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25/04/2012

Num certo bar do Leblon

- Então, vamos de chope? ... Dois? Tudo bem... Tira-gosto? Escolhe aí...

- Garçom, dois chopes, por favor, e umas isquinhas de peixe, com molho de mostarda! Pode ser? Obrigado.

...

Sabe filha, quanto mais esse tal de tempo me permite continuar por aqui, mais eu curto essa coisa mágica, instável, imprevisível, dinâmica e sem referências chamada vida. E, quer saber? Aquela história da “semeadura é livre, mas a colheita é obrigatória” é a mais pura verdade. Ou, como dizia Caminha: Em se plantando tudo dá.

Você deu! Você se revelou uma excelente colheita.

Muita gente pensa que a velhice amolece as pessoas, mas não é verdade! A velhice nos dá a chance de deixar as fichas caírem, isso sim. Toda aquela arrogância, aquela fortaleza burra que ostentamos nas idades anteriores vão por terra e a gente, simplesmente, aprende a dizer “eu te amo”, sabendo o que está falando. Nesse sentido, ficar mais velho é um grande barato!

Hoje, quando chamo você de “minha filha” não estou empregando um adjetivo (possessivo?) e um substantivo, mas dois adjetivos. É gratificante ver essa mulher que floresceu em você. Adoro isso! rsss E, então, todo um carinho emerge de mim e lhe envolve, como um abraço único e eterno. Reconhecido, agradecido e cúmplice.

...

Você fala do “lugar da gente”... Esses lugares podem estar onde menos esperamos. Por vezes, em pontos tão distantes da nossa realidade imediata que nem nos damos conta.

Você bem sabe o quanto gosto do meu Rio: meus filhos, meus pais e irmãos, minha história, minhas vitórias e derrotas... o Vasco, a Mangueira, as praias, o chope, a irresponsável superficialidade carioca, a irreverência que se transformou numa espécie de marca registrada desse seu pai... Mas, e daí? Não sou do Rio, sou do mundo. Sou um homem livre, consciente de meus limites, direitos e deveres. E, de quebra, falo um monte de idiomas, então, porque não Paris ou Madagascar? Ou Roma ou, simplesmente Blumenau?

Sabe, filhota, o sempre e o nunca não existem. São invenções do homem. E, para desespero dos pragmáticos, dos apologistas do caos e dos chatos de plantão o talvez é o mais sábio dos roteiros para a vida.

Assim, não tenha pressa, busque o seu lugar de coração aberto, deixe sua alma escolher. Mas, esteja atenta: um rio não passa duas vezes sob a mesma ponte. 

- Esse chope tá ótimo, né? Mais um?

- Garçom, mais dois chopes, por favor! Ah! E um Steinhagen... nacional!

...

Você me falando da sua empresa e eu do meu novo livro... rsss Mas, quer saber? Passam pela mesma linha de pensamento. É o nosso lado cidadão falando...

Essa coisa contemporânea, capitalista, estressante da busca permanente pelo lucro máximo é um engodo para os tolos. Ficamos tão obstinados na busca da melhor performance que esquecemos que as flores continuam nascendo, as pessoas que amamos envelhecem, que a busca da harmonia é que gera paz interior e que os beijos na boca continuam sendo os melhores prêmios.

Tudo bem que “um amor e uma cabana” ficava bem no movimento hippie dos anos sessenta, mas pensando bem, pra que uma casa de três salas e seis quartos se podemos viver bastante bem num sala e três quartos. Não somos hotel nem pousada. E depois, dá um trabalho do cacete limpar uma casa muito grande... rsss

O ensaio de que falei passa um pouco por isso. Discuto a importância da comunicação e o seu papel a serviço dos poderes constituídos. A relativização dos conceitos de verdade e mentira, a manipulação da opinião pública, a inesgotável sede de poder do “Senhor das Guerras”, a partir da análise de documentos existentes e que podem recontar histórias, como por exemplo, da queda das Torres gêmeas e a morte de bin Laden.

Papo de maluco, eu sei. Mas, algo que vai dar no que pensar. E, nem de longe, estou tentando criar mais uma nova Teoria Conspiratória. Tá tudo lá e só ler com mais atenção e não permitir que desviem nosso foco apenas para fazer de nossas empresas-patroas, a primeira colocada de seus rankings.

- Vou pedir uma rodada e a conta. Tudo bem?

Estaremos sempre aqui, filhota. Nesse bar ou aonde você precisar de seu Papy, amando você e com o coração sempre aberto.

PS: O nome do cara era Jorginho Carvoeiro. (rsss) Bola dentro pro Marcio. Tudo a ver com alguém que se conhece num show de um ex-Pink Floyd.

Papy ama você!

