A desagregação da União Soviética reacendeu um debate que já parecia ter esgotado todos os seus argumentos. De fato, a discussão sobre a chamada natureza social da União Soviética ganhou um novo impulso, seja porque o acesso a fontes até então proibidas tornou-se possível, seja porque se tornou necessário, agora, fornecer uma explicação coerente para a derrocada dessas sociedades.
Para além dos muros que separavam povos, caíram, também, os muros que isolaram, durante décadas, as diferentes posições críticas às sociedades do chamado Leste europeu.1 Posições que antes permaneciam hermeticamente fechadas, fornecendo explicações auto-alimentadas, sempre as mesmas, para processos sobre as quais a história ainda não havia dado a palavra final, foram obrigadas a criar e recriar um diálogo que havia recebido uma solução de continuidade já na década de 70. Não todas, é claro, mas, principalmente, aquelas
correntes que aceitavam os desafios políticos impostos pelas profundas transformações daquelas sociedades, empenharam-se nesse debate.
Não podemos, entretanto, acreditar que setenta anos de discussões sobre o tema se passaram em vão. Ainda mais que essas discussões repercutiam em opções políticas que não deixaram de ter sérias conseqüências sobre o desenvolvimento da esquerda mundial, principalmente da esquerda revolucionária anti-stalinista. E aqueles que alimentarem a ilusão de recomeçar do zero estarão cometendo um grave erro.
A agenda de discussão sobre a natureza social das sociedades do “Leste europeu” deve levar a trajetória desse debate em conta. Um programa de pesquisa sobre este tema pode, portanto, desenvolver três linhas de trabalho de maneira concomitante e correlata:
1) Uma reconstrução do pensamento daqueles que primeiramente abordaram este tema e que, por isso mesmo, assumiram estatuto de classicidade. Trata-se, em grande medida, da obra de militantes políticos. Obra, portanto, que deve ser avaliada sob uma dupla perspectiva: a da construção e um critério explicativo e a da prática que ele alimentava. Falamos aqui da obra, em primeiro lugar de Lenin e Leon Trotsky, mas não podemos esquecer autores como Christian Rakovski, Antonio Gramsci, Karl Korsh e Bruno Rizzi.
2) Uma reavaliação da obra de alguns autores, principalmente da década de 70, que trabalharam sobre esse problema tendo como parte de sua reflexão a obra dos clássicos, mas apresentando sua própria contribuição ao debate. Dentre o grande número de autores que compõem este bloco sublinhamos, pela importância e repercussão, a obra de Charles Bethelheim e do grupo de pesquisadores franceses articulado em torno da revista Communisme, de inspiração maoísta; e daqueles autores que identificados com a Quarta Internacional desenvolveram um debate, em grande parte desconhecido do público e boa parte registrado apenas em documentos de pequena circulação, mas, ao mesmo, tempo, extremamente rico. Dentre estes últimos destacamos Tony Cliff, dirigente do Socialist Workers Party, da Inglaterra; Ernest Mandel, membro do Secretariado Unificado da Quarta Internacional; e Nahuel Moreno, fundador da Liga Internacional dos Trabalhadores.
3) Por último um trabalho de pesquisa que, levando em conta os autores acima citados e as novas condições de desenvolvimento do trabalho científico depois da abertura dos arquivos soviéticos, retome, sob um novo prisma, velhos problemas colocados pela difícil transição ao socialismo, bem como aborde os novos problemas trazidos à luz pela “transição ao capitalismo”.2
Se enunciamos este ambicioso programa de pesquisa não foi, entretanto, para cumpri-lo neste pequeno espaço. Foi, antes de mais nada, para apontar a direção que esse debate deveria tomar para derrubar definitivamente os muros que dividiram a esquerda anti-stalinista e, ao mesmo tempo, justificar a importância do resgate histórico da posição que Leon Trotsky defendeu nesse debate. Se procedemos a tal tentativa de resgate não é, portanto, imbuídos do espírito do arqueólogo, e sim do pesquisador e militante preocupado com os problemas da transição ao socialismo.
A teoria do desenvolvimento desigual e combinado
A análise da obra de um autor como Leon Trotsky coloca uma grande número de problemas que é preciso ter em mente. Trata-se, em primeiro lugar, de uma obra de grande extensão que se desenvolve de maneira não linear, apresentando inflexões, rupturas e transformações implícitas e explícitas em seu interior. Trata-se, em segundo lugar, da obra de um militante político, de um personagem ativo dos acontecimentos históricos aos quais se refere.
