Luís António Cardoso da Fonseca Mail: luiscardosofonseca@hotmail.com

sábado, 22 de novembro de 2008

Porque é que há algo em vez de nada?


" Todos nós somos hóspedes da vida. Não há nenhum ser humano que saiba o significado da sua criação, excepto ao nível mais primitivo e biológico. Não há nenhum homem nem nenhuma mulher que saiba qual o objectivo (se é que existe...), qual o significado possível de ter sido "atirado" para o mistério da existência. Porque é que há algo em vez de nada? Porque é que eu existo? Somos hóspedes deste pequeno planeta, de uma urdidura infinitamente complexa, quiçá fortuita, de processos e mutações evolutivas que, em inúmeros estádios, poderia ter seguido um outro curso ou testemunhado a nossa extinção. Acabámos, aliás, por nos tornar hóspedes vândalos, produzindo lixo, explorando e destruindo espécies e recursos. Estamos a transformar rapidamente este ambiente extraordinariamente belo e intrincadamente perfeito, e inclusive o espaço sideral, numa lixeira venenosa. Há caixotes de lixo na Lua. Por mais inspirado que seja o movimento ecológico que, juntamente com a emergente percepção dos direitos das crianças e dos animais, é dos poucos capítulos esclarecidos do nosso século, é bem possível que tenha vindo demasiado tarde."


Excerto de " Errata: Revisões de uma vida ", de George Steiner, Trd. Margarida Vale do Gato


Felt -" Primitive Painters "

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Así nos salen las arrugas*


«No es de esas cosas que se eligen. La vejez llega y las arrugas aparecen, unas se ven, pero otras salen por dentro. "Dicen que cuando te miras en el espejo y empiezas a parecerte a tu padre es que ya te estás haciendo mayor. Mi reflejo empieza a parecerse a mi padre y mi padre se parece ya a la imagen que recuerdo de mi abuelo", explica Paco Roca (Valencia, 1969). Él es el autor de 'Arrugas', un libro que le ha valido el Premio Nacional de Cómic, que desde hace dos años entrega el Ministerio de Cultura. » Ver * aqui no El Mundo Online de 21/11/2008

Plastic Musik

Axel F


Saints


Immigrant Song

O Mercador de Veneza

" Shakespeare é um homem que afirma que todas as profissões, todas as épocas, todos os pontos de vista podem ser apanhados por essa rede de palavras que ele lança, como lança a sua rede um pescador. Para ele, nada no universo humano escapa à palavra e ao dizer. Quando ele recolhe a rede, tudo está lá. Tem na mão cada um de todos os peixes que nadam na totalidade cósmica. O mistério é ainda maior pelo facto de nada sabermos dele. Para Shakespeare tudo é para ser dito, como a Wittgenstein caberá mostrar que os limites do mundo são os limites da linguagem. Todas as províncias pertencem ao mundo de Shakespeare, todos os continentes, todos os oceanos - é um verdadeiro mapa-mundo. Excede-nos a todos, porque através da sua obra é o próprio mundo que se interessa pelo animal de linguagem e de símbolos que nós somos. Shakespeare prova a possibilidade última do dizer. Ajuda-nos do mesmo modo a compreender uma das passagens mais árduas de Aristóteles, que costuma citar-se como se fosse, aos olhos de todos, uma evidência. (...) Todos os manuais citam a frase de Aristóteles no capítulo VI da Poética: " A poesia é mais verídica que a história ". É uma frase que nunca deixou de me espantar, desde o primeiro dia em que tentei compreendê-la. Aristóteles ensina-nos que a ficção é mais verdadeira que a queda de Alcibíades narrada por Tucídides. O que merece uma explicação. É demasiado simples seguirmos Corneille afirmando que há lugar na ficção para as universalidades e as generalidades. Eis que estou em Veneza, vejo que é a cidade de Shakespeare, do Mercador, do Rialto. Ouço pessoas que perguntam que novas há no Rialto. Ou estou em Verona e descubro que é a cidade de Romeu e Julieta. Shakespeare nunca esteve lá. Criou o que se limitava a existir. E eis como compreendo a história inglesa. Os historiadores referem que Ricardo II abdica e que Ricardo III mata Henrique V em Azincourt. Por mim, nego totalmente tais factos, e tenho vinte e oito arquivos em minha casa; nada prova que as coisas se tenham passado assim. Shakespeare surge qualquer que seja a situação, qualquer que seja a política. Os nossos ciúmes são os de Otelo, as nossas senilidades as de Lear, as nossas ambições as de Macbeth. Vivemos na jactância da sua visão. Entramos no molde das suas previsões. A ficção oferece à vida possibilidades de identificação; identificamos a nossa situação mais pela ficção que pelo documento. A história não é nomeadora. O Génesis diz que os animais e os seres do Paraíso são como Adão os nomeou. Imensa tautologia! As coisas são como Shakespeare as nomeia, o que seria surpreendente da parte de um simples autodidacta, de um actor vagabundo. "
Excerto de " A presença de Shakespeare ", in Ramin Jahanbegloo - Quatro entrevistas com George Steiner. Trd Miguel Serras Pereira, Ed. Fenda(2006)

