sábado, 22 de maio de 2010

The Catcher in the Rye, de J. D. Salinger

Duro foi o período em que não me apeteceu ler nada. Em que nem comprar livros me empolgava. E talvez devesse prolongar essa temporada. Talvez seja natural haver esse interregno. Quem sabe, ficaria anos sem ler tanto quanto já li. Quem sabe, talvez deixasse de vez de comprar livros. E um dia, assim do nada, voltaria.

A verdade é que esse ideal não encaixa na minha cabeça. Quando são bookaholics como eu, têm dificuldade em aceitar que existe esse espaço nas nossas vidas em que pomos os livros de lado. Tentamos sempre não o fazer.

Ao tentar decidir-me entre Servidão Humana ou The Catcher in the Rye, acabei por escolher o último. Porquê? Porque tenho 17 anos, e tinha medo de não ler o livro antes de acrescentar mais um ano de vida.
E assim comecei a ler a obra que me fez ter vontade de ler de novo. Sem se ter tornado num marco pessoal, foi uma experiência que, tenho a certeza, vou repetir sempre que me sentir mais sozinho, ou sempre que decidir que é tempo de alguma mudança.

Não aconselho ninguém a ler este livro sem antes saber o que lhe espera! Há certos livros que convém nem sequer ler as contracapas, para não estragar o suspense. Este é precisamente o contrário. Convém ler, antes de começar, um apanhado do que se vai falar. De quem vai falar. Eu só comecei a apreciar verdadeiramente o livro depois de ter uma noção do que seria apresentado.

Holden Caulfield é um adolescente de 16 anos. É ele próprio a contar a sua aventura de 3 dias em Nova Iorque.
Foi expulso da escola, não dá para aquilo. E tem as suas razões, que descobriremos ao longo do livro. As aulas acabam a uma Quarta-feira. Mas, já que foi expulso, porque não sair uns dias mais cedo? Mas não pode ir já para casa, melhor será adiar a notícia aos pais (embora já seja a centésimo vez que é expulso).
O que faz até que chegue Quarta-feira? Vagueia pela cidade de Nova Iorque.

E assim é o livro. Um imenso divagar pela cidade, pelos pensamentos de Holden, de um adolescente. Não tem uma história concreta para além disso.
Por isso mesmo, convém ir para a leitura com este plano geral em mente.

Pensava que ia encontrar uma mente perversa. Uma mente disturbada. Até pensei que este era um livro sobre um assassino!
Mas não. É o mais normal possível. É um rapaz normal, tão normal quanto um adolescente pode ser.
Confesso que este livro não foi, de imediato, uma leitura que me surpreendesse. Antes de mais, a escrita que Salinger utiliza é quase que pobre. Um vocabulário extremamente pobre, palavreado repetitivo e sem grande estrutura... Resumindo, demasiada linguagem à gajo de 16 anos.
No entanto, há uma certa nostalgia que me fez querer pegar no livro. É, a maior parte do tempo, muito deprimente. Holden cruza-se com pessoas bastante duvidosas em Nova Iorque, atravessa as ruas como um vagabundo, embebeda-se, há toda uma atmosfera deprimente à medida que avança.
O que realmente me fascina na adolescência é que é a única vez na vida em que os nossos idealismos parecem encaixar na realidade. Em criança, temos sonhos, não queremos saber da realidade para nada. Em adultos, o que temos é a realidade e há pouco espaço para mais. Mas, quando adolescentes, tudo é possível. Todo o idealismo que a nossa mente cria encaixa numa realidade que estamos a formar! Holden é essa pessoa. É uma pessoa muito crítica, que não gosta das pessoas, e que no meio da sua confusão de hormonas procura uma espécie de "revolução". Ele tem ideais. Ele acredita em certas coisas. E é como se o mundo não o deixasse acreditar nisso.

Esse é o espírito adolescente, e é isso que o livro nos vem transmitir. A procura de uma identidade própria, quando tentamos unir as nossas crenças à realidade a que somos sujeitos. Onde pertencemos. Onde queremos estar. O que queremos fazer.

Não é um livro muito maduro, devo dizer. Um adulto escreveria sobre o mesmo tema de uma maneira bastante mais forte e atractiva. Mas, ainda assim, precisamos desta visão de dentro.
De realçar as suposições sexuais ao longo do livro. Como não podia deixar de ser.

Sem que me tivesse marcado notoriamente, vi-me quase todos os dias, depois das aulas, sentado no bar da escola a ler o livro. Este é, de longe, o melhor livro que um adolescente pode ler, pois para além da personagem principal ser da sua idade, é só ele. Não se trata de um grupo de amigos, ou as suas fantásticas aventuras. Nada disso. É uma personagem no meio do palco, directamente a falar connosco. É isso que nós queremos, é isso que nos faz sentir aquela empatia pelo livro!

Talvez seja uma experiência muito pessoal. Eu fui-me deixando levar aos poucos e poucos. Importa que saibamos o que nos espera. Gostei imenso de ler o livro, e como já disse Holden fez-me sentir acompanhado. É difícil dizer o que senti com esta obra. Sem que se tivesse tornado num marco a nível pessoal, foi uma leitura que me cativou.
Somos capazes de abandonar tudo para continuar a ler, e somos capazes de ficar sem respiração quando vemos os passos dele. Como cheguei a dizer, Holden poderia ter escrito um blogue. Soube mesmo bem.


2 comentários:

Otário Tevez disse...

olá rapaz, há algum que por aqui não passo... desconheço esta obra que recomendas e, de momento, lerei o 'ensaio sobre a lucidez' do saramago.
saudações e votos de boa semana!
boas leituras!

Pedro disse...

Otário, depois de ler "Ensaio sobre a Cegueira", também fiquei curioso com esse ;)

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