Fã de Sandra Carvalho? Delirado com A Saga das Pedras Mágicas? Ansiso pelos novos livros desta grande escritora portuguesa?
Então aqui tens, uma entrevista exclusiva à autora!! Agradeço mais uma vez a imensa disponibilidade da autora. Deliciem-se mais um pouco com as suas palavras :)
- Bem-vinda ao
Cantinho e muito obrigado por ter aceitado conceder esta entrevista! Antes de
mais, porque este é um blogue sobre livros: qual o seu livro favorito?
Olá!!! É um prazer estar aqui contigo e com
os seguidores do Cantinho! Eu é que agradeço por estes encontros tão agradáveis,
que me permitem dar um abraço a todos os meus companheiros de aventura e apresentar
os frutos da minha imaginação aos leitores que ainda não tiveram a oportunidade
de saboreá-los :).
Quanto à tua pergunta, desde criança guardo
tantos livros no coração que é difícil, mesmo impossível, eleger apenas um. No
entanto, quando me colocam essa questão costumo salientar as obras de Michael
Chichton e de Marion Zimmer-Bradley, pois foram dois escritores que me
acompanharam durante a adolescência e que coloriram o meu imaginário, acabando,
inevitavelmente, por influenciar a minha escrita.
- Parabéns por
mais um livro publicado, de uma nova série! Sobretudo para os leitores que já a
seguem, o que é que estas novas Crónicas trazem de novo e diferente? E o que
têm de comum com a Saga que fica para trás?
Os leitores da Saga
irão encontrar nas Crónicas o mesmo estilo de escrita, entusiasmado e
apaixonado, centrado nas cores, nos sons, nos odores e nos sabores, assim como
nas emoções das personagens. No entanto, as Crónicas resultam numa história
mais madura, onde todos os elementos de um romance de ficção e de aventura se
irão fundir com a realidade histórica de Portugal no século XV. Teremos, pois,
um vislumbre da vida dos “nossos” fidalgos e das intrigas que eram entretecidas
dentro e fora da corte, misturadas com a emoção dos Descobrimentos e as
peripécias dos corsários que serviam o reino e dos piratas que estabeleciam as
suas próprias leis. Essa “verdade” presente ao longo da história também faz com
que a componente mística das Crónicas seja diferente daquela a que os leitores
se habituaram na Saga. Enquanto a magia da Saga tinha imensas influências
Anglo-Saxónicas, a magia das Crónicas está ligada à nossa cultura, aos mitos e
aos medos, ao oculto e às mezinhas caseiras, o que, consequentemente, a torna mais
ajustada à nossa realidade.
- As personagens
de "O Olhar do Açor" existiram na realidade, ou apenas na sua
imaginação?
Em “O Olhar do Açor”
teremos cenários reais e cenários imaginados, da mesma forma que teremos
personagens criadas por mim a relacionarem-se com personalidades reais. Esse
foi o maior desafio das Crónicas: introduzir a História de Portugal e figuras
emblemáticas como o infante D. Henrique e os seus irmãos na narrativa, sempre
com o devido cuidado e respeito, para que os “factos” fossem preservados e
apresentados com fidelidade ao leitor, ao mesmo tempo que, em paralelo, a ficção
se desenvolvia. No fim, são as decisões tomadas por essas personalidades que
irão ditar o rumo da história e o destino das minhas personagens, mesmo quando a
sua intervenção não é direta.
- O novo livro
tem uma grande vertente histórica: a descoberta dos Açores. Enveredou numa
pesquisa histórica mais aprofundada, ou não foi essa a sua pretensão?
A descoberta dos
Açores foi o ponto de partida para a criação das Crónicas. Os “incidentes”
dessa viagem e as dúvidas que continuam a inflamar os debates dos historiadores
sobre os heróis da proeza e a maneira como esta se concretizou foi a chama que
fez explodir a minha imaginação. A partir daí, desenvolvi o trabalho de ficção,
regressando à pesquisa histórica sempre que entendi que a “realidade” poderia
abrilhantar a narrativa. Os factos históricos são apresentados de forma
simples, maioritariamente através das experiências vividas pelas minhas
personagens. Transmito o essencial da informação, para que o desenrolar da ação
desvende as razões e as motivações por detrás de cada acontecimento, ao mesmo
tempo que, gosto de acreditar, estou a estimular a vontade do leitor para
aprofundar o conhecimento dos factos. Note-se que “Crónicas da Terra e do Mar”
não é um romance histórico! A minha intenção não foi, nem é, concentrar-me na
“verdade incontestável” dos relatos e escritos históricos. Apenas desejo
oferecer aos leitores uma visão dos dois mundos: o real e o imaginário, fundidos
numa aventura que, espero, os vá intrigar e entusiasmar, divertir e comover.
- A ideia para
"Crónicas da Terra e do Mar" surgiu ainda durante a "era"
das Pedras Mágicas? De onde veio essa primeira ideia?
