Showing posts with label Mário Soares. Show all posts
Showing posts with label Mário Soares. Show all posts

Tuesday, March 01, 2022

PERIGOSíSSIMO

 

Visão c/p

Putin, um homem perigoso

No sábado, dia 9 de maio, Vladimir Putin invocou o fim da II Guerra Mundial, mostrando, simultaneamente, a contribuição dos aliados para a vitória sobre os nazis. Ao mesmo tempo, e na presença somente do Presidente chinês Xi Jinping – os europeus este ano faltaram à cerimónia -, fez desfilar toda uma enorme parada militar, digamos impressionante, a maior desde o fim da União Soviética. Desfilaram 16 mil militares, 143 caças e helicópteros e 194 novos tanques. Ou seja, tratou-se de uma demonstração inequívoca de grande força e poder militar. Daí a impressão de que a Rússia estará a preparar-se para uma nova guerra e não para a paz. Tudo isto a propósito do conflito com a Ucrânia e da violação do espaço aéreo de vários países europeus, entre os quais Portugal.

Putin foi, no tempo da URSS, um agente dos serviços secretos do KGB, ou seja, a polícia secreta da União Soviética. Com o passar dos anos, a União Soviética deixou de ser uma ditadura, com Mikhail Gorbachev, que tive a honra de conhecer pessoalmente, como antes conhecera Leonid Brejnev, que foi o Presidente dito da détente, por ter querido restabelecer relações entre a Rússia e a Europa. Foi com ele que falei da intenção de Álvaro Cunhal querer fazer de Portugal a «Cuba do Ocidente», coisa que Brejnev rejeitou em absoluto, estando como estava na détente em relação ao Ocidente.

Voltando a Putin. Ao contrário do que sucedeu em 2005, em que teve ao seu lado os principais líderes europeus nas comemorações do fim da II Guerra Mundial, no sábado, 9 de maio de 2015, esses mesmos líderes não aceitaram o convite, invocando o conflito no Leste da Ucrânia e acusando o Presidente Putin de continuar a apoiar os separatistas pró-russos.

Putin quis ter um relacionamento privilegiado com a senhora Merkel, que era comunista quando estava na Alemanha de Leste. Contudo, os europeus obrigaram-na a estar com a Ucrânia, cortando a relação especial que tinha com o Presidente russo.

No domingo, 10, a seguir à parada militar, houve em Moscovo uma homenagem ao soldado desconhecido. Ao lado de Putin, a senhora Merkel, pressionada pelos europeus, disse: «Foram a anexação criminosa da Crimeia e os confrontos militares no Leste da Ucrânia, que violam o Direito Internacional, que fizeram com que a cooperação tenha sofrido um sério revés…»

Sendo um homem difícil e hoje Presidente da Rússia, Putin tem o seu poder, que não é pequeno. Terá deixado de ser comunista, porque hoje, partidos comunistas, só há em raríssimos Estados, como em Portugal. Putin sabe disso muito bem e é um homem voltado para o futuro e não para o passado. Mas a questão da Ucrânia criou-lhe um grande problema. E isso pode vir a ter consequências mais graves como a do assassinato de Boris Nemtsov, líder da Oposição russa, ocorrido em 27 de fevereiro deste ano. Veremos. Mas tudo leva a crer que Boris Nemtsov tinha provas da participação da Rússia no conflito do leste ucraniano.

Em conclusão, Vladimir Putin é um homem perigoso. Ou, como dizem os brasileiros, um homem astuto, perigoso e imprevisível.

Artigo publicado, na seção Ensaio, na edição de 14 de maio de 2015

 

Sunday, January 08, 2017

MÁRIO SOARES

Cito de cor  a resposta de Mário Soares a uma pergunta de Fátima Campos Ferreira  nesta entrevista de 30 de Maio de 2013, e retransmitida ontem à noite na RTP.

FCF - Mas como é que o senhor enfrentou as opiniões contrárias à sua dentro do seu próprio partido?
MS  - Sucedeu-me isso quando, dos catorze membros do Secretariado, só três se mantiveram ao meu lado. Mas enfrentei-os, e depois pensei, como é que estes tipos me obedecem?, gente com muito melhor preparação académica do que eu, gente com vinte e dezanove valores ...
FCF - O engenheiro Guterres ...
MS - Sim, o Gueterres, o Constâncio, mas também o Sampaio, todos se viraram contra mim. E eu dei um murro na mesa, e eles obedeceram-me! 

Creio que é difícil encontrar melhor síntese do carácter determinado, possante, de antes quebrar que torcer, de Mário Soares. 
Figura central da democracia portuguesa, não foi o protagonista pacífico que a bonomia com que mobilizava o aplauso entusiástico de muitos portugueses intuiria parecer. Ficarão memoráveis nas páginas que a história lhe dedicará as rupturas crispadas, em momentos muito distanciados no tempo, com amigos do peito, Zenha e Alegre, entre vários outros. 

Depois de ouvir grande parte da entrevista, inquestionavelmente um testemunho imprescindível para compreender a personalidade de Mário Soares, vi, salvo erro na mesma estação televisiva, o programa das cerimónias e o trajecto do funeral entre a saída da sua casa no Campo Grande até ao Cemitério dos Prazeres, em voltas que vão atravessar a parte central e ribeirinha de Lisboa até aos Jerónimos para retornar a locais mais intimamente ligados à sua vida política.

A despropósito, admito-o, mas ocorreu-me a recente peregrinação das cinzas de Fidel Castro de uma ponta à outra de Cuba. A humanidade, quaisquer que sejam as suas convicções sobre a vida depois da morte, nunca admite a inexistência de seres superiores aos comuns mortais mesmo quando se afirma convictamente ateia. 

