de esteira. O forno era a gás e a pizza vinha automaticamente por essa esteira. Não era como esses fornos a lenha que vemos nas pizzarias mais tradicionais. Aí eu recolhia a pizza e colocava no pacote, etiquetava e despachava por uma janelinha ao meu lado, apertando um sino para chamar a atenção da recepcionista que iria entregá-la ao cliente. Fiquei fazendo isso. Num dado momento, começou a se tornar insuportável o cheiro forte de bacon e calabresa que tomava conta de tudo. Eu saia de trinta em trinta minutos para tomar uma água e me refazer, além do café. Era realmente difícil. Além do calor em excesso quando ficamos na frente de um forno como aqueles.

Ia e vinha, dava um grito pra alguém coisa e tal: “Aê Bahia, faz favor!” Foi como passei o tempo. A essas alturas eu já não chamava mais ninguém pelo nome ou apelido. De uma maneira todos eram “Bahia”. De repente me disseram que eu poderia fazer a minha própria esfiha, caso eu estivesse com fome. Bem, eu não tinha comido nada durante o dia todo, decidi ir lá ver como é que se fazia. Coloquei-me ao lado daquele sujeito que não falava a mesma língua que eu. Ele virou-se a mim, enfiou o dedo no nariz e voltou a se concentrar no trabalho. Dava socos em um monte de bolinhas de massa, depois as colocava em um recipiente e amassava fazendo delas uma seqüencia de discos e, só então colocava o recheio, que na maior parte era aquela carne misturada com tomate amassado e cebola picada. Imitei o procedimento e, na hora de colocar o recheio, peguei uns brócolis e queijo que percebi na bancada. Fiz quatro esfihas de brócolis e queijo e pus ao forno. Depois de cinco minutos, Jonny (único que assimilei o nome) recolheu-as e me entregou. Sentei numa mesa que havia por ali, aquela onde ficamos colocando os catchups no saquinho. Na metade da minha primeira esfiha sentaram-se ao meu lado duas das atendentes. Colocaram sobre a mesa, cada uma, um prato com arroz e batata com carne cozida. Exalava um cheiro. Um cheiro de carne cozida. Pensei: caramba. Aí elas ficaram conversando entre si, fofocando quaisquer coisas. E então, aconteceu: puxaram papo. Bem, tentaram alguma coisa, sim, mas eu não dei abertura. Aí eu guardei duas das esfihas e decidi que já havia me satisfeito.

Voltei ao lugar onde eram feitas as pizzas. Aí eu cheguei lá e o Bahia mexia com as massas. Ele retirava da gaveta aquelas bolas que havíamos feito e, com o rolo, esticava-as. Fui fazer também. Ele me estranhou, por algum motivo, e disse: “oxe”. Muita gente dizia “oxe”. Eu achava aquilo engraçado e simpático. E então eu me pus a esticar as massas, formando o disco. Não tive problemas com aquilo. Quer dizer, o meu ritmo não era tão bom, mas consegui algumas coisas.

Voltei a retirar as pizzas. Era tudo muito louco e frenético. Num sábado, uma pizzaria fervilha. Não temos muito que fazer a não ser tentar ajudar de todas as formas. De qualquer maneira, eu fiquei fixo na tarefa de retirar as pizzas do forno e despachar. Pela janela onde eu colocava as pizzas, apareceu a cabeça de uma das atendentes: “nossa, você aprende rápido” E eu não respondi nada. Qualquer coisa que viesse a dizer faria com que ela se achasse no direito de me dizer mais e mais coisas, o que iria gerar um baita mal entendido. Portanto, foi isso.

Meia noite e fui ao banheiro. Tirei a camiseta e a embrulhei novamente no plástico. Eu estava ansioso. Tirei a toca. Deixei tudo no armário. Sai e fui falar com o Tico, que comia sushis na cozinha. Ele me ofereceu, mas eu disse que não queria. Por algum motivo, ele já sabia de tudo e me deu trinta e seis reais, que era o equivalente às nove horas trabalhadas e mais os seis da condução. Agradeci-o e disse que havia sido uma boa experiência. Avisei-o caso precisasse de um motoqueiro, que iria ser um prazer.Sai de lá e dei uma boa noite Bahia de uma maneira geral. Todos retribuíram.

Pronto. Missão cumprida, né?

Sim, na rua, olhei pro céu. A atmosfera era agradável. Comuniquei-me com o universo. Houve alguma atenção por parte dele, senão eu não estaria escrevendo isso agora. Pensei nela. Pensei na vida. Caminhei. Caminhei sob a garoa. A sensação de nostalgia voltou a me invadir. Quantas vezes não passeamos sob a chuva com você segurando os meus braços? Agora ninguém o segurava. Era tudo muito simples e perfeito ao seu lado. O teu sorrido. Onde foi parar? A minha vida, onde foi parar? A nossa vida.