terça-feira, 18 de novembro de 2008

Celebrar a vagina*

" As vaginas têm sido muito injustamente descuradas ao longo dos tempos. E isso é tanto triste quando se tem em conta que, ainda que nem todos tenhamos saído de uma delas, uma parte de nós terá sempre por lá entrado. assim, não deixa de ser estranho, chocante quase, que tão pouca importância se tenha dedicado a essa parte fundamental da anatomia feminina e humana.
As responsabilidades, se aqui as quisermos apontar, estão do lado dos homens. Fascinados, mas igualmente receosos em relação a esse obscuro objecto de desejo, sede do acto de criação supremo, os homens sempre optaram por manter as vaginas bem escondidas do olhar perscrutador da ciência.. Há que não esquecer, afinal, que até há muito pouco tempo, a investigação era um mundo eminentemente masculino.
Claro que existem honrosas excepções. Homens como Gabriele Falloppio(1523-1562), William Masters(com a sua mulher Virginia Johnson) e em particular Ernest Graffemberg( o do famoso ponto G) vasculharam a vagina em profundidade e descobriram algumas das suas geniais características e potencialidades. Agora, porém, chegou a hora de as mulheres tomarem a responsabilidade pelo bem-estar das vaginas nas suas mãos. Uma ginecologista norte-americana, a dra. Lauri Romanzi, farta de ver vaginas maltratadas e de ter que as sanar, decidiu abrir um Vagina Spa em Nova Iorque. O principal objectivo de tal spa é o de ajudar as mulheres a cuidarem das suas partes íntimas de forma a valorizá-los e a prevenir problemas ginecológicos futuros. Uma das técnicas que a dra. Romanzi utiliza para o efeito é o método de Kegel, desenvolvido por outro investigador que de todo o direito deverá ser incluído na lista de homens amigos da vagina.
Arnold H. Kegel desenvolveu um conjunto de exercícios destinados a reforçar os músculos pélvicos em mulheres que sofriam de incontinência urinária após o parto. Mas, maravilha das maravilhas, as mulheres que passavam por este processo descobriram-se a ter orgasmos fabulosos como efeito secundário. Claro que depressa se começaram a direccionar os exercícios Kegel especificamente para esse objectivo, agora tornado principal.
Uma das grandes vantagens desses exercícios é que podem ser realizados virtualmente em qualquer lugar e circunstância: no escritório, durante o jantar de família, na sala de espera do dentista ou até - vade retro - durante a missa.
A dra. Romanzi está, portanto, no caminho certo. Nova Iorque, sempre na vanguarda de coisas modernas e vagamente extravagantes, já havia recebido no ano passado o Festival da Vagina, num conjunto de eventos que celebraram a genitália feminina em todo o seu esplendor. Afinal, o pénis já teve bem mais do 15 minutos de fama. Agora é a vez da vagina."

* Artigo de Nuno Godin, publicado na Pública de 16/11/2008

A origem do mundo

" A origem do mundo " de Gustave Courbet
" Etelvina acordou, voltando-se lentamente, ao ver-me, sorriu. « Vim acordar-te», disse eu. Ela bocejou; ao contrário dos meus dentes, dos da minha família, tinha uma dentadura completa e sã; o mal não a tinha atacado pela boca. « É que ontem à noite - explicou-me entre bocejos, acção que eu aprendera que era de péssima educação e ela era sobrinha de um senador, embora falecido; talvez a rua a tivesse contagiado não só no mal mas também nas más maneiras - deitei-me muito tarde.» Reparei então que tinha permanecido nua aquele tempo todo, sem fazer o mínimo gesto para se cobrir, eu a ver a vagina peluda: a primeira que via na minha vida."


Excerto de " Havana para um Infante Defunto ", de Guillermo Cabrera Infante, Trd. Maria do Carmo Abreu

Sonhos...

Twin Peaks - "Cooper's Dream"

Cenas domésticas


Fotografia de Frank Boots.

Autumn Leaves



segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Em escuta: " Ten Stones " - Woven Hand




Iron Feather

White Knuckle Grip

His Loyal Love

Quiet Nights Of Quiet Stars

Le Rouge et le Noir


Realizado por Claude Autan-Lara(1954) e interpretado por Gérard Philipe, Danielle Darrieux, Jean Martinelli.

O Vermelho e o Negro



Talvez receoso do corpo nu

" O apogeu da relação com Fela ( que ambos arranjámos maneira de dissimular muito bem, com manha de adultos) ocorreu num dia em que estava a tomar banho na minúscula casa de banho, que tinha uma janela lateral, sempre fechada, e era aberta por cima, com a parede da porta a terminar logo acima dela, a uma altura de cerca de dois metros. Estava a tomar duche quando ouvi uma voz que me chamava. Só me lembrei de procurar a sua fonte na janela entaipada. A voz disse então: «Aqui em cima», e olhei para cima e era Fela, olhando para mim, a rir, precariamente agarrada ao bordo da parede. Não soube que dizer, habituado há anos a tomar banho só, decidido a não me deixar ver despido. Talvez até tentasse cobrir-me de ridículo. Fela, muito contente com a sua acção audaz, ria, ria. Depois, como cólofon, propôs-me que fizesse o mesmo quando ela estivesse a tomar banho. «Não me tapo» animou-me, mas eu nunca me atrevi a imitá-la, talvez apreensivo por causa do seu feroz pai, talvez receoso do corpo nu."

Excerto de " Havana para um Infante Defunto ", de Guillermo Cabrera Infante, Trd. Maria do Carmo Abreu

Fotografia de Patrick Demarchelier

Cores aconchegantes





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" Muitas vezes, meu caro senhor, as aparências iludem, e quanto a pronunciar uma sentença sobre uma pessoa, o melhor é deixar que seja ela o seu próprio juiz. " Robert Walser

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