As particularidades de tal obra nos obrigam, portanto, a tomar certos cuidados, para valorizá-la de maneira adequada. É preciso verificar o estatuto que cada texto, grande parte artigos de polêmica ou documentos partidários, ocupa no interior da própria obra. É preciso cotejá-la com a prática política do autor. Tal procedimento não implica em uma seleção arbitrária daquilo que é relevante e do que não. Pelo contrário, ele exige que, antes de começarmos, tracemos a linha que percorre o pensamento do autor, ou seja, exige que identifiquemos qual é o problema chave que percorrerá sua obra. Em Trotsky este problema não é, senão, a revolução mundial, corolário de sua teoria do desenvolvimento desigual e combinado. 3
Os primeiros esboços dessa teoria encontram-se presentes em 1905 e Balanço e perspectivas, as duas obras que Leon Trotsky consagrou a análise da primeira revolução operária do século. Nestes dois textos, o ponto de partida é a análise do capitalismo russo e suas profundas relações com o capitalismo europeu. É a inserção da Rússia na economia européia o que a iria distinguir. Segundo Trotsky, “a sociedade russa que se formava sobre uma determinada base econômica interior estava sempre sob o influxo, e inclusive a pressão, do meio sócio-histórico exterior”.4
Pressão essa que se exercia no terreno da economia, mas também, senão principalmente, na arena política. Cercada por potências estrangeiras, a Rússia viu-se empurrada para o capitalismo em condições ditadas pelo primitivismo de sua economia nacional. Faltava ao país dos czares aquele dinamismo interno que havia permitido a transformação de pequenos produtores em empresários capitalistas. O impulso transformador não viria de baixo para cima. Teria que vir, então, de cima para baixo e de fora para dentro.
As condições sob as quais a pressão externa foi exercida levaram o Estado russo a exercer o papel de protagonista na construção do capitalismo naquele país. Dessa forma, o mercado mundial condicionou o desenvolvimento do capitalismo na Rússia através da mediação do Estado czarista. O capitalismo russo “aparece como filho do Estado”.5
O império dos czares, afirma Trotsky, não adentra ao capitalismo pela porta dos fundos e sim o faz, com pompa e circunstâncias, pela porta da frente do capitalismo financeiro. Não de maneira espontânea e sim, sob a constante pressão da Europa: “A nova Rússia tomou um caráter particular na medida em que recebeu o batismo capitalista, na segunda metade do século XIX, do capital europeu, que se apresentou sob sua forma mais concentrada e abstrata, como capitalismo financeiro”.6
No clássico História da revolução russa, Trotsky retomará estas idéias desenvolvidas em sua juventude, formulando, desta vez de maneira explícita, a teoria do desenvolvimento desigual e combinado. O capitalismo é, aqui, entendido como uma totalidade que “prepara e, até certo ponto, realiza a universalidade e permanência na evolução da humanidade”.7 A universalização do capitalismo acelerou tempos, mergulhando as economias nacionais de países “atrasados”, para usar a linguagem da época, em um contexto dominado por um mercado mundializado.
O capitalismo chegava a galope. Recusando a teoria evolucionista das etapas históricas Trotsky assim enunciou as conseqüências dessa aceleração histórica: “O privilégio dos países historicamente atrasados — que é realmente — está em poder assimilar as coisas, ou melhor dizendo, em serem obrigados assimilá-las, antes do prazo previsto, saltando por cima de toda uma série de etapas intermediárias.”8
Diferentes fases do processo histórico confundiriam-se, assim, no interior de uma mesma formação social, atribuindo-lhe uma fisionomia própria. É claro, alerta Trotsky, que a capacidade de saltar essas fases nunca é absoluta. Ela “encontra-se condicionada em última instância pela capacidade de assimilação econômica e cultural do país”.9 Vale lembrar que a importação da técnica ocidental durante o reinado de Pedro I produziu, na Rússia um inusitado agravamento do regime servil como forma fundamental de organização do trabalho.
A discussão sobre a maturidade da Rússia para a revolução socialista, que havia caracterizado o marxismo legal de Struve e o menchevismo de Plekhanov, recebia uma resposta inovadora e extremamente poderosa: a maturidade para a revolução socialista não é definida pelo desenvolvimento nacional e sim pela inserção da Rússia na economia mundial. As condições objetivas para a revolução eram, assim, definidas externamente à Rússia: “as condições objetivas prévias de uma revolução socialista já foram criadas pelo desenvolvimento econômico dos países capitalistas avançados”.10
E relembrando a lei do desenvolvimento desigual, já enunciada por Lenin em sua obra O desenvolvimento do capitalismo na Rússia, Trotsky afirma: “Dessa lei do desenvolvimento desigual da cultura deriva-se outra, que, faltando um nome mais adequado, qualificaremos de lei do desenvolvimento combinado, aludindo à aproximação das diferentes etapas do caminho e à confusão de diferentes fases, à amalgama de formas arcaicas e modernas.”11
A teoria do desenvolvimento desigual e combinado é, na verdade, uma teoria do desenvolvimento do capitalismo em sua fase imperialista. É importante notarmos, aqui, que ao contrário de Lenin, Nicolai Bukharin e Rosa Luxemburgo não há em Trotsky uma obra econômica propriamente dita. Existe sim uma teoria do imperialismo, presente de maneira mais ou menos explícita em suas obras, mas não uma teoria econômica do imperialismo. Ou seja, não há em Trotsky um “discurso econômico”, muito embora existam observações sobre a economia mundial em vários pontos de sua obra.12
A teoria do imperialismo que perpassa a obra do marxista russo é, ao mesmo tempo, econômica e política. Ela coloca em seu centro a contradição fundamental existente entre a nação-Estado e a internacionalização crescente das forças produtivas, transformando o mercado mundial em um elemento decisivo para a apreensão do imperialismo. Contradição esta que se manifesta, por um lado nas contradições entre a lei do valor no mercado mundial e a regulamentação estatal da economia no interior das fronteiras nacionais e, por outro, naquelas que existem entre os países imperialistas e os países coloniais e semicoloniais.13
Há, portanto, uma dimensão política inerente ao conceito de imperialismo utilizado por Trotsky. Uma dimensão que é colocada pela aguda observação sobre as crescentes contradições econômicas, sociais e políticoideológicas próprias à época imperialista. Tais contradições ficam ainda mais evidentes nas soluções capitalistas à crise do capitalismo — a contra-revolução e a guerra — e no lugar ocupado pelo Estado na regulação do capitalismo, lugar esse que já havia sido identificado por Trotsky, no caso russo, em 1905, por ocasião de suas análises da revolução daquele ano.