Entrei e sentei no balcão. Pedi uma garrafa de cerveja, enquanto uns moleques davam risadas em companhia de suas meninas numa mesa atrás de mim. Eu não tenho mais paciência pra isso. A gente era feliz. Fomos felizes. Tomei a garrafa de cerveja lembrando cada uma das garrafas que tomamos juntos. Lembrei do dia em que fui feliz ao teu lado. Ainda ouço você me acordar dizendo “bom dia Bahia”. E eu, às vezes, sem querer, me pego dizendo sozinho “bom dia, flor do dia”. Pra quem? Eu devo estar ficando louco.

Veio alguém e me cumprimentou. Eu só conhecia de vista, não sabia quem era. Talvez tenhamos estudado juntos há muito tempo atrás. De qualquer maneira, retribui. Pedi outra cerveja. Depois, uma dose de vodka... E assim por diante, você sabe como é... Mantive o pensamento em você.

Entrou no bar, por alguma coincidência metafísica qualquer dessas, uma daquelas atendentes. Não sei qual foi a concordância astral, mas lá estava ela. Passou por detrás de mim rebolando e senti o cheiro de um perfume. Bem, não era um ”Caroline Herrera”. Eu girei o rosto, como não iria fazer? Caminhou com a bunda empinada até o fundo, lá onde havia os sanitários. Parou, girou e olhou-me. Meditei e pensei: que mal tem? Ela prosseguiu. Virei a vodka que ainda restava no copo, levantei e fui. Ela me aguardava com a porta aberta segurando a maçaneta. Mesmo sendo feminino, empurrei-a porta adentro, de maneira que ficasse sem saída. Deixei que a porta se fechasse sozinha e a joguei pra dentro de uma das cabines, enquanto ela abaixava a saia toda desengonçada. Com as pernas arriadas, sentada numa privada de tampas fechadas, pôs com cautela o fio frontal da calcinha de lado, no instante em que pensei: caramba. Tirei pra fora, embrulhei-o e meti. Conforme as investidas, a cabeça da danada balançava que parecia uma maria mole pendendo pra fora. Na hora de gozar fiz graça: mirei no umbigo, mas acertei o olho. Acontece. Recompus-me e sai. Voltei a sentar no balcão e pedi outra cerveja. Ela ficou lá, não sei o que fazendo. Eu virava o copo quando passou por detrás de mim e beliscou meu abdome. Girei o rosto de maneira a retribuir. Arrivederci.

Sai de lá no meio da madrugada, assim que o bar fechou, ouvindo um psykovsky pelos fones de ouvido. Em momento algum eu tomei um ônibus, mas economizei e fui caminhando. Sempre caminhando. No dia seguinte acordei bem. Fui até o correio e postei dez reais que me sobrou ao endereço de minha ex-mulher. Meu bacuri tá lá, lindo e esperto. Como não pensar nele? Não sei se chegou o dinheiro, os correios são incertos. Ainda mais quando encaminhamos por carta simples.

Depois fiquei lendo a história do Brasil.

(por Lito Spuleta)