---

Pela resistência com que, durante toda a vida, e nas mais diversas circunstâncias, lutou pela democracia, 
Obrigado, Mário Soares.


Thursday, March 10, 2016

A FESTA FOI BONITA, PÁ, ESTAMOS CONTENTES

Marcelo tomou posse e, à noite, saltou à cadência da música de Abrunhosa, lembrou-me Dom Pedro na rambóia com a Lisboa medieva pobre.
O país estava a precisar de um presidente assim, à maneira de Mário Soares, ouviu-se repetidamente, e o próprio Marcelo não escondeu, mesmo durante a campanha eleitoral, que lhe admirava o estilo. Não a dançar, Soares, mesmo quando jovem, segundo parece, tinha o pé pesado.


Hoje está em Lisboa Pierre Moscovici para discussões com António Costa e Mário Centeno*.
Eurogrupo insiste num Plano B. 

Por razões óbvias, um plano B não é hipótese de que se reconheça publicamente a existência (mas que, no entanto, não pode deixar de existir) e se divulgue antes que se torne imperioso adoptá-la. Se anunciar um plano é uma jogada arriscada, divulgar uma hipótese alternativa equivaleria a comprometer o Plano A, que, neste caso, é o OE 2016. Estará o Eurogrupo a tentar precipitar o derrube do governo quando pretende o anúncio público da insuficiência das medidas previstas no OE, ainda em discussão  na especialidade? Ou ficará sossegado quando hoje António Costa tiver uma conversa de pé-de-orelha com Pierre Moscovici?

A propósito de planos que, como os chapéus, há-os de vários feitios:
Completam-se hoje 30 anos sobre a data em que  Mário Soares iniciou o seu primeiro mandato como Presidente da República. 
Nos primeiros dias de 1986 tinha havido um frente-a-frente entre Freitas do Amaral e Maria de Lourdes Pintassilgo. A páginas tantas, a discussão de ideias centra-se no confronto entre as virtudes e os malefícios do Plano. Freitas do Amaral aceita o Plano porque a Constituição** obrigava, Maria de Lourdes Pintassilgo considera o Plano uma exigência de sobrevivência nacional. 
Que o Plano não é assim tão útil e pode até ser perigoso, explica Freitas do Amaral, mostra-o o facto de haver países que não perdem tempo com planos, e são muito felizes com isso, e, pelo contrário, países que têm no Plano o seu santo salvador não passam da cepa torta. Quanto muito, Freitas do Amaral, concede que deveria haver um conjunto de objectivos. 
Por pouco, não venceu as eleições na primeira volta. 

Defrontou Mário Soares na segunda volta, que havia partido de uma posição de popularidade, medida pelas sondagens, inferior aquela com Cavaco Silva deixou ontem a presidência. 
No frente-a-frente final, Freitas do Amaral foi analítico, exaustivo na explicitação dos objectivos que se propunha atingir como presidente da República; Mário Soares, foi sintético, mais voltado para a contestação à consistência dos propósitos do seu opositor do que dar conta dos seus.  Venceu Mário Soares.

Trinta anos depois, Marcelo Rebelo de Sousa, tomou posse como Presidente da República. 
Foi eleito à primeira volta, assumindo explicitamente ver em Mário Soares o modelo que se propõe adoptar, sem obediência a planos prévios, movimentando-se consoante as circunstâncias. Mais do que manda a Constituição, a presidência é moldada pela personalidade do incumbente, ouviu-se ontem com insistência. 

Não sabemos, nem saberemos como se haveria Mário Soares com o espectro no horizonte próximo de planos de medidas de austeridade, que colocarão à prova a fragilidade do apoio condicionado ao Governo.
Como se haverá Marcelo Rebelo de Sousa com eles? É esse o travo amargo de quarta-feira de cinzas.

** Constituição da República - 1976
Na revisão constitucional de 2005 - Constituição da República - Revisão de 2005 - o Plano subsiste
imperativo ... mas, na realidade, meio esquecido.

Wednesday, February 10, 2016

DO LADO DE ESPÍRITO SANTO

P -     Continua a ir com Mário Soares almoçar a casa de Ricardo Salgado?
CM - Claro. Muitas vezes
...
P -    Não acha que ele ganhou um poder muito grande?
CM - Traduzido em quê?
P -     Em influência. A banca é um espaço onde se cruzam interesses privados e políticos.
CM - Que o sector político depende do sector financeiro não tenha dúvidas ... e continua a ser assim em todo o lado do mundo. Isso é perverso, sim. Mas é a verdade. Como é que as pessoas à frente dos bancos utilizam o poder é outra coisa. Mas que eu saiba, Ricardo Salgado nunca o utilizou de forma menos digna. E tentou compatibilizar os interesses do grupo familiar. 
...
P -    Tem a noção de que quando se fala da banca o cidadão tem um arrepio na espinha?
CM - Tenho. ... sempre que me procuram para perguntar o que devem fazer com o dinheiro (eu nem devia dizer isto publicamente) respondo: "Vão para o imobiliário, que é o que eu faço" ...
...
P -     Não contemplou o investimento reprodutivo?
CM - Não. Porque não tenho confiança no que possa vir a acontecer nos próximos seis meses. Estamos todos a navegar à vista. - Carlos Monjardino/ entrevista do "Público"

---
A franqueza do sr. Monjardino é assombrosa. 
Pelo menos tão assombrosa quanto o seu desplante.
Ninguém o julgará menos digno pelo facto de jantar muitas vezes em casa de um amigo com quem ao longo muitos anos, certamente, se brindaram mutuamente com reciprocidades de interesses. De mais a mais com a presença tutelar de um outro amigo, com mais idade e mais lustre, que se desdobra em acções temerárias de abrigo a amigos do peito das temerosas investidas dos agentes da justiça. 