A teoria do desenvolvimento desigual e combinado permitiu a Trotsky pensar a unidade dialética existente entre economia e política situando-se, imediatamente no nível da política e, mais especificamente, no nível da atualidade da revolução proletária.
Teoria da revolução e transição ao socialismo
O lugar da teoria do desenvolvimento desigual e combinado fica ainda mais claro na teoria da revolução permanente. Ao longo de sua atribulada vida, Trotsky cunhou pelo menos três formulações da teoria.
A primeira delas nasceu do entroncamento da já citada análise do desenvolvimento do capitalismo na Rússia com a experiência da própria revolução de 1905 e daquilo que ela havia aportado de novo à história das revoluções: a universalização da greve geral como arma privilegiada da luta operária e a construção de organismos de poder operário denominados soviets.
Assim como a derrota das revoluções de 1848 mostraram a Marx e Engels que a burguesia havia abandonado o caminho da revolução, os acontecimentos de 1905 serviram para mostrar, na Rússia, os fortes vínculos existentes entre a burguesia e o regime autocrático. A luta pela democracia na Rússia teria, inevitavelmente, que ser feita contra a burguesia e não por ela; deveria, afirmava Trotsky, conduzir o proletariado ao poder. A realização das tarefas democráticas pela ditadura do proletariado colocaria na ordem do dia tarefas socialistas.
Tome-se o caso da jornada de trabalho de oito horas, reivindicação que, em si, não era contraditória com a existência do capitalismo. Mas num quadro revolucionário a coisa muda de figura. A jornada de oito horas encontraria a resistência organizada dos capitalistas e enfrentaria, até mesmo, o lock out patronal e demissões ou ameaças de demissões em massa. O que faria, nessa situação, um governo operário. Não restaria outra saída que a expropriação das fábricas fechadas ou daquelas que demitirem e a organização da produção pelos trabalhadores. A concretização de uma reivindicação mínima dos trabalhadores, pelo governo operário conduziria, assim, à expropriação da burguesia.
A social-democracia russa não pode governar, conclui Trotsky, prometendo aos trabalhadores não abrir mão de seu programa mínimo e, ao mesmo tempo, prometendo à burguesia não ultrapassá-lo. Na ditadura do proletariado, a diferença entre o programa mínimo e o máximo se esfuma.
Só é possível realizar o programa mínimo enfrentando o capital. Revolução democrática e revolução socialista formam assim uma unidade, a unidade da “revolução ininterrupta, que entrelaçava a liquidação do absolutismo e do sistema de servidão civil com a revolução socialista através de uma série de conflitos sociais em agudização paulatina, através do surgimento de novas camadas sociais entre as massas e de contínuos ataques do proletariado aos privilégios econômicos e políticos das classes dominantes.”14
A teoria da revolução permanente em sua formulação de 1905 pode ser resumida como se segue: “a vitória completa da revolução democrática na Rússia somente pode ser concebida na forma de ditadura do proletariado seguido pelos camponeses. A ditadura do proletariado, que inevitavelmente colocaria sobre a mesa não somente tarefas democráticas, como também socialistas, daria, ao mesmo tempo, um impulso vigoroso à revolução socialista internacional. Somente a vitoria do proletariado do Ocidente poderia proteger a Rússia da restauração burguesa, dando-lhe a garantia de completar a implantação do socialismo.”15
Posição divergente assumiam, à época, tanto os mencheviques, como os bolcheviques liderados por Lenin. A posição dos mencheviques, teorizada por Plekhanov, afirmava o caráter burguês da revolução. Esse caráter seria determinado pelas próprias tarefas colocadas para a revolução e pelo papel dirigente que atribuíam à burguesia liberal na luta contra o anacrônico absolutismo russo. De acordo com Plekhanov, “o único objetivo não fantástico dos socialistas russos somente pode ser, atualmente, por um lado, a conquista de instituições políticas livres e, por outro, a elaboração dos elementos necessários à criação do futuro partido socialista operário da Rússia.”16
Trotsky resumia essa concepção das seguinte maneira: “a idéia menchevique da revolução, despojada de suas episódicas estratificações e desvios individuais, consistia no seguinte: a vitória da revolução burguesa na Rússia só era possível sob a direção da burguesia liberal e deve dar a esta última o poder. Depois, o regime democrático elevaria o proletariado russo, com um êxito muito maior que até então, ao nível de seus irmãos maiores ocidentais, pelo caminho da luta rumo ao socialismo.”17
Essa caracterização da burguesia liberal definia uma determinada política de alianças. Plekhanov não se cansava de repetir: “Sem assustar ninguém com o ‘fantasma vermelho’, por enquanto ainda distante, tal programa político atrairia a nosso partido revolucionário a simpatia de todos os que não são inimigos sistemáticos da democracia; juntamente com os socialistas poderiam subscrevê-lo muitíssimos representantes de nosso liberalismo”.18
