Uma vida inteira.
Eu passei uma vida inteira vivendo como se ela nunca fosse ter fim.
Pois ela me parecia eterna.
De uma força tão imensa e tão intensa, que mesmo ela envelhecendo, mesmo com a tal demência frontal, eu tinha certeza absoluta que ela estaria alí para sempre.
E estará, eu sei.
Mas há uma semana precisei aceitar que ela se fosse.
Aliás, mais que isso.
Do dia que ela entrou no hospital, com seus 88 anos, eu mesmo sem querer aceitei.
Engoli o tempo, a idade, a carne já enrugada e fraca.
Engoli o choro.
Muito.
E hoje engulo a saudade.
Todo dia um pouco. Aos litros.
Mas não me engasgo com ela.
Aliás, a vida toda achei que engasgaria.
Mas não.
Dona Elisa foi um exemplo tão exemplo, de tudo, nessa vida, que fica difícil ter um sentimento assim, claro, sobre ela.
Viva ou morta.
Ela, só ela, era um tratado inteiro.
Um evento.
Uma luz.
Tinha a gargalhada mais deliciosa desse mundo e quando chorava, chorava com a alma não com os olhos.
Tinha histórias. Uma porção.
De amores impossíveis, de cura, de família, de reza, dos pais.
Era italiana, daquelas nonas legítimas, matriarca de nascença.
Chama Isaac de Giuseppe, mas nunca me explicou porquê.
Costurava com as linhas e com um amor inexplicável que tudo unia.
Não desgrudou de seu crochê até o último segundo.
Era teimosa, com orgulho.
Despertava o que podia de bom nas pessoas e não houve um ser (humano ou não) que não tivesse se apaixonado por ela.
Aliás, minha vozinha era um anjo, um ser iluminado, sensitiva que só.
Enquanto pôde, ligou para toda a família, filhas e netos, toda a noite, e não dormia enquanto não abençoasse a todos nós.
Aos vezes me ligava com a certeza de que eu precisava de suas palavras.
E todas essas vezes acertava.
Tínhamos uma ligação única, de pensamento, de amor.
Segurou minhas mãos em todas as dificuldades que passei na vida.
E riu comigo todas as minhas alegrias.
Foi a confidente mais eficaz de todas que ainda possam vir existir.
Foi as palavras sábias que precisei ouvir.
Foi a vida, em vida.
E ainda é.
É tudo o que eu sei sobre ser mãe. E espero que seja sobre o ser avó.
Me ensinou sobre aceitar, contornar, desviar e encontrar caminhos para continuar.
Ela continuou.
Aceitou tudo o que lhe foi imposto e não caiu.
E se caiu, levantou.
E em todas as vezes, levantou firme, forte, sábia.
E com a mesma sabedoria, quando viu que era a hora, bufou.
E como quem diz "deixa pra lá, já cumpri todas as minhas missões aqui", foi viver melhor.
Descansar.
Obrigada, vó.
E se "Deus aperta mas não enforca", mesmo, confere aí pra mim e dê um jeito de me contar.
...
Eu passei uma vida inteira vivendo como se ela nunca fosse ter fim.
Pois ela me parecia eterna.
De uma força tão imensa e tão intensa, que mesmo ela envelhecendo, mesmo com a tal demência frontal, eu tinha certeza absoluta que ela estaria alí para sempre.
E estará, eu sei.
Mas há uma semana precisei aceitar que ela se fosse.
Aliás, mais que isso.
Do dia que ela entrou no hospital, com seus 88 anos, eu mesmo sem querer aceitei.
Engoli o tempo, a idade, a carne já enrugada e fraca.
Engoli o choro.
Muito.
E hoje engulo a saudade.
Todo dia um pouco. Aos litros.
Mas não me engasgo com ela.
Aliás, a vida toda achei que engasgaria.
Mas não.
Dona Elisa foi um exemplo tão exemplo, de tudo, nessa vida, que fica difícil ter um sentimento assim, claro, sobre ela.
Viva ou morta.
Ela, só ela, era um tratado inteiro.
Um evento.
Uma luz.
Tinha a gargalhada mais deliciosa desse mundo e quando chorava, chorava com a alma não com os olhos.
Tinha histórias. Uma porção.
De amores impossíveis, de cura, de família, de reza, dos pais.
Era italiana, daquelas nonas legítimas, matriarca de nascença.
Chama Isaac de Giuseppe, mas nunca me explicou porquê.
Costurava com as linhas e com um amor inexplicável que tudo unia.
Não desgrudou de seu crochê até o último segundo.
Era teimosa, com orgulho.
Despertava o que podia de bom nas pessoas e não houve um ser (humano ou não) que não tivesse se apaixonado por ela.
Aliás, minha vozinha era um anjo, um ser iluminado, sensitiva que só.
Enquanto pôde, ligou para toda a família, filhas e netos, toda a noite, e não dormia enquanto não abençoasse a todos nós.
Aos vezes me ligava com a certeza de que eu precisava de suas palavras.
E todas essas vezes acertava.
Tínhamos uma ligação única, de pensamento, de amor.
Segurou minhas mãos em todas as dificuldades que passei na vida.
E riu comigo todas as minhas alegrias.
Foi a confidente mais eficaz de todas que ainda possam vir existir.
Foi as palavras sábias que precisei ouvir.
Foi a vida, em vida.
E ainda é.
É tudo o que eu sei sobre ser mãe. E espero que seja sobre o ser avó.
Me ensinou sobre aceitar, contornar, desviar e encontrar caminhos para continuar.
Ela continuou.
Aceitou tudo o que lhe foi imposto e não caiu.
E se caiu, levantou.
E em todas as vezes, levantou firme, forte, sábia.
E com a mesma sabedoria, quando viu que era a hora, bufou.
E como quem diz "deixa pra lá, já cumpri todas as minhas missões aqui", foi viver melhor.
Descansar.
Obrigada, vó.
E se "Deus aperta mas não enforca", mesmo, confere aí pra mim e dê um jeito de me contar.
...