Mas é incrível que o sr. Monjardino ignore algumas das práticas menos dignas do seu anfitrião que estiveram na origem do descalabro do conglomerado centrado no GES, provocando na queda perdas ainda incalculáveis  que os portugueses são, indignamente, chamados a pagar. 

Esta entrevista é um espelho do outro lado do País. 

Wednesday, August 20, 2014

E SE DECRETÁSSEMOS O FIM DO CAVAQUISMO?

E se decretássemos o fim do Cavaquismo?
Pergunta, e decreta,  o prof. Pedro Lains num ensaio publicado aqui.
Comentei aqui.
 
Prof. Pedro Lains,

Leio e releio o seu texto e surpreende-me que atribua ao prof. Cavaco Silva responsabilidades, e alguns méritos, suponho, de quase tudo o que terá acontecido neste país desde a adesão ao euro, implicitamente desvalorizando totalmente os governos dos engenheiros Guterres e Sócrates e só muito tenuamente admita algumas responsabilidades de Mário Soares e, usando os seus termos, da linhagem histórica socialista. Tamanha quase exclusividade de responsabilidade assacada ao prof. Cavaco Silva parece-me decorrer mais de uma aversão pessoal do que de uma apreciação isenta de um economista historiador (ou vice versa). O exagero é o maior desvalorizador mesmo de um bom argumento. 

Passando da apreciação histórica dos factos (que só a História sedimenta) para as suas propostas, a minha surpresa aumenta.

Primeiro - Propõe, e cito, que "os departamentos onde se estuda a teoria económica deveriam contratar (ou contactar) cientistas políticos, historiadores, sociólogos, antropólogos, para estimular a discussão social e política no seu interior."

Admitindo, benevolentemente, que se trata de um bom ponto de partida, pergunto: Os departamentos a que alude não são livres de contactar outros cientistas sociais em funções em departamentos homólogos? Perguntando de outro modo, não são os cientistas sociais, historiadores, sociólogos, antropólogos, deste país, já investigadores pagos pelo OE? Ou, ainda de outro modo, por que esperam?

Segundo - Propõe que sejam "alteradas as relações entre o poder financeiro e os órgãos de comunicação social, alteração que deve partir dos dois lados".

Não é ingenuidade a mais esperar que as relações (que eu interpreto como dependências) dos orgãos de comunicação social relativamente ao poder financeiro sejam alteradas por mera vontade das partes? Ou percebi mal?

Terceiro - Propõe "a monitorização de reuniões entre banqueiros e políticos, que deveriam ser públicas, com comunicados sobre as matérias abordadas e respectivas conclusões. Fora delas, não devia haver encontros ou confraternizações".

Aqui, Caro Prof. Pedro Lains, o meu espanto é total. E perdoe-me perguntar-lhe: Em que mundo tem vivido?

Quarto - Propõe "uma maior intervenção do Governo junto dos reguladores, para coordenar o seu trabalho, dentro e fora de fronteiras, e para lhes dar maior protecção política."

Fico confuso porque acredito que a actividade de regulação só será eficiente se existirem mecanismos que obstem à captura dos reguladores pelos regulados. Ora a sua proposta não me parece confrontar-se com a inevitabilidade que referi. 

Quinta - Propõe "mudar a política oficial relativamente aos países menos transparentes de onde vêm grandes fluxos de capital."

Percebo onde quer chegar, e concordo consigo.
O problema é que eles já cá estão dentro, e muito dentro.
Tem alguma ideia para os retirar ou, pelo menos, parar de avançar? Aí é que está o busilis da questão, caro prof. Pedro Lains.
 ---
Extra comentário - Venham mais cinco!



Sunday, April 13, 2014

OS PROTAGONISTAS

40 anos depois

Destaco a imagem mais positiva, de Ramalho Eanes (61%), e a maior queda de Mário Soares (10 pontos percentuais, para 38%) nos últimos dez anos apesar de atingir o máximo (100%) em notoriedade.
 
Conclusão (minha): a insistente intervenção política de Mário Soares, se lhe grangeou a admiração e o espanto de muitos, valendo-lhe o reconhecimento de personagem do ano pela imprensa estrangeira em Lisboa, tem-lhe corroído notoriamente a imagem junto da opinião pública. 

Mas sondagens, são sondagens, vocês acreditam em sondagens?

Tuesday, May 28, 2013

À ESQUERDA DA AUSTERIDADE

O iOnline publica uma entrevista ao senhor Mário Soares a propósito da reunião de esquerda das segundas categorias (Seguro prometeu mandar alguém, o secretário-geral do PCP não foi directamente contactado ...) que o ex-Presidente da República convocou para o próximo dia 30 na Aula Magna da Universidade de Lisboa e que pode ser lida aqui.
 
Antes de mais, concorde-se ou discorde-se, no todo ou em parte, das afirmações do entrevistado, há que reconhecer a tenacidade e a rebeldia de um homem que, ainda a recuperar de um grave acidente de saúde, aos 88 anos de idade continua, à sua maneira, um percurso de luta pelos seus ideais políticos nucleares de sempre, mesmo se esse percurso apresente não raras vezes sinuosidades e até evidentes contradições.
 