A posição dos bolcheviques era outra. Apesar de definir a revolução como burguesa pelas tarefas que a ela estavam colocadas, Lenin descartava toda aliança com a burguesia liberal. O problema fundamental da revolução burguesa na Rússia atrasada era o da questão agrária. À política de alianças defendida por Plekhanov, Lenin contrapunha a aliança do proletariado com o campesinato e afirmava que somente uma ditadura destas duas classes, com os operários sob a direção do Partido Bolchevique, daria condições para a revolução cumprir as tarefas que para ela estavam colocadas. Essa ditadura seria não uma ditadura socialista, mas uma ditadura democrática. Evidentemente que uma ditadura com tal caráter poderia ser hegemonizada pelo campesinato, a classe mais numerosa de então.19
De uma forma sintética podemos notar que as três concepções, que se desenhavam em 1905, atribuíam tarefas, sujeitos sociais e sujeitos políticos diferentes para a revolução russa. Os mencheviques falavam de uma revolução com tarefas democráticas, dirigida pela burguesia. Os bolcheviques atribuíam a ela um caráter também democrático, mas afirmavam que o papel dirigente cabia aos operários e camponeses e ao partido revolucionário papel de sujeito político. Trotsky falava em revolução socialista, com o proletariado a sua frente, mas afirmava seu caráter espontâneo (ver o quadro).
Embora as tarefas da revolução Russa e seu sujeito social estivessem claramente definidos no pensamento de Trotsky desde aquela época, é só em 1917 que ele acrescentará a sua teoria, o papel dirigente do partido, ou seja, é só aí que ele definirá o sujeito político de tal transformação social. Temos, então, uma segunda formulação da teoria da revolução permanente. Tal formulação, ganhou corpo com a adesão de Trotsky e da Organização Interdistrital (Mezharaionka) ao Partido Bolchevique e se transformou em letra no livro Lições de Outubro, escrito em 1924.20
O encontro de Trotsky com o bolchevismo não resultou apenas de sua compreensão da questão do partido como também foi possibilitado pela vitória de Lenin na conferência realizada pelos bolcheviques em abril de 1917. Nas teses que apresentou à conferência, Lenin abandonou a idéia de uma revolução democrática na Rússia e afirmou o caráter socialista da revolução, opondo-se a um grande número de velhos bolcheviques, entre os quais Kamenev e Zinoviev. O giro promovido por Lenin no interior do Partido Bolchevique deu a Trotsky a certeza de que não havia mais razões para continuarem a caminhar separados pela mesma trilha.21
Chama a atenção que Trotsky, mesmo depois de 1917 e particularmente na obra Lições de Outubro, não procurou generalizar a teoria da revolução permanente. Foi somente em fins de 1929, já no seu exílio, que ele afirmou que tal teoria deveria ser apresentada “em ligação com o caráter, os laços internos e os métodos da evolução internacional em geral” e, mais especificamente, “para os países de desenvolvimento burguês retardatário (...) coloniais e semicoloniais”.22 Universalizada de tal forma, a teoria da revolução permanente aparece em sua terceira versão.
Foi a revolução chinesa de 1927 e a política da Internacional Comunista stalinizada o que levou Trotsky a debruçar-se de novo sobre tal teoria. Para Mandel, a demora de Trotsky em generalizar sua teoria se deveu entre outras razões à oposição que a ela manifestavam seus aliados da Oposição Unificada (Zinoviev e Kamenev), mas também à resistência demonstrada por alguns membros da Oposição de Esquerda (Karl Radek e Evgeni Preobrazhenski). A dimensão do processo revolucionário na China fez com que abandonasse sua atitude diplomática e encarasse frontalmente o problema, mesmo às custas de perder aliados.23
É dessa época a troca de correspondência entre Trotsky e Preobrazhenski sobre os problemas da revolução chinesa. Nestas cartas, Trotsky trava viva polêmica sobre a natureza social da revolução chinesa e a política de alianças levada à cabo pelo Partido Comunista Chinês. Discordando tanto da Internacional Comunista como de seu camarada da Oposição, Trotsky rejeitava a bandeira de “ditadura democrática” e afirmava a necessidade do proletariado conquistar o poder sob a direção do Partido Comunista Chinês.24
A versão mais acabada dessa formulação da teoria aparece em A revolução permanente, obra concluída em novembro de 1929. Como seria de se esperar, longas páginas são dedicadas à revolução chinesa. Mas, o que para nossos propósitos vale a apenas destacar são os três aspectos da teoria da revolução permanente, explicitados no capítulo introdutório de tal obra.25 São eles:
1) O cumprimento das tarefas democráticas nos países burgueses atrasados conduz, diretamente, à ditadura do proletariado, que coloca as tarefas socialistas na ordem do dia. Tornava-se, assim, permanente o processo revolucionário que ia da revolução democrática à transformação socialista da sociedade.