Tudo aconteceu de
uma maneira estranha… Por muito racional que eu queira ser, acabo por achar que
o “destino” me troca as voltas :) ! Digamos que na “era” da Saga das Pedras Mágicas os
leitores me pediam insistentemente para que, num novo projeto, eu me debruçasse
sobre a História de Portugal. Porém, apesar de a ideia me estimular, escrever
um romance puramente histórico estava fora de questão, pois não é esse o meu
apelo… Pelo menos, por enquanto! E não discernia uma forma de avançar com um
projeto que, precisamente, pudesse reunir a História com a ficção, sem correr o
risco de desvirtuar algo que para mim é sagrado: a memória da minha pátria e a
herança do meu povo. Por isso, quando terminei a Saga iniciei outro projeto…
Até que, um belo dia, ao arrumar na minha estante os livros que os filhos de
alguns amigos tinham ido buscar para “brincar”, verifiquei que estes possuíam
um tema em comum: corsários e piratas. A partir daí tudo se desenrolou como uma
avalanche. Para onde quer que me virasse, só ouvia falar do infante D.
Henrique, dos Descobrimentos… E das ilhas dos Açores! Como a minha cabeça não
para, dei por mim a recordar uma história sobre piratas que tinha iniciado na
adolescência, guardada nos meus caderninhos… E pronto! Foi a perdição J!
De repente, tudo parecia encaixar-se como as peças de um puzzle e crescer, até
ao ponto em que eu já não pensava noutra coisa. Então, decidi escrever só
algumas linhas da história que me andava a “atormentar” por julgar que assim arrefeceria
essa súbita “obsessão”… Todavia, as linhas transformaram-se em páginas, o
prólogo de “ O Olhar do Açor” estava concluído e a Leonor e a Guida já corriam
através do bosque…
- "O Olhar
do Açor" surge um ano depois do último livro da já série de culto "A
Saga das Pedras Mágicas". Foi difícil transitar de uma série para outra?
Um ano foi suficiente para descansar e avançar para uma história completamente
nova?
Na verdade, não existiu
um dia de descanso no meio deste processo :)! Durante a Saga, segui
o ritual de encerrar um livro e começar imediatamente outro, nem que fosse apenas
com uma frase. Por isso, terminada a última linha de “Sombras da Noite Branca”,
iniciei o outro projeto de que vos falei, confiante de que seria a opção certa
para suceder à Saga. Depois, aconteceu o que vos contei… Logo, não houve tempo
para pausas, reflexões, nem sequer uma noite bem dormida! Sempre achei que
seria difícil separar-me das emoções da Saga e das personagens que, durante
décadas, viveram no meu imaginário. Porém, julgo que o projeto que deixei
suspenso me ajudou a fazer essa caminhada. A partir do momento em que fui
fulminada pela ideia que deu origem às Crónicas, a separação da Saga deixou de
ser dolorosa… A Saga é um grande amor e a tentação de regressar a esse universo
estará sempre presente na minha vida, ainda que não possa prever se, um dia, o
farei ou não. Gosto de novos desafios e as Crónicas estão a ser, efetivamente,
um desafio colossal! Uma nova, absorvente e arrebatadora paixão!
- Costuma reler
os livros que já publicou? Revisitar as Pedras Mágicas lendo as suas próprias
palavras?
Tive de fazê-lo
quando estava a entrar na fase final da história, para me assegurar de que não
deixava nada por resolver. Quando uma narrativa percorre três gerações, ao
longo de oito livros, com personagens detentoras de personalidades tão fortes e
vontades tão complexas, é essencial atender a todos os pormenores, conjugando o
passado, o presente e o futuro em simultâneo. Isto significa que eu escrevi as
aventuras da Catelyn já a preparar o caminho para a Kelda e, enquanto
desenvolvia as aventuras da Kelda, não podia esquecer-me do caminho percorrido
pela Catelyn. Sim, deu-me imenso prazer reler a Saga… Não só porque é o meu
sonho de criança tornado realidade, mas também pelos inúmeros sonhos que os
meus leitores partilharam comigo ao longo desta aventura! Estou muito feliz e
orgulhosa das minhas meninas/mulheres – Catelyn, Edwina, Thora, Freya, Kelda…
Acreditem que aprendi muito com elas :)!
- Catelyn, Edwina
ou Kelda? Ou Constance?
Neste momento,
Leonor e Guida :)!
Mas Catelyn há de ser sempre a mais especial das minhas meninas. Primeiro,
porque cresci com ela, como se fosse a minha irmãzinha imaginária, pois não
tinha irmãos e desejava muito tê-los. Sempre que inventava uma história, Cat tornava-se
a heroína… E assim foi com a Saga! Depois, porque é graças a ela, à sua pureza
e sensibilidade, mas também por causa da sua paixão e da sua força, que a Saga
cativa tantos leitores. A Edwina é diferente… Tem consciência de que nasceu com
um destino traçado e faz todos os possíveis para agradar à família e cumpri-lo,
até ao momento em que o apelo do coração se torna irresistível. Quanto à Kelda,
é a minha menina-guerreira que eu simplesmente adoro! Ao contrário das
antecessoras, Kelda vai crescer “esquecida” pela família e terá de lutar muito
para encontrar o seu caminho e provar o seu valor. Por fim, Constance… De todas
as personagens femininas que criei, talvez ela acabe por ser a mais consciente
e ponderada, consequentemente a mais fria. Apesar de ser lutadora e corajosa, Constance
foi capaz de renunciar ao grande amor da sua vida para preservar a honra da
família. E mesmo quando teve uma segunda oportunidade de escutar a voz do
coração, decidiu silenciá-la para que a filha continuasse a desfrutar dos
privilégios da fidalguia. É o exemplo da mulher que sofre com um sorriso nos
lábios para que aqueles que estão à sua volta possam ser felizes.