Nesta entrevista, é muito saliente que nem os anos nem a enfermidade lhe retiraram a sua capacidade argumentativa de sempre. Fixado na defesa de uma ideia, se lhe contraditam o discurso, desenvencilha-se, se não lhe convir ou não souber retorquir, remetendo a responsabilidade da resposta para terceiros. Sendo o tema central da entrevista a reunião na Aula Magna e o objectivo da reunião a luta conjunta da esquerda contra a austeridade, colocado perante uma questão incontornável, que lhe emperra a narrativa, responde, sem rodeios, "isso não é comigo" *
 
Mas, de toda a entrevista, no entanto, há uma afirmação de Mário Soares, que só colateralmente tem relação com o tema central,  que o jornal i usa como título e está a ser usada pelas citações feitas na imprensa em geral: Portas tem sido chantageado pelo Governo pelo governo por causa do processo dos submarinos e dos carros de combate Pandur. Quando, pela primeira vez, Portas admitiu que estava a ponderar se ficava ou não, o caso dos submarinos voltou à primeira linha. E isso obriga-o a continuar no governo. O medo é que manda na vinha... (supõe-se que, nesta última frase,  há erro de transcrição do jornal ou lapsus linguae do entrevistado).
 
Quando é quase unânime que o destino político de Passos Coelho depende da espada de Portas, aparece sorrateiramente Mário Soares  a  espicaçar Portas. Sabe-a toda desde pequenino, salvo unir a esquerda em Portugal.
 
----
 
*Mas há um problema complicado. Há um ano, o sr. dr. defendeu que o PS devia romper com o Memorando da troika. Mas a verdade é que o PS não rompeu com o Memorando da troika. E isto pode conduzir-nos a um beco sem saída: este governo cai, já quase toda a gente o dá como moribundo, mas depois é substituído pelo PS, que vai ter de se submeter ao mesmo Memorando da troika?
Pois, mas isso não é comigo. Não tenho responsabilidades partidárias, hoje, nem as quero ter. Isso é com os partidos, com as centrais sindicais e com o povo, que é quem mais ordena.
 
 
 
 

Thursday, November 29, 2012

CARTA ABERTA

Carta aberta de 70 personalidades pede a Passos Coelho que se demita,  é o título da notícia no Público, que publica a carta em questão e os nomes dos signatários. Soares e 77 personalidades exigem demissão de Passos, o título no Diário de Notícias.
 
Setenta ou setenta e sete, a diferença é irrelevante. O que realmente conta é o objectivo da carta: "interpretar o clamor que contra o Governo se ergue, como uma exigência, para que o Senhor Primeiro-Ministro altere, urgentemente, as opções políticas que vem seguindo, sob pena de, pelo interesse nacional, ser seu dever retirar as consequências políticas que se impõem, apresentando a demissão ... "       
 
Portugal é um país com uma longa tradição de abaixo assinar. Nada de original, portanto, nesta carta das setenta ou setenta e sete personalidades que publicamente se fizeram intérpretes da exigência pública para que o primeiro-ministro se demita se não se decidir a alterar as opções políticas que vem seguindo.
 
São inconsistentes os considerandos e enviesadas as conclusões? Não são. Ninguém, nem sequer o primeiro-ministro, tem dúvidas que a opinião pública reprova, maioritariamente, hoje, e reprovará muito mais amanhã, as medidas de austeridade que lhe levam o couro e o cabelo. E que eleições legislativas antecipadas determinariam, muito provavelmente, a queda do governo. Nesse caso, que sequência governativa recomendariam os signatários da carta aberta?  Um governo minoritário do PS, ou, muito surpreeendentemente, uma coligação de esquerda incluindo o PCP e o BE, ou apenas um deles com o PS? 
 
Por onde andavam os setenta e tantos quando a dívida subia a níveis que nos colocaram o País à beira do abismo há cerca de dois anos atrás, ainda não governava Portugal o senhor Passos Coelho? Por que não os convocou nessa altura a urgência de reclamar a mudança de política que há muito tempo se impunha e que só a força das circunstâncias tão tardiamente acabou por derrubar o governo de então?
 

Tuesday, April 24, 2012

PARÁBOLA DO CASAL COM CONTA CONJUNTA


O Financial Times de hoje publica um artigo de Kenneth Rogoff ( professor de economia na Universidade de Harvard e co-autor de “This Time is Different”) - Uma parábola para o euro : um casal com uma conta bancária conjunta.


A parábola é conhecida, Kenneth Rogoff acrescenta, no entanto, um conjunto de outros titulares à conta inicial  para vincar mais a demonstração de que não há grupo que não acabe por se desintegrar se não houver entre os seus elementos um conjunto de valores centrípetos que lhes garanta unidade ao longo da viagem pelo tempo. 

Na sua versão original e mais simplificada que esta de Rogoff, pergunta-se se é possível a perdurabilidade da união de um casal que possui uma conta conjunta no banco mas um dos parceiros é perdulário ao ponto de afundar a solvabilidade e a credibilidade financeira do outro. A resposta óbvia é não. Por mais intensos que sejam os outros laços que os unem, mais tarde ou mais cedo o desregramento perdulário de um deles acabará por destroçá-los. A probabilidade dessa ocorrência aumenta quando aumenta o número de elementos ligados pela mesma conta conjunta. As vantagens, que também existem, na medida em que os banqueiros retribuem melhor as contas maiores, desfazem-se se um ou mais elementos do grupo colocar em causa a fiabilidade do conjunto.

Acontece o mesmo com um conjunto de países unidos por uma moeda comum. A mobilidade do factor trabalho entre os países membros é uma condição necessária mas não suficiente à coesão da união. Uma moeda comum exige, entre outros factores de coesão, uma autoridade fiscal central com autoridade tributária sobre os países membros, um regulador financeiro central, mas sobretudo não pode dispensar a legitimidade do poder de uma união política.

Em resumo: A União Europeia ou é uma união política legitimada democraticamente ou será desunião com todas as consequências dramáticas que esse divórcio implicará.