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

búúú

Como um típico sem autonomia, sou alguém caminhando até a porta da casa da mãe. Sinto-me debilitado. Com minha última depressão, é como se eu tivesse ficado com a cabeça plantada em um balde cheio de merda aguada, não podendo respirar por horas. Giro a maçaneta – pois o costume é de se deixar a porta aberta. Ao vacilo um cheiro de urina se exala de toda a parte. Meu estomago se vira, dando-me a sensação de algo errado. Vou me arrastando levando os jornais petrificados amarelados com urina por todo o espaço. Alcanço o sofá e sento-me. Percebo uma nuvem de poeira e pêlos se erguendo ao meu lado por um feixe de luz que reflete da persiana. Ouço o barulho de um ponteiro a cada segundo. São dez e meia da manhã. Recosto e medito. Um cachorro negro e cego vem até mim. Percebo que ele é cego quando bate com o rosto em minha canela. Ele me parece bastante debilitado. Identifico-me com ele. Ergo a mão para acariciá-lo. Ele se assusta e gira, tenta encontrar alguma coisa, mas só o que ele faz é se bater em tudo. Fica assustado e late. Mi madre grita “cala a boca!” lá do quarto que não enxerguei. Ela ainda está deitada e não quer ser incomodada. Ouço latidos vindos de lá também. São os outros animais ao perceberem movimentação. O cachorro negro começa a chorar. Mi madre grita novamente “Gordo, cala a boca!” Gordo sossega em um canto. Espirro e observo, então, o relógio. Mais latidos, dessa vez, sem motivo e, decido ir ao banheiro. Tentei não arrastar os jornais, observando cada passo, levantando os pés para driblar onde tinha urina. Piso em um excremento canino coberto por uma folha de jornal. Ele é macio. Chego ao banheiro e olho no espelho. O que eu vejo não me alegra. Devidamente levanto a tampa e miro no centro da privada. Motivo de ele ter permanecido durante tanto tempo ali amassado embaixo da cueca, talvez, foi que o jato saiu torto. Acertei o lixo ao lado. Seguro a urina, faço uma massagem e recomeço. Agora sim, consegui. Jogo uma água no rosto e desejo que tudo vá à merda. Volto, prestando o dobro de atenção, a fim de desviar qualquer coisa. Sento-me no sofá. Poeira, caos. Gordo se deitou num canto. Tita ao meu lado, no sofá. Ela tem câncer. A mais velha delas, das três. Metade de seu corpo está despelada, e nódulos gigantes crescem a cada dia na região mamária. Também há uma ferida que virou uma bolha. Não posso fazer nada para ajudá-la. Ao menos tento. Pego um saco de ração que vejo em cima da mesa e a sirvo. Ela agradece, levantando a cabeça e olhando os meus olhos. Volta a recostar-se. O relógio fica mais alto. Ouço o ponteiro cada vez mais alto. Tita ergue a cabeça e pega um grão da ração. Eu a amo, e faço carinho em sua cabeça. As outras duas cachorras não saíram do quarto de mamãe. Ficaram lá. E eu aqui. Ouvindo os ponteiros. Poeira e caos.

domingo, 21 de agosto de 2011

casa

sabem "casa"? pois bem. existem casas que são muito engraçadas, umas não tem teto, outras nada. existem casas que são de prostituição e casas de reabilitação. dentre todas, a mais engraçada e peculiar, é a casa onde, no interior dela, podemos nos surpreender com uma família de caralhos. para quem lê esta mensagem, que vá para uma casa dessa. que vá para a casa do caralho!

sábado, 21 de fevereiro de 2009

Hippies of Cyber

Era véspera de natal.

Uma sexta-feira insana. No telão, cenas de um filme esquisito.

Uma garrafa de catuaba divido em três pessoas, algumas latinhas de cerveja, talvez quatro, e uns fortes goles em uma bebida ardente, acho que era vodka. Isso foi o necessário para prestar bastante atenção em um telão que, sincronizado com o som pesado, nos dava medo e delírio!

Entendam-me...

Saí de casa sabendo que a lua estava cheia. No céu, dava sinais de que proporcionaria-nos momentos únicos. O misticismo pairava!
O Sábio me aguardando com uma garrafa de catuaba na mão e falando alguma coisa com alguém no celular, pessoas vizinhas aprontando-se para a noite com seus carros estacionados, alguns vagabundos jogados na rua e um menino inocente pedindo alguns trocados para um bêbado no boteco afim de comprar qualquer coisa. Isso era o começo da sexta-feira noite na São Paulo afastada. Claro, nada comparado com as noites em Frisco ou Denver, mas ainda sim, bela por sua melancolia natural. Daria um bom retrato. Como percebi que o velho no bar nem os olhos conseguia abrir, do bolso tirei alguns trocados e dei para o menino que me agradeceu, olhei para a lua uma última vez e sai rumo à liberdade!

No ônibus com destino ao centro elitizado, onde a festa tomaria cor, aniquilamos a garrafa inteira em poucos minutos de viagem. Agora já estávamos em três, o Rodrigo já havia entrado no ônibus em algum dos pontos anteriores. O som dos fones de ouvido faziam o espírito elevar-se. Pessoas ao redor notavam nossa inlúcida loucura. Andávamos em sinergia, loucos pela vida! Três alguéns que buscam extrair tudo o que a metafísica vida nos oferece de mais intenso, desde as mais simplórias coisas até aquelas que chamamos de pecado. Intensidade é pouco para classificar-nos nesse dia! Ocupávamos o fundão do veículo, naqueles assentos últimos que formam uma fileira completa de cadeiras, eu sentava na janela direita ouvindo a transcendencia em música atravez do fone, enquanto os outros dois tratavam de planear aquela noite, davam-me a entender que mirabolizavam, conseguia ouvir as risadas dementes saindo daquele outro lado. A luz da lua vinha de encontro em seus rostos através da janela, faziam deles grandes guardiões templários pelo retrato místico que formavam. O Rodrigo com seu boné e as enormes levas de cabelo saindo por volta dele, parecia um maníaco iluminado gargalhando. O Sábio olhou pra mim e riu maquiavélicamente...