Anderson Fabiano

Imagem: Acervo do autor


21/08/2011

Sou carioca e, de quebra, filho de Oxossi

Nesses tempos de aniversário do Rio, me pego pensando nessa coisa de ser carioca e confesso, sinto lá uma pontinha de orgulho. É que muita gente pensa que carioca é quem nasce no Rio. Ledo engano! Quem nasce no Rio é fluminense. Quer dizer, nem todo mundo, porque eu, Paulinho da Viola, Martinho da Vila e milhões de outros caras espertos, somos Vasco.

Ser carioca não tem nada a ver com a nossa naturalidade e sim com o estado de espírito, com o tipo de alma que habita nossos surrados corpinhos e o nosso jeito de encarar a vida. Na verdade, todo mundo pode ser carioca já que carioca que se preza, tem que ser meio moleque, irreverente, sacana e, se possível assumir, ainda que em doses homeopáticas, seu lado cafajeste. Canalha jamais! Mas, cafajeste, forever. Assim meio Carlos Imperial.

Só que para ser um legítimo carioca, tipo 12 anos, existem certas normas. Afinal, não é porque somos reconhecidamente esculhambados, que vamos abrir mão da nossa grife. Para ser aceito nessa confraria é preciso gostar de samba, futebol, chope com conversa fiada (e, afiada, também), papo de esquina e bunda dos outros. Isso mesmo: bunda! E não pensem que esse papo de bunda é coisa de machista porque estou falando de mulheres, também. As cariocas, aquelas que “basta o jeitinho dela andar” também são fissuradas numa bunda. Só que de homens, mesmo nesses tempos de múltiplas opções sexuais. Ainda está pra nascer uma carioca, que abra mão de cravar suas unhas bem tratadas numa bunda cabeluda naquela tal de hora “H”. Sabe qual é, né? Aquela hora em que gemidos discretos se transformam em urros nem tanto e os vizinhos descobrem o que estávamos fazendo no quarto, na sala, na cozinha...

Carioca e sexo, por um triz não são sinônimos. Pouca gente sabe (e quem sabe, se nega a reconhecer), mas foram os cariocas que, mesmo sem saber falar inglês, descobriram porque sexta-feira se grafa com S, E, X. E, também fomos nós que demos sentido aos happy hours, dos louros meninos do norte, quando numa livre tradução, adotamos a tradução de “horário pré-motel”.

Carioca é o único cara do mundo que está sempre pronto para receber uma desmilinguida asa de frango, quando pede a alguém para dar "umazinha".

O Rio deveria ser tombado como patrimônio cultural do mundo e não pelas águas de março (Ave, Tom!). Quando “neguinho” tava pensando em dar umas bandas lá pelos lados do moinho, a gente já vinha voltando com quilo e meio da melhor farinha. E mesmo naqueles tempos, em que paulista pensava que trabalhava mais que a gente (vide pesquisa no Fantástico), a cariocada desvairada já recebia, de braços abertos (Benção, Redentor), piauienses, mineiros, gaúchos e até paulistas na Imperial Irmandade Carioca. Mesmo que os caras se traíssem nos botecos da vida, pedindo um chopes e dois pastel.

Eu, que não tenho nada a ver com isso, modestamente, filho de Oxossi com Oxum, afilhado querido de Xangô, só lamento que o Rio já não seja tão suburbano como deveria. Pois, para quem não sabe, assim como o Brasil é mulato (Saravá, João Ubaldo), o Rio é suburbano. O Rio de Janeiro, fevereiro e março (Alô, ministro!) nunca foi Ipanema ou Barra. O Rio é Tijuca, Pilares e Madureira. O Rio nasceu no centro e, com a chegada da Família Real Portuguesa, foi mandado pro subúrbio. Nas Ipanemas da vida moram os suburbanos que deram certo. Ou ainda, os que pensam que deram certo. (E haja SPC pra segurar tanto cheque sem fundos dos falsos bacanas)

O melhor Rio ainda é o moleque, o debochado, o que prefere joelho de normalista no bonde, ao invés das bermudas “cofrinho” das fanqueiras. Nossa melhor bala é a “Ruth” (que dá figurinha e tudo) e não essas perdidas que andam por ai.

Não se iludam, aquele carioquinha de filme da Disney, com chapéu de palha e camisa listrada, só é encontrável em bares e rodas de samba pra lá da Central. Mas, como sou de Cascadura, tô bem na fita.

Sábado, primeiro de março, vou me meter numa camiseta regata, uma bermuda velha, calçar um chinelo de dedo, pegar meu tamborim, juntar a rapaziada pra tomar uma “baixa renda” com jiló e moela no bar do “seu” João e curtir minha carioquice.

“Brasil, tira as flechas do peito do meu padroeiro, que São Sebastião do Rio de Janeiro ainda pode se salvar”. (Salve Moacyr Luz, Aldir Blanc e Paulo Cesar Pinheiro)

É isso aí...

Anderson Fabiano

Publicado originalmente no Recanto das Letras em 12/03/2008

Imagem: Google - São Sebastião, de Guido Reni (1575 - 1642)