Dentro de algumas horas, cerca das 10 da noite, celebram-se 38 anos do início dos movimentos militares que no dia seguinte derrubariam um regime de quatro décadas que caiu sem que alguém tenha disparado um tiro em sua defesa. Este ano, as celebrações do 25 de Abril não vão contar com os militares representados na Associação 25 de Abril, Mário Soares também já fez saber que não contem com ele e Manuel Alegre, idem aspas. Argumentam, certamente por desmemoriação pontual, que a soberania do país está no prego e culpam este governo da afronta. 

Há dias, soube-se que o governo dos Países Baixos, que não se encontram em situação de fragilidade financeira, se demitiu por falta de apoio às medidas decorrentes do tratado recentemente assinado por 25 dos 27 membros da União Europeia.

Apenas  dois exemplos extremos, onde o incómodo das consequências da adesão a uma conta conjunta pré-nupcial ameaça acabar mais dia menos dia com a conta e destruir o grupo. A soberania, real ou imaginada, continua a determinar as emoções dos povos europeus enquanto eles não forem colocados perante a questão curial:

---, é de sua livre vontade ser europeu?, sujeitando-se a regras de convivência que não podem deixar de passar pela perda de soberania de cada um movimentar a conta conjunta conforme lhe der na real gana?  

---
Act. - É muito curioso, e essa foi a principal razão que me levou a escolher o artigo de Rogoff como tema do meu apontamento de hoje, que sejam sobretudo os economistas norte-americanos que defendem o federalismo como única saída para o impasse europeu. Na União Europeia, o assunto continua tabu. Mesmo os federalistas europeus não disfarçam o incómodo da, consequente,  perda de soberania, muitas vezes já largamente perdida.  

Wednesday, April 04, 2012

EU PAGO, TU PAGAS, PORQUE ELE NÃO PAGA

Acabo de ouvir que o carro em que seguia Mário Soares rodava a 199 km/hora na A17,  foi interceptado pela GNR e multado em 300 euros. A carta do motorista foi apreendida. Mário Soares não pagou a multa. O carro é do Estado.
O Estado paga a multa!, terá respondido Soares ao agente da GNR.
O Estado? Não. Quem paga, se o senhor não paga, são os contribuintes que pagam. ´

Senilidade, arrogância congénita ou falta múltipla de civismo?

Tuesday, April 26, 2011

OS REIS DAS FARÓFIAS

Passos Coelho diz que "fabricar uma espécie de União Nacional é uma perversão" (Público)

Parece cada vez mais evidente que Passos Coelho pretende perder as próximas eleições legislativas, e que Sócrates não desiste de as ganhar.

Depois dos apelos feitos por tanta gente convicta e demonstradamente democrática, Passos Coelho entendeu esses apelos como uma frente promotora de uma união perversa e, portanto, não democrática.

Diz PC,

“Ter a ideia de que, como estamos com um problema muito sério para resolver, temos de fabricar em Portugal uma espécie de União Nacional é uma perversão, ainda para mais a ser invocada num dia como este, porque a União Nacional não é desejada em Portugal, nem pelos que têm memória da que já existiu, nem por aqueles que, com prudência, aprendem lições do passado”.

O remoque acerta em cheio, nomeadamente, em Mário Soares que ainda a semana passada lhe atestou a capacidade de diálogo e que de há uns tempos a esta parte tem insistido na necessidade de um governo forte para enfrentar a crise. Mas atinge, principalmente, Cavaco Silva que fez no seu discurso de ontem um apelo inequívoco à formação de um governo com suporte maioritário no parlamento.

Até agora, Passos Coelho fez uma coligação pré-eleitoral com Fernando Nobre, geralmente considerada  desastrosa a todos os títulos. Apesar de declarações suas anteriores irem no sentido de formar um governo com suporte maioritário, no caso de ganhar as eleições com maioria relativa, as afirmações de PC,  hoje, ou são ininteligíveis ou só podem ser entendidas com o propósito de perder as eleições.

Por outro lado, Sócrates contornou as críticas à auto suficiência à agressividade,  que lhe seriam dirigidas, afirmando a sua inteira disponibilidade de sempre para o diálogo e culpando as oposições pela falta de consensos.

Passos Coelho será um ás em boas farófias mas não há quem como Sócrates para as enfeitar.

----
act - Sócrates à boleia do apelo de Cavaco deseja acordo com PSD

Tuesday, March 22, 2011

ANGÚSTIA PARA DEPOIS DE AMANHÃ

O apelo angustiado de Mário Soares no DN de hoje seria uma angústia patética se Soares não fosse quem é: um político experimentadíssimo nas artes políticas de vestir com palavras convictas intenções ocultas.

Porque, lendo este apelo de Soares, ninguém poderá deixar de concordar que o velho senhor tem toda a razão: Cavaco deve, neste momento crítico da vida nacional, dizer o que importa ser dito. Uma crise política, que no caso de eleições antecipadas se prolongará até ao último trimestre do ano, na melhor das hipóteses, arrasará ainda mais o já debilitadíssimo corpo do país.

Mas basta, ou é pelo menos um factor desbloqueador do actual impasse, que o PR se dirija à AR e diga aos deputados o óbvio? Claro que não é.
Quanto muito, e é essa a intenção encoberta do apelo de Sócrates, ajudaria a justificar perante a opinião pública as acções e omissões do PM no processo que está na origem desta recaída grave das relações entre os dois principais partidos.
Note-se, a este propósito por exemplo, que Soares denuncia as pressões internas no PSD para a convocação de eleições mas omite completamente as intenções no PS e as responsabilidades de Sócrates no desencadear da recaída.