2) O caráter internacional da revolução socialista é o resultado do estado da economia e da estrutura social do planeta. O internacionalismo, longe de ser um princípio abstrato é o reflexo teórico e político “do caráter mundial da economia, do desenvolvimento mundial das forças produtivas e do ímpeto mundial da luta de classes. A revolução socialista começa no âmbito nacional mas nele não pode permanecer. A revolução proletária não pode ser mantida em limites nacionais senão sob a forma de um regime transitório, mesmo que este dure muito tempo, como demonstra o exemplo da União Soviética. No caso de existir uma ditadura proletária isolada, as contradições internas e externas aumentam inevitavelmente e ao mesmo passo que os êxitos. Se o Estado proletário continuar isolado, ele, ao cabo, sucumbirá vítima dessas contradições. (...) A revolução internacional, a despeito de seus recuos e refluxos provisórios, representa um processo permanente.”26
3) A conquista do poder é apenas o início de um longo processo no qual “todas as relações sociais se transformam no transcurso de uma luta interior contínua. (...) Os acontecimentos que se desenrolam guardam necessariamente caráter político, dado que assumem a forma de choques entre os diferentes grupos da sociedade em transformação. As explosões da guerra civil e das guerras externas se alternam com os períodos de reformas ‘pacíficas’. As profundas transformações na economia, na técnica, na ciência, na família, nos hábitos e nos costumes, completando-se, formam combinações e relações recíprocas de tal modo complexas que a sociedade não pode chegar a um estado de equilíbrio. Nisto se revela o caráter permanente da própria revolução socialista.”27
Em sua formulação, tal como apresentada no texto de 1929, a teoria da revolução permanente é, ao mesmo tempo, uma teoria da revolução e uma teoria da transição ao socialismo baseada na permanente transformação das relações sociais. Este aspecto, o terceiro em nossa enumeração, tem, com bastante freqüência, escapado à atenção dos comentaristas, o que tem impedido não só de compreender o alcance dessa teoria, como tem produzido uma dissociação entre ela e a discussão sobre a natureza social da União Soviética.28
Tal desatenção é totalmente injustificada. Trotsky é claro ao afirmar a dimensão internacional da construção do socialismo, rejeitando a teoria do socialismo em um só país. Mas não é menos claro ao colocar a necessidade de transformação contínua das relações sociais. De todas as relações sociais. Mas se isso não estivesse claro no texto, ainda haveria seu esforço, durante os anos chaves da guerra civil, em discutir os problemas da cultura e da vida cotidiana na Revolução Russa.29
Sobre a natureza social da União Soviética
Para compreendermos a apreciação de Trotsky sobre a natureza social da União Soviética é preciso ter como ponto de partida a teoria da revolução permanente. Entre as maiores realizações da revolução de outubro de 1917 na Rússia está, sem dúvida, a expropriação da grande burguesia. A fração stalinista, já a partir de meados da década de 20, identificou essa expropriação com o advento do socialismo. Com isso, afirmava a possibilidade de construção do socialismo em um só país.
Trotsky combateu até o fim de sua vida essa identidade, afirmando que a expropriação não é suficiente para definir como socialista a natureza social da Rússia. Para Trotsky, “a transformação das formas de propriedade, não soluciona a questão do socialismo, apenas a coloca.”30
Ou seja, a transformação das relações de propriedade representa apenas o primeiro passo da transição ao socialismo. Para tornar-se social, a propriedade privada tem que passar inevitavelmente pela estatização, afirma Trotsky. Mas a condição necessária não é suficiente. A propriedade só se torna de todo o “povo”, ou seja, só é plenamente socializada, quando desaparecem os privilégios e as distinções sociais.