No bar de uma esquina, decidimos tomar umas cervejas antes de entrar. Cada um com uma lata enquanto andávamos na rua luminosa da avenida Paulista devidamente decorada pelas datas comemorativas à seguir, como todo ano. Luzes flamejantes lembravam o nascimento de Jesus, enormes arranha-céus enfeitados padronizavam aquilo que já estamos acostumados, pessoas andando pra lá e pra cá com pressa, vestidas formalmente para reuniões à portas fechadas. Alguns vagabundos com fome pedindo esmola do outro lado da rua cinzenta e esvoaçante. O centro!

Lá dentro, já estava normalmente alto. O telão chamava atenção por suas cores. O som no começo era progressivo.
Tratei de pegar mais cervejas enquanto os dois admiravam débilmente tentando entender a 'decór fluor'* àquele som fino. Peguei três latas, vorazmente extintas dentro de poucos instantes. Dançavamos e encontrávamos alguns amigos que também celebravam libertos. O Sábio tratou de pegar mais algumas latas, também em poucos minutos, nem mais uma gota. Mais tarde, o som já era outro, sessão descarrego! Algo que lembrava um maracatú, porém, não era necessário ninguém usar seus instrumentos para fazer o barulho, a tecnologia fazia tudo. Virou bagunça. Pesado e psicodélico, Disfunction o nome do projeto, fez todo mundo pular e dançar, todos celebrando estarem vivos e paralelos à qualquer preceito normativo de uma sociedade sistemática. Ali éramos todos um! Um grupo de "loucos" em busca da real inteligência humana. Abraços eram trocados. O guardião iluminado descarregava suas energias bem no centro da pista, todos notavam seu espírito, seu colar no pescoço sacolejava a cada movimento de seu corpo em sincronia com o som. Talvez umas duzentas batidas por minuto, e seu corpo as acompanhava em completa naturalidade, seus olhos estavam fechados... O Sábio permanecia estático, com um copo de vodka nas mãos, peguei aquele copo de sua mão e fui para outro ambiênte, subi as escadas e golava vez por outra aquela bebida forte. Lá em cima, hipnotizei... Descarregava as energias como alguém que à tempos não fazia. Sentia todas aquelas vibrações pulsantes de minha melancólica vida, jorrando-se para fora ao infinito desconhecido mundo de confusões, as duzentas batidas por minuto eram poucas para mim, meu corpo inteiro se mechia, perdi o controle, tudo o que fazia era pensar, enquanto meu corpo movia-se por si só, fiquei à mercê 'daquilo'!
Ah, o telão...


Decór fluor = Decoração fosforescente. Utilizadas geralmente em festas trance, psicodélica.

sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Reflexão nostálgica

Quando dei por mim, já estava delirando com o som futurista e com uma tecnologia não pertencente à este plano. Olhava ao meu redor, todos dançavam o ritmo alucinante. Sincronismo do tempo, com a música e as pessoas. Tudo estava belo, o sol estava belo, as pessoas eram belas, o lugar era fantástico. Sentia-me seguro, com amigos ao redor, nada de ruim por ali. Um lugar onde a maioria das pessoas possuiam uma mente ampla o suficiente para voltar a atenção às coisas que realmente importam... O mal não existia ali. Entrei neste mundo, ilusório ou não, exuberante! Nessa viagem onde parti, fiz muitas coisas, conheci muitas pessoas, em especial... a fada:

"Abrimos e expandimos os horizontes em uma viagem astral, na qual atingimos um grau em nossas mentes onde nos permitimos ser tudo e estar em tudo.. Fomos para os mais bonitos lugares e descobrimos as mais belas pessoas. Conhecemos a bondade e a ruindade, fomos a bondade e a ruindade. Entramos em um universo onde existiam balões coloridos, chicletes sortidos e o Arco Mágico Colorido. Lá, eu era o Deseínho e ela a Sininho, a fada. Ambos voávamos e tinhamos o poder de nós dois juntos, conseguir o que quisessemos. Consigo ainda me lembrar dos olhares malevolentes, como que nos invejando por sermos seres em total sintonia. Tinhamos o poder! Éramos do bem em um lugar onde dificilmente pudesse haver. Em um mundo ilusório construido pelo malígno, conseguiamos nos adaptar e tirar tudo de letra. Há quem diga, que eramos Almas Gêmea. Diz a lenda, que quando uma alma encontra sua outra, tudo torna-se mágico e belo, tudo torna-se fácil. De uma hora pra outra, o mundo torna-se nosso, abrimos a mente e conquistamos a Via-Láctea! Vivemos entre o céu e a terra..."

Essa foi a relação que tivemos.
Até hoje não sei bem o que foi aquilo, mais com certeza algo platónico!

(Primeiro post, prazer em conhecer quem quer que seja)