O PR deve intervir. Há muito tempo que escrevo isso mesmo neste caderno. E agora mais que nunca. Mas Cavaco Silva encontra-se enquadrado por uma moldura constitucional que limita os seus poderes aos de notário do Estado e a dissolver a AR, o oito e o oitenta. Os constitucionalistas que gizaram as estruturas fundamentais do regime e os que as alteraram conceberam um edifício absurdo: o de convocarem o povo à eleição por sufrágio universal de um presidente com uma intervenção condicionada a ser exercida nos extremos. Mário Soares poderia promover a abertura do debate urgente desta absurdidade.

Mário Soares poderia ainda, com a autoridade moral que todos lhe reconhecem, dizer que a governação do país exige um apoio parlamentar muito amplo e que esse apoio deve ser promovido pelo PR mas que só pode ser atingido se o actual secretário-geral do PS e PM estiver disponível para aceitar partilhar a definição dos objectivos necessários, dos meios para os atingir e a realização das correspondentes acções.

Porque Mário Soares sabe, toda a gente sabe, que a alternativa às eleições antecipadas é a renúncia de Sócrates à liderança obsessivamente isolada de um país sujeito a ameaças de todos os lados.

O problema com que o país hoje se confronta não é de agora. Repito-me pela enésima vez: Cavaco Silva não deveria ter dado posse a este Governo da forma expedita com que o fez, atendendo às condições já periclitantes da altura.
A partir do início dessa aventura com naufrágio anunciado, Sócrates convenceu-se que poderia governar como se dispusesse de maioria absoluta porque o mar era de rosas. E as oposições estariam dispostas a aceitar-lhe todas as decisões. Não estavam, e ele sabia bem, que não estavam, não tinham estado já quando ele dispunha de maioria absoluta e foi obrigado a recuar com inicitivas de reformas que as oposições, muitas vezes estupidamente, diga-se em abono da verdade, boicotaram.

Mário Soares poderia, se quisesse dar mais um grande contributo para a consolidação da democracia e evitar a angústia que o atormenta, falar com Sócrates: Zé, é tempo mudares. Ou mudas de estilo, e alargas a base de apoio de um governo que possa completar a legislatura,  ou pedes a passagem à reserva. Eleições legislativas antecipadas só te garantem lá para Outubro, na melhor das hipóteses,  uma situação tão ruim como aquela em que nos encontramos e tu teimas não reconhecer.

Mas também a lucidez de Mário Soares é obnubilada pelo clubismo que fomenta um maniqueísmo, que ele repudia mas que o infectou irreparavelmente há muito.    

AFIRMA SOARES

Um apelo angustiado

 Há razões para admitir que a próxima Cimeira da União Europeia, que se realizará em Bruxelas, nos dias 24 e 25, quinta e sexta-feira, vai ser decisiva para o futuro da Europa e do euro. A agenda, pelo menos, é indiscutivelmente importante e se for cumprida, como se espera, representará um passo em frente no projecto europeu, há tantos meses paralisado.
...
...  a agenda europeia, da próxima Cimeira de Bruxelas, irá debater: a reforma do Governo Económico da União Europeia; o reforço do pilar euro, mediante a criação de um Pacto sobre o euro; a criação dos mecanismos de estabilidade financeira, com capacidade para valer aos países europeus em crise, como é o caso português e outros; e, finalmente, definir uma estratégia europeia para o crescimento do emprego, sem o que cairão na recessão, criando planos nacionais, para os Estados membros do euro. ..
... Com que autoridade, para negociar vantagens para Portugal, se irá apresentar em Bruxelas o primeiro-ministro português?

Não interessa agora discutir, do meu ponto de vista, a quem cabem as culpas do impasse criado. Quando há conflitos partidários, geralmente, as culpas são quase sempre, mais ou menos, repartidas. Vamos, de resto, ouvir, na campanha eleitoral que, ao que parece, infelizmente, se vai abrir, essa discussão interminável. Para quê? Talvez, para não termos tempo de tratar do essencial, o problema que mais aflige o Povo Português: como sair da crise, financeira e económica, em que estamos mergulhados? Será sensato, assim, sejam de quem forem as culpas, acrescentar-lhe uma crise política? Será que alguém pensa, em consciência, que a nossa situação vai melhorar, por ignorarmos durante mais de dois meses a crise que hoje nos aflige - a todos - lançando--nos numa disputa eleitoral, ganhe quem ganhar - PSD ou PS - haja ou não coligações, à direita ou à esquerda?

Depois, o CDS/PP vai estar contra o PSD, a disputar-lhe o terreno, palmo a palmo, como se percebeu no Congresso de Viseu. Os Partidos da extrema-esquerda radical não se entendem, como se tem visto, mas estarão ambos contra Sócrates, o que só o reforça, no interior do PS. Mas nenhum partido quer realmente deitá-lo abaixo. Para ficar pior? Quer fritá-lo em lume brando, o que é diferente. Com a excepção, talvez, de Passos Coelho, porque está, cada vez mais, a sofrer pressões internas nesse sentido.

Quando o País acordar dessa campanha eleitoral, que só desacreditará os Partidos - os políticos e o País - quem terá condições efectivas para governar e nos tirar da crise? E por quanto tempo? Passos Coelho? Outra vez, Sócrates? À beira da bancarrota, o Povo Português estará então, desesperadamente, a pedir um governo de salvação nacional ou até: um salvador (que felizmente parece não ser fácil encontrar) visto não estarmos nos anos trinta do século passado...

No meu modesto entender, só uma pessoa, neste momento, tem possibilidade de intervir, ser ouvido e impedir a catástrofe anunciada: o Senhor Presidente da República. Tem ainda um ou dois dias para intervir. Conhece bem a realidade nacional e europeia e, ainda por cima, é economista. Por isso, não pode - nem deve - sacudir a água do capote e deixar correr. Como se não pudesse intervir no Parlamento - enviando uma mensagem ou chamando os partidos a Belém - quando estão em jogo, talvez como nunca, "os superiores interesses nacionais". Tanto mais que, durante a campanha eleitoral para a Presidência, prometeu exercer uma magistratura de influência activa. Não pode assim permitir, sem que se oiça a sua voz, que os partidos reclamem insensatamente eleições, que paralisarão, nos próximos dois meses cruciais, a vida nacional, em perigo iminente de bancarrota.