E ressaltando a necessidade de transformar profundamente as relações sociais, ou seja, a necessidade da permanente revolução (da revolução permanente) dessas relações, afirma: “A passagem das fábricas para o Estado mudou a situação do operário apenas juridicamente. Na realidade, ele é compelido a viver necessitando trabalhar um certo número de horas por um dado salário. As esperanças que teve outrora o operário no partido e nos sindicatos, transportou-as, após a revolução, para o Estado criado por ela. Mas o funcionamento útil deste Estado foi limitado pelo nível técnico e cultural. Para melhorar este nível, o novo Estado recorreu aos velhos métodos de pressão sobre os músculos e os nervos do trabalhador. Formou-se todo um corpo de estímulos. A gestão da indústria se tornou extremamente burocrática. Os operários perderam toda a influência sobre a direção das fábricas. Com o pagamento por peça, as duras condições de existência material, a ausência de liberdade para se deslocar, com a terrível repressão policial penetrando a vida de cada fábrica, o operário dificilmente se poderá sentir um ‘trabalhador livre’. Na burocracia ele vê um chefe, no Estado um patrão. O trabalho livre é incompatível com a existência de um Estado burocrático”.31
A revolução russa, portanto, longe de realizar o socialismo não fez senão inaugurar uma fase de transição entre o capitalismo e o socialismo.32 Para Trotsky, após a revolução as tendências socialistas e capitalistas continuam a se enfrentar no interior da sociedade russa após a vitória da revolução e de maneira ainda mais intensa após a morte de Lenin.33
Essa fase transitória só poderia ser completada com a vitória da revolução socialista em escala mundial. O mercado capitalista mundial cria entraves econômicos e estimula forças políticas de tal monta que transformam aquele setor do mundo no qual a burguesia foi expropriada em uma fortaleza sitiada.
A inserção da Rússia no mercado mundial havia, na análise de Trotsky, permitido à Rússia saltar etapas e realizar a primeira revolução socialista vitoriosa da história. Mas o fato de haver chegado primeiro à revolução não significava que a Rússia fosse o primeiro país a chegar ao socialismo, o que teria como pressuposto o fim da coerção do mercado mundial e da divisão internacional do trabalho criada pelo capitalismo.
A derrota da revolução no Ocidente (Alemanha e Hungria) e no Oriente (China), isolou a revolução russa, adiando a possibilidade de superação definitiva do capitalismo. A fração stalinista transformou esse fato em teoria afirmando a possibilidade de construção do socialismo em um só país. Não foi, entretanto, original. Em sua luta com a fração stalinista, Trotsky relembra que foi Georg von Vollmar, um dos líderes da ala revisionista da social-democracia alemã, um dos primeiros a pensar um “Estado socialista isolado”.34
Para Vollmar, uma Alemanha socialista manteria relações econômicas freqüentes com a economia capitalista mundial. Uma técnica mais desenvolvida e baixos custos de produção dariam a Alemanha uma superioridade incontestável no mercado mundial. O socialismo poderia, assim, ser vitorioso através do mercado, pela intervenção dos preços baixos, dispensando a revolução socialista. A conclusão de Trotsky é profética: a teoria do socialismo em um Estado isolado “baseia-se na perspectiva da coexistência pacífica dos sistemas socialista e capitalista.”35 Perspectiva essa que foi compartilhada pela fração stalinista.
Era contra essa coexistência pacífica que Trotsky lutava. Ele via na revolução mundial a única tábua de salvação para a sociedade soviética. Era a possibilidade que ela tinha de romper o isolamento e avançar na construção do socialismo. No pensamento de Trotsky a construção do socialismo estava subordinada ao primado da revolução mundial, o primado da política.
É por essa razão que ao descrever longamente a sociedade soviética, em uma conhecida passagem de A revolução traída, Trotsky termina apostando suas fichas na revolução mundial. Ou seja, a vitória do capitalismo ou do socialismo no interior da sociedade soviética era definida externamente pelo avanço ou retrocesso da relação, mundialmente definida, de forças entre as classes. Vejamos a conhecida citação para verificarmos como Trotsky coloca o problema: “A União Soviética é uma sociedade contraditória a meio caminho entre o capitalismo e o socialismo, na qual: a) as forças produtivas estão longe de ser suficientes para conferir à propriedade de Estado um caráter socialista; b) a propensão para a acumulação primitiva, nascida da necessidade manifesta-se através dos inúmeros poros da economia planificada; c) as normas de repartição preservam um caráter burguês sobre a base de uma nova diferenciação social; d) o crescimento econômico; melhorando lentamente a condição dos trabalhadores, contribui para a rápida form ão de uma camada de privilegiados; e) a burocracia, explorando os antagonismos sociais, tornou-se uma casta incontrolável, estranha ao socialismo; f) a revolução social, traída pelo partido governante, vive ainda nas relações de propriedade e na consciência dos trabalhadores; g) a evolução das contradições acumuladas pode conduzir ao socialismo ou fazer recuar a sociedade para o capitalismo; h) a contra-revolução em marcha para o capitalismo deverá quebrar a resistência dos operários; i) os operários, dirigindo-se para o socialismo, deverão derrubar a burocracia. Neste caso, a questão será decidida através da luta das forças vivas na arena nacional e internacional.”36
O último parágrafo do livro A revolução traída, deixa o problema ainda mais claro. Escreve Trotsky: “Mais do que nunca, os destinos da Revolução de Outubro estão hoje ligados aos destinos da Europa e do mundo. Os problemas da União Soviética se resolvem na península espanhola, na França e na Bélgica”.37
O primado da política, que se expressava na arena mundial, aparecia também na análise que Trotsky realizava das tarefas da construção do socialismo na União Soviética. Para o marxista russo, as novas relações de propriedade estabelecidas pela revolução estavam vinculadas indissoluvelmente ao caráter do Estado. O predomínio de tendências socialistas estaria assim assegurado não por um desenvolvimento automático da economia e sim pelo poder político da ditadura do proletariado. “O caráter da economia, como umtodo, depende, pois, do caráter do poder estatal”, concluirá Trotsky.38
E contrariando os argumentos economicistas próprios do marxismo vulgar definirá a política como o fator decisivo da economia soviética: “A política é a economia concentrada. Na presente etapa, a questão econômica da República Soviética resolve-se mais do que nunca do ponto de vista da política.”39
A ênfase que Trotsky dá na discussão sobre a natureza da sociedade soviética à definição do caráter do Estado, não é, portanto, arbitrária. Ela procura colocar o problema tal qual ele se apresenta para a ação revolucionária, definindo a política da Oposição de Esquerda, primeiro, e da Quarta Internacional, depois, frente a esse Estado. 40
Notas
1 Com o perdão da geografia acabam sendo enquadradas nessa categoria países tão distantes do “Leste europeu” como Cuba, China e Vietnam.