- Muitos fãs da
"Saga das Pedras Mágicas" gostavam de reencontrar esse mundo, apesar
da Sandra já ter deixado explícito que a história ficou concluída tal como
tinha planeado. Mas alguma vez se atreveu a escrever, por puro entretenimento,
uma nova história no mundo das Pedras Mágicas? Ou, pelo menos, existe no seu
imaginário?
A história existe no
meu imaginário, sim… À medida que a terceira geração da Saga evoluía, as
aventuras da quarta geração foram tomando forma na minha mente, como um
processo natural… Estou sempre a idear o que acontece a seguir; é mais forte do
que eu! Contudo, ao planear a estrutura da Saga resolvi que a narrativa
terminaria com a Kelda e decidi manter-me fiel a essa decisão. No entanto, os
meus queridos leitores estão constantemente a tentar-me, pedindo-me que
prossiga com a história ou que desvende o destino de algumas personagens pelas quais
se encantaram e que seguiram outros caminhos… Talvez um dia regresse a este
universo maravilhoso! Talvez! Porém, para já sinto a necessidade de crescer
para além da Saga, de explorar novos mundos, outros cenários, personagens e emoções…
Ainda assim, não irei fechar essa porta! O “incidente” que originou a escrita
compulsiva das “Crónicas da Terra e do Mar” ensinou-me que, por mais que tente
ser racional, é a paixão que decide o rumo da minha escrita! Afiancei que não me
dedicaria tão cedo à História de Portugal e o destino trocou-me as voltas de
uma maneira surpreendente, deliciosa e fantástica! Escreverei sempre o que o
coração me mandar… Essa é a única certeza que possuo.
- Algum conselho
para novos escritores, para aqueles que procuram dedicar-se à escrita?
Para começar, quem quer ser escritor
deve mesmo desejá-lo com todas as fibras do seu ser, ciente de que tem anos de
trabalho árduo pela frente! Leiam muito, estudem muito, pesquisem muito, ponderem
muito, escrevam muito… “Muito” é essencial! A composição de uma história é um
exercício solitário que exige uma enorme disciplina, concentração e rigor. O
processo criativo pode ser apaixonante e divertido, mas também é bastante
espinhoso!
Desenvolvida a ideia, torna-se
necessário revê-la e aperfeiçoá-la com um espírito de autocrítica aguçado. Só
se deve avançar para a procura de uma editora quando se sente que não há mais
nada a fazer para melhorar a história. E essa busca deve começar pela seleção
das editoras que estão a apostar no género literário ligado ao vosso projeto.
Feita essa “triagem”, elaborem uma lista de preferências e iniciem os contactos.
É importante que fiquem esclarecidas as condições impostas por cada entidade para
a aceitação de propostas, assim como o tempo que demoram, em média, a dar
resposta. Reúnam os elementos que vos forem pedidos e apresentem-se, e à vossa
obra, de forma confiante e apaixonada, mas sucinta e objetiva, sem exageros.
Depois, resta aguardar… Existem dezenas de editoras, com diferentes métodos de
trabalho. Supondo que tudo corre bem, como se deseja, cabe-vos a vós escolher
aquela que melhor poderá servir os vossos interesses presentes e futuros.
Todavia, também é possível que o
sonho não se concretize “à primeira”… Mas isso não é razão para esmorecer!
Lembrem-se de que estamos a viver tempos difíceis! Escutem com atenção as críticas
construtivas que vos forem feitas, assimilem-nas com humildade e utilizem-nas
para vosso benefício… Após um período de reflexão, voltem a tentar.
Em conclusão, por muito que eu goste
de ajudar, a verdade é que não existem conselhos milagrosos que assegurem a
criação de um livro e a sua publicação… No entanto, se a escrita vos traz
felicidade, sejam perseverantes e assertivos. O importante é que nunca parem de
escrever! Nunca deixem de acreditar! Nunca desistam de sonhar!
Resta-me agradecer ao Cantinho do
Bookaholic por esta conversa tão agradável e a todos vós que tivestes a
simpatia de me acompanhar.
Muito obrigada pelo vosso carinho.
Beijinhos
Sandra Carvalho
Mais uma vez, estou bastante agradecido pelas palavras amigáveis e entusiasmadas da Sandra. Espero que os seus fãs, e aqueles que ainda a têm de conhecer, tenham ficado tão agradados com a conversa (tenho a certeza que enche a barriga a muitos fãs!).
Preparem-se para a continuação de mais críticas, mais sugestões de leitura, e certamente mais autores à conversa... :)