Se não intervier agora, quando será o momento para se pronunciar? É uma responsabilidade que necessariamente ficará a pesar-lhe. Por isso - e com o devido respeito - lhe dirijo este apelo angustiado, quebrando um silêncio que sempre tenho mantido em relação ao exercício das funções dos meus sucessores, no alto cargo de Presidente da República.
...

Tuesday, March 15, 2011

AFIRMA SOARES

Sócrates não ter informado Cavaco "é imperdoável"
Triste Europa

por MÁRIO SOARES
1. Para quem há mais de cinquenta anos, como eu, é um europeísta convicto, a situação de decadência anunciada da União Europeia, sem valores - incluindo os comunitários, como a unidade, a solidariedade e a igualdade de todos os Estados membros -, representa uma imensa tristeza. Para além da falta de uma resposta concertada e conjunta à crise financeira e económica, as "receitas" propostas que corroem alguns dos Estados membros e a manifesta paralisia em matéria político-diplomática.
... Tento reagir, com realismo, como é meu dever, com a maior isenção e preocupado acima de tudo com o nosso país. Mas não é fácil, dado o clima de incerteza quanto ao futuro da União, a sobranceria do Governo alemão, que parece querer "germanizar" a Europa, e o facto de não haver comparação possível entre a generalidade dos grandes líderes europeus do passado e o egoísmo nacionalista dos de hoje.

A União Europeia - note-se - nesta fase é profundamente conservadora. Basta lembrar que entre os 27 Estados membros que a integram só três se reclamam do socialismo democrático ou da social-democracia e, mesmo assim, com poucas convicções.

... O capitalismo especulativo, sem valores éticos - que a crise financeira revelou, no seu pior -, está desacreditado, como os mercados especulativos, que só pensam no lucro, ignoram a crise, as pessoas, e põem Estados muitas vezes seculares, como o português, em tremendas dificuldades.

A globalização é um fenómeno irreversível - é evidente - mas está cada vez mais desregulada, o que torna imprevisível o futuro. As desigualdades entre pessoas e entre os Estados têm vindo a agravar-se perigosamente. O neoliberalismo, como ideologia, revelou-se um fracasso colossal, como há duas décadas foi a queda do comunismo, suscitando a mesma surpresa geral.

... É incontestável que a União Europeia, vista antes como um projecto político-social, invejável, original, de paz e de bem-estar, para todos, está hoje à deriva e sem rumo. Os seus dirigentes actuais, esmagadoramente conservadores, estão a perder contacto com a realidade e as populações, numa espécie de autismo político, que conduz ao descrédito, numa primeira fase, e depois à revolta. Perigosa situação!

Os actuais dirigentes europeus, e, em especial, os alemães e os franceses, que os seguem, obedientemente, negam-se a compreender que as receitas economicistas que impõem a certos Estados membros, longe de lhes resolverem as dificuldades, as complicam, até porque os conduzem, necessariamente, à recessão: mais desemprego, mais precariedade do trabalho, menos investimentos, crescimento zero e, em vez de progresso, regressão...

... é necessário um novo paradigma. Isto é: um novo modelo de crescimento. Introduzir regras e valores no capitalismo, pondo as pessoas acima dos mercados e estes submetidos a princípios éticos, o que implica a abolição dos paraísos fiscais e da economia virtual. Numa palavra: a economia real submetida à política e não o contrário. Ora, a verdade é que os actuais dirigentes europeus se recusam a ver a realidade e prosseguem ignorando a própria crise e deixando impunes os seus responsáveis. A prazo, se não houver mudanças, esta situação vai tornar-se intolerável e vamos assistir, não tenho dúvidas, a grandes convulsões.

Portugal nesta Europa

2. ... Criticar é fácil e protestar, mais ainda. É legítimo, aliás, em democracia, criticar e protestar, desde que o façam pacificamente. Mas agir, desinteressada e conscientemente, é melhor, desde que seja em função de uma alternativa, coerente, eficaz e estruturada, tendo uma visão do futuro, inserida num mundo em mudança. É o caminho para podermos sair do atoleiro em que nos encontramos.

É preciso informar completamente os portugueses da situação em que estamos, para os poder mobilizar. O que não tem sido feito suficientemente pelos responsáveis. O Presidente da República, no seu discurso de posse, insistiu neste ponto. Mas omitiu que a crise portuguesa actual foi causada e continua a ser, altamente influenciada, pela crise internacional e, em especial, pela europeia. Ora isso constituiu uma falha inaceitável, mesmo que não tenha sido voluntária.

O primeiro-ministro tem-se esforçado, na resolução da crise, com um zelo patriótico e uma energia pessoal absolutamente excepcionais. Mas cometeu erros graves: não tem informado, pedagogicamente, os portugueses, quanto às medidas tomadas e à situação real do País. Nos últimos dias, negociou o PEC IV sem informar o Presidente da República, o Parlamento e os Parceiros Sociais. Foram esquecimentos imperdoáveis ou actos inúteis, que irão custar-lhe caro. Avisou tão só o líder da Oposição, após a reunião de Bruxelas, pelo telefone. A resposta pública foi-lhe dada no discurso que Passos Coelho proferiu, em Viana do Castelo, muito didáctico, e foi negativa: "Não conte com o PSD para aceitar as novas medidas (negociadas/impostas?) pelos líderes da Zona Euro, reunidos no dia 11 de Março, em Bruxelas." Assim se abre, ao que parece, uma crise política, a juntar às outras que a precederam: financeira, económica (estamos a entrar em recessão), social, ambiental e de valores.