2 A abertura dos arquivos está dando lugar a um grande número de trabalhos monográficos, nos quais aspectos da política soviética têm sido esclarecidos. Faltam ainda trabalhos nos quais estes novos materiais forneçam a base para uma reflexão sobre a natureza da sociedade soviética. Uma amostra do resultaod desses trabalhos monográficos, pode ser encontrada na série From the Secret Archives of the Former Soviet Union, publicada pela editora Prometheus. Merecem destaque Valentina P. Vilkova, The struggle for power: Russia in 1923, Amherst, Prometheus, 1996; Yuri Buranov, Lenin’s will: Falsified and forbidden, Amherst, Prometheus, 1995; e Yuri l. Dyakov e Tatyana s. Bushuyeva, The Red Army and the Wehrmacht: How the soviets militarized Germany in 1923-1933 and paved the way for fascism, Amherst, Prometheus, 1995.
3 A rigor, Trotsky falará em Lei do Desenvolvimento Desigual e Combinado, muita embora reconheça que não é a expressão mais adequada. Assim como Michel Löwy preferimos a expressão Teoria do Desenvolvimento Desigual e Combinado, que nos parece, neste caso, mais apropriada. Michel Löwy, “A teoria do desenvolvimento desigual e combinado”, Outubro,1, 1998, pp. 73-80.
4 Leon Trotsky. 1905. Resultados y perspectivas, Paris, Ruedo Ibérico, 1971, v. 2, p. 147.
5 Idem, v. 2, p. 151.
6 Idem, v. 1, p. 59.
7 Leon Trotsky, Historia de la revolución russa, Bogotá, Pluma, 1982, v. 1, p. 14.
8 Idem, p. 15
9 Idem.
10 Leon Trotsky, 1905, Resultados y perspectivas, op. cit., v. 2, p. 205.
11 Leon Trotsky, Historia de la revolución russa, op. cit., v. 1, p. 15.
12 Denise Avenas, Teoria e política no pensamento de Trotsky, Lisboa, Delfos, 1973, p. 34.A respeito da ausência de uma teoria econômica do imperialismo, ver Ernest Mandel, Trotsky como alternativa . São Paulo, Xamã, 1995.
13 Ernest Mandel, op. cit., p. 37 e ss.
14 Leon Trotsky, 1905, Resultados y perspectivas, op. cit., v. 2, p. 187.
15 Leon Trotsky, “Tres concepciones de la revolución rusa”, in : Ernest Mandel (org.), Trotsky: teoria e prática da revolução permanente, México D.F., Siglo XXI, 1983, p. 59.
16 Georghi Plekhanov, El socialismo y la lucha política, México D.F., Roca, 1975, p. 96. Uma exposição completa da posição dos mencheviques, com suas contradições internas, pode ser encontrada em John D. Basil, The mensheviks in the Revolution of 1917, Columbus, Slavica, 1983, pp. 11-25.
17 Leon Trotsky, op. cit., p. 58.
18 Georghi Plekhanov, op. cit., p. 96. De fato, Plekhanov chegou a atribuir a derrota da revolução de 1905 aos bolcheviques, que, com suas palavras-de-ordem, teriam assustado os liberais, levando-os a apoiar o governo do czar (Cf. John D. Basil, op. cit., p. 14.
19 A posição de Lenin pode ser encontrada em “Duas táticas da social-democracia na revolução democrática” in Obras escolhidas, Lisboa, Avante, 1984, v. 1.
20 Leon Trotsky, Lecciones de Octubre, Buenos Aires, Biblioteca Proletaria, 1972. Escrito à época da aguda luta política no interior do Partido Bolchevique após a morte de Lenin, este pequeno livro recebeu um ataque frontal de Stálin, Zinoviev Kamenev e Bukharin.
21 Os mencheviques, por sua vez, não alteram substancialmente sua posição original, muito embora aceitem, em meio a crise do governo provisório, partilhar com os liberais a direção do Estado a partir de maio de 1917, quando o menchevique georgiano Iraklli Tsereteli assume o posto de ministro dos Correios e Telégrafos. Sobre as Teses de Abril e a adesão de Trotsky ao bolchevismo ver Pierre Broué, El Partido Bolchevique, Madri, Ayuso, 1973, pp. 116-126. Em sua “Carta ao Instituto Histórico do Partido” Trotsky protesta contra a falsificação da história da insurreição de Outubro e cita um grande número de documentos que dão conta de sua relação com o bolchevismo no decorrer do ano de 1917 (Leon Trotsky, A revolução desfigurada, São Paulo, Ciências Humanas, 1979, pp. 1-66). Referência fundamental é, também, Isaac Deutscher, Trotsky. O profeta armado (1879-1921), Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1984, em especial o capítulo 9.
22 Leon Trotsky, La révolution permanente, Paris, Gallimard, 1970, p. 228.
23 Trotsky chega a comparar a derrota da revolução chinesa com a derrota alemã de 1923. Leon Trotsky. “Correspondencia entre Trotski y Preobrajenski”, in Ernest Mandel (org.), Trotski: teoría y prática de la revolucion permanente, op. cit., p. 254.
24 Necessidade que não era definida pela conjuntura e sim pelo longo processo de desenvolvimento do capitalismo na China. Isso quer dizer que Trotsky não exigia a imediata conquista do poder e sim que a classe operária e o Partido Comunista Chinês lutassem por ele. O stalinismo procurou ao longo dos tempo qualificar a teoria da revolução permanente como uma aventura, o que Trotsky insistentemente desmentiu, como na seguinte citação: “Entende-se, evidentemente, que de forma nenhuma trata-se de convocar o Partido Comunista Chinês a fazer uma insurreição imediata pela tomada do poder. O ritmo depende inteiramente das circunstâncias. A tarefa consiste em garantir que o Partido Comunista esteja impregnado complemente da convicção de que a terceira revolução chinesa pode chegar a um final vitorioso somente através da ditadura do proletariado sob a direção do Partido Comunista.” Idem, p. 270.
25 Leon Trotsky, La révolution permanente, op. cit., pp. 42-44.
26 Idem, pp. 43-44.
27 Idem, p. 43.
28 É este o caso de Knei-Paz, que vê na teoria da revolução permanente, uma teoria da “revolução do atraso”. Baruch Knei-Paz, “Trotski: revoluçãopermanente e revolução do atraso”, in Eric J. Hobsbawn (org.) História do marxismo, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1985, v. 5.
29 Ver, por exemplo, Leon Trotsky, El nuevo curso. Problemas de la vida cotidiana, México D. F., Pasado y Presente, 1978. 30 Leon Trosky, The revolution betrayed. What is the Soviet Union and where is it going, Detroit, Labor 1991, p. 24.
31 Idem, p. 205.
32 “É, pois, bastante mais exato chamar o atual regime soviético, em toda a sua contraditoriedade, não socialista mas um regime transicional preparatório entre o capitalismo e o socialismo.” Idem, p. 41.
33 “O capítulo da Revolução de Outubro posterior à morte de Lenin, caracteriza-se tanto pelo desenvolvimento das forças socialistas quanto pelo das forças capitalistas da economia soviética.” Leon Trotsky, A revolução desfigurada, op. cit., pp. XII-XIII. Um daqueles muros que as correntes anti-stalinistas construíram separando-se entre si é responsável pela equivocada afirmação de que em A revolução traída, Trotsky teria afirmado a contradição entre “de um lado o caráter objetivamente socialista da base econômica e de outro, sua apropriação pela burocracia staliniana” (João Quartim de Moraes, “A difícil supressão das relações mercantis”, Crítica Marxista, 1(1): 1994, p. 69).
34 Leon Trotsky, La Internacional Comunista desde la muerte de Lenin, Buenos Aires, Materiales Sociales, 1973, pp. 106 e ss.
35 Idem, p. 107.
36 Idem, p. 216. Grifos nossos.
37 Idem, p. 247. Quando Trotsky escreve essas linhas, a guerra civil já havia começado na Espanha.
38 Leon Trosky, The revolution betrayed, op. cit. , p. 212.
39 Leon Trotsky, A revolução desfigurada, op. cit., pp. XIV.
40 Quando, durante o ano de 1939 uma aguda luta política se desenvolveu no interior da seção norte-americana da Quarta Internacional, o Socialist Workers Party, em torno do caráter da sociedade soviética, Trotsky fez questão de afirmar, logo no início do debate: “Quem disser que a URSS já não é mais um Estado operário degenerado, mas sim uma nova formação social, deve dizer claramente o que é que acrescenta de novo as nossas conclusões políticas.” Leon Trotsky, Em defesa do marxismo, op. cit., p. 15.