E agora? Ao invés do que parece, tudo ainda pode acontecer. Porque os Partidos da Oposição - todos - não querem ir para o Governo, nem assumir responsabilidades, numa situação que não é agradável para ninguém. O Presidente da República, perante o impasse criado, vai dissolver o Parlamento e provocar eleições? Para cairmos, no pior momento, numa campanha eleitoral, como a última presidencial, com as culpas atiradas uns aos outros, sem tratarmos dos problemas nacionais? E para quê? Para chegarmos, talvez, a resultados, mais ou menos, idênticos? Mas se o não fizer, deixa que o Governo - e o PS, o que é mais grave - fiquem a fritar em lume brando? Com que vantagem para o futuro?

As informações (poucas) que me chegaram da reunião de Bruxelas indicam que houve pela parte da União dos Estados da Zona Euro um pequeno passo em frente, incluindo, obviamente, a Senhora Merkel. ... o que seria importante era que os dois Estados ibéricos exigissem uma política europeia convergente e falassem no mesmo sentido. Dar-lhes-ia, em termos europeus, uma importância redobrada. Temos connosco a Comunidade Ibero-Americana e a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Não é pequena coisa, em termos europeus.

Veremos o que se passará nas duas próximas semanas, que serão decisivas para a União Europeia e, seguramente, também, para Portugal.

A geração à rasca

3. Entretanto, realizaram- -se em várias capitais de diferentes distritos, incluindo Lisboa e Porto, manifestações da chamada "geração à rasca", contra o desemprego e a precariedade do trabalho e, como se previa, contra o Governo, os políticos em geral, alguns conhecidos empresários, gestores públicos, juízes e promotores do Ministério Público... Conforme os gostos, as frutrações ou a raiva dos participantes interrogados, pelas televisões e as rádios.

Foram manifestações perfeitamente ordeiras que mostraram o desespero que se vive e em que participaram muitos milhares de pessoas de todas as idades. Curiosamente tantos idosos e gente de meia-idade, mulheres e homens, como jovens. Em certos momentos, com um ar de festa, a lembrar as manifestações espontâneas do 25 de Abril. Os jovens mais pobres - desempregados e imigrantes - dos arredores das grandes cidades, poucos participaram, estranhamente, em comparação com os jovens com cursos superiores, sem emprego, filhos em geral das classes médias, que disseram querer emigrar. Foi uma manifestação que merece um estudo sociológico aprofundado e isento. Mas que o Governo, nas dificuldades do presente, não pode nem deve menosprezar. É um sinal tremendo que deve ser tomado em conta. Tanto mais que, estrategicamente, os professores também se manifestaram, no mesmo dia; os condutores de veículos pesados entraram em greve no dia seguinte e por tempo indeterminado; e no dia 19, salvo erro, a Intersindical (CGTP/IN) tem convocada uma grande manifestação. Perante tais sinais os responsáveis não devem encolher os ombros, como habitualmente. São expressões múltiplas de um mal-estar social e político que está a levedar, vai intensificar-se, mas contém energias que podem ser úteis. Pode ser muito perigoso.

Compreendamos que não é só a juventude que está à rasca - a palavra pegou -, é o País, no seu conjunto, que está à rasca! Há que ter consciência da situação em que estamos - sobretudo o Governo, os Partidos e os movimentos cívicos democráticos - e agir, rapidamente, em conformidade. Antes que seja tarde.

Tuesday, June 01, 2010

AFIRMA SOARES - 2

Ouço na rádio, esta manhã, que Mário Soares  escreveu no Diário de Notícias que "Sócrates cometeu um erro grave ao vir anunciar já o apoio do PS à candidatura de Alegre". Também os jornais, incluindo o próprio Diário de Notícias, realçam esta afirmação do ex-Presidente da República. No Público, por exemplo, do longo artigo de Mário Soares  apenas a última parte é referida.
.
E, no entanto, o artigo, que pode ser encontrado aqui, merece uma leitura inteira e uma reflexão que acaba por ser preterida por uma questão alheia ao tema principal, e reconhecidamente prematura.
É por demais evidente que o próprio autor, ao chamar para um artigo acerca da encruzilhada em que se encontra a Europa (Alertas à Europa, assim o intitula), procurou um veículo dissimulado para descarregar a animosidade que a candidatura de Alegre e opoio do PS lhe incutem, mas, deste modo, poluiu irremediavelmente o tema fulcral.
.
Se é certo que esta reflexão de Mário Soares acerca da Europa não acrescenta muito aquilo que há muito conhecemos da sua posição de sempre relativamente à União Europeia e do papel que a Portugal pode invocar e desempenhar, percebe-se que a crise o induziu a contextualizar a sua perspectiva no caminho federativo que sempre defendeu para a Europa. 
.
Num ponto, contudo, a mensagem de Mário Soares não é para mim clara quando advoga, também ele, a constituição de um governo económico? Merkel e Sarkozy falaram dele, e depois calaram-se. Provavelmente porque pensaram num nome sem uma ideia à qual o pudessem atribuir? Em que é que um governo económico se pode distinguir de um governo político, isto é, de um governo tout court? 
.
"Se os Estados não querem uma união económica, então será melhor esquecer a União Monetária..."
Se quiserem uma união económica o que lhes ficará, então, a faltar para uma união política?
Tempo.
Tempo que pode ser de progressão ou de regressão. Porque a imobilização não é alternativa.
Todo o mundo é composto de mudança... Quem duvida do Poeta?